sexta-feira, março 10, 2006
E o Brasil?
José Dirceu
Ex-chefe da Casa Civil
Estamos assistindo a cenas surrealistas no debate (?) eleitoral. Uma luta interminável, sem regras, pela definição do candidato tucano. Sobre o futuro do país, os oito anos de governo FHC, as intermináveis denúncias sobre os desmandos ocorridos no caixa dois tucano de 98 e 2002, nenhuma palavra.
Tampouco o que se passa do lado de cá pode satisfazer ao PT e ao presidente. Não se discute publicamente qual será o programa que dará continuidade ao governo Lula. Que os tucanos estejam desesperados e sem rumo, dá para compreender: afinal, não destruíram o PT ou derrubaram o governo e, pior, assistem nervosamente o presidente recuperar seus índices históricos de aprovação e intenção eleitoral. Mas ao PT e ao governo Lula deveria interessar profundamente o debate de idéias. A não ser que a decisão seja não mudar nada ou simplesmente não discutir, fazer de conta que bastam as pesquisas e a popularidade do presidente.
Do outro lado da Praça dos Três Poderes, assistimos a um Congresso que, apesar da crise, não fez a reforma política; ao contrário, quer pôr fim à verticalização. Mas o que o país esperava era uma ampla e geral reforma política, que criasse as condições necessárias para fortalecer os partidos e afastar o poder econômico das eleições.
Vale tudo na cruzada tucana-pefelista. O que importa é a vitória. Seus representantes tentam desacreditar pesquisas, que apresentam Lula ganhando nos dois turnos. E prorrogam CPMIs, desde que não sejam investigadas as denúncias contra o senador Eduardo Azeredo, ex-governador de MG e ex-presidente do PSDB, e a lista de Furnas. Mas fogem da discussão principal: o desenvolvimento nacional.
O que todos esperamos é que o PT e o governo assumam abertamente esse debate, começando pela questão da taxa de juros, da dívida interna, do crescimento econômico, da distribuição de renda e do desenvolvimento nacional, salientando os passos positivos, mas também reconhecendo erros e propondo alternativas. Fora desse caminho, governar não faz diferença para forças políticas que fizeram sua trajetória sob o compromisso de gerações com a transformação social e a soberania do país.
A verdadeira questão é que não existem mais razões externas ou internas, para a manutenção da atual taxa de juros. Salta à vista que reduzindo a taxa real de juros para, ao menos, 5%, seremos capazes de administrar a dívida interna, levá-la para algo em torno de 30% do PIB e devolver, ao orçamento nacional, parte do superávit primário, incrementando o nível de investimentos. É preciso cumprir metas que mudem o país, mantendo a inflação baixa e reduzindo o déficit da Previdência para cerca de 1%. O governo Lula debelou a crise herdada de seu antecessor e abriu uma oportunidade histórica. Não podemos perdê-la por falta de audácia ou por fraqueza diante dos interesses que sempre dominaram o país.
Apenas com uma política nacional de desenvolvimento poderemos investir para resolver problemas sociais e econômicos que se arrastam há décadas e nos envergonham. Alfabetizar todos os brasileiros; universalizar o ensino médio técnico-profissional; reduzir a pobreza radicalmente, principalmente criando 2 milhões de empregos formais por ano; universalizar o saneamento básico; solucionar, nas metrópoles brasileiras, graves deficiências de transporte público e habitação; democratizar o campo com uma reforma agrária ampla e integrada ao desenvolvimento do país. E dar aos cidadãos acesso à Justiça e segurança.
É preciso assumir que o Estado brasileiro pode e deve planejar e coordenar o desenvolvimento nacional, investindo em infra-estrutura, seja através do Orçamento Geral da União, seja por concessões ou parcerias com a iniciativa privada. Também é necessário dar continuidade à política industrial e de inovação, garantindo os investimentos necessários em ciência e tecnologia. Sem isso, o Brasil não será um país desenvolvido.
A verdade - e o país reconhece - é que o presidente Lula e seu governo, com apoio do Congresso, da sociedade e do empresariado, criaram as condições de estabilidade e credibilidade para que o Brasil possa retomar, agora, sua trajetória de desenvolvimento.
Esse é o debate que interessa ao país.
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