3 de fevereiro de 2015 | 09:59 Autor: Fernando
Brito
Para ler de pé, em voz alta, para mandar para os amigos, os
parentes, a todos aqueles que conseguem ir mais fundo que os cinco centímetros
da histeria pseudo-moralista, que não consegue entender o que, dramaticamente,
está em jogo:
Quanto vale a Petrobras?
Mauro Santayana
O adiamento do balanço da Petrobras do terceiro trimestre do
ano passado foi um equívoco estratégico da direção da companhia, cada vez mais
vulnerável à pressão que vem recebendo de todos os lados, que deveria, desde o
início do processo, ter afirmado que só faria a baixa contábil dos eventuais
prejuízos com a corrupção, depois que eles tivessem, um a um, sua apuração
concluída, com o avanço das investigações.
A divulgação do balanço há poucos dias, sem números que não
deveriam ter sido prometidos, levou a nova queda no preço das ações.
E, naturalmente, a novas reações iradas e estapafúrdias, com
mais especulação sobre qual seria o valor — subjetivo, sujeito a flutuação,
como o de toda empresa de capital aberto presente em bolsa — da Petrobras, e o
aumento dos ataques por parte dos que pretendem aproveitar o que está ocorrendo
para destruir a empresa — incluindo hienas de outros países, vide as últimas
idiotices do Financial Times – que adorariam estraçalhar e dividir, entre baba
e dentes, os eventuais despojos de uma das maiores empresas petrolíferas do
mundo.
O que importa mais na Petrobras?
O valor das ações, espremido também por uma campanha que vai
muito além da intenção de sanear a empresa e combater eventuais casos de
corrupção e que inclui de apelos, nas redes sociais, para que consumidores
deixem de abastecer seus carros nos postos BR; à aberta torcida para que “ela
quebre, para acabar com o governo”; ou para que seja privatizada, de
preferência, com a entrega de seu controle para estrangeiros, para que se possa
— como afirmou um internauta — “pagar um real por litro de gasolina, como nos
EUA”?
Para quem investe em bolsa, o valor da Petrobras se mede em
dólares, ou em reais, pela cotação do momento, e muitos especuladores estão
fazendo fortunas, dentro e fora do Brasil, da noite para o dia, com a flutuação
dos títulos derivada, também, da campanha antinacional em curso, refletida no
clima de “terrorismo” e no desejo de “jogar gasolina na fogueira”, que tomou
conta dos espaços mais conservadores — para não dizer golpistas, fascistas, até
mesmo por conivência — da internet.
Para os patriotas – e ainda os há, graças a Deus – o que
importa mais, na Petrobras, é seu valor intrínseco, simbólico, permanente, e
intangível, e o seu papel estratégico para o desenvolvimento e o fortalecimento
do Brasil.
Quanto vale a luta, a coragem, a determinação, daqueles que,
em nossa geração, foram para as ruas e para a prisão, e apanharam de cassetete
e bombas de gás, para exigir a criação de uma empresa nacional voltada para a
exploração de uma das maiores riquezas econômicas e estratégicas da época, em
um momento em que todos diziam que não havia petróleo no Brasil, e que, se
houvesse, não teríamos, atrasados e subdesenvolvidos que “somos”, condições
técnicas de explorá-lo?
Quanto vale a formação, ao longo de décadas, de uma equipe
de 86.000 funcionários, trabalhadores, técnicos e engenheiros, em um dos
segmentos mais complexos da atuação humana?
Quanto vale a luta, o trabalho, a coragem, a determinação
daqueles, que, não tendo achado petróleo em grande quantidade em terra, foram
buscá-lo no mar, batendo sucessivos recordes de poços mais profundos do
planeta; criaram soluções, “know-how”, conhecimento; transformaram a Petrobras
na primeira referência no campo da exploração de petróleo a centenas, milhares
de metros de profundidade; a dezenas, centenas de quilômetros da costa; e na
mais premiada empresa da história da OTC – Offshore Technology Conferences, o
“Oscar” tecnológico da exploração de petróleo em alto mar, que se realiza a
cada dois anos, na cidade de Houston, no Texas, nos Estados Unidos?
Quanto vale a luta, a coragem, a determinação, daqueles que,
ao longo da história da maior empresa brasileira — condição que ultrapassa em
muito, seu eventual valor de “mercado” — enfrentaram todas as ameaças à sua
desnacionalização, incluindo a ignominiosa tentativa de alterar seu nome,
retirando-lhe a condição de brasileira, mudando-o para “Petrobrax”, durante a
tragédia privatista e “entreguista” dos anos 1990?
Quanto vale uma companhia presente em 17 países, que provou
o seu valor, na descoberta e exploração de óleo e gás, dos campos do Oriente
Médio ao Mar Cáspio, da costa africana às águas norte-americanas do Golfo do
México?
Quanto vale uma empresa que reuniu à sua volta, no Brasil,
uma das maiores estruturas do mundo em Pesquisa e Desenvolvimento, no Rio de
Janeiro, trazendo para cá os principais laboratórios, fora de seus países de
origem, de algumas das mais avançadas empresas do planeta?
Por que enquanto virou moda — nas redes sociais e fora da
internet — mostrar desprezo, ódio e descrédito pela Petrobras, as mais
importantes empresas mundiais de tecnologia seguem acreditando nela, e querem
desenvolver e desbravar, junto com a maior empresa brasileira, as novas
fronteiras da tecnologia de exploração de óleo e gás em águas profundas?
Por que em novembro de 2014, há apenas pouco mais de três
meses, portanto, a General Electric inaugurou, no Rio de Janeiro, com um
investimento de 1 bilhão de reais, o seu Centro Global de Inovação, junto a
outras empresas que já trouxeram seus principais laboratórios para perto da
Petrobras, como a BG, a Schlumberger, a Halliburton, a FMC, a Siemens, a Baker
Hughes, a Tenaris Confab, a EMC2 a V&M e a Statoil?
Quanto vale o fato de a Petrobras ser a maior empresa da
América Latina, e a de maior lucro em 2013 — mais de 10 bilhões de dólares —
enquanto a PEMEX mexicana, por exemplo, teve um prejuízo de mais de 12 bilhões
de dólares no mesmo período?
Quanto vale o fato de a Petrobras ter ultrapassado, no
terceiro trimestre de 2014, a Exonn norte-americana como a maior produtora de
petróleo do mundo, entre as maiores companhias petrolíferas mundiais de capital
aberto?
É preciso tomar cuidado com a desconstrução artificial,
rasteira, e odiosa, da Petrobras e com a especulação com suas potenciais perdas
no âmbito da corrupção, especulação esta que não é apenas econômica, mas também
política.
A Petrobras teve um faturamento de 305 bilhões de reais em
2013, investe mais de 100 bilhões de reais por ano, opera uma frota de 326
navios, tem 35.000 quilômetros de dutos, mais de 17 bilhões de barris em
reservas, 15 refinarias e 134 plataformas de produção de gás e de petróleo.
É óbvio que uma empresa de energia com essa dimensão e
complexidade, que, além dessas áreas, atua também com termoeletricidade,
biodiesel, fertilizantes e etanol, só poderia lançar em balanço eventuais
prejuízos com o desvio de recursos por corrupção, à medida que esses desvios ou
prejuízos fossem “quantificados” sem sombra de dúvida, para depois ser — como
diz o “mercado” — “precificados”, um por um, e não por atacado, com números
aleatórios, multiplicados até quase o infinito, como tem ocorrido até agora.
As cifras estratosféricas (de 10 a dezenas de bilhões de
reais), que contrastam com o dinheiro efetivamente descoberto e desviado para o
exterior até agora, e enchem a boca de “analistas”, ao falar dos prejuízos, sem
citar fatos ou documentos que as justifiquem, lembram o caso do “Mensalão”.
Naquela época, adversários dos envolvidos cansaram-se de
repetir, na imprensa e fora dela, ao longo de meses a fio, tratar-se a denúncia
de Roberto Jefferson, depois de ter um apaniguado filmado roubando nos
Correios, de o “maior escândalo da história da República”, bordão esse que
voltou a ser utilizado maciçamente, agora, no caso da Petrobras.
Em dezembro de 2014, um estudo feito pelo instituto Avante
Brasil, que, com certeza não defende a “situação”, levantou os 31 maiores
escândalos de corrupção dos últimos 20 anos.
Nesse estudo, o “mensalão” — o nacional, não o “mineiro” —
acabou ficando em décimo-oitavo lugar no ranking, tendo envolvido menos da
metade dos recursos do “trensalão” tucano de São Paulo e uma parcela duzentas
vezes menor que a cifra relacionada ao escândalo do Banestado, ocorrido durante
o mandato de Fernando Henrique Cardoso, que, em primeiríssimo lugar, envolveu,
segundo o levantamento, em valores atualizados, aproximadamente 60 bilhões de
reais.
E ninguém, absolutamente ninguém, que dizia ser o mensalão o
maior dos escândalos da história do Brasil, tomou a iniciativa de tocar,
sequer, no tema — apesar do “doleiro” do caso Petrobras, Alberto Youssef, ser o
mesmo do caso Banestado — até agora.
Os problemas derivados da queda da cotação do preço
internacional do petróleo não são de responsabilidade da Petrobras e afetam
igualmente suas principais concorrentes.
Eles advém da decisão tomada pela Arábia Saudita de tentar
quebrar a indústria de extração de óleo de xisto nos Estados Unidos, aumentando
a oferta saudita e diminuindo a cotação do produto no mercado global.
Como o petróleo extraído pela Petrobras destina-se à
produção de combustíveis para o próprio mercado brasileiro, que deve aumentar
com a entrada em produção de novas refinarias, como a Abreu e Lima; ou para a
“troca” por petróleo de outra graduação, com outros países, a empresa deverá
ser menos prejudicada por esse processo.
A produção de petróleo da companhia está aumentando, e
também as descobertas, que já somam várias depois da eclosão do escândalo.
E, mesmo que houvesse prejuízo — e não há — na extração de
petróleo do pré-sal, que já passa de 500.000 barris por dia, ainda assim
valeria a pena para o país, pelo efeito multiplicador das atividades da
empresa, que garante, com a política de conteúdo nacional mínimo, milhares de
empregos qualificados na construção naval, na indústria de equipamentos, na
siderurgia, na metalurgia, na tecnologia.
A Petrobras foi, é e será, com todos os seus problemas, um
instrumento de fundamental importância estratégica para o desenvolvimento
nacional, e especialmente para os estados onde tem maior atuação, como é o caso
do Rio de Janeiro.
Em vez de acabar com ela, como muitos gostariam, o que o
Brasil precisaria é ter duas, três, quatro, cinco Petrobras.
É necessário punir os ladrões que a assaltaram?
Ninguém duvida disso.
Mas é preciso lembrar, também, uma verdade cristalina.
A Petrobras não é apenas uma empresa.
Ela é uma Nação.
Um conceito.
Uma bandeira.
E por isso, seu valor é tão grande, incomensurável,
insubstituível.
Esta é a crença que impulsiona os que a defendem.
E, sem dúvida alguma, também, a abjeta motivação que está
por trás dos canalhas que pretendem destruí-la.