sábado, maio 20, 2006

Cláudio Lembo e as contradições da direita

Editorial Vermelho

É pitoresca e merece exame a entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, publicada em 18 de maio, do governador Cláudio Lembo, do PFL. Ela pode ser vista com estranheza e revela que podem existir contradições e diferenças de opinião na direita brasileira.

A estranheza decorre da contradição que a entrevista significa. Afinal, o governador de São Paulo é o responsável, em última instância, pela segurança pública no Estado e o dirigente da polícia que, nestes dias, tem sido veemente acusada pela matança generalizada de "suspeitos" de participar da ação criminosa que paralisou e aterrorizou a capital paulista. Mas que, mesmo assim, nas declarações à Folha, resolveu salientar claramente o fundo social da crise cuja superfície foi a ação organizada dos criminosos.

Cláudio Lembo disse ao jornal que um problema tão grave como este só será resolvido quando a "minoria branca" (são palavras textuais do governador) mudar sua mentalidade. "Temos uma burguesia muito má, uma minoria branca muito perversa", disse. "A bolsa da burguesia vai ter que ser aberta para poder sustentar a miséria social brasileira no sentido de haver mais empregos, mais educação, mais solidariedade, mais diálogo e mais reciprocidade de situações".
E descartou, como solução, o endurecimento da repressão. "Transitoriamente pode resolver", disse. "Mas se nós não mudarmos a mentalidade brasileira, o cerne da minoria branca brasileira, não vamos a lugar algum".


Aqui se pode lembrar ao governador, pelo menos, duas coisas. Primeiro, que ele foi ao longo dos tempos que se remonta à ditadura militar, um quadro político expoente disso que ele denomina de "elite branca má e peversa". Segundo, como já se disse, ele é o responsável pela Polícia Militar de São Paulo é terá que responder sob as denúncias que envolvem a " matança indiscriminada de suspeitos".

De qualquer, são palavras fortes, principalmente na boca de um político conservador, oriundo da ditadura militar – que apoiou e serviu – e que herdou o governo do estado de São Paulo, depois de uma década de predomínio tucano, com uma máquina administrativa montada por Geraldo Alckmin, fortemente suspeita, nestes anos todos, de ações arbitrárias e ilegais – e ineficientes, é preciso dizer – no combate ao crime no estado.

Aliás, na entrevista, o governador foi pródigo em elogios ao governo Lula e ao ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos. Lula, disse ele, "telefonou, foi muito elegante comigo. Conversei muito com o presidente, ele me deu muito apoio". O ministro da Justiça, por sua vez, esteve em São Paulo e chegou à conclusão, juntamente com o governador, de que não era necessária a intervenção do Exército.

Se sobraram elogios para o governo federal e órgãos subordinados a ele - a Polícia Federal, disse Lembo, foi "extremamente leal, solicita e dinâmica" – as queixas em relação aos aliados tucanos foram amargas. Geraldo Alckmin, ex-governador e candidato tucano à presidência da República, telefonou apenas duas vezes. José Serra, que almeja a cadeira suceder a Lembo na eleição de outubro, não deu sequer o ar da graça. Ele "não telefonou", disse o governador, categórico e irônico: "Os impulsos telefônicos são tão caros...".

Criticou também as declarações do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso que, segundo ele, "poderia ter ficado silencioso" a respeito da crise. "Para opinar a respeito de um terma tão amargo, tão grave, ele teria que refletir, pensar. E se informar". Lembo referia-se às críticas feitas por FHC sobre um eventual acordo entre as autoridades paulistas e o comando da ação criminosa. E foi duro em sua resposta: "Quanto ao presidente [FHC], pode ser que eventualmente ele tenha precedente sobre acordos. Eu não tenho", garantiu.

http://www.vermelho.org.br/base.asp?texto=2501