Sobre: Quem matou a escola pública?
Taí um tema que nós TEMOS de começar a estudar urgentemente -- dentre outros motivos porque o Brasil ainda não tem projeto propriamente 'pedagógico' de educação pública. (No Brasil, aliás, só o MST tem projeto de educação pública, socialista e democrática. E, na América Latina, só Cuba.)
Concordo COMPLETAMENTE com Eduardo Guimarães, sobre o golpe de 1964 ter sido praticamente dirigido contra os projetos que tínhamos, então, em andamento, para construirmos aqui uma escola pública democratizante, de conscientização política, socialista, e de inclusão social, como meio necessário e imprescindível para construirmos uma sociedade mais justa. Esse projeto ainda não estava sequer completamente pensado, em 1964: ele estava sendo pensado, naquele momento; foi morto, portanto, no berço.
Isso explica que, hoje, NEM A UNIVERSIDADE BRASILEIRA tenha, ainda, sequer 'um rascunho' do que seja um projeto pedagógico de escola pública democrática e de democratização: tudo o que tínhamos foi apagado, também, da e na universidade brasileira.
O programa das quotas -- que é excelente e tem de ser defendido -- não é, ainda, um projeto político-pedagógico.
O programa das quotas visa, apenas, a reabrir as portas da universidade a TODA a sociedade brasileira, com atenção aos mais pobres, que, durante 40 anos, ficaram COMPLETAMENTE excluídos da educação pensada exclusivamente para as elites brasileiras.
Reabertas as portas da universidade, então, será a hora de CONSTRUIRMOS, praticamente do zero, a universidade que teremos de ter, mas ainda não temos.
Esse é um problema extremamente complexo, porque só dois atores sociais são competentes para PENSAR uma universidade democrática:
(1) a própria universidade, se ela já estiver democratizada; ou
(2) onde a universidade não seja democrática e, portanto, seja incapaz de PENSAR e construir uma universidade mais democrática, só o Estado democrático tem poderes e competências para CONSTRUIR uma universidade democrática.
O Brasil está nesse ponto e nesse impasse, hoje: nossa universidade não é democrática (e continua em processo de privatizamento, pelos interesses dos capitais privados); portanto, nossa universidade brasileira, toda ela, é completamente incompetente para pensar a universidade democrática que o Brasil terá de ter; e nós apenas estamos recomeçando a redemocratizar o Estado, mas ainda não formamos, sequer, os primeiros especialistas competentes para propor um projeto de universidade democrática: até agora só conseguimos (e a duras penas) COMEÇAR a nos movimentar nessa direção.
O primeiro passo desse projeto é o programa de quotas. Mas o programa de quotas, até agora, apenas conseguiu começar desimpedir o caminho, para os mais pobres, que estão começando a poder chegar... ONDE? À universidade elitista e desdemocratizatória que temos.
Se ficarmos só nisso, teremos andado bem pouco -- e nada garante que tenhamos andado para a frente.
Só como lembrete, pra acrescentar a esse excelente artigo do Eduardo Guimarães, lembro umas coisinhas que me ocorrem;
-- a escola pública dos anos 40, 50 e 60, no Brasil, era 'cria' direta do projeto de desenvolvimento nacional de Getúlio Vargas. (Sobre isso, valeria a pena estudarmos um coisa que foi simplesmente apagada -- pior: foi distorcida completamente -- da história do Brasil, a saber, a influência civilizatória que tiveram, no Brasil, as idéias positivistas, que aqui tiveram um desenvolvimento específico, justamente a partir de Getúlio);
-- em 1962, 1963 e 1964 estavam em andamento, no Brasil, pelo menos dois importantes modelos de escola pública (pensada do primário à universidade):
(1) o de Anísio Teixeira (para a escola primária); e
(2) o de Darcy Ribeiro para a Universidade do Brasil, a ser implantado a partir da Universidade de Brasília.
Anísio Teixeira foi um dos primeiros cassados pelo golpe de 1964; dado que não tinha nenhum outro tipo de militância política, conclui-se que ele foi cassado exclusivamente por suas idéias -- e planos e projetos, muitos já em implantação naquele momento -- para praticamente construir toda uma educação pública democrática (ou, pelo menos, civilizatória) no Brasil.
Tudo isso, é claro, no plano da educação pensada como política pública.
No plano propriamente pedagógico, o golpe de 1964 matou também tudo o que havia de mais adiantado, no mundo, em matéria de educação popular, quando acabou com o projeto de Paulo Freire.
Tudo isso tem de ser recuperado e estudado. Nossa luta está só no começo. Mas pode-se começar, sim, pelo programa de quotas.
8-) Caia
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