O RESGATE ESPANHOL E O BRASIL
Embora o Primeiro-Ministro Mariano Rajoy e líderes do PP - o
partido que está no poder – façam de tudo para tentar tapar o sol com a
peneira, o fato é que o “resgate”, aprovado no fim de semana, ficará na
história como uma intervenção branca da Comissão Européia na economia
espanhola, a fim de evitar a quebra do país.
O dinheiro aprovado pela Troika (Comissão Européia, Banco
Central Europeu e Fundo Monetário Internacional), de 100 bilhões de euros,
servirá para que, mais uma vez, se socializem os prejuízos para preservar os
lucros privados, ou, em última instância, garantir, por mais algumas semanas ou
meses, a sobrevivência de empresas que se confundem com a história recente do
país, e que , se tivessem que sobreviver sem ajuda, em um ambiente de
concorrência justa, já estariam definitivamente quebradas.
É como se, de repente, o governo brasileiro pedisse
emprestado, em pleno sábado, 10% do PIB, ou, no nosso caso, 260 bilhões de
dólares emprestados , só para cobrir o buraco de meia dúzia de bancos,
aumentando, na mesma proporção, a dívida nacional, já que o responsável pelo
pagamento do empréstimo será o próprio estado espanhol, que, para isso, fará
novos cortes na educação, na saúde, na segurança, nas aposentadorias, nos
investimentos. Isso, em um país no qual centenas de famílias, a cada dia são despejadas
de seus lares, por não terem dinheiro para pagar a prestação da casa própria ,
pelos mesmos bancos “resgatados” no fim de semana.
O Brasil de hoje não é a Espanha, embora muitos brasileiros
ainda insistam em achar que os “desenvolvidos” são eles. Temos 375 bilhões de
dólares em reservas internacionais contra 35 bilhões de euros em reservas
espanholas. Uma dívida externa de 13% do PIB, contra 165% da Espanha. Uma
dívida interna líquida de 36% do PIB contra 80% (até dezembro) da Espanha, e
isso sem nunca termos recebido, durante anos, bilhões de euros em ajuda da
União Européia. Ou ter tido acesso a crédito farto e barato, a juros
infinitamente menores aos cobrados aqui, na mesma época. Com esse dinheiro,
adquiriram, na bacia das almas, com a cumplicidade de conhecidos entreguistas
brasileiros, alguns de nossos maiores bancos e empresas, nos anos 90. E, se
tiverem que sair do Brasil, depois de remeter para suas matrizes, durante anos,
fabulosos lucros, os "capitais" "espanhóis" serão
imediatamente substituídos por outros, como os chineses, como já está
acontecendo.
Convertidos, de uma hora para a outra, - com sua entrada na
Comunidade Européia e a transformação de suas pesetas em euros - em “europeus”
e novos “ricos”, muitos espanhóis acreditaram, nos últimos anos, no mito da
“marca Espanha”, vendido, em papel dourado, pela imprensa espanhola e os
sucessivos governos que ocuparam o Palácio de la Moncloa.
Aznar recusou-se a entrar para o G-20, quando podia, porque
achava que o lugar da Espanha era o G-8. Zapatero proclamava aos quatro ventos
a condição da Espanha de “oitava potência econômica do mundo” e disse que o
país já tinha conquistado, de pleno direito, seu lugar na “Champions League” da
economia mundial. E todos, inclusive Mariano Rajoy, sempre apregoaram, baseados
principalmente no marketing do BBVA e do Santander, seus bancos como os mais
sólidos do mundo, quando na verdade, como se vê agora, o sistema financeiro
espanhol apresenta – inclusive pela ausência de uma regulação e de uma
fiscalização fortes - mais furos do que um queijo suíço.
Há dois dias, a Fitch rebaixou para BBB-, a um ponto do grau
de especulação, os títulos da Repsol. E passou para negativas as perspectivas
da Telefónica espanhola, que teve sua nota rebaixada também pela Moody,s e pela
Standard & Poors. E ameaçou rebaixar de novo a nota do Santander, que já
havia tido sua nota rebaixada em maio, apesar da venda de ativos como 51% de
sua filial na Colômbia e de boatos de que estaria querendo vender também parte
de sua filial no Brasil. Outras empresas também tiveram suas notas rebaixadas
por agências de risco internacionais e a taxa de risco da Espanha voltou a
passar dos 500 pontos, apesar do socorro aos bancos de 100 bilhões de euros
que, afinal de contas, é equivalente aos capitais no valor também de
aproximadamente 100 bilhões de euros que deixaram o país nos primeiros meses do
ano.
No Brasil, no entanto, embora muitas empresas espanholas que
atuam em nosso país estejam sendo diretamente afetadas pela crise, muita gente
- como se estivéssemos na Terra e Madrid e Barcelona em outro planeta – prefere
fingir que, nesse contexto, não existe nada de importante ocorrendo.
Encorajadas por essa atitude, as empresas espanholas que
aqui operam fazem o mesmo. Mesmo com a crise roendo suas canelas, insistem em
nos tratar como se fossemos um bando de otários que só pensa em praia, pandeiro
e futebol.
Devendo mais de 57 bilhões de euros – é absurdo que marcas
estrangeiras patrocinem selecionados esportivos oficiais brasileiros em
apresentações no exterior - a Telefónica, controladora da Vivo, vai associar,
pela bagatela de 15 milhões de dólares, sua marca às seleções brasileiras de
futebol até 2015.
Só do BNDES, a Vivo pegou 3 bilhões de reais emprestados no
ano passado . O Santander, que - pasmem - patrocina a Copa Libertadores da
América, cujo nome homenageia quem derrotou as tropas espanholas em nosso
continente, acaba de lançar uma campanha no Youtube. A campanha usa Pelé como
garoto propaganda, para descobrir quem “mais entende de futebol na América
Latina”. Vejam o link:
Postado por Mauro Santayana