Redação Carta Capital14 de março de 2011 às 16:50h
Manifestação apartidária permitiu adesão em massa com presença de partidos da esquerda à extrema direita. Em pauta, o descontentamento com a difícil situação trabalhista dos jovens no país
“Apartidário, laico, pacífico” foram as palavras de ordem entoadas pelos quatro jovens organizadores da manifestação do último sábado 12 em Portugal, quando cerca de 200 mil pessoas saíram às ruas de Lisboa para protestar contra a precariedade das condições de vida e de trabalho no país. A estimativa é dos organizadores: no Porto calcula-se que cerca de 80 mil pessoas também aderiram à manifestação e houve passeatas em ao menos outras dez cidades portuguesas.
O movimento começou após a criação, em 5 de fevereiro, de uma página no Facebook convocando a manifestação. Na sexta-feira 11, mais de 50 mil pessoas tinham confirmado presença pelo site. Um dos organizadores, Paula Gil, 26 anos, delineou os objetivos do movimento: “Desperdiçam-se as aspirações de toda uma geração. Desperdiçam-se recursos e competências. Somos a geração com maior nível de formação na história do país. Acreditamos que temos os recursos e ferramentas para dar um futuro melhor para o país”, segundo relato da BBC.
Gil fez referência à instabilidade e precariedade de emprego da população, principalmente dos jovens, denominados geração à rasca (geração desesperada). O jornal Financial Times destacou que o índice de desemprego entre pessoas graduadas com menos de 25 anos é de mais de 30%. “O único trabalho que conseguimos é para experiência, não remunerado, e o único futuro que nos oferecem é emigrar”, disse ao Financial Times Inês Gregório, 29, formada em história da arte e que trabalha em cafés desde que concluiu o curso, há seis anos.
A adesão em massa de manifestantes deixou claro o desencanto dos portugueses com a classe política, destacou o El País, lembrando que a abstenção nas eleições presidenciais de janeiro, que reelegeu Cavaco Silva, foi além dos 50%.
Um dia antes da manifestação, o governo anunciara novas medidas de austeridade para acenar aos mercados que Portugal conseguiria superar a crise financeira sem interferência externa, ao contrário do ocorrido na Grécia e Irlanda. Entre as medidas, a redução de compensação financeira que as empresas têm de pagar a funcionários demitidos, revisão de impostos, cortes de até 10% em pensões estatais, redução de gastos em saúde e de benefícios para desempregados. Além do mais, os manifestantes pediam o fim dos estágios não remunerados e vínculos trabalhistas precários, sem direito a férias remuneradas ou ao 13º salário.
O apartidarismo do movimento permitiu a participação massiva da população. Apesar disso, conforme informa a BBC, estiveram presentes grupos ligados a partidos políticos. Entre eles, os de esquerda, anarquistas e até mesmo de extrema direita, alguns com cabelos raspados, tatuagens de símbolos celtas e suásticas. O El País, por sua vez, destacou que, apesar de defenderem o apartidatismo da manifestação, os organizadores têm vínculos políticos. Três deles militam ou já militaram nas juventudes do Partido Socialista, do Comunista e do Bloco de Esquerda. Eles convidaram todos os deputados da Assembléia da República a participar do acontecimento.