quarta-feira, novembro 23, 2005


Negros marcham pela igualdade racial

Mais de 8 mil pessoas participaram ontem (22), em Brasília, da Marcha Zumbi+10, enchendo as quatro pistas da avenida da Esplanada dos Ministérios.

A marcha contra o racismo, pela igualdade e a vida marca os 310 anos da morte de Zumbi - líder do Quilombo dos Palmares -, mas foi o marinheiro negro João Cândido, herói da Revolta da Chibata, quem mereceu destaque na manifestação.

A filha do herói negro, Zeelândia Cândido de Andrade, de 81 anos, encabeçou o grupo de representantes da marcha que esteve em audiência com o presidente da Câmara dos Deputados, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), para pedir a agilização da votação do projeto de anistia do líder negro, que foi expulso da Marinha do Brasil por ter comandado a revolta no Rio de Janeiro, em 1910.

Rebelo, que foi destacado pelos manifestantes "como homem que veio das lutas populares como ele [João Cândido]", garantiu que o projeto terá prioridade absoluta logo que chegue do Senado.

Ele disse que se identificava com a história de João Cândido, lembrando os versos da música Mestre Sala dos Mares, de João Bosco e Aldir Blanc: “Há muito tempo nas águas da Guanabara / O dragão do mar reapareceu / Na figura de um bravo feiticeiro / A quem a história não esqueceu (...)”.

A lei de anistia a João Cândido, de autoria da então deputada petista Marina Silva, representa o resgate da respeitabilidade do herói negro, garantindo a graduação dele para o posto que exerceria caso não tivesse sido expulso da corporação, pagamento de indenização pelos danos causados e estabelecimento de pensão para a família. Os manifestantes querem que o projeto seja aprovado até o dia 6 de dezembro, data do aniversário de morte de João Cândido.

Ao presidente Lula, com quem o grupo esteve em audiência no início da noite, eles reivindicaram que o governo federal batizasse um navio da Marinha do Brasil com o nome de João Cândido.

Conforme relata Martvs das Chagas, secretário nacional de Combate ao Racismo do PT, também foi levada à Lula a preocupação com a votação do substitutivo do Estatuto de Igualdade Racial, aprovado pela CCJ do Senado.

Conforme Martvs, que participou do encontro com Lula, o substitutivo retirou a proposta de criação do Fundo de Promoção da Igualdade Racial, um importante instrumento para financiar as ações previstas no estatuto.

“O presidente Lula se mostrou sensível à questão e pediu uma reunião entre representantes das duas marchas Zumbi+10 (a primeira foi realizada no dia 16 de novembro) e parlamentares da Câmara e do Senado para discutir melhor a questão. O substitutivo está sendo encaminhado à Câmara e, caso seja aprovado na íntegra, irá à sanção do presidente da República.

Lula recebeu ainda o pedido de agilizar a regularização das terras quilombolas. O presidente determinou a criação de um grupo de trabalho entre representantes do Incra e da Seppir (Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial) para fazer um levantamento das terras quilombolas que não têm problemas de litígio e que possam ser tituladas em curto prazo.

Para Martvs, as mais de duas horas de audiência com o presidente da República se mostraram proveitosas. "Lula mostrou disposição de atender a maioria de nossas solicitações", afirmou.

O secretário ressalta o sucesso da marcha, que, segundo ele, foi feita com muita dificuldade, sem aporte financeiro, apenas com recursos do movimento negro. "Conseguimos levar mais de 200 ônibus para Brasília", comemora.

Reparação
Segundo os organizadores, a reivindicação principal da marcha é que o governo reconheça, em todas as suas iniciativas, a necessidade de adotar ações de reparação das injustiças históricas cometidas contra a população negra, que são diferenças de renda, acesso ao mercado de trabalho, educação, saúde, saneamento.

O mais recente Atlas Racial Brasileiro, elaborado pelo PNUD (Programa das Nações Unidades para o Desenvolvimento) e pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), revelou que 65% dos pobres e 70% dos que viviam na indigência em 2004 eram negros. Segundo dados do Ministério da Educação, a taxa de analfabetismo entre os negros é de 17,2%, enquanto entre os brancos é de 7,5%.

Outros pontos da pauta de reivindicação são a garantia dos direitos da juventude e das mulheres negras; respeito às religiões de matriz africana e valorização da diversidade cultural.

Durante a marcha, os gritos de palavras de ordem destacavam outros problemas, como a violência, que vitima principalmente os jovens negros. Os líderes gritavam pela construção de “um mundo onde cabe todo mundo”. As faixas lembravam que “Somos todos diferentes – mulheres e homens de todas as raças -, porém com direitos iguais”. Um grupo de crianças carregava cartazes com a inscrição: “Sou negro, amo minha cor”.

Linha Aberta, com informações do site Vermelho (www.vermelho.org.br)

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