sexta-feira, outubro 14, 2011

Mafalda viva e única

CULTURA — POR DESACATO.INFO EM 13 OCTOBER 2011 ÀS 8:33 PM


Por Moisés Pérez Mok. *
Buenos Aires.- Quase meio século após sua estreia, Mafalda constata hoje que o passar dos anos está muito longe de significar o fim das preocupações e, menos ainda, a solução a problemas urgentes.
Risonha e impertubável, a pequena protagonista de quadrinhos criada pelo argentino Joaquín Salvador Lavado (Quino), observa agora o mundo desde seu banco de praça, de ferro e madeira, na esquina das ruas Defesa e Chile, a escassos metros da antiga casa de seu criador.
Ali permanece sentada com sua bata cor verde limão, desde há mais de dois anos, quando o Programa Portas do Bicentenário do Governo da Cidade de Buenos Aires decidiu homenagear a seu pai intelectual com uma estátua de sua mais conhecida criação.
A só uns passos, no edifício localizado na rua Chile 371, onde Quino deu vida também às restantes personagens do grupo (seus pais, Guille, Manolito, Liberdade, Felipe, e Susanita,) uma placa lembra os que passam: “Aqui viveu Mafalda”.
Hoje, a escultura de 80 centímetros de altura, realizada pelo artista Pablo Irrgang em resina e fibra de vidro reforçada, constitui um dos lugares mais fotografados não só do velho bairro San Telmo, senão de toda esta cidade, cujo bairro Colegiales tem também uma Praça Mafalda.
Esta última foi inaugurada em 28 de novembro de 1994 depois que quatro artistas plásticos pintaram em bancos e brinquedos desse espaço público fragmentos dos quadrinhos que refletem toda a sabedoria da Mafalda, para muitos o ícone do pensamento inconformado da América Latina.
A surpreendente vigência da Mafalda
Em uma entrevista com a revista Viva, Quino admitiu “nem eu mesmo sei” por que a vigência de Mafalda. Talvez -disse- porque muitas das coisas que ela questionava continuam sem resolver; disso não resta dúvidas.
Além disso, porque muitos dos acontecimentos e comentários que desde seu primeiro aparecimento público, em 29 de setembro de 1964, até a segunda metade do ano 1973 -quando deixou de se publicar- puseram na boca da menina as inquietudes sociais e políticas de sua época.
Uma vez, relatou o criador, perguntaram-me se não pensava em ressuscitá-la. “E ressuscitá-la significaria que está morta, quando ninguém dúvida que está bem viva, felizmente”.
Segundo as próprias palavras de Quino, Mafalda é para ele tão única como tentar viver de novo a alegria daquela época que costuma trazer à memória as canções dos Beatles, cujas gravações escuta “mais por nostalgia que por inspiração”.
Em 1988, a inteligente menina esteve a ponto de converter-se no primeiro -e seguramente único- personagem de quadrinhos a ser declarada Cidadã Ilustre desta cidade, mas uma trava legal fez com que a proposta fracassasse. Entre outras coisas, argumentava-se que:
Mafalda segue sendo na memória coletiva dos argentinos a menina que pergunta, a questionadora, irreverente, e inesperada, que propôs tantas interrogantes incômodas e nos fez refletir sobre a validez dos hábitos, crenças, preconceitos e lugares comuns, ajudando deste modo a construir uma sociedade melhor.