terça-feira, maio 23, 2006

COMO SE CONSTROÉM OS DISCURSOS DE VERDADE?


A CUT na rua em SP

Na medida em que os embates se acirram, como nas velhas fórmulas clássicas, me parece cada vez mais fácil identificar o que vai por trás dos discursos contra o governo Lula, revestido de um discurso que se constrói consensualmente na sociedade hoje, de combate à corrupção.

Estes discursos são todos discursos que atualizam o liberalismo clássico: a concepção do Estado como um organismo que paira acima dos interesses de classes, acima das tensões vivas e constantes que se travam no dia a dia das cidades e, sobretudo, o Estado como o organismo que garante o bem (estar, a segurança, a saúde, a educação) de todos.

Impressionante como esses discursos, sejam feitos pela direita, sejam feitos pelos auto intitulados de esquerda, se afirma, em qualquer uma das perspectivas que se queira tomá-los, a partir dessa matriz de pensamento liberal.

Senão, como explicar que todos os discursos que se produzem hoje na sociedade contra o governo Lula partam do mesmo ponto: de um absoluto desconhecimento, de que nunca tinham ouvido falar como esse Estado era cortado pela corrupção?

O que vemos, na boca dos inúmeros jornalistas e todos os seus derivados (apresentadores de programas, articulistas, cientistas sociais) etc., é um discurso dissimulado, fomentado num espanto que, espanando os ombros, pergunta: quem botou esse bicho aqui? De onde veio (oh) toda essa corrupção?

Nem um pouco diferente é o discurso que grassa hoje as universidades públicas. Ao contrário. Além de expressar espanto (sempre aquele mesmo de, quem colocou esse bicho aqui?) frente ao caráter corrupto do estado, essa esquerda intelectualóide vai além, e acusa Lula e o PT pela corrupção.

Assim é que, por traz da cada discurso produzido por nossos ‘jornalista-cientista social’ sobre a corrupção do estado, tem também um ‘cientista social-jornalista’ para afirmar que quem acabou de colocar toda essa corrupção neste Estado, foi Lula e o foi o PT; justificado pelo despreparo do governo , pelos seus erros históricos, pelo campo majoritário, seja lá pelo o que for, para esses, a corrupção que assola o país é fruto, não dos séculos de dominação: a escravidão, a colonização, as inúmeras ditaduras que se produziram ao longo da história do Brasil, e que sempre massacraram os trabalhadores, a multidão. Não. O que vemos acontecer no Estado hoje é fruto da ocupação deste estado, pelo Lula, ou seja, todos os problemas que estão aparecendo no nosso Estado hoje o assolaram quando a corja, o bando do Lula (a CUT e o PT) assaltou o Estado.

E é assim que esses intelectuais ‘marxistas’ junto com os meios de comunicação se tornam os mais ferozes opositores do governo Lula. E melhor ainda, em nome do povo e dos seus interesses!

Como é clássico tudo isso que nos acontece que chega a causar até um certo enfado!.
Noventa por cento da população brasileira partilha hoje vinte e cinco por cento da produção e os outros setenta e cinco por cento da riqueza produzida socialmente ficam concentrados nas mãos dos dez por cento restantes.

Não é, me parece assim, com esses dados, tão difícil identificar o que se esconde por sob o discurso de defesa do povo que embasou nosso processo de industrialização, que embasou, um após o outro, os modelos de dominação da burguesia e seus interesses.
Será tão difícil descobrir, a partir das características produzidas pelo nosso modelo de desenvolvimento, a quem esse estado tem servido ao longo dos anos?

Mas ao contrário, é justamente no momento em que as lutas e os enfrentamentos que produzimos consegue alçar um de nossos representantes a presidente da república que a intelectualidade brasileira (e suas figuras públicas) se embate de forma ainda mais acirrada, com o mesmo ódio de classe que a burguesia manifesta, contra o governo Lula , chegando alguns inclusive a afirmarem que o governo Lula é o pior governo que nossa história já teve.

É aqui que nossa porca torce o rabo, por que certamente há uma verdade nessa afirmação. E, como nos diz Zizek, o discurso ideológico mais eficiente é o discurso da verdade.
O governo Lula pode mesmo ser o pior governo da história. Só que, o que esses discursos escondem é o para quem o governo Lula é o pior governo que existe?

Por trás de um discurso de defesa dos interesses da nação e do povo, (e contra o governo Lula) produzido pela direita ou pela esquerda (o que importa?) o que se escondem são justamente os diferentes interesses, tensões e lutas sociais das relações capitalistas. O que Marx chamou da luta de classes. Pois é, pasmem, o que nossos marxistas de plantão excluem das suas análises, são, simplesmente, as lutas de classe. (muitos, muitos e muitos risos)
Olha nossa porquinha com o rabo bem, bem, torcidinho.

Pois, o que não se revela, para além do que tem de verdade nesse discurso, é o que ele tem de ideológico: é que o governo Lula é o pior governo que a história já teve para esses setores da sociedade, mas para outros (a maioria dos trabalhadores, da multidão) o governo Lula é, sem dúvida nenhuma, o maior avanço que a nossa história já produziu.

Qualquer governo que nasça da história de lutas dos trabalhadores é melhor do que qualquer governo que nasça da história da burguesia, ceifada por domínios conseguidos a base da subjugação e extermínios de culturas e populações inteiras, de roubos, de opressão e de violência jorrando por tudo que é lado.

Ao contrário, o governo Lula nasce das nossas lutas de resistências, nasce daqueles que, para se libertarem da opressão, precisaram ao longo da história inventar, criar estratégias, criar o novo. Para quem a multiplicidade, as diferenças, o plural é a potência de quem produz a vida no seu dia a dia.

O governo Lula inverteu a prioridade de interesses e a deslocou – pela primeira vez na nossa história - para o interesse da grande maioria da população: os trabalhadores médios, os informalizados, os desempregados, os favelados, os negros, os pobres!

Como é fácil produzir um discurso de que as políticas sociais públicas não servem pra nada. De que os programas sociais do governo Lula são assistencialistas ou a economia neoliberal, para aqueles (como os nossos intelectualóides) que moram em zonas bem urbanizadas, sem problema de água ou esgoto, que não dependem do transporte público, para quem tem garantia da vaga pro filho numa universidade pública (eles mesmos produzem os critérios de seletividade que eles mesmos podem atender). De quem só usa o sistema de saúde privado, de quem tem acesso às novidades da tecnologia em suas versões mais atualizadas, assim como à produção cultural e científica universal, etc.

Como é fácil, para esses, produzirem um discurso de que o governo Lula não serve.
Só esquecem de dizer é para quem o governo Lula não serve. E, igualmente, para quem o governo Lula representa um avanço inestimável na nossa história.

Impressionante como esses pseudo- intelectuais (ou melhor dizer intelectuais orgânicos da burguesia?) reproduzem com facilidade e eloquência o discurso das elites desse país.
“A CUT está aparelhada pelo governo Lula! Os movimentos sociais estão aparelhados pelo governo Lula! Mas, não se preocupe história, que nós, os detentores da moral e da verdade, estamos de prontidão para salvá-la. Vamos lutar contra o governo Lula até o fim.”
Tão bestialmente revolucionários, dispostos a darem a própria vida pela revolução!!!

A vida, que fique bem claro. Estão dispostos a darem à vida (e se sacrificarem nos seus projetos pessoais e, em nome do povo, virem até na chapa da Heloisa Helena). Mas partilhar, por exemplo, com aquele bando de pobres e negros a sua universidade, o espaço dos seus filhos na universidade, ai não. Ai já é pedir demais.

Entender que a história caminha por conta própria, que as lutas sociais imprimem sempre matizes novas as cores da nossa realidade isso eles não vão entender nunca.

Por que, o que tem por traz desse discurso de 'esquerda', o que essa classe média de pseudos intelectuais escondem é um profundo desprezo por qualquer coisa que não seja do seu próprio interesse.

Por isso que ela se coloca hoje, de forma muitas vezes feroz, contra qualquer ação que dificulte os seus pequenos interesses, que dificulte a ela consumir os códigos do seu pequeno mundinho.
Essa classe média luta com afinco pelos seus interesses, ao preço de cumpliciar (estar ao lado, de mãos bem dadinhas) com a burguesia centenária (e agora globalizada) que sempre governou esse país.

A principal arma usada hoje para a conservação da ordem social, que é contra toda e qualquer mudança que mexa de alguma forma com os interesses de qualquer um dos setores dominantes, é essa verdade que eles produzem.

É assim que seu discurso preconceituoso e conservador se reveste de uma camada cientifica – intelectual que justifica, por exemplo, serem contrários a política de cotas do governo Lula que pode (finalmente e efetivamente) começar a possibilitar aos negros-pobres (pobres de tão pretos/ pretos de tão pobres) a fazerem parte da produção acadêmica e que, diferente do que eles dizem, não abaixaria o nível dessa produção e sim a enriqueceria imensamente.

Faz me rir essa pretensão da classe média de achar que o seu saber é melhor, mais qualificado do que o da potência de luta dos trabalhadores. Coitada! Se não consegue ter como projeto de vida nada além de um dia ser como a burguesia e frequentar iates em Angra dos Reis e posar pra Playboy.

A classe média achar que suas produções estéticas (artes, música, intelectual, afetiva, comportamental) são mais significativas do que a daquela produzida pela multidão é só mais outro indício da sua mediocridade. Mediocridade de quem sempre apoiou, ao longo da história, as ditaduras como o golpe de estado de Getulio Vargas e o golpe militar de 64.

Repito o que li dia desses: o que pensar de uma população que tem como auge da sua afetividade as relações com os animais?

Assim é que os interesses da classe média não se coadunam com os interesses do governo Lula, não apenas por uma questão ideológica, ou melhor, essa questão ideológica tem bases bem fincadas na distribuição de renda.

Quem melhor do que a classe média soube, historicamente, se beneficiar de forma bastante rendosa do caráter corruptivo do Estado brasileiro?

Quem mais senão a classe média burlou esse estado no seu dia a dia usando os sistemas públicos de serviços do Estado através da sua rede de influência?
Como a formiga no pires, esses intelectuais acham que esse seu pequeno mundo é o próprio mundo.

O problema social para a classe média é um quadro do fantástico. A classe média só vê a 'questão social' (mas adora classificá-la) quando ela aparece na boca da Regina Case ou quando ela mesma é 'vitima' de alguma violência, ai que ela descobre que talvez alguma coisa tenha saído errado.
Assim é que eles revestem a defesa dos seus interesses em um discurso de que são contra o governo Lula por ser um governo pouco radical: um governo que repete a política neoliberal do FHC, que não rompe com o FMI, que isso, e que aquilo.

Quanta baboseira diante de um cenário em que tanto se tem a fazer e a avançar!!!!
Mas, pra sorte da história, o povo, a multidão, aqueles trabalhadores que foram sistematicamente excluídos dos espaços onde a riqueza material circula, mas que também foram os protagonistas das lutas das últimas décadas, são os que podem e têm apresentado alternativas novas pra história.

O governo Lula é a expressão disso.
O governo Lula é a possibilidade de superarmos a crise de representação deste Estado burguês e começarmos a criar uma nova democracia.

A multidão é a expressão das novas formas de produzir com novas formas de governar: nova forma de gestar o público, o comum, o que é de todos, que sem dúvida alguma está muito distante dos interesses da classe média ou das pequenas ou das grandes elites.
A campanha eleitoral do Lula será, sem duvida, um momento de acirramento, de embates, de lutas.

E devemos estar preparados e mais do que nunca atentos: o inimigo se espreita em qualquer fresta, em qualquer fala, em qualquer prática. Abaixo essa intelectualidade idiota, abaixo essa classe média imbecil!

E viva a revolução da multidão!!!!!!!!

Abraços carinhosos
Elisa
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UAU! Precisamos MUITO desses guerrilheiros consistentes, cá na blogosfera lulista!
Bem-vinda, companheira!

Estamos atentos, carentes de discursos assim consistentes e claros.

Temos de pegar isso, ler, ler, ler, ler até que esses conteúdos se incorporem a nós -- como se incorporaram em nós a lingüística de classe, a sociologia de classe, a economia de classe dos nossos cursos 'de academia' de classe. No Brasil, além de serem saberes de academia-de-classe, são também saberes DE COLONIZAÇÃO, para colonizar.

Os novos saberes se construirão assim, na multidão, para a multidão, contra os saberes da colonialidade.

A-do-rei!

8-) Caia

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