publicado em 22 de junho de 2012 às
17:50
por Rodrigo Vianna,
em Escrevinhador
Em 1917, quando a Revolução explodiu
na Rússia, os marxistas encontraram uma explicação rápida para o fato de o
movimento comunista não ter surgido com mais força nos países centrais do
Capitalismo (como se depreendia que deveria ocorrer, pelas teorias de Marx): a
terra do Czar era “o elo mais fraco da cadeia”.
Nos anos 60, de certa forma, foi isso
também o que levou Guevara a fazer guerrilha na Bolívia, em busca de outros
vietnãs mundo afora. O país andino era um Estado (aparentemente) fragilizado,
sem a força de uma burguesia brasileira ou argentina, sem a coesão política de
Colômbia e Venezuela. Além disso, o povo boliviano tinha tradição de luta – como
já se fizera notar nos anos 50 do século XX. Guevara terminou cercado e morto,
porque o “frágil” Estado boliviano teve apoio dos EUA no combate ao foco
guerrilheiro. Não funcionou na Bolívia a idéia do “elo mais
fraco”.
Mas a direita parece ter aprendido
com isso.
Frente ao movimento contínuo de
governos à esquerda, eleitos nos últimos 15 anos na América do Sul, e mesmo na
América Central, os setores conservadores (com apoio aparente dos seviços de
inteligência dos EUA) passaram a atuar para derrubar, justamente, os “elos mais
fracos”.
Fizeram isso depois de perceber que
atacar Chavez – como se tentou em 2002 – poderia gerar uma reação ainda mais
perigosa no Continente. Primeiro, atuaram em Honduras. Lá, um presidente de
origem conservadora, virara aliado tardio da esquerda bolivariana. Mas faltava
coesão e mobilização social à base de apoio de Zalaya. A direita deu o golpe,
com aparência de legalidade. O presidente foi tirado de pijama de casa, e
deportado. Os EUA prontamente “reconheceram” o novo governo. E Honduras entrou
depois numa espiral de violência, em que o Estado foi retomado pelas forças mais
conservadoras.
Agora, o “elo mais fraco” é o
Paraguai. Lugo chegou ao poder sem maioria no Congresso (alô rapaziada que
torce o nariz para as alianças de Lula e Dilma; sem aliança, Lula teria virado
um Lugo em 2005), desgastou-se pessoalmente com escândalos sexuais. E a base
social de seu governo – apesar de ter algum peso – parece ser a mais fraca do
subcontinente, na comparação com Argentina, Venezuela, Equador, Bolívia, Brasil
e Uruguai.
Há alguns anos, pessoas da minha
família que moram em Assunção já haviam relatado o estranhamento geral no
Paraguai com o tal EPP (uma guerrilha “misteriosa”, surgida em províncias de
tradição agrária e que passou a atuar e espalhar o ‘terror” entre fazendeiros,
justamente no governo Lugo). A mídia paraguaia tenta associar o EPP aos
movimentos sociais históricos, que deram e dão apoio a Lugo. Cria-se assim uma
gelatina confusa de “subversão” e ameaça à propriedade. Lugo seria associado a
essa gelatina, essa é a base para o golpe parlamentar em
curso.
Lugo é acusado – especificamente – de
inação pelo confronto entre militantes sem-terra e a polícia, há poucos dias.
Houve várias mortes. O confronto, registrado em imagens ricas e abundantemente
distribuídas mundo afora, pode não ter sido “armado”. Não tenho provas para
afirmar coisa parecida. Mas não me cheira bem. Sabemos que a CIA segue a atuar.
O Wikileaks revela como opera a rede de informações (com apoio na mídia,
inclusive brasileira, que tenta revereter a “onda vermelha” na américa do Sul).
É fato que, à direita paraguaia, interessava sobremaneira ter um ou vários
cadáveres à mão – para colocar na conta de Lugo. Como se o presidente, e não a
histórica concentração de terras no país vizinho, fosse o cupado pelos
confrontos agrários e a instabilidade no campo.
Um ex-bispo, acusado ao mesmo tempo
de subversão e de traição ao princípio católico do celibato, parece ser o “elo
mais fraco” perfeito para uma direita acuada na América do
Sul.
O libelo acusatório contra Lugo é uma
piada, parece escrito pelo professor Hariovaldo. Mas na Venezuela, em 2002, os
discursos dos golpistas também pareciam uma piada. E, se não fosse a reação
popular, Chavez estaria exilado ou morto.
Resta saber se Lugo terá a grandeza
e a firmeza de Chavez. E mais que isso: se contará com apoio popular efetivo
para reverter o golpe “hondurenho” desfechado pelo Parlamento. Apoio diplomático
ele tem. A UNASUL está com Lugo. Mas Zelaya também teve todo esse apoio. E
perdeu.
Do outro lado há o peso histórico da
direita, que dialoga diretamente com Washington, na tentativa de iniciar a
reversão da onda vermelha na América do Sul.
O Paraguai será o elo mais fraco a se
romper? Ou a direita morrerá cercada no Parlamento – feito Guevara no interior
boliviano? É a história que se escreverá nas ruas de Assunção e no interior do
país vizinho.