Autor:
Luis
Nassif
Atualizado às
18:10
No Sirio, em tratamento, Lula soube que seu
arquiinimigo, Roberto Civita, também estava internado, câncer na próstata, só
que em situação bem mais grave. Assim que foi informado, decidiu visitá-lo,
apesar da resistência de dona Marisa.
Desceram ao apartamento de Roberto Civita
acompanhado do oncologista de Lula, Roberto Kalil. Civita se emocionou com a
visita e pediu desculpas pelos ataques a Lula e ao filho. Lula lhe disse para
não se emocionar muito para não atrapalhar o tratamento.
Kalil viu sinais de ironia no alerta de
Lula. Quem o conhece, viu a solidariedade para com o próximo.
A visita foi para a pessoa de Roberto
Civita. Mas em nada mudou o julgamento de Lula sobre o publisher Roberto
Civita.
Desdobramentos
Algumas deduções e desdobramentos da
notícia acima.
Ganha consistência o rumor de que João
Roberto Marinho esteve na Casa Civil do governo Dilma, solicitando o empenho do
governo para a não convocação de Roberto Civita pela CPI, devido à doença. Da
Abril ele seria a única pessoa a poder responder pelos movimentos da Veja nos
últimos anos. Nenhum executivo - com exceção de Fábio Barbosa - tem acesso às
instâncias mais altas da República.
A notícia do agravamento da doença, além
disso, lança nuvens de suspeita sobre o futuro da editora. Os herdeiros não
demonstram pique para segurar o timão. Analista do mercado - com quem acabo de
conversar agora - julga que se encerra o ciclo Civita na mídia brasileira, sem
conseguir chegar até a terceira geração. Não significa o fim da Abril, mas, a
médio prazo, dos Civita à frente do grupo.
Roberto recebeu uma editora sólida do pai e
teve oportunidades de criar um império. A influência da mídia sobre o governo
Sarney permitiu-lhe conquistar uma rede de TV a cabo, a TVA. Depois, com a BOL,
foi o primeiro grupo de mídia a tentar explorar as possibilidades da
Internet.
Na segunda metade dos anos 90, junto com
Otávio Frias de Oliveira, tentou adquirir a Rede Bandeirantes. Na época, fiz uma
espécie de meio campo entre ele, Frias e João Saad.
Gradativamente, o grupo foi fracassando em
todas as frentes. A BOL acabou fundindo-se com a UOL - da Folha. Mais à frente,
Civita foi engolido por Luiz Frias que, na primeira capitalização do grupo,
adquiriu a participação da Abril. De um lado, Civita tentava reduzir o
endividamento. De outro, julgava que na hora em que quisesse, o conteúdo do
grupo permitiria montar uma nova UOL. Perdeu o bonde.
Mais tarde, também para reduzir a dívida,
vendeu a TVA para o grupo Telefonica, matando sua última oportunidade de virar
um grupo multimidia.
Finalmente, houve um processo de
capitalização em que o sul-africano Nasper adquiriu 30% da Abril. Outros 20%
ficaram com duas holdings de Delaware, cujo controle nunca foi revelado. Quando
vendeu a TVA, provavelmente a Abril recomprou os 20%
adicionais.
Alguns anos atrás, a Abril lançou a toalha
do lado midiático. Civita passou a investir em educação, montando cursos
apostilados e adquirindo editoras de livros didáticos. O poder de intimidação da
Veja, as parcerias políticas permitiram avançar em algumas
frentes.
Montou estratégias de ataques a
concorrentes. Atacou um curso de Ribeirão Preto com informações mentirosas.
Depois, apoiou-se em uma ONG recem aberta para ataques macartistas contra
concorrentes. A aproximação com jornalistas de outros veículos fez com que, uma
semana depois de conceder duas páginas ao livro de um deles, este publicasse em
O Globo artigo criminalizando politicamente livro de história de editora
concorrente.
Ainda há chão pela
frente.
Mas a saga dos Civita, no Brasil, será
conhecida por duas fases: a do velho Victor Civita com suas histórias em
quadrinhos, suas coleções de livros de economia, filosofia e música, a ousadia
em lançar Realidade, Quatro Rodas e Veja. E a era de Roberto Civita, que errou
em todas suas estratégias e transformou a menina dos olhos da Abril - a revista
Veja - no mais repelente modelo de jornalismo que o país jamais teve em toda sua
história.