Mauro Santayana
Em discurso recente
no Senado, Pedro Simon advertiu contra o perigo de que o crime organizado se
aposse das instituições do Estado. Até o caso Cachoeira, disse o parlamentar
gaúcho, havia sido comprovada a corrupção de setores da burocracia dos
governos, mas não a da estrutura do Estado.
O governador Marconi Perillo se esquivou, com habilidade,
das questões mais graves, em seu depoimento na CPMI. Registre-se que ele se
encontrava mais do que tranqüilo, mesmo respondendo às indagações precisas do
relator, até que chegou a vez do deputado Miro Teixeira. O experiente homem
público, mesmo tendo como ponto de partida o caso menor, que é o da venda da
casa de Perillo, deixou, na argúcia de suas perguntas, graves suspeitas.
Como pôde o governador receber o dinheiro de uma empresa e
passar a escritura a um particular? Também ficou claro a quem ouviu o
governador ser difícil que ele ignorasse as atividades ilícitas do apontado
contraventor; ele conhecia, com intimidade, a sua vida empresarial, social e
familiar.
O caso Cachoeira – e a advertência de Pedro Simon é
importante – mostra como a nação está acossada por um inimigo interno
insidioso, que é o crime organizado. Os recursos públicos são desviados para
alimentar um estado clandestino, que está deixando de ser paralelo, para
constituir o núcleo do poder, em alguns municípios, em muitos estados e na
própria União. Essa erosão interna da nacionalidade brasileira, que se
assemelha a uma gangrena, coincide com o cerco internacional contra o nosso
país.
Enquanto parte da opinião nacional acompanha, indignada, as
revelações do esquema Cachoeira, articula-se eixo internacional entre os
Estados Unidos, a Espanha e todos os países da Costa do Pacífico, com a exceção
do Equador e da Nicarágua, contra o nosso povo, mediante a Aliança do Pacífico.
Não há qualquer dissimulação.
Como informa a publicação Tal Cual, da oposição venezuelana,
o foro funciona ativamente e já celebrou seis reuniões de alto nível. “Os
quatro países signatários da nova Aliança do Pacífico – revela a publicação –
têm, todos eles, governos de centro ou centro-direita, crêem no capitalismo,
são amigos dos Estados Unidos, e favorecem os tratados de livre comércio e o
princípio do livre-comércio em geral. Une-os sobretudo um temor comum e impulso
defensivo frente à ascendente potência hegemônica ou neo-imperial que é o
Brasil”. E termina: “sentimo-nos satisfeitos e aliviados pelo surgimento do
muro de contenção à expansão brasileira, que é a Aliança do Pacífico”.
Assim, os Estados Unidos cuidam de retomar a sua influência
e presença militar na América Latina. Nesse sentido, procuram valer-se da
Aliança do Pacífico para estabelecer bases militares cercando o Brasil, da
Colômbia ao sul do Chile. Leon Paneta, o Secretário de Defesa dos Estados
Unidos, acaba de acertar com o presidente do Chile, Sebastián Piñera, o
estabelecimento de uma base norte-americana em Fuerte Aguayo, nas proximidades
de Valparaíso. Entre outras missões dos militares americanos está a de treinar
os carabineiros chilenos, a fim de coibir manifestações populares. Há, ao mesmo
tempo, uma orquestração da imprensa e dos meios políticos e empresariais, a fim
de reabilitar a figura do ditador Pinochet.
Os Estados Unidos, que mantêm uma base no Chaco paraguaio, quiseram
também ocupar o aeroporto de Resistência, na província argentina do Chaco, e o
governador Capitanich assentiu, mas o governo de Cristina Kirchner vetou o
acordo.
A participação da Espanha nesse novo cerco ao Brasil é
evidente. Em Madri, os embaixadores dos quatro paises maiores envolvidos
(México, Colômbia, Peru e Chile) se reuniram, para defender a nova aliança, e
coube ao embaixador do Chile, Sergio Romero, ser bem explícito. Ao afirmar que
o bloco não nasce contra o Brasil, nem contra o Mercosul, aclara, no entanto,
que o grupo recebe de braços abertos os investimentos europeus, especialmente
da Espanha e dos Estados Unidos - que poderiam formalmente participar da
Aliança.
Limpemos os nossos olhos, vejamos os perigos que ameaçam
diretamente a nossa sobrevivência como nação independente, nas vésperas do
segundo centenário do Grito do Ipiranga. Não temos que ficar abrindo mais
divisões internas, e devemos nos unir para enfrentar, ao mesmo tempo, o inimigo
interno, que é o crime organizado e suas teias nas instituições do Estado, e os
inimigos externos.
Esses, sempre que estivemos avançando no desenvolvimento
social e econômico, procuraram quebrar as nossas pernas, contando com traidores
brasileiros. Não é preciso recuar muito no passado. Basta lembrar o cerco
contra Vargas, em 1954, a tentativa de golpe de 1955, repetida em 1961 e, por
fim, o golpe de 1964, com as conseqüências conhecidas. Registre-se que, apesar
da vinculação com os Estados Unidos, durante o governo Castelo Branco, e a
famosa doutrina das “fronteiras ideológicas”, vigente durante o governo Médici,
a partir de Geisel os militares brasileiros não mantiveram a mesma
subserviência diante de Washington.
Enfim, espera-se que o Itamaraty mantenha o governo da Sra.
Dilma Roussef a par dessas manobras anti-brasileiras, comandadas a partir de
Madri e de Washington, e que a CPMI vá até o fundo, nas investigações em curso.
Elas não devem parar nas imediações de Anápolis, mas chegar a todo o Brasil,
conforme os indícios surjam. É bom conhecer a verdade do passado, mediante a
Comissão formada para isso. E se faz também necessário conhecer a verdade do
presente, e impedir que o crime tome conta das instituições nacionais, como
está ocorrendo no México de Calderón.
E não nos devemos esquecer que o sistema financeiro mundial
é também uma forma – superior e mais poderosa – de crime organizado. E muito
bem organizado.
Postado por Mauro Santayana