16/2/2012, Leonidas Oikonomakis Λεωνίδας Οικονομάκης, ROARMAG.orghttp://roarmag.org/2012/02/greece-protests-austerity-imf-eu-sankara-creditors/
Para Eduardo Galeano
Aconteceu em 1987.
A Conferência da Organização da Unidade Africana reuniu-se em Addis Abbeba, Etiópia, nos últimos dias daquele julho de muito calor. E lá estava ele. No uniforme caqui, com seu invencível bom humor, Thomas Sankara[1], presidente revolucionário de Burkina Faso, o Che Guevara da África. Foi seu último discurso, e ali conquistou os corações dos pobres e explorados. Hasta siempre.
“Não podemos pagar essa dívida, primeiro porque, se não pagarmos, os credores não morrem. Isso é garantido. Mas se pagarmos, morremos nós. Isso também é garantido” – disse ele. E continuou: “Os que nos empurraram para que nos endividássemos, jogaram como se estivessem num cassino. Enquanto ganharam, ninguém discutiu coisa alguma. Mas agora, que estão perdendo muito, exigem pagamento. E nós só falamos de crise. Não, Sr. Presidente. Eles jogaram e perderam. É a regra do jogo. Não pagaremos. E a vida continua.”
Como eco dos protestos contra as medidas de ‘austeridade’ na Grécia, ouve-se outra vez a voz de Sankara, o Che Guevara da África. O herói que desafiou seus credores.
Mas Sankara também sabia muito bem que não poderia estar sozinho na resistência. E portanto conclamou os demais chefes de Estado africanos a seguir seu exemplo:
“Se Burkina Faso for o único Estado que se recusa a pagar a dívida, eu não estarei aqui, na nossa próxima Conferência”, disse ele, profético. E todos riram.
Hoje, está acontecendo outra vez.
O Parlamento Grego reuniu-se no domingo à noite (na madrugada da 2ª-feria, para ser bem preciso) para votar um novo memorando que imporá ainda mais restrições à classe média e aos mais pobres naquele país, que já enfrentam terríveis dificuldades. E, isso, para obter mais um empréstimo, 70% do qual será gasto para pagar o serviço da dívida anterior. A sessão foi orquestrada por um governo preposto (não eleito) – comandado por um primeiro-ministro banqueiro (também preposto, não eleito) – formado, dentre outros, de gente da extrema direita.
As novas medidas incluem corte de 22% no salário mínimo (32% para os de menos de 25 anos), 15.000 demissões no setor público em 2012 e 150 mil até 2015 (num país cuja taxa de desemprego já é superior a 20%!), cortes em serviços públicos (saúde, educação e assistência social), privatização de patrimônio público (rentável!), mais a promessa assinada de que as medidas serão implementadas, seja qual for o resultado das eleições previstas para abril – como decretou recentemente “Sua Alteza” Wolfgang Schäuble.
Na rua, à frente do Parlamento, centenas de milhares de pessoas (entre as quais Manolis Glezos e Mikis Theodorakis, heróis da resistência grega) reuniram-se para manifestar sua oposição ao memorando, à “Troika”, ao modelo econômico dominante e àqueles políticos gregos que votavam, no Parlamento. No que gritavam, ouvia-se um eco que chegava de Addis Abbeba e do fundo dos tempos: “Não podemos pagar essa dívida, primeiro porque, se não pagarmos, os credores não morrem. Isso é garantido. Mas se pagarmos, morremos nós. Isso também é garantido.”
À primeira vista, parece que não fez diferença alguma. O memorando foi aprovado pelo Parlamento. Mas, agora, a “Troika” está em pânico, com medo de ser derrubada pelo poder do povo, nas eleições de abril. Então, os credores tentam pateticamente adiar o pagamento do ‘resgate’ para depois das eleições, quando o novo governo grego, depois de eleito, tiver sido obrigado a jurar que também cumprirá os termos do memorando.
Temam o povo! Vivemos grandes tempos para a democracia!
Thomas Sankara, o homem que acreditava que revolucionários podem ser assassinados, mas não suas ideias, não chegou à Conferência da Organização da Unidade Africana do ano seguinte. Foi assassinado três meses depois daquele famoso discurso em Addis Abbeba, por seu ex-amigo e companheiro em armas, Blaise Compaoré, que continua lá, presidente de Bukina Faso, até hoje.
Assistam:
Sankara, The Upright Man [O homem íntegro], Robin Shuffield
http://www.youtube.com/watch?v=HvBC7tmgFFM&feature=related
Sankara, “O discurso da dívida” (29/7/1987)
http://www.youtube.com/watch?v=jvYM6cGuBo8&feature=related (em francês)
A Conferência da Organização da Unidade Africana reuniu-se em Addis Abbeba, Etiópia, nos últimos dias daquele julho de muito calor. E lá estava ele. No uniforme caqui, com seu invencível bom humor, Thomas Sankara[1], presidente revolucionário de Burkina Faso, o Che Guevara da África. Foi seu último discurso, e ali conquistou os corações dos pobres e explorados. Hasta siempre.
“Não podemos pagar essa dívida, primeiro porque, se não pagarmos, os credores não morrem. Isso é garantido. Mas se pagarmos, morremos nós. Isso também é garantido” – disse ele. E continuou: “Os que nos empurraram para que nos endividássemos, jogaram como se estivessem num cassino. Enquanto ganharam, ninguém discutiu coisa alguma. Mas agora, que estão perdendo muito, exigem pagamento. E nós só falamos de crise. Não, Sr. Presidente. Eles jogaram e perderam. É a regra do jogo. Não pagaremos. E a vida continua.”
Como eco dos protestos contra as medidas de ‘austeridade’ na Grécia, ouve-se outra vez a voz de Sankara, o Che Guevara da África. O herói que desafiou seus credores.
Mas Sankara também sabia muito bem que não poderia estar sozinho na resistência. E portanto conclamou os demais chefes de Estado africanos a seguir seu exemplo:
“Se Burkina Faso for o único Estado que se recusa a pagar a dívida, eu não estarei aqui, na nossa próxima Conferência”, disse ele, profético. E todos riram.
Hoje, está acontecendo outra vez.
O Parlamento Grego reuniu-se no domingo à noite (na madrugada da 2ª-feria, para ser bem preciso) para votar um novo memorando que imporá ainda mais restrições à classe média e aos mais pobres naquele país, que já enfrentam terríveis dificuldades. E, isso, para obter mais um empréstimo, 70% do qual será gasto para pagar o serviço da dívida anterior. A sessão foi orquestrada por um governo preposto (não eleito) – comandado por um primeiro-ministro banqueiro (também preposto, não eleito) – formado, dentre outros, de gente da extrema direita.
As novas medidas incluem corte de 22% no salário mínimo (32% para os de menos de 25 anos), 15.000 demissões no setor público em 2012 e 150 mil até 2015 (num país cuja taxa de desemprego já é superior a 20%!), cortes em serviços públicos (saúde, educação e assistência social), privatização de patrimônio público (rentável!), mais a promessa assinada de que as medidas serão implementadas, seja qual for o resultado das eleições previstas para abril – como decretou recentemente “Sua Alteza” Wolfgang Schäuble.
Na rua, à frente do Parlamento, centenas de milhares de pessoas (entre as quais Manolis Glezos e Mikis Theodorakis, heróis da resistência grega) reuniram-se para manifestar sua oposição ao memorando, à “Troika”, ao modelo econômico dominante e àqueles políticos gregos que votavam, no Parlamento. No que gritavam, ouvia-se um eco que chegava de Addis Abbeba e do fundo dos tempos: “Não podemos pagar essa dívida, primeiro porque, se não pagarmos, os credores não morrem. Isso é garantido. Mas se pagarmos, morremos nós. Isso também é garantido.”
À primeira vista, parece que não fez diferença alguma. O memorando foi aprovado pelo Parlamento. Mas, agora, a “Troika” está em pânico, com medo de ser derrubada pelo poder do povo, nas eleições de abril. Então, os credores tentam pateticamente adiar o pagamento do ‘resgate’ para depois das eleições, quando o novo governo grego, depois de eleito, tiver sido obrigado a jurar que também cumprirá os termos do memorando.
Temam o povo! Vivemos grandes tempos para a democracia!
Thomas Sankara, o homem que acreditava que revolucionários podem ser assassinados, mas não suas ideias, não chegou à Conferência da Organização da Unidade Africana do ano seguinte. Foi assassinado três meses depois daquele famoso discurso em Addis Abbeba, por seu ex-amigo e companheiro em armas, Blaise Compaoré, que continua lá, presidente de Bukina Faso, até hoje.
Assistam:
Sankara, The Upright Man [O homem íntegro], Robin Shuffield
http://www.youtube.com/watch?v=HvBC7tmgFFM&feature=related
Sankara, “O discurso da dívida” (29/7/1987)
http://www.youtube.com/watch?v=jvYM6cGuBo8&feature=related (em francês)