terça-feira, junho 20, 2006

Os ratos correm para a toca

Incoerente e sem votos, Freire põe PPS a serviço da direita

O PPS decidiu não formalizar coligação com o PSDB, mas aprovou, em convenção realizada ontem, no Rio de Janeiro, oferecer apoio “firme e decidido” ao candidato tucano à Presidência da República, Geraldo Alckmin. A decisão consuma décadas de uma longa caminhada da sigla no sentido da direita. Para simbolizar esta “nova fase”, o PPS elevou o prefeito do Rio, Cesar Maia (PFL), à condição de principal da convidado da convenção de ontem.

Contrariando os desejos do candidato tucano Geraldo Alckmin e do próprio presidente nacional da sigla, Roberto Freire, o Partido Popular Socialista (PPS) decidiu nesta segunda-feira não formalizar uma aliança presidencial com o PSDB. O apoio a Alckmin será informal. A deliberação foi aprovada por aclamação na convenção nacional do PPS, realizada no Rio de Janeiro.

O prefeito do Rio, Cesar Maia (PFL), foi o convidado principal da convenção do PPS, que também sacramentou a aliança em torno da candidatura da deputada Denise Frossard (PPS) ao governo do Rio. Freire lamentou que o PSDB, que lançou o deputado Eduardo Paes, tenha ficado fora da aliança, que conta também com o PV do deputado Fernando Gabeira, mas disse respeitar a decisão.

O PSDB aceitará o apoio informal do PPS à candidatura Alckmin, mas os estrategistas tucanos não escondem que preferiam ter o apoio formal do PPS para aumentar o tempo de TV de Alckmin ou, o que seria melhor, ter Roberto Freire como candidato à Presidência para cumprir dois objetivos: ajudar a direita a levar a eleição para o segundo turno e usar o PPS para fazer o jogo sujo para o PSDB, atacando diária e sistematicamente a candidatura de Lula, enquanto Alckmin ficaria liberado para fazer uma campanha menos virulenta e mais propositiva.

Em reuniões a portas fechadas com Alckmin, Freire já havia se colocado à disposição para cumprir o papel de sócio menor da direita, mas os caciques do PPS que ainda desfrutam de alguma sensatez o impediram de consumar o casamento de papel passado com o candidato tucano. Restou a Freire aceitar a lógica das coligações estaduais e oferecer à direita “o apoio político, firme e decidido, à candidatura de Geraldo Alckmin”.

A convenção também decidiu que Freire participará do conselho político da campanha de Alckmin, como forma de expressar o compromisso com a candidatura. O deputado dará palpites no programa de governo do candidato tucano. Se seus palpites serão levados em conta é outra história. Freire explicou que as exigências da verticalização e de conflitos regionais entre tucanos e candidatos do PPS impediram que Alckmin tivesse a coligação oficial - e o tempo de televisão - com seu partido. Freire citou os estados de Tocantins, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e Mato Grosso como os principais entraves regionais à aliança nacional com o PSDB.

Discurso incoerente
Mas, mesmo para justificar a aliança informal, o presidente do PPS é obrigado a lançar mão de malabarismos retóricos. Freire tem se apegado muito ao discurso da ética para explicar sua adesão subalterna ao projeto eleitoral da direita. Em seu blog, ele afirma que “com a arrogância que vem dos tempos em que ainda pregavam a ética, Lula e o PT não enxergam o risco que estão correndo. Perderam a capacidade de despertar valores republicanos ao tombar na vala comum da corrupção, do fisiologismo, da incompetência, da submissão à politicagem.” O suposto envolvimento de integrantes do PT com o chamado “valerioduto” é freqüentemente citado por Freire como prova do “desmantelamento” moral do governo e do PT.

Mas quando questionado por repórteres se o PSDB também não estaria na mesma situação já que um de seus principais líderes, o senador e ex-presidente tucano Eduardo Azeredo (MG) também usou recursos do chamado “valerioduto”, Freire desconversa e diz que o caso de Azeredo “é muito diferente”. O líder do PPS também desconversa quando é lembrado que Alckmin impediu a instalação de quase 70 CPIs sobre irregularidades em seu governo e que recentemente foi alvo de diversas denúncias de mal versação de dinheiro público. Ou que o governo FHC comprou deputados para aprovar a emenda da reeleição e praticou uma verdadeira orgia de corrupção nos processo e privatização. Todos esses episódios que mancham a trajetória do PSDB não são levados em conta por Roberto Freire.

Outro ponto de Freire gosta de destacar em seus virulentos discursos contra o governo Lula é a condenação da forma ortodoxa com que o atual governo conduz a economia. Resta saber que argumentos o presidente do PPS usará para defender Alckmin neste tema, uma vez que está mais do que claro que o programa que Alckmin apresentará durante a campanha (se é que o fará) não terá uma linha de divergência com o que há de mais reacionário na lógica neoliberal de condução econômica. Itens como a retomada das privatizações, o forte atrelamento aos organismos internacionais e a completa submissão aos interesses do sistema financeiro são pontos pacíficos da linha programática a ser adotada pela coligação PSDB/PFL.

Sem votos
Mas a incoerência do discurso não esconde o real motivo de Freire ter desistido de levar adiante sua candidatura. O que pesou mesmo, além das pressões dos diretórios regionais por causa da verticalização, foi a constatação de que corria o sério risco de terminar em último lugar na corrida presidencial.

Ao lançar sua candidatura, no auge da histeria midiática que fabricou a crise do chamado “mensalão”, Freire imaginava que a situação do presidente Lula e do PT era tão deplorável que qualquer candidato oposicionista cairia nas graças do eleitorado. À medida que as pesquisas foram desmontando esta tese, Freire “caiu na real” e foi, aos poucos, vendo que suas pretensões eleitorais não passavam de um sonho de uma noite de verão.

Não faltam números para comprovar a pouca densidade eleitoral de Freire. Nas diversas séries de pesquisas realizadas sobre a sucessão presidencial de 2006, Freire nunca conseguiu ultrapassar a marca dos 4% das intenções de voto e, mesmo assim, só alcançou este patamar nos cenários de pesquisa estimulada em que não havia concorrente do PMDB na disputa. Nos cenários com candidatura peemedebista, a média de Freire era de 2% das intenções de voto. Já nas pesquisas espontâneas, nas quais não é mostrada ao eleitor nenhuma lista de candidatos, o nome de Roberto Freire não chega nem a ser lembrado.

A última participação eleitoral do presidente do PPS também colabora para qualificá-lo como um político sem votos. Freire foi o deputado federal eleito com menos votos no Estado de Pernambuco em 2002. Teve exatamente 54.003 votos, e só escapou de ser cassado pelas urnas porque a coligação com a qual concorreu (PPS / PSDC / PHS / PSC) conseguiu, por pouco, atingir coeficiente eleitoral para a eleição de um parlamentar.

O próprio Freire reconhece sua condição. Ontem, ao declarar o apoio informal do PPS à candidatura tucana, disse que não sabe “qual a contribuição em termos de voto” poderá dar ao candidato tucano. “Já a credibilidade do PPS, não tenho dúvida, será uma grande colaboração”, disse. E prosseguiu afirmando que “temos mais de 80 anos de história na política brasileira e não estaremos ao lado do governo Lula pela indecência que ele significa. Ele foi uma fraude do ponto de vista da perspectiva de mudança...”

Parece que de fraude, Roberto Freire realmente entende, a começar pelo embuste de tentar carregar para o PPS a trajetória do velho PCB, cujos ideais, símbolos e história Roberto Freire e seus comparsas já tinham rasgado e jogado no lixo em 1992. Agora, ao colocar o PPS a serviço da direita mais reacionário do país, Freire acabou de vez de sepultar o restinho de dignidade histórica que ainda restava à sigla que preside.

Da redação,Cláudio Gonzalez
http://www.vermelho.org.br/base.asp?texto=4063