José Dirceu,
ex -ministro-chefe da Casa Civil
[29/JUN/2006]
Quem acompanhou a via sacra dos programas sociais do governo Lula, particularmente do Bolsa Família, sabe que a oposição e grande parte da mídia apostaram no seu fracasso. No início, foi um coro só: "Os petistas e o governo Lula são incompetentes, não sabem administrar programas sociais". Agora que o Bolsa Família está implantado em todo o país e dá acesso a uma renda mínima para 11,1 milhões de famílias – que antes viviam abaixo da linha de pobreza – e é reconhecido pelas Nações Unidas, tentam virar o disco com outros argumentos.
"O Programa é eleitoreiro e aumenta o gasto público", dispara a oposição. Não bastasse, sai, agora, com a seguinte pérola: "o Bolsa Família pode ser o responsável pelo não crescimento do país". Os críticos chegam a chamar o Programa de bolsa esmola para concluir, numa análise simplista do quadro eleitoral, que o voto popular está sendo comprado pelo governo. Só isso – imaginam – explicaria a rejeição popular à coalizão tucano-pefelista e o apoio ao presidente Lula. Nega-se, às camadas populares, qualquer traço de consciência crítica que as leve a discernir os aliados, das elites que só sabem agir em benefício próprio.
Escapa, a essa elite, que o apoio ao presidente Lula é fruto, primeiro, de sua própria liderança, construída ao longo dos últimos trinta anos; e, segundo, da força de seu partido, o PT, o preferido dos eleitores segundo as pesquisas. O que a oposição e certa imprensa não podem admitir é que, no governo, o mesmo Lula criou 5 milhões de empregos formais em quatro anos; hoje, 99% das crianças brasileiras fazem três refeições ao dia e; vivemos no Brasil menos desigual dos últimos 46 anos.
Segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas, com base em dados da PNAD, a renda per capita dos pobres, em 2004, subiu 14%, enquanto a renda média da população cresceu 3,6%. Sob a administração Lula, a inflação brasileira foi reduzida a 4,5%, as pensões subiram, o salário mínimo aumentou e compra, hoje, duas cestas básicas, em comparação a pouco mais de uma, comprada em 2002.
Se erram o alvo com os primeiros tiros, nossos críticos disparam outra bateria, acusando o governo de populismo cambial. Será? Hoje, o Brasil tem superávit em contas correntes, reduzimos em 1/3 a dívida externa e saímos do FMI. Pagamos a dívida no Clube de Paris e retiramos de circulação títulos como os Bradies e os C- Bonds .
Se na frente externa o quadro é positivo, no mercado doméstico a pregação tucano-pefelista da volta ao passado não ecoa nas periferias. O preço do saco de cimento caiu para R$ 9, e o número de construções populares multiplica-se por todo o país. Para não perder o bordão, nossos críticos alegam que o Bolsa Família não inclui as condicionalidades prescritas pelo Banco Mundial, principalmente as que se referem a matrícula e presença na escola. Por aí também não dá mais, uma vez que, hoje, 90% das escolas brasileiras monitoram a presença das crianças beneficiadas pelo Programa, contra menos de 20% no governo anterior (com o Bolsa Escola).
No desespero, a oposição chega ao ponto de detectar um derradeiro risco nesse processo: "O crescimento de renda "à chinesa", com políticas compensatórias, ameaçaria as contas públicas". Menos, Senhores: todo mundo sabe que a verdadeira ameaça ao país é a dívida interna, que dobrou em relação ao PIB, nos oito anos de mandato de FHC. Quem ainda restringe a aceleração do crescimento são os juros pagos, que consomem 8% do PIB, enquanto o custo do Bolsa Família, por exemplo, é inferior a 0,5% do PIB. Num segundo mandato, é imperioso vencer as restrições do rentismo, reduzindo os juros.
A verdade nua e crua é essa: naquilo que a elite só enxerga "esmolão", o que emerge é um novo modelo de desenvolvimento com distribuição de renda. A redução das desigualdades, entre 2002 e 2005, e a notada melhoria da qualidade de vida dos mais pobres, como constata a pesquisa da FGV, reafirmam a convicção de que não há desenvolvimento sem distribuição de renda. O verdadeiro air-bag para proteger o país da volatilidade mundial não é o retorno à ortodoxia regressiva e antipovo e, sim, a construção de um amplo mercado interno de massas.
É evidente que o nosso principal problema não são os gastos nos programas sociais, mas a cegueira sectária daqueles que não se conformam com os avanços do governo Lula.