SEG, 13/10/2014 - 05:17
ATUALIZADO EM 13/10/2014 - 05:17
Por Tereza Cruvinel
A colaboração premiada foi instituída no Brasil para
facilitar à Justiça a obtenção de provas na investigação de crimes e
organizações criminosas. Mas sem apresentar provas, dois corruptos confessos e
um juiz de primeira instância, que autorizou a gravação e divulgação de seus
depoimentos, podem decidir a eleição presidencial. A alternância no poder é
salutar para a democracia mas não pela criação de fatos destinados a afetar o
resultado eleitoral.
Há uma sincronia entre as investigações das irregularidades
na Petrobrás e a eleição presidencial em curso, que lembra a sintonia entre o
julgamento dos réus do mensalão pelo STF e as eleições municipais de
2012. O acordo de delação premiada com Paulo Roberto Costa e Alberto
Youssef foi firmado antes do primeiro turno mas os depoimentos foram
programados para acontecerem logo depois. O Juiz e os procuradores
que o conduzem sabem o que estão fazendo.
E tanto sabem que recomendaram aos réus que, nos depoimentos
gravados para serem divulgados, não mencionassem o nome de nenhuma autoridade
com mandato eletivo. Se isso acontecesse, por força do foro privilegiado, o
processo subiria imediatamente para a esfera do STF. E ali o presidente
já não é Joaquim Barbosa, mas Ricardo Lewandowski, que não transigiria com as
formalidades legais e rituais, evitando que os procedimentos judiciais
ganhassem conotação eleitoral, a favor ou contra qualquer força política.
Por isso Costa e Youssef falaram tanto em “agentes políticos” quando se
referiam a figuras do PT, PP e PMDB que teriam relação com o esquema. Não se
furtaram, porém, a mencionar três diretores da Petrobrás e o tesoureiro do PT,
Vacari Neto, que não tendo mandatos, não forçam a mudança do processo para a
instância superior. Os outros implicados serão citados mas eles podem ficar
para depois. O alvo agora é o PT e a reeleição de Dilma Rousseff. E para isso,
é bom que o processo continue na primeira instância.
A delação somente deve render vantagens aos delatores se as
informações por eles fornecidas forem provadas e realmente contribuírem para o
esclarecimento dos fatos. Youssef e Costa não apresentaram provas do que
disseram mas jogaram uma bomba de alta potência sobre a campanha eleitoral.
Embora a figura da delação seja considerada um avanço pelo meio jurídico em
geral, há críticas à sua adoção e principalmente, à frágil regulamentação de
sua aplicação.
O presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa,
Augusto de Arruda Botelho, em artigo hoje na Folha de São Paulo, pede o fim do
instituto, alegando que os réus são submetidos a “um sombrio e triste percurso”
até optarem pela delação: prisões ilegais, depoimentos coercitivos, torturas
psicológicas e ameaças a parentes, entre outros recursos utilizados para
quebrar a moral dos investigados. Este é um ponto de vista relacionado
com a garantia democrática do direito de defesa.
Mas é também relevante o impacto das divulgação das delações
premiadas – antes de provadas – sobre os processos sociais, entre eles o
eleitoral. A Lei 12.850/2013 estabelece que as informações
obtidas através da colaboração premiada (este é o verdadeiro nome da coisa, na
lei), não bastam para incriminar terceiros. Essa é uma cautela para evitar que
o premiado invente informações contra outros para se beneficiar. A lei
teve esta preocupação com as supostas vitimas individuais dos delatores mas não
considerou o impacto das denúncias sobre o coletivo e a vida social, nela
incluído o processo eleitoral, questões de segurança ou mesmo de política
externa.
Seu aprimoramento exigirá, em algum momento, que se regule
melhor a questão da divulgação dos depoimentos, levando em conta o direito de
terceiros e as circunstanciais sociais. No caso presente, o candidato de
oposição, que chegou ao segundo turno por sua própria força junto a parcela
expressiva do eleitorado, dispensa a colaboração de fatos que podem tisnar a
pureza do processo eleitoral.