Às vésperas de declarar-se candidato oficial do PSDB ao governo de São Paulo, o prefeito José Serra tornou-se protagonista de uma polêmica judicial.
Condenado junto com outras autoridades a restituir aos cofres públicos R$ 200 milhões por conta de supostos prejuízos provocados por uma medida adotada durante o governo FHC, o prefeito é, junto com os ex-ministros Pedro Malan e Pedro Parente, estrela de um processo que tramita no STF. Busca-se anular a condenação. A causa é antiga. Tramita pelos escaninhos do Judiciário desde 2002. Naquele ano, a 20ª Vara Federal de Brasília considerou procedente uma denúncia do Ministério Público contra Serra, Malan e Parente. Os três foram condenados, junto com outras autoridades, a ressarcir o erário por terem autorizado o pagamento, com recursos públicos, de prejuízos dos correntistas que tinham dinheiro em bancos que sofreram intervenção em 1995. A operação estava vinculada ao Proer, o programa de reestruturação do sistema financeiro. A sentença é de 11 de abril de 2002. Serra, Malan e Parente foram alcançados porque integravam, na época da decisão considerada lesiva ao Tesouro, o CMN (Conselho Monetário Nacional. O conselho autorizou o governo a financiar o pagamento de até R$ 5.000,00 aos correntistas das instituições que sofreram intervenção em 95 _os bancos Econômico S.A, Mercantil S.A. e Comercial de São Paulo S.A. O Ministério Público Federal considerou que a medida foi ilegal. Sustentou na ação que havia uma "vedação constitucional para aporte de recursos oriundos de reserva monetária (...) sem prévia autorização” do Senado Federal. Os responsáveis foram enquadrados na lei que pune os crimes de improbidade administrativa. Aproveitando-se de uma decisão do STF que cancelara uma outra condenação que havia sido imposta ao também ex-ministro de FHC Ronaldo Sardenberg pelo uso de jatinhos da Força Aérea em viagens de turismo, os advogados de Malan foram ao Supremo. Pediram ao tribunal que avocasse o processo, anulando as decisões do juízo de primeira instância. O recurso foi distribuído por sorteio ao ministro Gilmar Mendes, que ocupara o posto de Advogado-Geral da União na época em que Serra, Malan e Parente eram ministros de FHC. Invocando a liminar que beneficiara Sardenberg, proferida pelo ministro Nelson Jobim, também ele um ex-auxiliar de FHC –ocupara a pasta da Justiça-, Gilmar Mendes pôs por terra a condenação contra os ex-colegas. A tese de Jobim, aproveitada por Mendes, é a de que a lei de improbidade, invocada para condenar Sardenberg, Serra, Malan e Parente, não pode ser aplicada contra "agentes políticos". Todos eles só poderiam ser julgados por "crime de responsabilidade". O que lhes garantiria o chamado foro privilegiado -presidentes da República, ministros, senadores e deputados federais só poderiam ser processados no STF; governadores, no STJ; deputados estaduais, prefeitos e vereadores, nos Tribunais de Justiça. A prevalecer esse entendimento, conforme noticiado aqui em janeiro, podem ser anulados mais de 10 mil ações e inquéritos abertos contra gestores públicos pela prática de improbidade administrativa. A polêmica volta à baila agora, para infortúnio do candidato Serra, porque Gilmar Mendes incluiu o processo na pauta de julgamentos do STF. Significa dizer que a liminar concedida por Mendes em favor dos ex-ministros de FHC pode ser submetida aos demais juízes do Supremo a qualquer momento.
Em 2002, Serra pediu que caso corresse em segredo
Logo que foram condenados em primeira instância a ressarcir o erário em R$ 200 milhões, os ex-ministros de FHC contrataram escritórios privados de advocacia para defendê-los. No caso de Serra, que disputava com Lula a presidência da República em 2002, época em que a sentença condenatória foi divulgada, um dos pedidos feitos pelos advogados foi para que o caso tramitasse em segredo de Justiça, para evitar explorações indevidas contra o candidato. "O importante no processo é que ficou provado que os acusados não tiveram comportamento imoral, tirando proveito próprio do fato. Eles agiram no interesse público", disse na época o advogado Marco Antonio Meneghetti, defensor de José Serra. "O que existe é uma discussão doutrinária: o governo deveria ou não garantir as contas dos poupadores (dos bancos sob intervenção) até determinado valor?". "O próprio STF já decidiu que o Proer foi constitucional, uma reação necessária diante da ameaça de uma crise sistêmica", afirmou o advogado Arnold Wald, contratado por Pedro Malan. Segundo Wald, os valores financiados aos correntistas teriam sido devolvidos ao Banco Central antes mesmo que ação de improbidade movida pelo Ministério Público começasse a tramitar.
Blog do Josias de Souza (30/03/06)