quinta-feira, maio 20, 2010

A MORTE DE WALTER RODRIGUES


A FÉ DOS QUE NÃO ACREDITAM

Fé pode ser uma palavra vazia se não conseguimos agir, viver e às vezes até morrer pelas coisas que ela representa para cada um de nós.
Em meio a pautas repetitivas e sem profundidade e matérias com nítidos interesses políticos ou comerciais, o trabalho do jornalista Walter Rodrigues se diferenciava da grande maioria pela apuração detalhada e imensa capacidade de nos informar sobre coisas que, sem ele, dificilmente conseguiríamos saber.
Estranha seita essa dos jornalistas de verdade que obriga seus praticantes à eterna descrença. A duvidar sempre das versões oficiais, dos releases encomendados, dos fatos acabados e que não permitem questionamentos. Para os jornalistas de verdade duvidar é a alma do negócio.
Mesmo que para isso seja preciso trabalhar em redações menores e salários equivalentes, abdicar das assessorias, dos trabalhos paralelos, dos cargos comissionados e de tantas outras benesses que podem surgir para desviar o jornalista de fé da sua missão de informar com clareza e servir à sociedade, prestando um serviço público, mesmo sem receber do governo.
Os que passaram pelo exercício da profissão e pelas redações, principalmente nos veículos maiores e em cargos com algum poder de decisão, sabem como é pesada a força dos interesses que rodeiam esses ambientes de trabalho e como esses mesmos interesses podem ser persuasivos e implacáveis, quando são contrariados, ou ainda melhor, levados a público.
Jornalistas como WR fazem isso por toda a vida, seguindo por um caminho solitário, motivado por razões talvez inexplicáveis para a maioria, numa espécie de cruzada quase inocente, denunciando e expondo sórdidos acordos, conchavos de ocasião, verdades que não foram feitas para o conhecimento da sociedade e que se não fosse pelo trabalho de pessoas como WR permaneceriam escondidas, servindo a propósitos de pouco valor.
Perdi minha fé no jornalismo a cerca de 20 anos atrás e talvez a tenha recuperado agora, não pela maior parte do que vejo publicado, mas pela chance que me foi dada pela Universidade de ajudar na formação de uma nova geração de profissionais para que sejam capazes de enfrentar tantos desafios de um jeito melhor.
Para os que virão fica o exemplo de Walter Rodrigues, que com todos os seus defeitos, teve a qualidade de viver por uma fé, a fé dos que não acreditam, a fé dos jornalistas.

Por  Márcio Carneiro - jornalista, produtor de vídeo e professor do Departamento de Comunicação Social da UFMA

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