ENTREVISTA DA SEMANA
JOSÉ DIRCEUEx-deputado federal por São Paulo e ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu esteve ontem (dia 19) em Salvador para um encontro com o presidente da Assembléia Legislativa da Bahia, Marcelo Nilo (PSDB), militantes do PT e com o governador Jaques Wagner (PT). Veio rever os amigos e fazer política. Encontrou um tempo na agenda para receber o Bahia Notícias e conceder esta entrevista exclusiva no hotel em que ficou hospedado, quando falou da luta para provar sua inocência no Supremo Tribunal Federal (STF), onde é acusado de liderar um esquema de corrupção que ficou conhecido como mensalão, e da sucessão em 2010. Inelegível até 2015, já que foi cassado pela Câmara em dezembro de 2005 por quebra de decoro, Dirceu, que lutou contra a ditadura e é um dos fundadores do PT, prepara o seu retorno completo à vida política.
Fotos: Max Haack
"Houve em 2006 uma pressão grande para que eu iniciasse um movimento pela anistia. Mas tomei a decisão de só voltar a pleitear a anistia depois que o Supremo me julgasse" Bahia Notícias- Qual o objetivo de mais uma visita a Salvador?
José Dirceu – Rever os amigos (risos).
BN – E fazer política?
JC – Olha, todos os anos eu faço isso. Só que agora tem uma repercussão maior porque estão querendo antecipar a sucessão de 2010. Estive aqui em Salvador em 2007 e em 2008 para fazer palestras, participar de debates, visitar os amigos, como o governador e o prefeito, com quem estive várias vezes, assim como rever meu amigo Josias Gomes (ex-deputado federal do PT e atual superintendente da Assembleia Legislativa da Bahia). Desta vez vim almoçar com o presidente da Assembleia, Marcelo Nilo (PSDB). É verdade que faço contatos políticos, mas não em nome da direção do PT. Continuo querendo ajudar o presidente Lula e o PT e procurando me defender das acusações que pesam contra mim, expor minhas razões e meu clamor para que o Supremo Tribunal Federal (STF) me julgue o mais rápido possível. Já fui absolvido em primeira instância, em CPI, em outros inquéritos. Estou pendente desse julgamento do Supremo para pedir a minha anistia à Câmara. Assim vou poder voltar plenamente à vida política do país. Hoje eu tenho direitos políticos, posso votar, participar de cargo público. Estou apenas inelegível.
BN – Essas viagens pelo país já são uma preparação para retornar à vida pública como eleito?
JD - É, sempre é. Eu nunca deixei a atividade política. Eu simplesmente não fui mais membro da direção do PT, até porque já fui sete anos presidente do partido, cinco anos secretario geral, fui 20 anos da direção. Acho que já dei minha contribuição. E o momento é de renovar, de uma nova geração assumir a direção do PT, como vem acontecendo em vários estados. E também, evidentemente, percorro o país para participar do debate político, como faço também no meu blog diariamente, e ajudar a militância política do PT na disputa, enfrentando a oposição, pois isso faz parte da democracia.
BN – Pensa em voltar para a Câmara Federal se conseguir a anistia?
JD - Não tenho hoje uma decisão do que faria no caso da absolvição pelo Supremo, que tenho certeza que conquistarei, e da anistia, que depende da Câmara e do Senado. Claro que espero também conquistá-la.
BN – O senhor chegou a iniciar um movimento de coletar assinaturas pelo país para lutar pela anistia no Congresso.
JD - Houve em 2006 uma pressão grande para que eu iniciasse um movimento pela anistia. Mas tomei a decisão de só voltar a pleitear a anistia e a direção do PT, se fosse o caso, depois que o Supremo me julgasse. A não ser que o julgamento fique, como às vezes dão a entender, para 2015 ou 2017. Como tudo indica que o julgamento será concluído entre 2010 e 2011, vou aguardar. Eu não faço nada para obstruir o Supremo. Pelo contrário. Eu nem pedi o foro privilegiado. Eu já fui julgado na primeira instância em dois processos e já estaria julgado também no processo do Supremo. O Supremo que decidiu estender o foro a quem não tinha, e não entendi essa decisão.
BN – Mas o senhor indiciou testemunhas fora do país, o que pode atrasar o julgamento.
JD - É, eu indiquei duas (testemunhas) fora do país, o que foi apresentado muitas vezes como obstrução, o que é um absurdo. Pois se apresentaram eles como prova contra mim tenho de chamá-los para testemunhar.
BN – Quem são as duas testemunhas?
JD – Miguel Horta, que é um importante empresário português (da Portugal Telecom), e o ex-ministro de Obras de Portugal, Antonio Mexia.
BN – No Brasil, quem são os políticos arrolados como testemunha do senhor?
JD – Ah, não lembro. Tem vários porque foram citados também. Quando você indica uma testemunha, está indicando para fazer contraprova. Você indica porque ou o Ministério Público ou em algum depoimento alguém atribuiu a você uma conduta ilícita apoiando-se num terceiro. Ora, tenho de chamar essa terceira prova. Se o terceiro diz que não é fato, que não é verdade, a acusação perde, pois só tem prova testemunhal, não tem material. O problema é que fizeram falsas acusações, e tenho de me defender. Aliás, não existe nenhum problema das duas testemunhas de fora do prestarem depoimento, porque Portugal está aqui do lado. Se não me engano, deve ter uns seis vôos da TAP por dia de Portugal. E eu é que arco com a passagem. Além disso, não é preciso fazer tradução dos documentos, a não ser que a língua em Portugal mudou, porque vieram com essa conversa de que iam gastar R$ 19 milhões por causa das traduções.
BN – Quais os argumentos da defesa do senhor?
JD - Eu não tive participação nem direta ou indireta, muito menos fui mentor intelectual ou chefe de nada que aconteceu. E isso está comprovando. Quando o Supremo aceitou a denúncia, deixou claro que isso não era culpabilidade e que o Ministério Público ia ter que provar. Estou fazendo essa luta para provar minha inocência, mas quem tem que provar que sou culpado é o Ministério Público, que fez a denúncia ao Supremo. E muitos dos que me acusaram já se retrataram em juízo. Veja o caso Celso Daniel (ex-prefeito petistas de Santo André assassinado em janeiro de 2002), que paguei mico durante dois anos com a imprensa dando manchete de primeira pagina. Quando processei o irmão de Celso Daniel (João Francisco Daniel, que acusou Dirceu de receber recursos recolhidos em Santo André para o PT através de um esquema de propinas cobradas de empresas de ônibus), ele se retratou em juízo e isso nunca saiu na imprensa com o mesmo destaque. No caso dos dois processos em Brasília, um por improbidade administrativa e outro por enriquecimento ilícito, eles foram arquivados. O outro que acusava meu filho de práticas ilegais era tão absurdo que não só foi arquivado como o foi com uma critica do juiz à acusação do Ministério Público Federal. Tomei aquele momento de tantas denúncias infundadas contra mim como um momento de luta política.
BN – O senhor acha que foi perseguido, como aconteceu na época da ditadura militar?
JD – Nesse caso não se trata de perseguição, mas de luta política. Queriam me tirar do governo.
BN – O Ministério Público também?
JD – Não, o Ministério Público faz o papel dele. Eu digo o seguinte. A campanha toda, a existência de um mensalão, a acusação de Roberto Jefferson (ex-deputado e presidente do PTB, que acusou Dirceu de ser chefe do mensalão e também acabou cassado) e o uso que foi feito disso foi para desestabilizar o governo, para derrotar o presidente Lula ou para fazer o impeachment dele. Não conseguiram derrotar o presidente, que foi reeleito, e nem tentaram fazer o impeachment. No caso do PT, que tentaram atingir também, o PT foi o partido mais votado em 2006 e será em 2010 de novo, porque nós temos uma história. No meu caso, tenho uma história de 40 anos de vida política.
BN - Mas o governo não tinha maioria? Parte do governo também queria derrubar o governo?
JD – O governo tinha e tem maioria mas não para matérias dessa natureza, de cunho político, programático e ideológico. O governo tem maioria para votar o programa mínimo para o país. Mas quando se trata de questões como essa, da luta contra o PT, o governo só teve maioria para impedir qualquer movimento direto contra o presidente. Além disso, houve a crença equivocada que me cassando o movimento contra o governo e contra o PT iria cessar. Também houve a divisão interna do PT. Um setor minoritário do PT se aproveitou das denúncias contra o PT para tentar fazer disputa política e tentar tomar de assalto a direção do partido, coisa que não aconteceu. Infelizmente, tragicamente, uma vilania que vai ficar registrada na história do PT e da esquerda brasileira, quando setores minoritários do PT se aproveitarem dessa crise para tentar nos expulsar do PT, não nos defenderam, não defenderam o partido ou o governo. Aliás, foi aqui em Salvador que o presidente falou isso no aniversário do PT, há dois anos. Ele disse que naquele momento, muitos no PT e no governo não defenderam o governo. Disse isso na minha frente e fiquei surpreso.
BN – Então a crise que levou à cassação do senhor em 2005 não passou de uma articulação macabra para atingir a cúpula majoritária do PT e o governo? Foi uma crise política inventada?
JD - Não, não digo isso. Houve erros políticos, e estamos pagando por eles. Vamos responder por eles na Justiça, que é questão do caixa dois no Brasil, mas não mensalão. Não houve mensalão.
BN – O senhor se arrepende de não ter renunciado para preservar a totalidade dos direitos políticos?
JD – Não, de jeito nenhum. Tinha que me defender, que defender o presidente, o governo e o PT. Cumpri meu papel. Se eu renunciasse, não teria a autoridade política que tenho hoje. Estou acostumado com lutas desde a época da ditadura militar.
BN – Está calejado?
JD – Não tanto, a idade pesa, mas... (risos)
BN – Por falar em idade, no último dia 17 o senhor completou 63 anos com uma festa em Brasília na qual compareceram figuras importantes do governo Lula, como a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) e o vice-presidente José Alencar. Isso mostra que o senhor ainda tem prestígio no governo?
JD – Mostra que essas pessoas são meus amigos, meus companheiros, que tem afeto por mim, amizade por mim e não necessariamente concordam comigo, com as minhas propostas, minhas posições, mas sabem que sou honesto, reconhecem meu papel na vida política brasileira, na construção do PT, na eleição do presidente, e querem que eu seja absolvido pelo Supremo e volte plenamente para a atividade política.
BN – São amigos que ouvem seus conselhos?
JD – Não sou procurado para dar conselhos com freqüência por eles. Veja bem. Muitos me perguntam se eu vejo o presidente regularmente. Isso não acontece porque não sou mais ministro, deputado ou presidente do PT. Sou amigo do presidente e militante do PT. Lógico que sou um militante do PT que tem liderança. Não é porque tem oposição a mim no país que não tenho apoio no país. Eu teria sido eleito deputado e talvez o mais votado do PT em São Paulo, em 2006. Mas não participo mais do centro de decisão nem do PT nem do governo. Minha influência política se dá é viajando país, através do meu blog, debatendo, discutindo o país. Quando sou convidado pelo PT ou pelo governo de reuniões eu participo, se pedem minha opinião eu dou, mas no governo isso não acontece.
BN – O senhor participa das reuniões da direção do PT?
JD – Não. Participo mais hoje das reuniões da minha corrente, a “Construindo um novo Brasil”. Não voltei mais para as reuniões da direção do PT porque não sou membro do diretório nacional. Visito estados, participo de debates com militantes, sou bem recebido pelo PT, como aconteceu agora numa visita que fiz ao Rio Grande do Sul. Mas são reuniões informais. No fundo são gestos de solidariedade, e não porque exerço influência.
BN – O PT tem sido bem comandado, em sua avaliação?
JD – Está sendo bem dirigido. O PT viveu um momento muito difícil, uma campanha insana para destrocá-lo durante três anos. E Berzoini (Ricardo Berzoini, presidente nacional do PT) foi eleito no auge da crise com uma expressiva votação, que foi uma resposta da militância. Depois, ele foi reeleito em 2007 e faz bem seu papel, tanto que o partido ajudou a reeleger o presidente e teve um excelente resultado eleitoral em 2006 e 2008. Lógico que agora teremos eleição de direção no final do ano. Em novembro, vamos renovar a direção do PT por um processo direto. E vai ser um processo importante, porque vamos eleger a direção que vai fazer a campanha de 2010.
BN – O que o senhor acha da volta de Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT expulso do partido na época do escândalo do mensalão, ao partido?
JD - Eu votei contra a expulsão dele, porque foi um julgamento antecipado que fizeram dele. No mínimo, o PT deveria ter esperado a decisão da Justiça. Ele tem direito de pleitear essa volta pela história dele no PT, no movimento sindical, na vida política do país e jamais fez qualquer coisa em benefício próprio. Ele pretende ser candidato a deputado federal por Goiás, estado dele, aonde tem atuado politicamente.
BN – Quando o senhor estava no governo, era considerado um ministro linha dura. Se estivesse hoje ainda como ministro da Casa Civil, as negociações com o PMDB, que todo dia cobra mais espaço no governo e conquistou o comando das duas Casas do Congresso Nacional, seriam mais duras?
JD – Sou um precursor da defesa da integração do PMDB como um todo no governo. Aliás, o governador Jaques Wagner é um dos responsáveis por esse fato, quando, de 2006 para 2007, o PMDB veio para o governo como um todo.
BN – Todo não, já que existe uma parte do partido que se coloca como oposição a Lula, inclusive em São Paulo.
JD – Isso é natural. Às vezes o PT participa de um governo e uma parte do PT faz oposição, como já aconteceu aqui na Bahia. Veja bem. Hoje mesmo escrevi no meu blog isso. É importante que o PMDB deixe de ter uma relação com o governo na base de nomeações, de ocupação de cargos, de disputa por espaço no governo, que todos os partidos no mundo ocupam, e de defender reivindicações de recursos para seus governadores - qualquer outra ação já pertence a outro campo, pois estou falando do campo político - e passe a ter presença política no governo, na formulação da política do governo. Como agora acabou de reivindicar...
BN – E toda semana reivindica alguma coisa...
JD – Faz parte. O PT também reivindica. Quando o PSDB e o PFL estavam no governo, o PMDB também reivindicava do governo Fernando Henrique Cardoso.
BN – Hoje o PMDB tem sido alvo de denúncias de corrupção feitas por membros do próprio partido. Além disso, enfrenta problemas políticos no Congresso, principalmente no Senado...
JD – Acho que o importante é se fazer uma reforma administrativa tanto na Câmara quanto no Senado nesse momento. E agora é a hora de fazer a reforma política. O Parlamento está em crise, está com a imagem desgastada. Há uma campanha contra também, porque há o interesse em desgastar o PMDB porque o PMDB está apoiando o presidente. Veja bem. Quando o PMDB participava do governo FHC, porque não havia uma campanha contra o PMDB? É a leitura que precisamos fazer. Porque agora no governo do presidente Lula? Porque querem fazer tudo para o PMDB não apoiar o presidente em 2010 e a candidata dele.
BN – Foi essa a intenção do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE)?
JD - O senador é peemedebista, e esta disputando o PMDB, inclusive o nome dele foi inventado para ser vice do José Serra (governador tucano de São Paulo), provável candidato (à Presidência) do PSDB. Isso já diz tudo. Ele tem o direito de fazer as denúncias dele, o PMDB já disse a ele para especificar e fazer uma acusação concreta que o PMDB responde.
BN – O senhor acha o PMDB confiável?
JD – Veja bem. Um partido às vezes sai por divergência do governo, insatisfeito com o espaço e até com a impopularidade de um governo. Isso é natural. O PT não saiu do governo aqui do prefeito João Henrique (PMDB) e lançou candidato? Isso é natural.
BN – Aqui o PT saiu praticamente na véspera do período eleitoral. O senhor não acha que se o PMDB for sair, por exemplo, do governo Wagner tem que fazer isso com um pouco mais de antecedência?
JD - Acho improvável que o faça. Nenhum partido gosta de sair de governo, só o PT. É um caso raro na história, um DNA só nosso.
BN – Agora o PMDB está pleiteando em Brasília lugar permanente no grupo de coordenação do governo Lula, que define a pauta política e econômica do país. É mais uma reivindicação do partido. É uma reivindicação justa?
JD – São dois espaços diferentes. Existe o Conselho Político do governo, que o PMDB tem lugar e participam os presidentes dos partidos aliados e líderes. E tem a coordenação, que tem outro caráter. Dela participam a equipe econômica, o chefe da Casa Civil, o ministro de Relações Institucionais, da Comunicação, da Fazenda, do Planejamento, do Banco Central e o ministro que comanda a área sobre a qual uma reunião de coordenação irá acontecer. Ou seja, o PMDB pode participar, se o assunto for, por exemplo, na área da Integração Nacional, do ministro Geddel Vieira Lima. Mas como o PMDB não tem ninguém na articulação política do governo e não faz parte da equipe econômica, então não participa sempre. A rigor, a participação permanente do PMDB mudaria o caráter da coordenação, que é assim em vários países do mundo. Mas pela importância do PMDB, que tem sete governadores, o maior número de prefeitos e grandes bancadas no Congresso, o pleito é positivo, na medida em que o partido quer participar das decisões. Se isso ajudar o PMDB a formar uma direção no PMDB, um núcleo nacional, uma liderança nacional, acho isso muito importante. Porque se o PMDB se fortalecer como partido melhora a política brasileira também.
BN – Se o senhor fosse fazer uma aposta, apostaria que o PMDB estará nacionalmente com o PT em 2010?
JD – Acredito que sim. Depende de nós também, das alianças regionais e do acordo político. Mas a tendência do PMDB é continuar com o PT e apoiar a candidata do PT, do presidente Lula.
BN – O ministro Geddel ensaia uma candidatura do governo da Bahia em 2010. Isso pode atrapalhar as articulações nacionais entre PT e PMDB?
JD - Depende, porque é legítimo que um deputado federal, uma liderança como o Geddel Vieira queira ser senador ou governador. Isso é problema do PMDB decidir se vai lançar. Nós não temos medo não. Achar que temos medo, que não temos força política para disputar e ganhar em 2010 é erro. Mas o ideal é manter a aliança. Defendo o apoio a reeleição de Wagner com Geddel como candidato ao Senado, com uma aliança nacional com um palanque forte aqui na Bahia. Mas se for necessário ter dois palanques, enfrentar o ministro Geddel, enfrentar Paulo Souto, o PSDB, DEM, o PMDB vamos enfrentar e vamos ganhar porque temos força política, temos base social eleitoral na Bahia para isso. Agora se o ministro rompe com o governador ou vice-versa, se ele vai ficar no governo Lula como ministro isso depende do presidente e do PMDB. Pode ser que continue. Pode ser que não.
BN – Então, na sua opinião, é possível duas candidaturas da base do presidente Lula na Bahia?
JD – Pode acontecer isso em muitos estados, como já aconteceu várias vezes. Em Minas isso pode acontecer em 2010. Lógico que na Bahia não é o ideal, pela importância que tem o estado. Trabalho dia e noite para a manutenção da aliança e do entendimento entre o governador e o ministro, mas quero deixar claro que nós não temos medo não. Podem pensar que estamos tremendo nas pernas, e é bom não pensar isso. Pois já mostramos que temos militância forte.
BN – Tem lideranças no PMDB baiano que costumam dizer que o ministro Geddel não teria uma vaga garantida pelo PT na disputa ao Senado, o que acabaria atrapalhando um entendimento com o governador...
JD – Não é verdade. A vaga do ministro está garantida. Agora se o PT vai ter candidato ou apoiar o nome de outro partido para a outra vaga, isso tem de se discutir. É preciso analisar o que é melhor para reeleger Wagner governador e Geddel senador: ter o candidato do PMDB e do PT ou do PMDB e de outro partido da base aliada. Pois, do ponto de vista nacional, temos aliados na Bahia que são tão importantes como o PMDB, a exemplo do PSB, que é forte, por exemplo, em Pernambuco.
"Oposição é sempre oposição. É a mesma coisa. O problema é que eles estão sem bandeira, sem projeto, sem proposta para o pais"
BN – Mas os peemedebistas lembram que o PT é um partido cheio de tendências e que pode haver disputa pelo Senado, o que não garantiria esse cenário que o senhor está falando...
JD - Tem razão. Pode haver disputa sim. O PT, como todos os partidos, como o PCdoB, também tem disputa interna. O PMDB falar que o PT é um partido cheio de tendências é para rir. Isso é natural, faz parte da democracia dos partidos. Mas o esforço que vamos fazer é para que o PT faça aquilo que é melhor para reeleger o governador e manter o PMDB na aliança.
BN – O senhor durante muito tempo fez oposição ao governo federal, nos governos do PSDB, por exemplo. A oposição que é feita hoje ao presidente Lula no Congresso é menos dura do que a que o PT fazia no passado? Por isso o presidente navega num mar de grande popularidade?
JD – Oposição é sempre oposição. É a mesma coisa. O problema é que eles estão sem bandeira, sem projeto, sem proposta para o pais. Por exemplo, veio a crise e eles nem apresentaram nos estados onde governam propostas para combater a crise e ficaram perplexos. O presidente preparou o país e deu respostas imediatas para a crise, usando dinheiro das reservas, baixando impostos, atendendo setores específicos, viabilizando crédito para o exportador e empresas brasileiras que rolaram dívida no exterior, baixando a taxa Selic - que vai baixar, espero, mais 1,5% - mantendo os investimentos do PAC. Falta bandeira à oposição.
BN – Mas a oposição teve uma grande vitória recentemente com a derrubada da CPMF no Congresso.
JD – Sim, mas CPMF que agora vai nos faltar.
BN – Mas antes o governo vinha batendo recordes de arrecadação e ninguém poderia adivinhar que a crise viria...
JD – Mas já temos experiência suficiente para saber que a atividade econômica é incerta, insegura e imprevisível.
BN – O presidente errou ao dizer que a crise não passava de uma marola?
JD – Pode não ter sido a expressão correta, mas se você comparar a crise no Brasil com a crise em outros países do mundo, como o Japão, os países do leste europeu e do báltico, por exemplo, você nota que ela foi bem menor aqui. A crise nos EUA, na Espanha, no Reino Unido é muito mais forte que na América Latina e no Brasil. Como nossa economia é menos aberta, como temos um mercado interno forte, uma economia em crescimento, reservas, sistema bancário sólido, vamos ser menos afetados. E isso apesar da oposição ter, em algum momento, torcido pela crise. Hoje a oposição está mais no muro da lamentação do que no da solução para o país.
BN – Governos populistas e de esquerda como os da Venezuela e da Bolívia ameaçam a democracia na América Latina?
JD – Não, pelo contrário. Não tem nada mais democrático do que aconteceu com esses países.
BN – Mas na Venezuela Hugo Chávez ameaçou até prender adversários políticos em nome da nacionalização dos aeroportos e portos. Isso é democracia? Reeleição indefinida é democracia?
JD – A questão dos aeroportos e dos portos foi uma decisão legítima do Congresso venezuelano. E a oposição vai participar das eleições legislativas ano que vem e pode assumir até a maioria do Congresso. Claro que não concordo com a reeleição definitiva. Aqui no Brasil não concordamos com o terceiro mandato do presidente Lula, apesar de ser uma tese legítima e constitucional. Mas o referendo que deu a Chávez a possibilidade de continuar se reelegendo foi democrático e correto. Chávez foi o presidente que mais se submeteu às urnas sem ter os instrumentos econômicos e a mídia ao seu lado. Qualquer programa de culinária, e eu vi isso quando estive lá, passa a tarde dando pau no governo. Como pode uma coisa dessas? Isso é liberdade de imprensa? Enfim, tem coisas na Venezuela que são um caso a parte. Mas porque foi importante para a democracia essas vitórias da esquerda na América Latina? Primeiro porque elas resgataram os recursos naturais para os países. Esses países perderam o controle dos recursos naturais, que foram explorados e nada voltava para o país de origem. Hoje se investe mais em saúde, educação, infraestrutura, desenvolvimento tecnológico, combate à pobreza. Na Bolívia e no Equador, seus presidentes se submeteram a plebiscitos e foram eleitos vencendo os jornais, as TVs, que faziam oposição. É mais do que democracia. E na Argentina, Paraguai, Uruguai, Chile, Nicarágua há democracia hoje. Nada que acontece nesses países é comparável, por exemplo, com o controle da máquina pública e privada que o carlismo exerceu durante anos aqui na Bahia.
BN – Se o senhor fosse hoje ainda ministro da Casa Civil, seria o candidato natural à sucessão do presidente Lula em 2010?
JD – Talvez sim, talvez não. Primeiro eu precisaria ter o apoio do presidente. Segundo precisaria ter voto. O PT e o presidente tem voto, mas o candidato também tem que ter. A ministra Dilma pode não ter voto, mas não tem rejeição. Evidentemente que talvez eu estivesse entre os três ou quatro petistas que poderiam pleitear a sucessão. Nunca me passou pela cabeça isso pois eu estava mais preocupado com o governo e com a reeleição de Lula em 2006. Mas evidentemente que eu teria direito, credenciais e o PT me reconheceria.
BN – A ministra Dilma é hoje o melhor nome no PT para disputar a sucessão?
JD – Dos nomes que o PT tem hoje acredito que sim.
BN – Se o governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), estivesse no PMDB e ao lado do presidente Lula, ele seria um bom nome?
JD – Não seria porque o PT e o presidente Lula acreditam que o caminho é reeleger um petista na Presidência. Isso pela força do presidente, do peso político do PT e o sucesso deste governo. Mas quem governa Minas Gerais sempre pode pleitear a Presidência da República.
"Muitos me perguntam se eu vejo o presidente regularmente. Isso não acontece porque não sou mais ministro, deputado ou presidente do PT"
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