Paul Singer: Ambigüidades do governo Lula não são transitórias
Petista de carteirinha e maestro da Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes), o professor Paul Singer não prognostica um período de transição dentro do governo Lula. Para ele, a gestão é ambígua, sim, assim como a realidade...
Maurício Hashizume – Carta Maior
BRASÍLIA – O governo Lula traz no seu âmago duas ambigüidades fundamentais, nos campos da política e da economia. A primeira diz respeito à adoção de políticas radicalmente capitalistas combinadas com experiências de inspiração socialista. A segunda delas contempla a política macroeconômica, na qual traços desenvolvimentistas são acompanhados de modelos restritivos bem ao gosto dos operadores do mercado financeiro internacional.Tanto direto quanto realista, o quadro marcado por contrastes leva a assinatura do experimentado professor Paul Singer, petista de carteirinha que rege a Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes), instalada no Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). As ações que a Senaes vêm desenvolvendo (confira abaixo detalhes do novo projeto da secretaria), aliás, são apontadas pelo secretário como exemplos do tal recôndito espírito socialista da administração da qual faz parte. No campo da política econômica, basta ver a política de juros, recomenda o professor Singer. De um lado, a soberba Taxa Selic segue à risca os ditames conservadores. De outro, a política de crédito consignado para aposentados e assalariados permitiu a queda dos juros em aproximadamente 50% , bem como a bancarização de parte da camada mais pobre da população. “As medidas vão em direção opostas. E o presidente Lula sabe disso. Trata-se de uma espécie de grande compensação”.O prognóstico do professor, contudo, parece ser ainda mais contundente que as ambigüidades escancaradas. Essa combinação de medidas conflitantes, acredita, não deve sofrer alterações significativas caso o presidente seja reeleito. “Transição eu não vejo. A convivência dentro do governo nunca foi tranqüila. A questão da taxa de juros, por exemplo, recebeu críticas inclusive do vice-presidente [José Alencar]”.Na disputa dentro do Partido dos Trabalhadores (PT) pelo programa de governo e no Encontro Nacional do mês de abril, as contradições devem vir à tona. Programas como os de Economia Solidária, pontua Singer, membro do Diretório Nacional (DN), têm apoio tanto da militância quanto por Lula. “Não sei como vai ser, mas vai haver um choque, especialmente na questão do juros”. Para amarrar sua análise, Singer frisa que a ambigüidade verificada na espinha dorsal do governo Lula não se restringe às opções do ex-metalúrgico. “A realidade também é ambígua”, seleciona. O pragmatismo do secretário alia estabilidade da inflação controlada com a redução do preço da cesta básica possibilidade de acesso, parâmetro essencial e irrevogável para mensurar a melhora das condições de vidaA aliança de forças progressistas na América Latina - calcada em lideranças díspares como Hugo Chávez, na Venezuela, e Michelle Bachelet, no Chile – também deixa transparecer a ambigüidade. “Não é uma particularidade do Brasil e nem deste momento específico”.Nos cálculos do professor, não há como aplicar no Brasil a receita seguida por Chávez na Venezuela. Há, contudo, para Singer, uma luz no fim do túnel. “Os movimentos sociais no Brasil são vigorosos e possuem capacidade de mobilização enorme. Aqui, tudo depende do movimento social”.
Novo projeto
Lançado em seminário realizado ao longo dos últimos dias (14 a 17 de março), o Projeto Promoção do Desenvolvimento Local e Economia Solidária permitiu a capacitação de 251 agentes de desenvolvimento solidário selecionados a partir de reuniões realizadas nas comunidades quilombolas, indígenas, mulheres, jovens, catadores, trabalhadores desempregados, agricultores familiares e empreendedores de turismo sustentável que serão remunerados para executarem atividades de incentivo às práticas solidárias locais.Levantamento realizado pela Senaes, em parceria com o Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES) registrou quase 15 mil empreendimentos com características solidárias no país e identificou cerca de 1,25 milhão de trabalhadores em atividade no setor. Do total de Empreendimentos Econômicos Solidários (EES), 44% estão sendo desenvolvidos na Região Nordeste. Entre as atividades econômicas, predominam as atividades de agricultura e pecuária (64%), e de têxteis, confecções, calçados e produção artesanal em geral (21%).