segunda-feira, setembro 02, 2019

Lula, do cárcere, diz ao mundo que está de volta ao jogo


O fogo devora a Amazônia. Bolsonaro já é alvo da indignação mundial
27/8/2019, Pepe Escobar,
Asia Times (do Brasil)

O Brasil sempre foi terra de superlativos. Mesmo assim, nada que supere a perversa configuração de hoje: um estadista de dimensão global está no cárcere, e um miliciano bandido apalhaçado, cujas manias e perversões são declaradas ameaça a todo o planeta... está na presidência.

Em entrevista exclusiva, que durou duas horas, muito abrangente, realizada numa sala do prédio da Polícia Federal em Curitiba, sul do Brasil, o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva expôs à opinião pública planetária os próprios argumentos a favor de sua inocência na saga da chamada ‘operação lava-jato’, dita contra a corrupção, e inocência hoje já confirmada por
vazamentos bombásticos publicados por The Intercept. Além disso, o ex-presidente também se reposicionou para retomar o status que sempre foi dele, de líder político global. Deve acontecer sem demora – e depende de uma decisão a ser tomada pelo Supremo Tribunal Federal do Brasil, tribunal para o qual a Justiça não é exatamente cega.

A entrevista foi solicitada há cinco meses. Lula falou aos jornalistas Mauro Lopes, Paulo Moreira Leite e eu, representando, os três, o website Brasil247 e eu, Asia Times. Na 5a-feira passada, imediatamente depois da entrevista, foi publicada
uma primeira versão, com apenas uma câmera focada em Lula. Está sendo preparada uma edição integral editada e legendada em inglês, para distribuição no final da semana à opinião pública global.

Imagem: Pepe Escobar, colunista de Asia Times (primeiro à esquerda, com manta), encontra-se com Lula na prisão. Foto: Editora Brasil 247

Lula é a encarnação da máxima de Nietzsche: o que não mata fortalece. Em excelente forma (corre na esteira pelo menos duas horas por dia), atento e agudo, com muito tempo para ler (acabava de ler um ensaio sobre Alexander von Humboldt), exibiu o fôlego amplo que é sua marca registrada, alcance e conhecimento amplo de inúmeras questões – às vezes expostas como se fossem partes de uma narrativa de realismo fantástico à Garcia Marquez.

O ex-presidente vive numa cela de 3mx4m, sem grades, com a porta aberta, mas com dois policiais federais de plantão no corredor; sem acesso a internet ou TV a cabo. Um dos seus auxiliares entrega-lhe diariamente um pen drive carregado com noticiário político e parte com miríade de mensagens e cartas.

A entrevista é ainda mais espantosa, se posta no contexto incendiário (literalmente) da política brasileira atual – que flerta ativamente com uma forma híbrida de semiditadura. Ao mesmo tempo em que Lula fala de temas essencialmente importantes, e claramente vai recuperando a própria voz, mesmo dentro de uma prisão federal, o atual presidente Jair Bolsonaro se pôs, ele mesmo, como alvo da indignação global, visto em praticamente todos os quadrantes do planeta, como ameaça à humanidade, que tem de ser contida.

Mapa (AFP): “Dia do Fogo”


Tudo tem a ver com o Dia do Fogo

Corte direto para o G7 em Biarritz: no máximo, trata-se de palco secundário, reunião de esquina, em que o ocidente suposto liberal chafurda na própria impotência. Sem a presença dos líderes do Sul Global, o G7-Biarritz não tem como lidar com as mais graves questões globais do momento.

E isso nos leva à questão literalmente candente dos incêndios na Floresta Amazônica. Na entrevista, Lula foi diretamente ao ponto, ao apontar a responsabilidade total de eleitores de Bolsonaro.

O G7 só fez ecoar as palavras de Lula.

O presidente da França Emmanuel Macron disse que ONGs e vários atores jurídicos, ao longo de anos, têm levantado a questão de se definir o status internacional da Amazônia – exatamente o que as políticas de Bolsonaro, só elas, já lançaram para o topo da agenda global.

A oferta do G7, de um pacote de ajuda imediata de $20 milhões para ajudar as nações amazônicas a combater os incêndios florestais, e na sequência lançar uma iniciativa global para proteger a floresta gigante equivale a uma gota de chuva.

[Depois de esse artigo estar escrito, o Brasil rejeitou a oferta dos países do G7. Um alto funcionário disse ao presidente Macron da França, na 2ª-feira, que ele que cuidasse “da própria casa e de suas colônias” – como noticiou a AFP. “Talvez esses recursos sejam mais úteis para reflorestar a Europa” – disse Onyx Lorenzoni, chefe do gabinete de Bolsonaro, ao portal de notícias G1. “Macron não consegue evitar nem um incêndio previsível numa igreja que é Patrimônio da Humanidade. O que está querendo ensinar a nosso país?” Referia-se ao incêndio, em abril, que devastou a Catedral de Notre-Dame. “O Brasil é país livre e democrático, que jamais recorreu a práticas colonialistas e imperialistas, como talvez seja o objetivo do francês Macron” – disse Lorenzoni (Nota dos Editores)].

Imagem: O incêndio arde sem controle e avança sobre uma fazenda em Nova Santa Helena, no norte do estado de Mato Grosso, na área sul da bacia amazônica no Brasil, dia 23/8/2019. Foto: Joao Laet / AFP

Significativamente, o presidente Donald Trump dos EUA sequer compareceu à sessão do G7 que discutiu mudança climática, ataques contra a biodiversidade e os oceanos – e o desflorestamento da Amazônia. Não surpreende que Paris tenha simplesmente desistido de emitir declaração conjunta ao final da reunião.

Na entrevista que nos concedeu, o ex-presidente Lula lembrou o papel importante que o Brasil desempenhou COP-15 (Conferência das Partes*) na reunião de cúpula sobre mudança climática em Copenhagen em 2009. E contou sobre o desenrolar das negociações, e sua intervenção para defender a China contra acusações que lhe faziam os EUA, de que seria o país que mais poluiria o planeta.

Naquela ocasião, Lula disse: “Não é preciso derrubar sequer uma árvore na Amazônia para plantar soja ou criar gado. Se alguém está fazendo isso, é crime – e crime também contra a economia brasileira.”

Previa-se que a COP-15 promoveria as metas fixadas pelo Protocolo de Kyoto, que expirariam em 2010. Mas a reunião fracassou, depois que EUA – e União Europeia – recusaram-se a elevar as metas de redução nas emissões de CO2, culpando atores do Sul Global, por essa alegada impossibilidade.

Em agudo contraste com Lula, o projeto de Bolsonaro resume-se à destruição nada criativa de patrimônio brasileiro, como a Amazônia, sacrificado aos interesses que Bolsonaro representa.

Agora, o clã Bolsonaro pôs-se a culpar o Gabinete de Segurança Institucional, GSI, do próprio governo deles, comandado pelo general Augusto Heleno – que teria errado ao avaliar o escopo e a gravidade dos atuais incêndios que estão devorando a Amazônia.

Heleno, por falar deles, manifestou-se publicamente a favor de sentença de prisão perpétua para Lula.

Imagem: Protestos em Curitiba, Brasil, dia 23/8/2019, contra os incêndios na Amazônia, e imagens dos que o povo identifica como culpados: o presidente Trump dos EUA e o presidente Bolsonaro do Brasil. Foto: Henry Milleo / dpa

Mesmo assim, essa não é a história completa – mesmo que Bolsonaro, pessoalmente, insista em culpar “ONGs” pelos incêndios.

A história real confirma o que Lula disse na entrevista. Dia 10 de agosto, um grupo de 70 ricos proprietários de terras, todos eleitores de Bolsonaro, organizaram, num grupo de WhatsApp, um “Dia do Fogo” na região de Altamira, no grande estado do Pará.

Trata-se precisamente da região onde estão a maioria dos incêndios florestais no Brasil – infestada por agressivos empresários do agronegócio, devotados a desflorestamento massivo, selvagem; investiram na ocupação da terra e numa guerra sem quartel contra camponeses sem-terra e pequenos produtores agrícolas. O “Dia do Fogo” foi concebido como movimento de apoio ao impulso dos Bolsonaros para pôr fim a todos os controles e monitoramentos oficiais e anular multas impostas a um dos “Bs” do lobby BBB (Boi, Bala, Bíblia).

Lula deu sinal de que se mantém muito bem informado: “Basta examinar aquelas fotos de satélite, identificar o proprietário da terra onde aparece cada incêndio e intimá-lo, para que informe quem está ateando fogo à floresta. O proprietário que não procurar a Polícia para denunciar incêndios criminosos em suas terras é responsável pelos incêndios.”

Pé na estrada, com o Papa

É possível que esteja ativada no Brasil uma estratégia viciosa, pós-verdade, de guerra híbrida. Dois dias depois da entrevista de Lula, aconteceu em Brasília uma fatídica paella, na residência oficial do vice-presidente, quando Bolsonaro reuniu-se com todos os mais altos generais, inclusive o vice-presidente Hamilton Mourão. Analistas independentes consideram seriamente, como hipótese de trabalho, que esteja em preparação um processo de ‘liquidação’ do Brasil, que se serviria das preocupações globais em torno da Amazônia, com toda a negociata escondida sob o véu de retórica nacionalista fake.

Combinaria perfeitamente com o padrão já em curso, de vender a principal e bem-sucedida empresa de aviação estatal, Embraer; de privatizar grandes blocos das reservas de petróleo do pré-sal; e de alugar aos EUA a base de lançamento de satélites de Alcântara. A soberania do Brasil sobre a Amazônia oscila perigosamente sobre o cadafalso.

Considerando a riqueza de informações que se encontra na entrevista de Lula, para nem falar da narrativa detalhada de como funcionam realmente os bastidores do poder, Asia Times publicará colunas específicas mostrando o Papa Francisco, os BRICS, Bush e Obama, o Irã, a ONU e a governança global. Foi a primeira entrevista de Lula, do período em que está no cárcere, na qual se sentiu suficientemente relaxado, para mergulhar em eventos das relações internacionais.

O que se viu muito claramente é que Lula é o único fator possível de estabilidade para o Brasil. Ele está pronto, tem agenda clara, não só para o Brasil, mas para o mundo. Disse que tão logo deixe a prisão, meterá o pé na estrada – e gastará muitas e muitas milhas por avião: quer embarcar, ao lado do Papa Francisco, numa campanha global contra a fome, contra a destruição neoliberal e contra a ascensão do neofascismo.

Agora, comparem esse autêntico estadista global no cárcere, e um bandido incendiário que rasteja em seu pessoal labirinto.*******

* “Conferência das Partes” é o corpo que toma decisões, da United Nations Framework Convention on Climate Change, UNFCCC [NTs].

Lula: grupo BRICS foi criado como instrumento de ataque



29/8/2019, Pepe Escobar,
Asia Times [de Curitiba, Brasil]

Em entrevista exclusiva, de amplo alcance, com mais de duas horas de duração, realizada numa sala de prisão em Curitiba no sul do Brasil, o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva do Brasil reemergiu depois de mais de 500 dias de cárcere, e enviou mensagem clara ao mundo.

No atual frenesi midiático, 24 horas por dia, sete dias por semana, de mentiras altissonantes e notícias forjadas [ing. fake news], é virtualmente impossível encontrar qualquer chefe de Estado atual ou anterior, em qualquer lugar do mundo, sentado para entrevista com jornalistas e que deseje, do fundo da alma, comentar todos os atuais desenvolvimentos políticos e conte, prazerosamente, histórias dos corredores do poder. Menos ainda, ainda em situação de prisioneiro.

Uma primeira parte dessa minissérie focou a Amazônia. Aqui, focamos as relações do Brasil com o grupo BRICS e Pequim. BRICS é a sigla que designa o grupo das principais economias emergentes – Brasil, Rússia, Índia e China – que se formou em 2006 e a partir de 2010 inclui em suas reuniões anuais também a África do Sul.

Minha primeira pergunta a Lula foi sobre o grupo BRICS e o atual tabuleiro de xadrez geopolítico, com EUA posta diante de uma parceria estratégica Rússia-China. Como presidente, de 2003 a 2010, Lula foi importante para formar os BRICS e expandir a influência do grupo – claro contraste com o que faz o atual presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, que parece convencido de que a China seria uma ameaça.

Lula destacou que o Brasil deveria ter-se aproximado da China, num processo especular do que se construiu entre Rússia e China: “Quando houve uma reunião dos BRICS aqui no Brasil, no estado do Ceará, eu disse à companheira Dilma [Rousseff, ex-presidenta do Brasil] que nós devíamos organizar um pacto semelhante ao pacto Rússia-China. Um grande pacto, que desse aos chineses parte do que eles queriam, a saber, a capacidade do Brasil para produzir alimentos e energia, e também a capacidade de acesso ao conhecimento tecnológico. O Brasil precisava de muita infraestrutura. Precisávamos de trens de alta velocidade, muitas coisas. No final, não aconteceu.”

Lula definiu suas top prioridades ao apoiar a criação dos BRICS: autonomia econômica e congregar um grupo de nações capazes de ajudar o que o “Consenso de Washington” descreve como Países menos Desenvolvidos [ing. LDCs, Least Developed Countries].

E enfatizou: “O grupo BRICS não foi criado para ser instrumento de defesa, mas para ser instrumento de ataque. Para que pudéssemos criar nossa própria moeda e sermos independentes do EUA-dólar nas nossas relações comerciais; para criar um banco de desenvolvimento, o que fizemos – mas ainda é tímidos demais; para criar algo forte, capaz de ajudar o desenvolvimento das partes mais pobres do mundo.”


Imagem: Ex-presidente Lula do Brasil fala de uma sala numa prisão, no sul do Brasil. Foto: Editora Brasil 247

Lula fez explícita referências aos medos que uma nova moeda inspiravam aos EUA: “Essa era a lógica por trás dos BRICS, fazer algo diferente, não copiar fosse quem fosse. Os EUA ficaram com muito medo quando eu discuti uma nova moeda, e Obama telefonou para mim, e perguntou ‘Você está tentando criar uma nova moeda, um novo euro?’ Respondi ‘Não. Só estou tentando me livrar do EUA-dólar. Só estou tentando deixar de ser dependente.”

Fácil imaginar como Washington engoliu essa.

Obama talvez estivesse tentando avisar Lula de que o ‘Estado Profundo’ dos EUA jamais permitiria que os BRICS investissem num moeda, ou cesta de moedas para escapar do EUA-dólar. Adiante, Vladimir Putin e Erdogan alertaram a presidenta Dilma – antes de ela sofrer o impeachment – de que o Brasil seria atacado sem piedade. No fim, a liderança do Partido dos Trabalhadores foi apanhada completamente despreparada para uma conjunção de complexas técnicas de guerra híbrida.

Uma das maiores economias do mundo foi ocupada por neoliberais de linha duríssima, praticamente sem luta e sem oferecer qualquer resistência. Na entrevista, Lula confirmou essa visão: “Temos de examinar os pontos em que erramos.”

Lula também manifestou algum desapontamento pessoal. Esperava muito mais dos BRICS. “Imaginei BRICS mais agressivos, mais proativos e mais criativos. ‘O império soviético fracassou; criemos um império democrático.’ Acho que tivemos alguns avanços, mas avançamos lentamente. Hoje, os BRICS deveríamos ser muito mais fortes.”

Lula, Obama e China

É fácil imaginar como o que veio depois foi digerido em Pequim. Explica-se assim em grande parte o imenso respeito que a liderança chinesa dedica a Lula. Também é relevante para o debate global em curso sobre o que está acontecendo na Amazônia. Deixemos que o próprio Lula conte a história, em seu estilo inimitável, com ecos de Garcia Márquez.

“Uma coisa que os chineses devem recordar, é que houve muita gente zangada, quando reconheci a China como economia de mercado. Muitos amigos meus foram contra. Mas eu insisti, ‘Não. Quero os chineses na mesa de negociação, não fora dela. Há discordâncias? Ponham os chineses na OMC, vamos legalizar tudo.’ Sei que Hu Jintao [presidente da China] gostou muito.”

“Outra coisa que fizemos com a China foi a COP-15 [Conferência das Partes*] em Copenhagen, em 2009. Deixe-me contar algo: cheguei à COP-15 e havia uma lista de pedidos de audiência. Todo mundo queria falar comigo – Angela Merkel, Sarkozy, Gordon Brown; Obama já telefonara duas vezes. – E eu não entendia por quê. Não entendia por que eu seria tão importante. O que queria de mim, aquela gente? Queriam que o Brasil concordasse, na COP-15, que a China seria o principal demônio poluidor do planeta. Sarkozy veio falar comigo, com uma linha de montagem cinematográfica, 30 câmeras, um show completo: Lula acusando a China. Tivemos várias reuniões e eu disse a todos ‘Olha, eu sei que a China está poluindo. Mas quem pagará pela poluição histórica, séculos de poluição que vocês poluíram, antes de a China poluir? Onde está a comissão de estudos históricos, para analisar a industrialização da Inglaterra?’’

“Então, aconteceu uma coisa fantástica. Não havia acordo à vista, e eu queria que Sarkozy conversasse com Ahmadinejad – adiante falarei sobre o Irã [falou, adiante, na entrevista]. Ahmadinejad não apareceu no jantar que marcamos, e portanto não houve reunião. Discutimos, discutimos, até que eu disse ao Celso [Amorim, Ministro de Relações Exteriores do Brasil], ‘Celso, olhe aqui, temos um problema. Essa reunião vai acabar sem acordo, e eles vão culpar Brasil, China, Índia, Rússia. Temos de achar uma solução’. Propus então que o Celso telefonasse aos chineses e acertasse uma reunião paralela. Lá estavam Brasil, China, Índia e acho que África do Sul. A Rússia, me parece, não estava.

“Nessa reunião, imagine a nossa surpresa quando Hillary Clinton ‘descobre’ que estávamos lá, e tenta invadir a reunião. Os chineses a impediram de entrar. Todos aqueles chineses nervosos atrás da porta, e eis que aparece Obama. Obama também queria entrar. Os chineses também o impediram de entrar. A China estava representada ali por Jiabao [Wen Jiabao, primeiro-ministro].

Imagem: Lula e o presidente Barack Obama dos EUA, à esq., em reunião com chineses e outros líderes em Copenhagen, dezembro de 2009, na COP15, da Conferência da ONU para mudança climática. AFP / Jewel Samad

“Afinal, permitimos que Obama entrasse. Obama entrou e disse ‘Vou sentar perto do meu amigo Lula, para não ser atacado aqui.’ Sentou ao meu lado e começou a falar sobre o acordo. Dissemos a ele que não havia acordo algum. Um dos negociadores chineses estava tão furioso com a presença de Obama, que nem sentou, falava em pé, em mandarim, ninguém entendia coisa alguma, ele pediu um tradutor, Jiabao não permitiu. A impressão que se tinha, dos gestos que ele fazia, era que ele gritava palavrões contra Obama, falava muito agressivamente, de dedo em riste. Obama comentou ‘Esse está bravo’.” A embaixadora do Brasil disse que falava alguma coisa de mandarim e contou que o homem gritava palavrões pesados.

“O fato é que nessa reunião acumulamos enorme credibilidade, porque nos recusamos a culpar os chineses. Lembro uma sessão plenária, na qual estava previsto que Sarkozy, Obama e eu falássemos. Eu seria o último a falar. Quando cheguei, vi que não havia nada preparado para eu dizer, nem uma linha anotada, nada. Disse a um dos meus assessores, por favor, saia e prepare alguns itens para que eu me oriente. Mal ele saiu, fui chamado para falar: haviam invertido a pauta. Fiquei muito nervoso. Mas fiz um bom discurso. Fui aplaudido de pé. Sei-lá que tipo de coisa eu disse a eles [risos]. Depois foi a vez de Obama, que absolutamente não tinha o que dizer. E o público distraiu-se e começou aquele zum-zum, de gente conversando na plateia: pouca gente deu atenção a Obama. E com Sarkozy, na sequência, a mesma coisa.

“Mas naquele dia falei sobre o papel do Brasil na questão ambiental. Vou pedir que alguém do Partido dos Trabalhadores localize aquele discurso e mande para vocês. Agora, só se ouvem vozes que comparam as políticas do meu governo e de Bolsonaro. Não se pode aceitar essa coisa de que ONGs estariam incendiando a Amazônia. Quem está queimando a Amazônia são eleitores de Bolsonaro, empresários, criminosos locais, gente interessada em matar índios, gente que sempre quer matar os mais pobres.”*******

* Conferência das Partes” é o corpo que toma decisões, da United Nations Framework Convention on Climate Change, UNFCCC [NTs].