quarta-feira, novembro 16, 2005
Se caixa 2 valesse cassação, quem sobraria???
Esses, são os caras que querem cassar Zé Dirceu.
Membros do Conselho de Ética prestam contas de ficção ao TSE
Rizardo Izar, presidente do Conselho, declarou ao TSE ter gasto apenas R$ 213.909,83 para se eleger deputado federal por São Paulo, Estado onde a eleição é caríssima.
Estamos publicando nesta edição a tabela com aprestação de contas das campanhas eleitorais dos integrantes do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados ao Tribunal Superior Eleitoral, nas últimas eleições parlamentares realizadas no país. O leitor poderá observar, no quadro ao lado, o impressionante mundo de fantasia que são os valores declarados à Justiça. Esses números mostram o quão desmoralizado é o sistema de financiamento, e também o de prestação de contas, das campanhas eleitorais brasileiras.
ABSURDO
Por exemplo, o presidente do Conselho de Ética, deputado Ricardo Izar, eleito pelo Estado em que as eleições são mais caras em todo o país. Pois, amigo leitor, ele declarou que gastou R$ 213.909,83 para se eleger deputado federal pelo Estado de São Paulo. No atual sistema, cheio de marketeiros e outras aberrações, todo mundo sabe que essa quantia não elege nem vereador de pequena cidade do interior desse Estado. No entanto, Izar declarou essa quantia e ninguém até hoje reclamou, apesar do evidente absurdo. Por quê?
Porque Izar está longe de ser um caso isolado. Vejamos o relator do processo contra o ex-ministro José Dirceu, deputado Júlio Delgado (PSB-MG), que vive a deblaterar contra os colegas em nome da moralidade pública: pois ele informou ao TSE que seus gastos não passaram de R$ 129.686,70 para se eleger pelo vastíssimo Estado de Minas Gerais – também um dos Estados onde a campanha é mais cara e concorrida. Sim, amigo leitor, é o TSE que informa: Delgado declarou que gastou apenas um pouco mais de R$ 100 mil para se eleger deputado federal! E por Minas Gerais! Incrível é que os céus, por vergonha, não tenham desabado sobre a terra depois de tal prestação de contas.
Porém, existe coisa pior. Veja-se a intimorata deputada Zulaiê Cobra (PSDB-SP), enérgica e sonora representante do eleitorado tucano paulista, sempre a vituperar a suposta desonestidade dos outros e a chamá-los de “bandidos” e até de “bandidões”. Pois a bravíssima Zulaiê declarou ao TSE que gastou meros R$ 112.433,41 – menos ainda do que Delgado – para se eleger em meio às endinheiradas outras cobras e lagartos que são os seus concorrentes, sobretudo aqueles de seu próprio partido. Não há dúvida, trata-se de um milagre de parcimônia e austeridade. Em meio aos rios de dinheiro que correm na eleição paulista, Zulaiê teve que desembolsar – e arrecadar – apenas R$ 112 mil! Pelo menos, mulher de palavra que é, foi o que declarou ao TSE. Quem duvidaria de tão transparente criatura? No entanto, é provável que nem Jesus Cristo conseguisse tal feito, apesar de ser filho de Deus e de ter conseguido até mesmo ressuscitar...
Mas o combativíssimo deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), oráculo do socialismo e da revolução proletária e defensor, junto com o deputado Abi-Ackel, da moral e dos bons costumes, conseguiu milagre maior ainda. Aliás, mostrou mais uma insuperável qualidade: a de não enrubescer ao declarar que gastou, no Rio de Janeiro, que disputa com Minas o troféu de segunda eleição mais cara do país, apenas R$ 65.150,09. Sim, caros leitores, o deputado Alencar declarou que gastou R$ 65 mil em sua eleição e não consta que sua cútis tenha ficado nem ao menos rósea, o que deve ser mais uma demonstração de suas proletárias virtudes, com certeza.
O que não é possível é que o país continue a conviver com essa hipocrisia. Qualquer um sabe que uma campanha para deputado federal nos grandes estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, e mesmo nos Estados menores, custa várias e várias vezes mais do que esses valores que hoje divulgamos. Esta tabela é a confirmação cabal de que o atual sistema eleitoral brasileiro, como ele está organizado, é um sistema falido, desmoralizado e sem sentido. As suas prestações de contas não passam de peças de ficção – a começar por aqueles que se arvoram em juízes dos seus colegas, e os acusam por terem praticado exatamente a mesma coisa que eles.
Urge que se enfrente de forma séria e responsável esta situação. E mudá-la só é possível com a aprovação de uma reforma política e eleitoral que implante o financiamento público das campanhas, acabe com a marketagem nababesca e com o reino das pesquisas tão enganosas quanto mercenárias. Fora isso, é puro cinismo. Num quadro como o atual, punir alguns parlamentares pelo suposto uso de caixa 2, como querem setores venais da mídia – são sempre os mais venais que querem executar ao grito de que outros são “corruptos” – seria a falência moral do Congresso Nacional. Ou se resolve o problema, que é estrutural, que é do próprio sistema atual, ou o Congresso estará transformado, publicamente, à vista de todos, num antro de fariseus.
As invencionices de Roberto Jefferson sobre uma suposta compra de votos, o folclórico mensalão, foram desmentidas por todas as investigações. O próprio Jefferson foi cassado exatamente por ter mentido a esse respeito. O que restou mesmo foi somente a discussão sobre os expedientes de caixa 2 praticados nas eleições. É por isso que deputados estão sendo acusados, e por nada mais. É por isso que o Conselho de Ética – esse bastião da moralidade parlamentar – quer cassar fulano e beltrano. Na verdade, pela prestação de contas desses deputados não coincidir com o dinheiro que gastaram realmente. Mais acima, falamos que nem Cristo conseguiria o que alguns membros do Conselho conseguiram – eleger-se com tão pouco dinheiro. Aqui, cabe lembrar o caso da adúltera: que atire a primeira pedra quem apresentou prestação de contas verdadeira ao TSE. Também como no caso da adúltera, só os fariseus são capazes de ato tão nojento.
O fato é que depois de mais de cinco meses de prolongadas investigações realizadas pelas três CPIs, pelo Ministério Público, pela Polícia Federal e pela Controladoria Geral da União, o que ficou comprovado é que houve caixa 2 envolvendo a maioria dos parlamentares acusados. Só isso e nada mais. O que, realmente, basta olhar as prestações de contas ao TSE, não era nenhuma novidade.
REFORMA
Certamente é possível corrigir isso. E não é executando parlamentares para supostamente esconder os próprios atos, pois estes atos ficarão irremediavelmente expostos, com o agravante da infâmia. O que é necessário é aprovar uma reforma político-eleitoral que acabe com uma hipocrisia que não resiste a um simples olhar na prestação de contas ao TSE dos próprios membros do Conselho de Ética.
JORNAL HORA DO POVO SÉRGIO CRUZ
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