4/fevereiro/2010 12:35
Jardim Romano: a chuva cospe o pobre na cara da elite
O Conversa Afiada reproduz comentário do amigo navegante Vander Fagundes:
Enviado em 04/02/2010 às 10:53
Estava lendo duas notícias que saíram hoje:
É a sowetização a pleno vapor!
Em tempo: Comentário do amigo navegante daniel neto.
Enviado em 04/02/2010 às 9:52
“O Bairro Jardim Romano, na zona leste de São Paulo, deverá ficar sem obras emergenciais para resolver os problemas causados pelos alagamentos que atingem a área desde o dia 8 de dezembro. Na segunda-feira, o prefeito Gilberto Kassab (DEM) decretou estado de calamidade pública para o Jardim Romano e outros 11 bairros da região. O decreto permite aos governos realizar obras emergenciais sem a necessidade de realizar licitação As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.
De acordo com o prefeito, a realização de obras emergenciais no Jardim Romano não está nos planos da prefeitura. Kassab afirmou que decretou calamidade pública para que os moradores onde o primeiro andar foi atingido pelos alagamentos que fiquem isentos do pagamento de mensalidade para a Caixa. Outro benefício é permitir aos moradores da área que possam sacar parte do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). A Defensoria Pública de São Paulo já solicitou à prefeitura que utilize o caráter excepcional para executar serviços de melhorias para a população na área.”
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Veja um dos primeiros passos da "obra" demotucana AQUI
Kassab fecha albergues e lota ruas
Filipe Vilicic
"Dormia no Albergue Cirineu e depois fui para o São Francisco", conta Carlos dos Santos. "Mas os dois fecharam, não consegui vaga em outro da região e tive de voltar a pernoitar no Minhocão." Santos é um dos moradores de rua que preferem dormir ao relento a deixar o centro de São Paulo e bairros próximos. Em dois anos, a região já perdeu quase 700 leitos em albergues municipais. Outros dois abrigos estão com os dias contados para também fechar as portas. A medida eleva a conta para mais de mil vagas extintas.
A consequência é visível: vias e praças são ocupadas por uma massa cada vez maior de moradores de rua. Segundo estimativa da Associação Viva o Centro, são 2 mil na região. "E o número tem aumentado com o fechamento dos albergues", afirma o superintendente da instituição, Marco de Almeida. Ele diz que essa população cresceu na Avenida Duque de Caxias, na Praça da República e no Largo do Arouche. O Movimento Nacional da População de Rua estima que 15 mil pessoas vivam nas vias da capital (quase 5 mil a mais que há sete anos).
Queixas semelhantes tem a diretora da Associação Paulista Viva, Marli Lemos. "Depois que encerraram os serviços dos albergues, apareceu um monte de morador de rua por aqui", reclama. "Regiões onde não havia tantos mendigos, como a Alameda Santos e o vão do Masp, agora estão lotadas."
Desde 2008, a Prefeitura desativou dois albergues no centro: o Jacareí (antigo Cirineu), com quase 400 vagas, e o Glicério (conhecido como São Francisco), com 300 leitos, segundo a Secretaria de Assistência Social (Seads). "Mas chegamos a abrigar mais de 700 pessoas", relata frei José Santos, que administrava o Albergue do Glicério. "É claro que a maioria voltou às ruas." Neste ano, a Prefeitura pretende encerrar os serviços de outros dois centros: o República Condomínio AEB, com 85 vagas, e o Pedroso, com cerca de 400.
POSTADO POR ESQUERDOPATA
Como embelezar São Paulo
(e sair ganhando com isso)
Artigo sobre a empreitada anti-moradores de rua em São Paulo.
"Nosso 'dispositivo inclinado de afastamento de população indesejável' (diapi) não precisa agredir ninguém. Cumpre apenas, silenciosamente, o que a polícia ou a guarda municipal não poderiam fazer sem empregar um bocado de violência física."
"Nosso 'dispositivo inclinado de afastamento de população indesejável' (diapi) não precisa agredir ninguém. Cumpre apenas, silenciosamente, o que a polícia ou a guarda municipal não poderiam fazer sem empregar um bocado de violência física."
Direitos todo mundo tem: à saúde, à educação, à moradia, à segurança... Verdade é que essas coisas muitas vezes ficam no papel. Mas há um direito humano, lembrado por Anatole France, que até hoje ninguém ousou desrespeitar: o de dormir debaixo da ponte. Eis, frisava o escritor, uma prerrogativa que o Estado assegura "tanto aos mendigos quanto aos milionários".
Recente iniciativa do prefeito José Serra parece colocar em xeque essa evidência.
Na passagem subterrânea entre a avenida Paulista e a Doutor Arnaldo, surge uma verdadeira inovação em termos de arquitetura pública: a "rampa antimendigo". Trata-se de um piso inclinado, com superfície áspera, que impede os miseráveis de se abrigarem no lugar.
Já era um espaço bastante exíguo e disputado. O motorista que sai da Doutor Arnaldo e avança por aquela espécie de túnel começa reparando nas pinturas murais que enfeitam o caminho. Vê simpáticos grafites, figurinhas dançantes, uns ETs sorridentes e, à medida que o túnel se aprofunda, toma contato com ótimas reproduções de quadros modernistas: uma praia de Pancetti, uma paisagem de Tarsila, algumas mulheres de Di Cavalcanti ilustram aquele buraco urbano.
Quando subimos de novo em direção à Paulista, o vão de parede disponível para as pinturas diminui; só então, num ângulo espremido entre dois planos de calçada, é que vemos amontoados alguns seres humanos entre sacos de lixo, caixotes desmontados, fardos de roupa velha e ruínas de um colchão.
Construída como a arquibancada de um imaginário estádio para ratazanas, a obra da prefeitura ocupa esse pedaço do túnel, cuidando de desalojar os mendigos que dormiam por ali. A não ser que eles insistam em se deitar no novo plano inclinado, correndo o risco de rolar até o asfalto, onde terminariam providencialmente atropelados. De todo modo, a rampa ganhou um revestimento de chapisco, desconfortável o bastante para dissuadi-los da imprudência.
Chapisco? A palavra é demasiado vulgar. O melhor seria chamar de textura rústica a camada que recobre as rampas. Fico pensando de que modo se optou por esse pormenor decorativo. Afinal, não dá para saber quais os níveis de desconforto necessários para impedir um mendigo de se deitar onde quer que seja.
Por que não usar cacos de garrafa? Tudo ganharia um colorido nostálgico e suburbano, figurando uma São Paulo de outros tempos. Ou então pregos, espetos... Ah, mas aí seria extremismo. Nosso "dispositivo inclinado de afastamento de população indesejável" (diapi) não precisa agredir ninguém. Cumpre apenas, silenciosamente, o que a polícia ou a guarda municipal não poderiam fazer sem empregar um bocado de violência física.
E ninguém é violento por aqui. Só eles, é claro, os que se escondem no subterrâneo.
"Não se trata de rampa antimendigo", protesta com veemência o subprefeito da Sé em carta à Folha na última segunda. "A área, como é público e notório, servia para acoitar delinqüentes que se misturavam a pessoas que eventualmente moravam ali, também elas vítimas da ação criminosa."
Imagino então que as vítimas, uma vez expulsas do local, estejam agradecendo à prefeitura. Lamento, em todo caso, que se tenha perdido uma oportunidade rara de prender delinqüentes: não são muitos os que se deixam localizar em endereço fixo, público e notório.
Quem sabe, em vez de um plano inclinado, a prefeitura não deveria ter construído grades debaixo do viaduto: uma parceria com o governo Alckmin criaria ali uma interessante alternativa prisional.
Seja como for, poderemos apreciar melhor as comoventes réplicas de Portinari que, naquele trecho exato da passagem subterrânea, sofriam a concorrência dos mendigos reais. Admirem-se, portanto, aqueles esquálidos retirantes em sutis matizes de azul e cinza, corvos voejando em volta e lágrimas saindo aos jorros dos olhos de crianças famintas. Sabia das coisas o velho Portinari. Um pouco ultrapassado talvez.
Afinal, a arte engajada está fora de moda e não condiz com o ritmo pragmático da cidade. A nova rampa, lembrando uma escultura abstrata, rigorosa e pura, vem aludir a períodos ulteriores, menos conteudísticos, de nossa evolução estética. A não ser que represente uma homenagem ao auditório de Niemeyer no parque Ibirapuera e ao tobogã do Pacaembu. Se não nos atrapalhassem os mendigos, poderíamos apreciar muitas harmonias ocultas na paisagem paulistana.
Uma dúvida, entretanto. Será que, apesar de sua austeridade construtiva, essa rampa não é um instrumento de autopromoção do prefeito? Fala-se nele como candidato à Presidência da República. Terá alguém inconscientemente desenhado uma minirrampa do Planalto nos subterrâneos da Paulista? Sem esquecer que o seu próprio sobrenome sugere, a exemplo da nova obra, algo de escarpado, íngreme, difícil de subir.
Mas a determinação ascensional da prefeitura não pára por aí. Lança-se em direção aos postes da Eletropaulo. Sim, noticia-se a criação de uma taxa sobre tal equipamento urbano. O raciocínio é que os postes, sendo coisas privadas (em especial para os cachorros, aliás), ocupam um lugar público, as calçadas. Cabe, portanto, uma cobrança. Por que não?
Juntando uma coisa à outra, ocorre-me a solução definitiva para o caso da Paulista: cobrar imposto dos mendigos. Afinal, eles se apropriam de um bem público e o utilizam para fins pessoais. Exigindo-lhes uma taxa módica, conseguiríamos expulsá-los dali sem precisar gastar um tostão em rampas e chapiscos. Nada como os mecanismos de mercado. É o que eu sempre digo.
Marcelo Coelho em Folha de São Paulo 28/09/2005
Recente iniciativa do prefeito José Serra parece colocar em xeque essa evidência.
Na passagem subterrânea entre a avenida Paulista e a Doutor Arnaldo, surge uma verdadeira inovação em termos de arquitetura pública: a "rampa antimendigo". Trata-se de um piso inclinado, com superfície áspera, que impede os miseráveis de se abrigarem no lugar.
Já era um espaço bastante exíguo e disputado. O motorista que sai da Doutor Arnaldo e avança por aquela espécie de túnel começa reparando nas pinturas murais que enfeitam o caminho. Vê simpáticos grafites, figurinhas dançantes, uns ETs sorridentes e, à medida que o túnel se aprofunda, toma contato com ótimas reproduções de quadros modernistas: uma praia de Pancetti, uma paisagem de Tarsila, algumas mulheres de Di Cavalcanti ilustram aquele buraco urbano.
Quando subimos de novo em direção à Paulista, o vão de parede disponível para as pinturas diminui; só então, num ângulo espremido entre dois planos de calçada, é que vemos amontoados alguns seres humanos entre sacos de lixo, caixotes desmontados, fardos de roupa velha e ruínas de um colchão.
Construída como a arquibancada de um imaginário estádio para ratazanas, a obra da prefeitura ocupa esse pedaço do túnel, cuidando de desalojar os mendigos que dormiam por ali. A não ser que eles insistam em se deitar no novo plano inclinado, correndo o risco de rolar até o asfalto, onde terminariam providencialmente atropelados. De todo modo, a rampa ganhou um revestimento de chapisco, desconfortável o bastante para dissuadi-los da imprudência.
Chapisco? A palavra é demasiado vulgar. O melhor seria chamar de textura rústica a camada que recobre as rampas. Fico pensando de que modo se optou por esse pormenor decorativo. Afinal, não dá para saber quais os níveis de desconforto necessários para impedir um mendigo de se deitar onde quer que seja.
Por que não usar cacos de garrafa? Tudo ganharia um colorido nostálgico e suburbano, figurando uma São Paulo de outros tempos. Ou então pregos, espetos... Ah, mas aí seria extremismo. Nosso "dispositivo inclinado de afastamento de população indesejável" (diapi) não precisa agredir ninguém. Cumpre apenas, silenciosamente, o que a polícia ou a guarda municipal não poderiam fazer sem empregar um bocado de violência física.
E ninguém é violento por aqui. Só eles, é claro, os que se escondem no subterrâneo.
"Não se trata de rampa antimendigo", protesta com veemência o subprefeito da Sé em carta à Folha na última segunda. "A área, como é público e notório, servia para acoitar delinqüentes que se misturavam a pessoas que eventualmente moravam ali, também elas vítimas da ação criminosa."
Imagino então que as vítimas, uma vez expulsas do local, estejam agradecendo à prefeitura. Lamento, em todo caso, que se tenha perdido uma oportunidade rara de prender delinqüentes: não são muitos os que se deixam localizar em endereço fixo, público e notório.
Quem sabe, em vez de um plano inclinado, a prefeitura não deveria ter construído grades debaixo do viaduto: uma parceria com o governo Alckmin criaria ali uma interessante alternativa prisional.
Seja como for, poderemos apreciar melhor as comoventes réplicas de Portinari que, naquele trecho exato da passagem subterrânea, sofriam a concorrência dos mendigos reais. Admirem-se, portanto, aqueles esquálidos retirantes em sutis matizes de azul e cinza, corvos voejando em volta e lágrimas saindo aos jorros dos olhos de crianças famintas. Sabia das coisas o velho Portinari. Um pouco ultrapassado talvez.
Afinal, a arte engajada está fora de moda e não condiz com o ritmo pragmático da cidade. A nova rampa, lembrando uma escultura abstrata, rigorosa e pura, vem aludir a períodos ulteriores, menos conteudísticos, de nossa evolução estética. A não ser que represente uma homenagem ao auditório de Niemeyer no parque Ibirapuera e ao tobogã do Pacaembu. Se não nos atrapalhassem os mendigos, poderíamos apreciar muitas harmonias ocultas na paisagem paulistana.
Uma dúvida, entretanto. Será que, apesar de sua austeridade construtiva, essa rampa não é um instrumento de autopromoção do prefeito? Fala-se nele como candidato à Presidência da República. Terá alguém inconscientemente desenhado uma minirrampa do Planalto nos subterrâneos da Paulista? Sem esquecer que o seu próprio sobrenome sugere, a exemplo da nova obra, algo de escarpado, íngreme, difícil de subir.
Mas a determinação ascensional da prefeitura não pára por aí. Lança-se em direção aos postes da Eletropaulo. Sim, noticia-se a criação de uma taxa sobre tal equipamento urbano. O raciocínio é que os postes, sendo coisas privadas (em especial para os cachorros, aliás), ocupam um lugar público, as calçadas. Cabe, portanto, uma cobrança. Por que não?
Juntando uma coisa à outra, ocorre-me a solução definitiva para o caso da Paulista: cobrar imposto dos mendigos. Afinal, eles se apropriam de um bem público e o utilizam para fins pessoais. Exigindo-lhes uma taxa módica, conseguiríamos expulsá-los dali sem precisar gastar um tostão em rampas e chapiscos. Nada como os mecanismos de mercado. É o que eu sempre digo.
Marcelo Coelho em Folha de São Paulo 28/09/2005