sábado, março 11, 2006

Um tiro no pé

Ação da Via Campesina na Aracruz quis chamar a atenção da sociedade para impactos negativos das florestas artificiais. A causa é urgente e necessária, mas a ação foi um tiro no pé dos movimentos e de muita gente que luta contra o avanço destas florestas.
Marco Aurélio Weissheimer
PORTO ALEGRE - A ação da Via Campesina na madrugada de quarta-feira, no viveiro da empresa Aracruz, em Barra do Ribeiro (RS) foi um tiro no pé e prestou um desserviço aos movimentos ambientalistas que lutam contra a proliferação das florestas artificiais de eucalipto e também aos organizadores da II Conferência Internacional sobre Reforma Agrária e Desenvolvimento Rural. Isso tem de ser dito assim, em alto e bom tom.Representantes das agricultoras que participaram da ação disseram que o seu principal objetivo foi chamar a atenção da opinião pública sobre os efeitos ambientais e econômicos deste tipo de plantação. Fizeram isso da pior maneira possível. O debate sobre o impacto das florestas artificias não é de conhecimento da maioria da população. Não é preciso aguardar nenhuma pesquisa de opinião pública para saber que o bombardeio midiático que se seguiu à ação na Aracruz transformou a empresa e os defensores das florestas artificiais em vítimas.A proliferação dessas florestas artificiais no Brasil e os projetos para sua expansão no Rio Grande do Sul e no Uruguai (com o acréscimo de fábricas de celulose) representa um grave problema que deve ser discutido do modo mais amplo possível com a população. A história ensina que muitos desses projetos são assinados entre as grandes empresas do setor e governos sem debate sobre suas implicações com as comunidades envolvidas.A falta de informação e de debate costuma andar de mãos dadas com a rápida implementação destes projetos. A partir da ação na Aracruz esse silêncio foi rompido, só que a favor da empresa. Os grandes grupos de comunicação, que tem as empresas do setor entre seus patrocinadores, deitaram e rolaram em cima do episódio e vão deitar e rolar muito mais ainda. Neste quadro, parece razoável perguntar: qual é mesmo a capacidade comunicativa dos movimentos sociais para travar esse debate na sociedade?Mas há uma pergunta que precede esta. O que significa fazer essa disputa na sociedade? Significa, entre outras coisas, informar a população sobre um determinado problema e exercer a dura tarefa do convencimento. Convencimento de quem não está convencido, de preferência. O que se viu nas horas seguintes à ação na Aracruz, entre boa parte de quem está lutando contra a expansão das florestas artificiais, foi um ar de perplexidade e de constrangimento. Um constrangimento acompanhado pela convicção de que alguns passos para trás foram dados nesta disputa. Trata-se agora de fazer o debate necessário sobre os impactos negativos destas florestas em um ambiente político muito desfavorável. Ou não é assim?Mas os efeitos negativos não param por aí. No momento em que cresce o processo de criminalização dos movimentos sociais, realimentado diariamente pelos setores mais conservadores e reacionários do país, o que uma ação como esta vai causar? Em primeiro lugar, muito trabalho adicional para os advogados dos movimentos, que são poucos e trabalham em condições que não são exatamente ideais. Em segundo, a intensificação do bombardeio na mídia que, de um modo crescente, não hesita em associar os movimentos sociais ao terrorismo. Obviamente que isso deve ser combatido. Mas como é mesmo que se faz esse combate? Como é mesmo que se conversa com amplos setores da população?Outro problema: a ação foi realizada justamente no momento em que se realiza, em Porto Alegre, a II Conferência Internacional sobre Reforma Agrária e Desenvolvimento Rural, promovida pela FAO com apoio do governo brasileiro. A grande mídia já vinha ignorando solenemente os debates da conferência, de olho apenas no movimento dos movimentos, à espera justamente de uma ação como a que ocorreu na Aracruz, para colocar suas tropas em ação. Ganhou o presente que queria.Na noite de quarta-feira, o programa “Conversas Cruzadas”, da TV COM de Porto Alegre, do grupo RBS, convidou o governador em exercício do Rio Grande do Sul, Antonio Hohlfeldt, para discutir o episódio. Hohlfeldt e o apresentador Lasier Martins sapatearam e dançaram em cima do significado político da Conferência, do Ministério do Desenvolvimento Agrário e dos próprios movimentos sociais. Sem direito a nenhum contraponto e sem nenhuma sutileza. Aliás, os intervalos do programa traziam anúncios da Aracruz.Que resposta vai se dar a isto? Os organizadores da ação vão divulgar um manifesto na conferência, explicando os seus motivos e os efeitos negativos das florestas artificiais? Quem terá acesso a ele? Em sua maioria, aqueles que já estão convencidos. Ou os leitores de veículos como a "Carta Maior", a "Caros Amigos", o "Brasil de Fato", entre outros, que, em sua maioria, também já estão convencidos. E o restante da população, que tem pouca informação ou desconhece completamente o tema? Como se dialoga com ela? Ou não se dialoga?Na manhã de quinta-feira, o clima entre muitos participantes da Conferência de FAO era de constrangimento. Mas ninguém parece muito à vontade para falar publicamente o que está pensando. O silêncio, neste caso, é um péssimo conselheiro.Os movimentos sociais desempenham um papel fundamental na luta pela Reforma Agrária, por um novo modelo de desenvolvimento e pela democratização do Estado brasileiro. Mas não estão sozinhos nesta luta e nem são o centro do mundo. Há um trabalho educativo de convencimento a ser feito junto à população. Há diferenças e contradições entre quem está na linha de frente das lutas sociais e quem está trabalhando em governos, tentando fazer alguma coisa para melhorar o país. Cada um tem sua dinâmica própria, sua velocidade e seus limites. Tomar decisões isoladas, expondo ainda mais esses limites para a intensificação do ataque de adversários de projeto, não parece ser uma estratégia muito inteligente. Ou é?
Marco Aurélio Weissheimer é jornalista da Agência Carta Maior
http://agenciacartamaior.uol.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=2965&alterarHomeAtual=1

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Mulheres da Via Campesina ocupam fazenda da Aracruz
08/03/2006 Cerca de 2 mil mulheres da Via Campesina ocuparam na madrugada desta quarta-feira o hortoflorestal da Aracruz Celulose, em Barra do Ribeiro (RS). A mobilização tem o objetivo de denunciar as conseqüências sociais e ambientais do avanço da invasão do deserto verde criado pelo monocultivo de eucaliptos. A Fazenda Barba Negra concentra a principal unidade de produção de mudas de eucali pto e pínus da Aracruz, tendo inclusive um laboratório de clonagem de mudas.
"Somos contra os desertos verdes, as enormes plantações de eucalipto, acácia e pinus para celulose, que cobrem milhares de hectares no Brasil e na América Latina. Onde o deserto verde avança a biodiversidade é destruída, os solos deterioram, os rios secam, sem contar a enorme poluição gerada pelas fábricas de celulose que contaminam o ar, as águas e ameaçam a saúde humana", afirmam as mulheres em manifesto da Via Campesina.
A Aracruz Celulose é a empresa que possui o maior deserto verde no País. São mais de 250 mil hectares plantados em terras próprias, 50 mil só no Rio Grande do Sul. Suas fábricas produzem 2,4 milhões de toneladas de celulose branqueada por ano, gerando contaminação no ar e na água, além e prejudicar a saúde humana.
As mulheres da Via Campesina também protestam em solidariedade aos povos indígenas que tiveram suas terras invadidas pela Aracruz Celulos e no Estado do Espírito Santo. Em janeiro deste ano, as famílias indígenas foram expulsar violentamente pela Polícia Federal, que utilizou máquinas da própria empresa para fazer o despejo.
A Aracruz é a empresa do agronegócio que mais recebeu dinheiro público. São quase R$ 2 bilhões recebidos nos últimos 3 anos. No entanto, uma empresa como a Aracruz gera apenas um emprego a cada 185 hectares plantados, enquanto a pequena propriedade gera um emprego por hectare. "Se o deserto verde continuar crescendo em breve vai faltar água para bebermos e terra para produzir alimentos. Não conseguimos entender como um governo que quer acabar com a fome patrocina o deserto verde ao invés de investir na Reforma Agrária e na Agricultura Camponesa", afirma o manifesto.
A mobilização da Via Campesina também ocorre para denunciar os impactos ambientais da monocultura de eucalipto, que está avançando no Rio Grande do Sul com três grandes empresas: a Votorantim, a Stora Enso e a Aracruz. Os desertos de eucalipto desgastam o solo e consomem muita água: cada pé de eucalipto é capaz de consumir 30 litros de água por dia.
A mobilização das mulheres da Via Campesina marca o Dia Internacional da Mulher. "Neste 8 de março, nos solidarizamos com as mulheres camponesas e com as trabalhadoras urbanas de todo o mundo, que sofrem com as várias formas de violência impostas por esta sociedade capitalista e patriarcal", conclui o texto.

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Marcha Mundial das Mulheres se solidariza com camponesas
09/03/2006 Quando é preciso gritarNós, da Marcha Mundial das Mulheres, que organizamos manifestações em todo Brasil, reafirmamos: o 8 de março, Dia Internacional da Mulher, é dia de luta. E toda forma de luta dos movimentos sociais vale a pena. Nossas companheiras da Via Campesina têm todo nosso apoio e compromisso nas ações contra o agronegócio da morte. A expansão do eucalipto e da acácia transforma o território brasileiro em um deserto verde. Estas empresas vendem a ilusão do progresso e de que qualquer pesquisa é favorável à humanidade. No entanto, o que recebemos é o Brasil subordinado à tirania do mercado internacional. E o agronegócio de exportação, baseado no uso intensivo de recursos naturais e na superexploração do trabalho. Dizemos não à tudo isto. Queremos a que a organização da economia e da sociedade tenha no centro o bem-estar e a felicidade das pessoas e não o lucro de poucos. Queremos emprego com direito a salário digno. Queremos terra para quem nela trabalha. Queremos as sementes e a biodiversidade como patrimônio dos povos e à serviço da humanidade. Não aceitamos a criminalização dos movimentos sociais. Toda solidariedade às mulheres camponesas. Transformar o mundo para transformar a vida das mulheres.
Coordenação Executiva da Marcha Mundial das Mulheres

Carta O Berro.
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Miguel Rossetto diz que ação na Aracruz é inaceitável
Para ministro do Desenvolvimento Agrário, “é inaceitável substituir o argumento pela destruição violenta e a troca de idéias pela intolerância”.
Redação - Carta Maior
PORTO ALEGRE - O ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, afirmou na manhã desta quinta-feira (9), em nota official, que os acontecimentos na empresa Aracruz, no município de Barra do Ribeiro (RS), são inaceitáveis e ferem a consciência democrática de todos os brasileiros. Na madrugada de quarta-feira, agricultoras ligadas à Via Campesina destruíram um viveiro de mudas de eucalipto e um laboratório de pesquisa. A nota de Rossetto distribuída à imprensa afirma:“Condeno e lamento os fatos ocorridos na madrugada da última quarta-feira, na empresa Aracruz, em Barra do Ribeiro (RS). As imagens que o país assistiu mostram cenas de inaceitável violência e ferem a consciência democrática de todos os brasileiros. É inaceitável substituir o argumento pela destruição violenta e a troca de idéias pela intolerância”.“Episódios deste tipo em nada contribuem para um debate sério e conseqüente a respeito do modelo de desenvolvimento rural que queremos para nosso país. Atos como este devem ter suas conseqüências tratadas com rigor no âmbito do Poder Judiciário”.“A luta pela Reforma Agrária no Brasil nada tem a ver com ações desta natureza e não deve ser confundida com atos isolados. A Reforma Agrária a que todos aspiramos – massiva e de qualidade – se desenvolve dentro do mais amplo espírito democrático”.

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