sábado, abril 22, 2006

FATOR SELIC

Taxa de juros volta ao patamar de 2001 e alivia dívida pública
Comitê de Política Monetária (Copom) decide baixar a taxa básica de juros, a Selic, em 0,75 ponto percentual, empurrando-a ao menor patamar em cinco anos. Corte incentiva crescimento do PIB e ainda diminui impacto na dívida.
André Barrocal – Carta Maior

BRASÍLIA - Depois de dois dias de reunião, o presidente e os oito diretores do Banco Central (BC) decidiram, por unanimidade, no início da noite desta quarta-feira (19), baixar a taxa básica de juros, a Selic, em 0,75 ponto percentual, empurrando-a ao menor patamar em cinco anos. Ainda que esteja muito acima da “taxa dos sonhos” pregada por entidades de trabalhadores e de empresários, o sétimo corte seguido do juro pelo Comitê de Política Monetária (Copom) ajuda a estimular o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), mas tem ainda um outro efeito importante. O alívio que dá à astronômica dívida pública, em grande parte atrelada à Selic. Indexação, aliás, que a Secretaria do Tesouro Nacional, gerente da dívida, anunciou que trabalha para sepultar.Na sua relação com a dívida, a queda da Selic ajuda o crescimento do PIB na medida em que puxa os débitos para baixo, diminuindo a necessidade de superávits primários pesados e, portanto, de retenção de investimentos públicos que também incentivam a atividade econômica. “A rigidez da política monetária tem um impacto grande na dívida, mas isso não se discute”, reclama o economista especializado em contas públicas Francisco Lopreato, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Para ele, o debate é abortado pelo pensamento econômico vinculado aos rentistas, que lucram com o juro alto e preferem apontar o gasto corrente do governo como culpado pela falta de investimentos e a carga fiscal.No ano passado, o conservadorismo do BC no manejo da taxa de juros teria custado R$ 140 bilhões à dívida interna, nos cálculos do economista Dércio Munhoz, da Universidade de Brasília (UnB). A estimativa pressupõe dois parâmetros. Primeiro: gasto de R$ 230 bilhões com a dívida, entre superávit primário e rolagem feita com recursos obtidos a partir de dívida nova. Segundo: que já seria “excepcional” um juro real de 7,5% descontada a inflação medida pelo Índice Geral de Preços-Disponibilidade Interna (IGP-DI), de 1,2% em 2005. No fim de dezembro do ano passado, o juro básico do BC estava em 18%.A calibragem da Selic e seu impacto na dívida já provocaram trombadas entre o Tesouro Nacional, gestor da dívida, e o Banco Central. O ex-secretário Joaquim Levy, que deixou o cargo junto com o ex-ministro Antonio Palocci, queixava-se de que o esforço fiscal para reduzir a dívida era anulado pela mão pesada do Copom. Apesar de Levy não estar mais no Tesouro, a percepção de que o juro do BC atrapalha a dívida continua. Horas antes da reunião do Copom desta quarta-feira, o secretário Carlos Kawall informou que quer acabar com o “fator Selic” na dívida. A intenção é tirar do mercado todos os títulos públicos remunerados pelo juro do BC. Esse tipo de papel é tido como de pior qualidade. Tende a custar ao governo mais caro do que outros papéis (indexados à inflação, por exemplo) e a dificultar a gestão da dívida – a Selic aplicada ao título é a do dia do vencimento, e não se pode prever que juro o BC fixará no médio e longo prazos.Lentamente, o Tesouro já vem tentando baixar o impacto da Selic na dívida. No fim do governo Fernando Henrique, 60,83% dos papéis estavam indexados ao juro do BC. Em dezembro de 2005, a proporção era de 50%. Em março, recuou para 45%FLEXIBILIZAÇÃOAo reduzir a taxa Selic em 0,75 ponto percentual, o BC seguiu o ritmo das duas reuniões anteriores e não sinalizou nenhuma tendência para as próximas decisões. A nota explicativa divulgada pelo BC diz: “Dando prosseguimento ao processo de flexibilização da política monetária iniciada na reunião de setembro de 2005, o Copom decidiu, por unanimidade, reduzir a taxa Selic para 15,75% ao ano, sem viés, e acompanhar a evolução do cenário macroeconômico até a próxima reunião, para então definir os próximos passos na sua estratégia de política monetária.”A reunião nestas terça-feira (18) e quarta-feira (19) deve ter sido a última do diretor de Política Econômica, Afonso Bevilaqua, considerado o “campeão da ortodoxia”. Um substituto para o cargo já foi indicado, mais ainda depende de aprovação no Senado. É provável que isso ocorra até 30 e 31 de maio, quando o BC sentará mais uma vez para definir a taxa básica de juros.