sexta-feira, abril 06, 2007




Carta a Danuza Leão



Cara Danuza:


Você diz em sua coluna de domingo (1) que está precisando só da opinião de Fernando Gabeira. Mas espero, humildemente, que você também leia a minha. Senão pelo compromisso jornalístico, por uma questão de civilidade. Começo lembrando que há algum tempo a Folha de S.Paulo publicou uma sugestiva carta de um leitor. ''Desculpe, mas acabou a minha capacidade de absorver só notícias negativas. A Folha há muito deixou de praticar um jornalismo investigativo e entrou firme no jornalismo denunciativo, que não leva a nada'', disse ele.


O leitor estava comunicando a perda da paciência com um determinado tipo de jornalismo. Ele não é o único. Nem a Folha de S.Paulo é a única publicação a colocar como prioridade de sua estratégia editorial a busca do pior em tudo. É um caso em que se aplica a grande frase de Eça de Queiroz: ou é má-fé cínica ou obtusidade córnea.


Esse tipo de política editorial dá cartaz, mas não consegue ocultar algo fundamental: poucas vezes um governo brasileiro teve a sorte de enfrentar inimigos tão desqualificados como os que enfrenta hoje. De fato, um dos trunfos mais poderosos de Lula é o tipo de gente que profere bravos discursos clamando por princípios e pureza, como ACM, Bornhausen, FHC...


Assim fica difícil! Munidos de um visto temporário para o mundo da ética, esses personagens só podem levar a opinião pública a uma conclusão: se eles estão contra o governo, este só pode estar certo. Disso decorre uma constatação que vale a pena anotar: a mídia é de fato golpista.


Outro exemplo é um entrevista concedida por Gabeira (PV-RJ) - já que você o elegeu como seu único interlocutor nesta questão - à Folha tempos atrás. A linhas tantas, o entrevistador, Josias de Souza, pergunta: ''Se (José) Dirceu fosse preso hoje, o senhor seqüestraria um embaixador americano para libertá-lo?''. Essa formulação pode ser definida como a síntese da mentalidade idiota que prevalece na maioria das redações.


Já Gabeira abusou do que se pode chamar de histrionismo. A gabolice de Gabeira lhe rendeu uma superexposição na mídia e foi elogiada até por colunistas sociais. Gabeira estava sendo conduzido ao picadeiro. O circo não podia parar. Como o deputado Roberto ''Dinamite'' Jefferson praticamente já havia cumprido seu papel, entrou em cena Gabeira e seus traques.


Com o clima de fim de festa instalado nas CPIs, puseram o travesso deputado para de vez em quando gritar: ''Lobo, lobo!''. Assim ele mantinha o aparato da direita mobilizado para combater qualquer indício de flagrante nas mal escondidas intenções contra o governo Lula.


O que se via na mídia era um panorama de ruínas. Os prognósticos mais tenebrosos eram atirados ao público de todas as formas possíveis - pela televisão, pelas rádios, pelos jornais, pelas revistas, pela internet. (Quem haverá, por exemplo, de esquecer as expressões faciais de pânico indignado de William Wack no Jornal da Globo?) Nesse ambiente que premia sistematicamente a indignação, pouco importando se ela se baseia ou não em fatos, tornou-se regra conferir respeitabilidade à opinião desinformada.


Outro exemplo é a carta de José Dirceu aos deputados. ''A mídia me julgou e me condenou no dia em que um deputado corrupto resolveu se vingar por eu ter negado qualquer proteção para livrá-lo do processo que viria'', escreveu Dirceu, referindo-se ao ex-deputado Roberto Jefferson. E conclui: ''Quando a mídia escolhe alguém para crucificar, justa ou injustamente, não há reputação que resista incólume''.


Até aí não há novidade: essa mídia serve para isso mesmo. Se alguém está contrariado com alguma decisão do poder público; insatisfeito com o resultado de alguma eleição, seleção, licitação ou critério para qualquer coisa definido por algum órgão de governo; disposto a azucrinar algum desafeto, apenas, esse alguém tem uma avenida aberta pela frente; munido de alguns argumentos - podem ser merecedores de consideração ou pura fanfarronada -, esse alguém pode exercitar suas manobras politiqueiras, barrar o prosseguimento de um processo legítimo que não o beneficiou, levantar suspeitas contra um administrador que não atendeu aos seus interesses ou apenas dar a sua colaboração para atulhar um pouco mais os tribunais do país. O caminho é este mesmo: recorra à mídia.


O que se passou no caso Dirceu mostra como é fácil, e isento de quaisquer ônus, atentar contra os fatos por interesses politiqueiros. Devoto daquilo que o cineasta Billy Wilder chamou de Big Carnival (grande carnaval) - filme que no Brasil recebeu o nome de A Montanha dos Sete Abutres e que retrata o caso de um repórter especialista na arte da trapaça -, o noticiário atingiu o auge das previsões tétricas. Nesse tipo de noticiário que culpa o governo por tudo, aparecem os que criticam o presidente da República, os revoltados com o socialismo, com o MST, com a MPB, bem como os insatisfeitos em geral, seja com o campeonato brasileiro de futebol ou com o atraso do trem, a acne juvenil, a aftosa e o bicho-do-pé. Ou seja: tudo é culpa do governo.


Esse comportamento não é, absolutamente, irrelevante, porque inclui a mentira. Trata-se de um noticiário - melhor seria dizer bagunçário - que cumpre papel bem definido no jogo político que se estabeleceu no país. Ele serve aos velhos coronéis, muitos deles modernos, que usam os meios de comunicação como arma principal na luta política. E isso tem um perverso efeito colateral: a corrosão do caráter do jornalista.


Um jovem que chegue a uma redação e seja confrontado com a realidade cotidiana de trapaças de variadas espécies para a obtenção de notícias - mentiras sobre a natureza da reportagem para conseguir entrevistas e gravadores escondidos para colher flagrantes, para ficar apenas em dois exemplos comuns - é rápida e inevitavelmente engolfado pela frouxidão dos valores. A conclusão é inescapável: por mais defeitos que tenha, por mais problemas por resolver que acumule, o governo brasileiro - incluindo Franklin Martins - é, hoje, infinitamente melhor do que a mídia.


Cordialmente,

Osvaldo Bertolino


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Danusa Leão fazia melhor papel quando era recepcionista da antiga Régine, boate do Meridien. Nos anos 70, o Brasil passando por uma grande crise, a elite branca decadente brasileira, com a Danusa de porteira de boate, vivia o esplendor mundano. Régine, uma francesa vazia, aplicou 3 milhões de dólares para abrir uma boate no Rio. E a Danusa lá. É dizem que ela tem saudades.
M V M <=> @News
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