quarta-feira, março 29, 2006

Ângela: A Dança da Alegria

O deputado João Magno (PT-MG) foi absolvido da acusação de ter recebido dinheiro do valerioduto. A deputada Ângela Guadagnin festejou a absolvição de seu colega de partido com uma dança no plenário da Câmara Federal. Ela não o inocentou. Havia pedido uma pena menor, como a suspensão do mandato, uma vez que ele fez uso do caixa 2, um crime eleitoral. Seu pedido não foi aceito. Dias antes, pelo mesmo motivo, um deputado federal do PFL também foi inocentado. No Senado, o senador tucano Eduardo Azeredo, ex-presidente do PSDB, teve o processo por ter recebido também o dinheiro do valerioduto, aliás, foi o primeiro, arquivado. Se não era crime a ser punido quando os parlamentares eram do PFL e do PSDB, por que, então, punir um deputado do partido dela? Por isso festejou, dançando. Foi a dança da alegria. Ela se justificou: “O plenário Ulysses Guimarães já foi palco de muitas coisas, como apitaço, Constituição rasgada e até xingamentos. Eu apenas demonstrei alegria. Em minha opinião, ela agiu erradamente. No entanto, a sua ação não merecia o estardalhaço que a imprensa escrita e falada dedicou ao ato. Acho, como jornalista, que a dança deveria ser mostrada: é um fato político que merecia ser registrado. No entanto, a mídia, principalmente a tucana, extrapolou, como vamos ver.
Além de apresentar a dança da alegria, os jornais dedicaram ao fato Editoriais, pegando pesado. A Folha publicou o Editorial “Na cadência do deboche”. O Estadão não ficou atrás, no Editorial “A dança da impunidade”. O mesmo aconteceu com um jornal de Mogi Guaçu, com o Editorial jocoso: “A “bailarina” do mensalão”. Alguns deputados, mesmo da oposição, foram mais amenos. Carlos Sampaio (PSDB-SP) afirmou: “Discordo dela, mas respeito a forma convicta como age. Só não sei se é convicção pessoal ou partidária. Ela fala com o coração”. Outra oposicionista, Maninha (PSOL-DF), declarou à Folha: “Todo mundo perdeu a vergonha, ninguém fica mais constrangido com sua própria postura”. Ela acha, porém, que a repercussão é maior por se tratar de uma deputada. “Se a Ângela fosse homem e esse homem tivesse ensaiado passos no plenário, o caso teria outra dimensão”. Além de mulher, deputada, Guadagnin é do PT. Esse fato, ser petista, foi ressaltado, por Fabiano Santos, professor do Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro. Para ele, a dança de Guadagnin é um tema irrelevante. O único problema que ele disse ter visto no gesto da deputada foi a sua falta de percepção de que, hoje, “tudo o que o PT faz pode se voltar contra o PT”. Fernando Rodrigues, em artigo na Folha (Tucanos e petistas), analisou essa atitude, em minha opinião, ingênua, da deputada: “No Congresso, os petistas são mais bobos que os tucanos. Não se viu ninguém do PSDB dançar no plenário quando foi arquivado o caso de Eduardo Azeredo, também acusado de envolvimento com o “mensalão”. Mas houve comemoração em privado, com certeza”. A Veja, como já era esperado, dedicou a capa à deputada Ângela. Quanto ao Azeredo, isto nunca vai acontecer!
Tivemos manifestações de intelectuais contra a dança da alegria. Alguns espinafrando a deputada. Outros a defenderam, como a socióloga Maria Victória Benevides, que, após dizer que o gesto de Ângela foi “estapafúrdio” e “infantil”, ser ele, o gesto, “muito menos grave do que outros, como, por exemplo, o senador Arthur Virgílio [PSDB-AM] vir ao microfone e dizer que vai dar uma surra no presidente da República”. Outros fatos, além desse apontado, são também mais graves do que a dança da alegria. Dias atrás, deputados do PMDB, governistas e defensores de Garotinho, trocaram tapas no Congresso, quando tentavam indicar o líder do partido. Vocês viram estardalhaços, oba-oba, na divulgação da briga? Eu não vi!
Os leitores dos grandes jornais se manifestaram. A maioria das cartas publicadas era de condenação, seguindo a opinião desses jornais, como é óbvio. Alguns, poucos, defendendo-a. Esse foi o caso de Pedro Valentim (Bauru-SP), no Painel do Leitor da Folha: “Quanto à dança após a absolvição do deputado João Magno (PT-MG), vejo um estardalhaço hipócrita e falso moralista por parte da sociedade, da imprensa e da oposição. A psicologia do comportamento humano vê a dança como manifestação física e psicológica do nosso corpo. Reflete alegria do momento. (...) Acho estranho uma sociedade que não se indigna com o fato de cachorrinhos de estimação [de madames] viverem e comerem melhor do que milhares de crianças pobres se revoltar contra uma atitude no máximo discutível e que não significa nenhum fim do mundo”. Não é o que pensa a alegria raivosa, como diz Chico Buarque!
Fernando de Barros e Silva, editor de Brasil (Folha) não deixou por menos: fez severas críticas à deputada Ângela, no artigo “Da dança ao lixão”. Sobre esse último tema, escreveu: “O “banho de ética” prometido por Geraldo Alckmin ao Brasil acaba de levar uma ducha de água fria com a excelente reportagem de Frederico Vasconcelos, nesta Folha, a respeito do “lixão” – como eram chamados os anúncios da Nossa Caixa politicamente direcionados pelo governo do Estado, tudo por baixo do pano. (...) Isso para não falar nas 400 peças de alta-costura de dona Lu [esposa de Alckmin], todas “doadas” pelo estilista Rogério Figueiredo. Pois é. Os alckmistas estão chegando, estão chegando os alckmistas.”
A dança da alegria foi um erro menor. Mesmo assim, a grande mídia tucana não perdoou. Agora ela deve estar preocupada com a queda de Palocci, com análises justas, umas, e tendenciosas, outras! Hoje vamos ficar com o ato alegre de Ângela. Depois trataremos da alegria, sem dança pública, dos tucanos!

JASSON DE OLIVEIRA ANDRADE,
jornalista em Mogi Guaçu