segunda-feira, abril 17, 2006

Observador da luta política

“Não acendas para teu inimigo fornalha tão quente que te venha a queimar também.” (Shakespeare)

Miguel do Rosário é escritor, colunista da Novae, editor de Arte & Política. (http://oleododiabo.blogspot.com/)

Os amantes, observadores e participantes da vida política nacional podem reclamar de tudo, menos de tédio. Nos últimas dias, tivemos a divulgação do resultado de dois importantes institutos de pesquisa eleitoral, Datafolha e Sensus, que confirmaram a consolidação da popularidade de Lula e o seu favoritismo nas eleições deste ano. Tivemos o fim da CPI dos Correios, numa votação final tumultuada, confusa, agressiva. Tivemos, por fim, a denúncia do Procurador Geral da República, divulgada com sensacionalismo pela imprensa, que procura desesperadamente uma chancela para o tom dramático que vem usando nos últimos tempos. O troféu do ridículo ficou com o JB, com sua manchete adolescente: O mensalão existiu. PT saudações.Os golpistas do Globo, Merval Pereira e Miriam Leitão, não tecem uma crítica ao boicote que as oposições vêm fazendo ao país, ao obstruir a votação do Orçamento.O presidente Lula está sendo obrigado a liberar verbas através de Medida Provisórias e o filho do César Maia, o deputado federal Rodrigo Maia (PFL-RJ), membro da ala golpista do Congresso, ainda tem o desplante de dizer que entrará na Justiça contra a edição das MPs. O irritante é ver que a colunista Miriam Leitão, diante de tal descalabro, que afeta tão gravemente o equilíbrio financeiro do país, não diz uma palavra.O Observatório de Imprensa é um fórum de respeito, mas está perdendo credibilidade ao tentar assumir um papel de crítico da crítica, com seus colunistas gastando impulsos eletrônicos para tentar provar que os milhares de cidadãos indignados com a parcialidade da imprensa estão enganados e que a imprensa é que está certa. Mesmo assim, a OI tem o mérito de ser um site aberto ao contraditório e que investe e incentiva uma diversa, ampla e múltipla participação democrática, tanto nas áreas de comentários quanto na seção dos Leitores. A impressão que eu tenho é que os jornalistas do OI, como todos seus pares no país, aliás, sentem-se acuados pelo poder e agressividade da mídia corporativa, única com bons (?) empregos, em termos salariais. Por outro lado, o movimento pró-democracia, pró-Brasil e pró-Lula cresce, ganha novos adeptos, novos sites, blogs e se expande na internet, nos sindicatos e na sociedade brasileira como um todo. Já tive a oportunidade de escrever sobre isso, mas vale a pena repetir. A internet trouxe para o microfone democrático toda uma classe de cidadãos não intelectuais que antes se contentavam em alinhar-se ou não com determinados professores ou políticos, monopolizadores da palavra escrita e falada. O espaço democrático da internet está dando visibilidade para donas-de-casa, aposentados, engenheiros, garçons, professores de ginásio, advogados, pequenos funcionários públicos expressarem suas opiniões políticas e suas idéias sobre o Brasil. Trata-se de um contingente que, através da internet, está tendo acesso a fontes variadas de informações, o que permite a construção de um olhar crítico e mesmo algo rebelde, muito lúcido e sagaz sobre a conjuntura política. Não somente lêem o que os colunistas dizem sobre a pesquisa do Sensus: entram no site do Sensus e analisam diretamente as estatísticas. Lêem editoriais do Estadão, da Folha, cotejam com as críticas do Observatório da Imprensa e, por fim, se manifestam, em linguagem coerente, na maioria das vezes num estilo sóbrio, conciso, com uso abundante de números e dados confiáveis sobre economia, desemprego, crescimento econômico.A consciência política do brasileiro está evoluindo e o golpismo tem forçado as pessoas a aperfeiçoarem seu nível de consciência. Diante do risco de verem roubadas, pelas mesmas elites de sempre, sua fé e sua esperança na democracia, noto um saudável desespero das pessoas em se informarem com mais cuidado, em se manifestarem com mais coerência. As pesquisas eleitorais estão apontando uma grande recuperação de Lula junto ao eleitorado jovem e às pessoas mais esclarecidas, sobretudo depois da sagração de Alckmin como principal adversário. Alckmin representa o atraso, é aliado de primeira hora de todas aquelas velhas oligarquias nordestinas. Ele mesmo é um almofadinha provinciano, sem carisma, sem idéias, além de um moralismo vulgar, direitista, carola, retrógrado, elitista e mentiroso. A luta ideológica é mais intensa, naturalmente, entre as pessoas com formação política mínima, em geral da classe média. O povão vota com o estômago, com o instinto, razão pela qual se mantém fiel ao presidente. Nesta batalha ideológica, nota-se o número contra a força, muitos blogs e sites contra o poderio da mídia. Mesmo que a mídia corporativa triunfe nessa guerra (Deus nos proteja!), a experiência desta organização blogueira, internáutica, representa uma vitória importante, existencial, cultural e política, uma força com a qual, a partir de agora, políticos e poder econômico terão que conviver. Em última instância, a coligação direita & mídia pode até ganhar, aqui e ali, o poder político, mas nunca nossas mentes e corações.A recuperação da renda dos trabalhadores, o aumento recorde do salário mínimo, a geração de emprego, a valorização das estatais, o controle da inflação, a redução da dívida pública, a nova orientação da política internacional, são fatores que estão ajudando a reconstruir a auto-estima dos brasileiros e a sua confiança de que o país é viável, desde que não seja novamente entregue às mãos desastradas e à sanha golpista da oposição. Uma imagem me vem à mente: quando Lula esteve, recentemente, na Inglaterra, momento em que foi homenageado por políticos, empresários e pela famíila real, sempre havia grupos de imigrantes brasileiros às portas dos locais onde o presidente estava. A Band entrevistou alguns, a Globo não. Sabe por quê? Por que os brasileiros no exterior, em sua maioria, tem grande admiração pelo presidente Lula, porque, observando de longe, vêem como o país ganhou em prestígio, em respeito, sob a gestão Lula. Um entrevistado pela Band foi um rapaz de seus vinte e poucos anos que veio à Londres estudar e trabalhar, como tantos outros. Sua declaração me comoveu, ele disse: "quando eu vim a Londres, há uns quatro anos atrás, não pensava em voltar. Queria estudar e depois trabalhar e morar na Inglaterra. Hoje não. Hoje eu sei que vou voltar para o Brasil." Reparem que ele não falou nem que pretendia voltar; não, ele estava decidido, e disse aquilo, diante das câmeras, com orgulho, altivez e alegria. Era um rapaz educado, sensível, uma dessas pessoas que realmente sofrem em pensar na crescente miséria de parte de nossa população; e que se sentem felizes e aliviadas quando constatam que o processo de pauperização do país foi estancado, e que o navio Brasil novamente singra em direção a um futuro mais promissor. Entretanto, me entristece, me revolta ver que possuímos ainda uma certa esquerda oportunista, falastrona, hipócrita e cínica, que se apropria de conceitos de esquerda de forma totalmente arbitrária, falsa, porque estão se ligando cada vez mais aos interesses da direita nacional. No Globo, li que durante evento na Universidade de São Carlos, trabalhadores e sindicalistas encresparam-se contra estudantes que pretendiam fazer um infantil protesto contra o presidente Lula. "Abaixo a burguesada, quem manda aqui é a peãozada!", bradavam os trabalhadores, indignados que um pequeno bando de almofadinhas de olho azul (sem preconceito, só metáfora) estragassem o evento, histórico para eles, de encontro com seu presidente. O Globo, está claro, noticiou de forma a prejudicar os manifestantes pró-Lula, mas não conseguiu. Ficou evidente, para mim, que um segmento cada vez maior de trabalhadores e cidadãos está disposto a sacrificar sua energia e seu tempo para lutar contra a volta da direita oligárquica e usurpadora ao poder, ajudada pelo apoio esporádico (ampliado artificialmente) de setores alienados do esquerdismo juvenil (tipo Psol) ou senil (tipo PPS e PDT) e pela parcialiade vergonhosa de nossa mídia corporativa.