segunda-feira, maio 17, 2010

Washington vai continuar a mandar-nos morrer até encontrar um melhor negócio para os seus interesses corporativos

O exército dos EUA sofre grande derrota no Vale Korengal e é obrigado a retirar
17 de Maio de 2010
James Circello
Fonte: Uruknet | Tradução de F. Macias

Soldados norte americanos e civis afegãos morrem, para que o Pentágono possa ocultar a derrota

 
O exército norte-americano retirou de uma base no recôndito Vale Korengal no Afeganistão, depois de passar quatro anos a tentar ganhar o controlo do terreno. As forças norte-americanas até negociaram os termos da sua derrota, pagando aos combatentes da resistência e deixando-lhes a base completamente intacta, em edifícios, combustível, geradores e equipamento militar, de forma a poder retirar tranquilamente do vale.
Os media corporativos e na sua maior parte, as cúpulas do Pentágono inventaram que a retirada forçada do “Vale da Morte” tinha sido uma ‘mudança de estratégia’. Esta assim denominada ‘mudança’ deixou surpresos os soldados e fuzileiros que perderam amigos e derramaram sangue nas montanhas do Afeganistão, enquanto eram obrigados a defender um posto avançado que os comandos militares norte-americanos afirmaram ser “ um remoto lugarejo de valor estratégico limitado”.
Apesar do seu “valor estratégico limitado”, foram mortos ali, surpreendentemente, 42 soldados norte-americanos, centenas ficaram feridos, e morreu um número desproporcionado de civis afegãos. Um dos últimos soldados que morreu lá, suicidou-se, incapaz de suportar os horrores diários de uma missão sem esperança.

 
Soldados norte-americanos usados como isca

 
Os soldados estacionados no Vale Korengal tinham uma missão: permanecerem sentados como alvos à espera de serem atacados, dia após dia. Os afegãos do Vale Korengal combatiam porque invasores estrangeiros ocupavam o seu país há quase uma década. O exército norte-americano ocupou o Vale Korengal para os desafiar a combater. Esta é a lógica do império.
A dura realidade, de que nós não servimos para mais nada do que isca, não pode ser omitida. A estratégia do Vale Korengal – de colocar soldados e fuzileiros em perigo usando-os como isca para atrair a resistência afegã a combater, para então caças, helicópteros e outros meios entrarem em acção e atacarem os combatentes afegãos e os liquidarem usando todo o equipamento disponível – foi um completo fracasso. A retirada deve servir como um sinal claro de que a nossa dor e sofrimento não são uma preocupação para os comandos militares nem para os políticos que nos obrigam a combater.
O New York Times reproduziu o que o especialista Robert Soto da Companhia B, 1º Batalhão, 26ª Infantaria, disse. As suas palavras dão-nos uma visão dessa verdade: “Dói,” diz ele “dói a um ponto que -três unidades do exército, todos nós fizemos o que fizemos lá. E todos nós perdemos homens. Todos fizemos sacrifícios. Eu tinha 18 anos quando fui para lá. E eu nunca poderia imaginar que tinha que passar por aquilo que passámos naquela idade”.
Até oficiais comentaram o absurdo da táctica do posto avançado como armadilha: “ Na realidade ninguém precisa de estar ali”, disse o Major Ukiah Senti, oficial executivo do 2º Batalhão, 12º Regimento de Infantaria, da Task Force Lethal, que tem a supervisão de Korengal e das regiões vizinhas. “Nós, na verdade, não estávamos com atenção a outra coisa que não à nossa própria protecção”.
Assim como o posto dos EU que foi devastado em Wanat em 2008, deixando 75% das tropas mortas ou feridas num dos ataques mais mortíferos da guerra, não havia” nenhum objectivo” a não ser esperar para ser atacado. As forças norte-americanas também retiraram desse posto, derrotados pela população local. Todos os soldados que morreram em Wanat, Vale Korengal e em todos os outros postos no Afeganistão, morreram porque os generais não sabiam como derrotar a resistência que cada vez é maior. Em vez de aceitarem a derrota, os generais mandavam tropas para uma região onde eram odiados pela população local e deixavam-nos ser constantemente bombardeados.
Os generais sabiam perfeitamente que eles não podiam derrotar a resistência dessa forma e o único objectivo era mantê-los a combater para adiar a derrota.

 
A resistência afegã ao imperialismo norte-americano torna-se cada vez mais forte

 
O Vale Korengal é um microcosmos de todo o país. De forma arrogante, os generais pensavam que ocupando o vale, iriam atrair e derrotar todos os combatentes da resistência, e eventualmente conquistar a simpatia da população local. Mas a sua presença apenas enfureceu o povo e inspirou muitos mais combatentes a resistir à ocupação. É esta a situação em todo o Afeganistão. As cúpulas do Pentágono admitem abertamente que as forças da resistência não podem ser derrotadas militarmente. O objectivo no Afeganistão, tal como no Korengal, é combater e morrer sem parar, enquanto os generais tentam descobrir como vão evitar que a derrota seja conhecida.
Nós estamos hoje a ser enviados para uma guerra que os políticos EU sabem que não podem vencer, uma guerra em que é impossível para os comandantes militares definirem “a vitória”, uma guerra em que não há um final previsível. A resistência afegã está a crescer e intensifica-se a cada mês, como acontece desde o início da guerra. Em 2009, as mortes dos norte-americanos no Afeganistão foram o dobro do número que morreu em 2008. Nos primeiros três meses de 2010 duplicaram os números de 2009. Uma derrota do exército norte-americano é inevitável, assim como as baixas de civis continuam a subir e o sentimento popular está cada vez mais contra as forças de ocupação.
Os políticos dos EUA recusam-se a aceitar este facto evidente e vão continuar a mandar milhares para matarem e morrerem nas montanhas do Afeganistão. Os mesmos políticos que fizeram grandes discursos no Congresso denunciando os Talibãs, estão agora a declarar abertamente a sua intenção de chegarem a um acordo com eles. Os mesmos Talibãs que enraiveceram Bush e Obama, igualmente – a mesma ideologia contra a qual o exército norte-americano foi enviado para afastar do poder – está agora a receber a oferta de lugares no poder num novo governo de coligação.
O objectivo da guerra no Afeganistão nunca foi o de “estabelecer a democracia” como Bush declarou, ou de lutar contra “o terrorismo”, mas sim formar um governo que fosse favorável aos interesses corporativos dos EUA e servisse de plataforma para novas invasões e intervenções na região rica em recursos. Neste momento, os soldados e fuzileiros, homens e mulheres ao serviço do exército, estão a ser usados de moeda de troca, contra os sentimentos anti-colonialistas do povo afegão. Washington vai continuar a mandar-nos morrer até encontrar um melhor negócio para os seus interesses corporativos.

 
Soldados e fuzileiros lutem contra!

 
Como membros recrutados no exército norte-americano, é completamente contra os nossos interesses continuarmos a lutar nesta guerra criminosa e ilegal no Afeganistão – uma guerra travada com base na agressão imperialista dos EUA, com o único objectivo de se tornar no poder dominante da região.
O povo do Afeganistão quer as mesmas coisas que nós queremos: poder viver em paz, livre da ocupação, do medo e da morte. Os políticos de Washington D.C. e as cúpulas militares – desde o Pentágono até à nossa Companhia de CPs – não pararão por nada, no seu esforço de conquistar o povo do Afeganistão. Mas isso nunca irá acontecer. O povo afegão nunca aceitará o colonialismo. Eles nunca se irão curvar nem quebrar.
Nós somos enviados para a morte por gente que se proclama ser nosso “ líder”- o corpo do exército dos EUA – mas isso não tem que ser assim. Nós temos todo o direito a recusar estas ordens ilegais e criminosas, que nos são dadas por homens e mulheres que não entram realmente em nenhum combate, não passam nenhum sofrimento e não vão para morrer. Estes oficiais constroem as suas carreiras sobre o sangue e lágrimas dos soldados. Eles vão continuar a enviar-nos para a morte até nós nos levantarmos e lutarmos contra isso.

 
O autor é veterano da guerra do Iraque e co-fundador do March Forward!, e desertou do exército recusando as ordens para ir para o Afeganistão em 2007.


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