quinta-feira, abril 24, 2008

Folha vai sair do armário...

vai virar Folha da Daslu,






deles para eles...
______________________________

O fim do Ombudsman na Folha

Carlos Eduardo Lins da Silva, 55, assume em 23 de abril, a função de ombudsman da Folha. Anunciado com pompa, ganhou página inteira na edição de domingo passado com uma “entrevista”, com direito a foto cuidada e um texto falso, a tal ponto que as perguntas, essenciais nesse gênero de matéria, sugerem respostas e surgem sem autoria: assina a matéria a inefável criatura “Da Redação”.

- por Chico Villela

(http://www.novae.inf.br/site/modules.php?name=Conteudo&pid=999)

A decadência do jornal Folha de S. Paulo é irreversível. Em texto anterior, “A III Word War e a mídia”, resenhei algumas das suas matérias sobre temas internacionais e destaquei procedimentos jornalísticos indignos por parte da Folha. O mais evidente, de uns anos para cá, tem sido a desproporcional cobertura dedicada aos erros e desmandos do governo Lula e aliados e a blindagem vergonhosa às ações ominosas e censuráveis de FHCs, Serras, Virgílios, Alckmins, Aécios e similares e seus aliados e partidos. O tema atual é a crise dos ombudsman.
Troquei muitas mensagens com o anterior ombudsman Mário Magalhães, acompanhei seu trabalho nas análises diárias do site, e sempre encontrei lisura e competência. As colunas impressas da edição de domingo, mesmo que restritas a comentários gerais sobre temas quase sempre relevantes, também eram honestas. Discordamos com freqüência, a ponto de me motivar ao artigo citado. O jornalista Mário Magalhães não foi aprovado para um segundo mandato, como manda a tradição e a prática, em razão de sua oposição à proibição da Folha em publicar na internet as suas análises diárias. Numa última coluna, de densa dignidade, descreveu seus métodos de trabalho, que com freqüência sacrificaram sua vida familiar e social, e anunciou com todas as letras as razões da sua saída. Perde a imprensa nacional um profissional sério e dedicado à sua melhoria. Mas a Folha ganha um substituto à altura do jornal, dos mais matreiros, capaz de afirmações ofensivas até mesmo à inteligência de leitores de pouco tirocínio.
O sr. Carlos Eduardo Lins da Silva, 55, assume hoje, 23 de abril, a função de ombudsman da Folha. Assume com o compromisso de não publicar mais suas críticas diárias na internet, mas apenas dirigi-las ao público interno. Anunciado com pompa, ganhou página inteira na edição de domingo passado com uma “entrevista”, com direito a foto cuidada e um texto falso, a tal ponto que as perguntas, essenciais nesse gênero de matéria, sugerem respostas e surgem sem autoria: assina a matéria a inefável criatura “Da Redação”. Nem o elementar registro dos participantes da “entrevista” existe. As perguntas - formuladas talvez por ele mesmo, o que seria deslize menor que sua elaboração pela Direção – não conseguem esconder o ar de ‘bola levantada’ para o entrevistado chutar e marcar gols. Uma entrevista didática, arrumadinha, ótima para criar auras de bom comportamento.
A abertura, de umas sessenta palavras, abriga uma afirmação que desvenda o caráter de defesa do jornal embutido na matéria. Aspas: “O novo ombudsman da Folha [...] crê que os jornais brasileiros vivem um momento contraditório. Pelo lado bom, não sofrem da crise de credibilidade que acomete os diários norte-americanos (sic). Pelo ruim, estão perdendo o poder de influenciar a opinião pública.”
O sr. da Silva viveu e estudou muitos anos nos EUA, e o fato transparece nas suas respostas: seu único ponto de referência de imprensa, citado várias vezes, é a mídia euana (norte-americanos são mexicanos, estadunidenses e canadenses). Mas o que se destaca no trecho é a plantação de uma falsa oposição: a grande mídia euana está no seu pior momento de credibilidade, em razão do seu comportamento sabujo de amplificar as 736 (até agora) mentiras do governo Cheney-Bush, tanto quanto, nem mais nem menos, a grande mídia brasileira também está. Afinal, em qual país vive o sr. da Silva?
A tiragem da Folha já foi de mais de 500 mil exemplares; hoje, anda pelos 300 mil. Culpa-se a internet e os novos meios. Possa ser. Mas a credibilidade não tem relação com a internet. A afirmação do sr. da Silva é falsa e higieniza a fachada do jornal. A perda do poder de influenciar a opinião pública deriva da perda de credibilidade, e não da concorrência dos novos meios. Em recente medida de arbítrio, em choque com tradições democráticas universalmente acatadas, o jornalista Paulo Henrique Amorim perdeu o direito ao seu espaço no IG. A mídia grande silenciou o que seria notícia em qualquer país sério com imprensa decente. Fatos assim fazem mais pela perda de credibilidade que cem novos blogs honestos, contundentes e bem informados como o de Amorim. Não é na mídia grande que se encontram os certeiros artigos de Luis Nassif a respeito da latrina jornalística em que se transformou a outrora revista Veja: é na internet, como nesta novae. Assim é a credibilidade do sr. da Silva e da Folha. O que os novos meios fazem é esclarecer, com rapidez e alcance, fatos e afirmações que ecoam de formas distorcidas na grande mídia, e é exatamente isso que os transforma em liquidantes da credibilidade dessa grande mídia, que a perde porque mente e falsifica.
Mas o ombudsman estreante ganhou uma página e falou bastante, à vontade. Primeira pergunta: “Jornais brasileiros e americanos...” Já se destacou que norte-americanos são canadenses, mexicanos e estadunidenses, que prefiro chamar euanos, termo menor e mais brasileiro. Americanos são todos os habitantes das Américas: brasileiros, equatorianos, nicaragüenses, canadenses, cubanos, xavantes, aimarás... Mas a subserviência universal da mídia garante aos euanos os títulos de norte-americanos e americanos.
Fala o sr. da Silva: “Para mim, a saída para o jornal impresso é apostar na profundidade, na qualidade e ter mais foco, tratar de menos assuntos. Porque isso a internet não pode. O jornal impresso precisa procurar o tipo de conteúdo em que ele se sai melhor [...]”. Recomenda-se ao sr. da Silva uma busca mais acurada na internet dirigida a sites em que a profundidade é abismal e oceânica, e em que se publicam matérias que as mídias grandes nunca irão publicar, por estarem de rabo preso com anunciantes, conchavos políticos, jogadas empresariais e outros fatores que reinam sobre a imprensa. Só dois como exemplo: http://www.globalresearch.ca/, norte-americano, digo, canadense; e www.leap/E2020, europeu. Alguém precisa soprar ao ombudsman que essa conversa de que jornal pode aprofundar e internet é superficial já passou do prazo de validade.
Fala o sr. da Silva: “Eu acho natural que esse novo modelo que eu defendo tenha menos leitores que o modelo atual. [...] Ele deve ser dirigido para uma parcela mais específica da população. Pode ter menos circulação, mas gastará menos com papel e poderá ter mais publicidade, focada para aquele público. E o mais importante, ele pode ter mais influência social do que esse jornal dirigido ao público em geral, que é muito caro para ser produzido.” O jornal preconizado pelo sr. da Silva é dirigido a uma elite reduzida, que afeta formadores de opinião, com “mais influência social”, com anúncios focados. Faltou abrir o jogo: um jornal para a elite do dinheiro, do saber, da propriedade, parcelas menores da população que não se confundem com o “público em geral”, nós. Na edição em que o ombudsman foi presenteado com uma página, a maioria absoluta dos anúncios de uma ou mais páginas focam condomínios de luxo, automóveis especiais ou eletrodomésticos de sonho. Ou seja, focados os anúncios já são. Falta uma parte do jornalismo, na esteira da publicidade. Talvez o jornal dos sonhos do ombudsman esteja mais próximo e real do que ele imagina.
Pergunta: “Qual é o grande desafio dos jornais impressos hoje?”. Responde o sr. da Silva: “É definir qual papel terão. Principalmente para manter a influência. [...]” Nem uma palavra sobre honestidade, credibilidade, veracidade, isenção: trata-se de uma questão técnica, uma tarefa de especialistas. Isso transparece na próxima resposta.
Pergunta: “A internet trouxe mais participação dos leitores. Você vê futuro nessas experiências que usam o leitor como provedor de conteúdo?”. Responde o sr. da Silva: “Sou bastante cético com relação a isso. Essa suposta democratização da internet, que permitiria ao cidadão ser repórter, é muita demagogia. O público precisa de informação apurada com rigor, com método. Só algumas pessoas, que têm jeito e experiência, conseguem fazer isso.” Ou seja, a progressiva abertura da imprensa, a participação crescente do leitor como opinante, a interatividade que pode garantir espaços mais democráticos ao mundo da informação, tudo isso repugna ao ombudsman; somos amadores, demagogos; a informação, e sua análise e compreensão, são tarefa de poucos especialistas. Nem uma palavra sobre empulhação, desonestidade, jogo sujo, deturpação de notícias, torção de verdades, amplificação de fatinhos (dos inimigos) e sumiço de fatões (dos amigos), etc. Nem uma letra sobre a vigarice jornalística: isso não é ‘técnico’.
Claro: afinal, a imprensa é dirigida por interesses humanistas e feita por anjos neutros e ilibados, a julgar pela sua próxima resposta sobre os ‘desafios’ ao trabalho do ombudsman pela turbulência política que se avizinha, com as eleições: “Eu acho que o jornal tem o direito de endossar um candidato. Não acho que deva, mas tem o direito. Por outro lado, no noticiário, o jornal não tem o direito de endossar um candidato. Ele tem que fazer uma cobertura o mais próximo possível do isento” Não se trata mais de perguntar em que país mora o ombudsman: a questão é saber em que mundo ele mora. Apoiar, sim, mas de forma crítica e discreta, sem que isso se reflita no noticiário. Cobrir, sim, mas com o máximo de isenção possível, o que se assemelha a meia virgindade ou meias mentiras: isento, ou se é, ou não se é. É pra rir.
A respeito da influência dos blogs sobre a opinião pública, o sr. da Silva afirma: “No Brasil, com certeza, não. Nos EUA, sim. Essa influência está sendo sentida na eleição presidencial. No entanto, eu acho que é uma influência ruim, perniciosa. [...] Para o ombudsman, alguns blogs brasileiros são radicais, não argumentam, ofendem, e isso contaminaria o “tal formador da opinião pública”. Sobre a contaminação dos formadores de opinião pela manipulação permanente da verdade dos fatos, a exemplo do que faz diariamente o Jornal Nacional da Rede Globo, nem uma palavra.
Quase ao final, a pergunta-chave da “entrevista”, redigida de forma a dar razão ao jornal: “O ombudsman anterior, Mário Magalhães, condicionou sua permanência no cargo a que o jornal voltasse atrás de decisão tomada no ano passado de não mais divulgar na internet a crítica interna, que, no entender da Direção de Redação, estaria sendo usada pela concorrência e instrumentada por jornalistas ligados ao Planalto. Você acha que a crítica deveria ser pública?”
A resposta é um primor de contorcionismo, servilismo e ofensas ao ombudsman anterior: Primeira parte: “Do ponto de vista do ombudsman, acho que essa questão é irrelevante. Do ponto de vista do jornal, inócua. Irrelevante porque qualquer coisa importante da crítica interna poderá estar na coluna de domingo, que é pública. O leitor, então, não perderá nada”. Ou seja, as muitas observações diárias do ombudsman sobre todo o jornal e suas seções, que eram minuciosamente apontadas por Mário Magalhães, sairão do alcance do leitor. Afirmar que o leitor não perderá nada, em razão da coluninha restrita de domingo, é empulhação. Insista-se: o jogo lógico é desonesto, e ingênuo com o leitor que sabe ler: é verdade que “qualquer coisa poderá estar” na coluna de domingo, mas isso não pode se sobrepor ao fato de a coluna de domingo abrigar um mínimo das críticas. O leitor perde, sim, perde quase tudo, e ganha um jornal opaco e um ombudsman mergulhado em falácias lógicas elementares.
Segunda parte: “Já para o jornal, acho que a medida é inócua porque o fato de ser restrita à Redação não vai impedir que a concorrência e grupos políticos tenham acesso a ela. [...] Acho que o impasse foi gerado por uma questão que não precisaria tê-lo provocado, nem de um lado nem de outro.” Vou necessitar do leitor (contra os conselhos do sr. da Silva) para me esclarecer sobre o significado dessa segunda parte. O ombudsman fala como se o impasse fosse absurdo, que tivesse existência independentemente das partes. A Folha fez uma exigência antiética, o ético Mário Magalhães não concordou e saiu: onde está a “questão que não precisaria tê-lo provocado”? Até agora, só existem uma questão, que provocou um impasse, e a sua solução. O fato de o sr. da Silva talvez se sentir desconfortável em ocupar a função nesse momento, já assumindo a proibição de exposição das suas observações na internet, leva-o a minimizar e a relativizar algo que é claro e definitivo. Madame Natasha diria: o sr. ombudsman está tentando nos enrolar.
O título da matéria é: “Jornal precisa encontrar seu novo papel, diz ombudsman”. A julgar pelas posições conservadoras e aristocratas do eleito, a Folha passará a circular impressa em papel cuchê.

Chico Villela na NovaE
,,,