Alexandra Peixoto: “Úteros não são caixões”
por Alexandra Peixoto, no site da Universidade Feminista Livre
No próximo dia 11 de abril, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgará se as mulheres brasileiras poderão realizar o aborto de um feto anencéfalo.
Mas o que é a anencefalia? Um feto anencéfalo não tem cérebro e a mortalidade após o nascimento é de 100% dos casos. Portanto, a anencefalia é uma condição que não permite a vida. Sob esta condição submeter uma mulher a esta gravidez é submetê-la a sofrimento.
A mudança na lei permitirá a interrupção da gravidez de um anencéfalo. A lei não obrigará o aborto, mas permitirá que as mulheres tenham o direito de decidir se querem ou não levar adiante essa gravidez, respeitando o princípio da autonomia.
“Nossos úteros não são caixões”, como diz Elisa Gargiulo. Pelo aborto legal e seguro. Pela vida das mulheres.
Assista este vídeo — Uma História Severina –, que mostra a crueldade de se obrigar uma mulher a levar a gravidez de anencéfalo até o fim.
Severina é uma mulher que teve a vida alterada pelos ministros do Supremo Tribunal Federal. Ela estava internada em um hospital do Recife com um feto sem cérebro dentro da barriga, em 20 de outubro de 2004. No dia seguinte, começaria o processo de interrupção da gestação. Nesta mesma data, os ministros derrubaram a liminar que permitia que mulheres como Severina antecipassem o parto quando o bebê fosse incompatível com a vida.
Severina, mulher pobre do interior de Pernambuco, deixou o hospital com sua barriga e sua tragédia. E começou uma peregrinação por um Brasil que era feito terra estrangeira – o da Justiça para os analfabetos. Neste mundo de papéis indecifráveis, Severina e seu marido Rosivaldo, lavradores de brócolis em terra emprestada, passaram três meses de idas, vindas e desentendidos até conseguirem autorização judicial. Não era o fim.
Severina precisou enfrentar então um outro mundo, não menos inóspito: o da Medicina para os pobres. Quando finalmente Severina venceu, por teimosia, vieram as dores de um parto sem sentido, vividas entre choros de bebês com futuro. E o reconhecimento de um filho que era dela, mas que já vinha morto. A história desta mãe severina termina não com o berço, mas em um minúsculo caixão branco.