quinta-feira, dezembro 14, 2006

Sobrevivemos satisfatoriamente democráticos e assim vivemos hoje, continuando a nos redemocratizar, nós a nós mesmos




Vá pro tanque, D. Eliane, façavôr. Os tempos de Lula, no Brasil, são complexos demais pro seu DES-jornalismo de lambança __________________________________________

Ontem, 13/12/2006, fez 38 anos que foi assinado o Ato Institucional n. 5 (13/12/1968), que ‘legalizou’ o assassinato da democracia brasileira, iniciado em 1964. O AI 5 foi dito ‘esgotado’, e veio a dita ‘Anistia’ à moda Tancredo. Há alguns meses, dia 28/8/2006, fez 28 anos a Lei n. 6.683, chamada “Lei da Anistia”.[1]

Entre o AI 5 e a Anistia passaram-se 10 anos dificílimos. Erra brabamente quem disser que a direita venceu aquela guerra, assim como erra brabamente quem disser que a oposição àquela direita perdeu aquela guerra. Mas parece que se pode dizer, sim, que alguma direita (ainda não perfeitamente identificada nem para ela mesma) derrotou, sim, de fato, todo o Brasil, quando, no início dos anos 80, construiu-se aquela tal de ‘redemocratização’ de araque, cria daquela ‘anistia’ de araque. Os anos anteriores haviam sido anos de guerra, não de convescote.

Mas a ‘redemocratização’, essa, foi puro convescote. De fato, foi tão difícil sobreviver àquela guerra quanto foi (e ainda é) difícil sobreviver àquele convescote. Mas, sim, o Brasil sobreviveu. O melhor de tudo: sobrevivemos satisfatoriamente democráticos e assim vivemos hoje, continuando a nos redemocratizar, nós a nós mesmos, contra tooooooooooooooooooooooooda a mídia de jornalão, sob o governo do presidente Lula.

A opinião pública no Brasil – eterno país sem-jornalismo e sem-universidade democráticos –, conheceu de todas essas missas muito menos que a metade. E, assim como conhecemos dessas missas muito menos que a metade, continuamos ainda meio que desentendidos de nós mesmos, ainda, em pleno século 21. E, em pleno século 21, também continuamos perfeitamente sem jornalismo e sem universidade democráticos. A sobrevivência da democracia, no Brasil, é um fenômeno ainda não explicado. E é claro que nenhum brasileiro sério está à espera de que alguma ‘sociologia’ uspeano-pefelista consiga explicá-la.

Eu, pessoalmente, já não cultivo sequer a ilusão de que a ‘sociologia’ uspeana sequer QUEIRA explicar alguma coisa que interesse mais ao Brasil do que à UDN-PSDB-PFL (e sempre uspeana). Mas, em matéria de democracia, o que importa à democracia é tê-la, muito mais do que explicá-la ou entendê-la. E a tucanaria-uspeana-pefelista, bem francamente, que se dane!

O caso é que, sem nenhuma sociologia que sequer QUEIRA (ou tente) explicar alguma coisa, o lambancismo que tudo confunde, hoje travestido de ‘jornalismo’ no Brasil, já está convertido em meio de vida para todos quantos, entendam ou não entendam de alguma democracia brasileira, só querem, mesmo, é acabá coa raça dela. D. Eliane Cantanhede, se quiser, pode reinvindicar para ela mesma a coroa de “Rainha do Lambancismo Vendido aos Consumidores-Leitores de Jornais (eleitores!) como se Fosse Jornalismo”, no Brasil do presidente Lula.

Sim, sim, eu sei: a disputa será dura. Mas, sim, me parece que D. Eliane Cantanhede, na Folha de S.Paulo, é sempre mais dedicadamente lambancista do que D. Dora Kramer, D. Lucia Hippólito. (Mêo! Ia-me esquecendo da Miriam Leitão! Que lambancista!) O caso é que, de algum modo que não entendemos ainda, ainda há sobreviventes dos golpistas de 64, assim como há sobreviventes da ‘resistência’ daqueles anos, e todos estão ativos na política brasileira.

Todos esses são grupos complexos. Os golpistas de 64 sobreviventes sabem com alguma certeza o que eles não querem (eles não querem ‘comunismo’, por exemplo, seja lá o que for o ‘comunismo’, pra eles, ou o ‘esquerdismo’), mas são totalmente incompetentes para ver claramente o que eles querem e como chegar lá. Sorte, portanto, dos eternos resistentes democráticos, pq nossos inimigos só sabem, deles mesmos, apenas, algumas vagas idéias-gerais, muito primitivas, tipo “farinha pouca, meu pirão primeiro”, “pobre é burro”, “preto é ladrão”, “Daslu é lindo”, “FHC é sociólogo”, “D. Eliane Cantanhede é jornalista” etc.

Nada disso é simples como parece. E, o pior pra eles e o melhor pra nós: nada disso funciona hoje, como funcionava antes. “Farinha pouca, meu pirão primeiro” é muito mais fácil de dizer, do que de fazer. No que dependa de mim, por exemplo, é claro que hoje o negócio é o MEU pirão primeiro, não o deles, e eu vou a luta, e ninguém tasca. Todos já viram que há pobres inteligentíssimos (por exemplo, os que aprendam a rir dos ricos e riam muito, na cara deles, e os que se elejam presidente da República, no Brasil, na Venezuela, na Bolívia, ou em qquer lugar do planeta).

“Preto é ladrão” é coisa que ofende, mas, afinal, já não protege nenhum branco rico; hoje, os brancos ricos já temem, igualmente, e muito, tanto os pretos ladrões quanto muuuuuuuuuuuuuuuuuitos brancos ladrões. “Daslu é lindo” já é frase que nenhum Alckmin atreve-se a dizer em voz alta, de medo de, só por dizer, ser preso por crime de sonegação de impostos e ladroagem generalizada e ter de pagar aquela baita multa.

E “FHC é sociólogo”, afinal, já virou piada-total, ou já está identificado como pura ‘verdade de igrejinha’, daquelas de que até deus duvida, a começar por D. Ruth.

Os que viveram aqueles duros anos, do AI 5 à ‘anistia’, seja num seja no outro campo, e que, então, estavam em luta de vida ou morte, distribuem-se hoje, em 2006, em 4 grupos: (i) os que lembram, querem lembrar e insistem em fazer lembrar aqueles anos; e, de outro lado, em campo ainda diametralmente oposto, em 2006, (ii) os que insistem em tentar obrigar os outros esquecer, ou, no mínimo, a fingir, uns prôs outros, que todos (eles) já esqueceram.

Curiosamente, todos eles vivem conversando uns com os outros, pra demonstrar, precisamente, que NÃO ESQUECERAM. E a Folha de S.Paulo vive de perguntar ao Jarbas Passarinho o que ele diz que esqueceu, mas tá na cara que ele não esqueceu, pq, se esqueceu... pra que entrevistar o cara?! [risos, risos]. Além desses, sempre há, é claro, também, (iii) os perfeitos imbecis de sempre, que, lembrando ou esquecendo, sempre pensam que sabem tudo, porque, esses, afinal, sempre há, feito os Jabores e os Mainardis e as D. Danuza Leão e as Lucia Hippólito e o Jô e D. Eliane, e D. Dora Kramer e o Clóvis Rossi e tal & tal.

Esses três grupos, hoje, ainda convivem, no Brasil – porque são generacionalmente contemporâneos. Estão vivos e ativos na sociedade brasileira, ainda, em 2006, tanto o General Meira Mattos (92 anos) – que está incluído no grupo (i), acima – quanto o deputado Babá, dito ‘trotskista’ (de algum trotskismo que ele, diz ele, teria aprendido da senadora HH, a qual, diz ela, tê-lo-ia aprendido na Bíblia, durante um curso de enfermagem).

Nesses dois extremos, em que habitam personagens já completamente inviáveis para o mundo histórico real, o negócio está sossegadíssimo: o General Meira Mattos ainda sonha com prender-matar-e-arrebentar o deputado Babá, o qual sonha também com prender-matar-e-arrebentar o general Meira Mattos. O general Meira Mattos ainda lembra de tudo, mas já ninguém lembra do general Meira Mattos. E o Babá não sabe, sequer, se há alguma coisa de que ele deveria lembrar, mas ele sesqueceu. Não há, portanto, nenhum risco, em matéria de esquecer ou de lembrar seja lá o que for. Nem há perigo algum de o general conseguir jeito de acabá coa raça do Babá ou de o Babá conseguir jeito de acabá coa raça do general. A boa e bela democracia brasileira, sob o governo do presidente Lula, os mantêm bem afastados um do outro – em perfeita segurança, portanto, seja a deles seja a nossa.

No meio do campo, a tranqüilidade também reina. Os comunistas, é claro, não querem que os seus heróis sejam esquecidos. E, mesmo que esses heróis sejam os mesmíssimos que o general prendeu, matou e arrebentou em 64-68, todos os comunistas deram jeito de lembrar os seus heróis, em 2006, apesar da específica ordem que o general deu, no sentido de que todos esquecessem tuuuuuuuuuuuudo.

De interessante, que, em 2006, cada grupo de heróis comunistas encontrou seus legítimos lembradores. Cada grupo lembrou quem quis e o que quis – e, em vez de uma solenidade emocionante, tivemos duas. Prova disso foram as duas solenidades que lembraram, mês passado, os 37 anos do assassinato, pela ditadura, de Carlos Marighella, fundador da ANL[2] (, emboscado e assassinado dia 4/11/1969, na Al. Casa Branca, em São Paulo)[3]; e, ontem, as solenidades que lembraram os 30 anos da Chacina da Lapa, em que Pedro Pomar e Ângelo Arroyo, militantes comunistas, foram também emboscados e assassinados pela ditadura (17/12/1976)[4].

Três heróis da democracia brasileira, democraticamente festejados, em 2006, aí, nas barbas do general. O PT vive lá os seus problemas, sim, mas nenhum problema do PT é grave. E, afinal, os problemas do PT são do PT, e cabe ao PT resolvê-los. Não fosse o lambancismo da D. Eliane Cantanhede, qualquer criança de escola já teria entendido, pelo menos, essa evidência simples: os problemas do PT NADA TÊM A VER COM OS PROBLEMAS do governo Lula nem – e muito menos – têm a ver com os problemas do Brasil. É o PT que tem de crescer para acompanhar a democracia brasileira – e todos devemos trabalhar para que o PT cresça e acerte-se.

Não fosse lambancista obsessiva, D. Eliane Cantanhede estaria trabalhando, como jornalista, para ajudar o PT a crescer e democratizar-se.

Não. D. Eliane Cantanhede DECIDIU que ela, sozinha, vai ser juíza e carrasco do PT e, isso, mediante o mais empenhado lambancismo, inventando, ela, para o PT, a maior quantidade possível de rolos insanáveis.

Tivéssemos jornalismo e jornalistas, no Brasil, todos poderíamos estar festejando a evidência de que o Brasil vai bem, dentre outros motivos, porque estamos conseguindo sobreviver lindamente até à falta TOTAL de jornalismo democrático.

Essas questões históricas de fundo, esse negócio todo de o que lembrar e o que esquecer, ou de quem ‘pode’ lembrar e quem ‘deve’ esquecer o quê, em cada caso, são sempre complexíssimas, sobretudo se discutidas no calor da hora. Mas não há dúvidas de que temos MUUUUUUUUUUUUUUUUUUITO a festejar, em boa democracia, se se vê que (i) um Jarbas Passarinho manda esquecer tudo; (ii) a Folha de S.Paulo publica a ‘ordem’... e ninguém liga pro que diga nenhum Jarbas Passarinho; e cada comunista faz lá a solenidade que queira fazer e lembra o que queira lembrar; e, entre a ordem de ‘esqueça’ e a solenidade do ‘eu lembro’... ainda reelegemos o presidente Lula.

Tudo isso aí acima me vem à cabeça, hoje, ao ver a TOTAL LAMBANÇA que D. Eliane Cantanhede tentou armar, na ‘coluna’ de hoje[5]. Não sei de onde D. Eliane pode ter tirado a idéia de que ela (lambancista militante) seria autoridade para saber o que é esquerda ou direita, sobretudo abaixo do Equador, em nação pós-colonial, em pleno século 21, em tempos de crise do capitalismo senil.

Quanto a nós, os sobreviventes democráticos de 1964 e 1968... Acho que, enquanto não acharmos meio para dar uma saneada geral no lambancismo que o DES-jornalismo brasileiro e a DES-sociologia tucano-uspeana e pefelista implantaram na opinião pública ao longo dos últimos 40 anos, não saberemos discutir, com alguma consistência, o que, exatamente, o presidente Lula disse, quando ele disse que não é de esquerda.

Se ele pensava na esquerda à Babá, o presidente faz muito bem em não ser de esquerda, e eu tb não sou de esquerda-à-Babá e deusnoslivre desses esquerdismos doença-infantil.

Se ele pensava na esquerda academizada que há no Brasil... que deusnoslivre também dessa esquerda academizada. Se ele pensava na esquerda petista... Bom, essa, o presidente deve conhecer melhor do que eu. Se ele não quer saber dessa esquerda.. eu tendo, aí, mais a concordar do que discordar do presidente Lula.

CONTUDO, Lula defende com unhas e dentes o deputado Aldo Rebelo e, esse sim, é de esquerda, da boa e velha cepa da esquerda leninista que nunca fugiu dos riscos do poder, no poder, para construir o poder dos pobres. Aliás, o nosso presidente da Câmara dos Deputados, deputado comunista, orgulho do Brasil, lá estava, ontem, presente, perfilado e emocionado, na solenidade que marcou os 30 anos da Chacina da Lapa, em que Pedro Pomar e Ângelo Arroyo, militantes comunistas, foram emboscados e assassinados pela ditadura.

Os nossos mortos – os mortos da esquerda brasileira – dependem dos vivos, pra continuarem vivos. Talvez dependam, também, de um metalúrgico. Isso, afinal, só a história dirá. Essa luta está só começando. É possível que, hoje, a atitude mais libertária seja, apenas, qualquer humilde movimento, brotado do coração difuso da multidão, e que vise, apenas a livrar o Brasil do lambancismo dito 'jornalístico' e publicado nos jornalões. Sabe-se lá. Tudo é luta.

Viva o Brasil! LULA É MUITOS.

NOTAS [1] Ler, na íntegra, em http://www010.dataprev.gov.br/sislex/paginas/42/1979/6683.htm [2] "A Ação Libertadora Nacional (ALN) surgiu como uma dissidência do Partido Comunista Brasileiro (PCB), liderada por Carlos Marighella, que defendia a luta armada contra a ditadura militar. Marighella foi expulso do partido e o comitê estadual em São Paulo rompeu com o PCB formando, em 1967, o Agrupamento Comunista de São Paulo (AC-SP). A dissidência cresceu em vários Estados, constituindo a ALN." (Dos filhos deste solo. N. Miranda e C. Tibúrcio. São Paulo, Fundação Perseu Abramo e Boitempo, 1999, p. 26.) [3] Os que nada saibam sobre isso, aprenderão bastante em http://www.desaparecidospoliticos.org.br/detalhes1.asp?id=85 [4] Os que nada saibam sobre isso, podem informar-se no Portal Vermelho, do PCdoB, em http://www.vermelho.org.br/base.asp?texto=11119 [5] ELIANE CANTANHÊDE, “Evolução da espécie humana”, Folha de S.Paulo, 14/12/2006, p. 2 e na internet em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1412200604.htm

Caia Fittipaldi

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