quarta-feira, setembro 27, 2017
terça-feira, setembro 26, 2017
domingo, setembro 24, 2017
Escravidão, e não corrupção, define sociedade brasileira, diz Jessé Souza
Quem sintetizou a interpretação dominante do Brasil, que todos aprendemos nas escolas e nas universidades, foi Gilberto Freyre (1900-87). É a ideia de que viemos de Portugal e que de lá herdamos um jeito específico de ser. Para o autor de "Casa-Grande e Senzala" e para seguidores como Darcy Ribeiro (1922-97), essa herança era positiva ou, pelo menos, ambígua.
Sérgio Buarque de Holanda (1902-82),
outro filho de Freyre, reinterpreta a ideia como pura negatividade em registro
liberal. Cria, assim, o brasileiro como vira-lata, pré-moderno, emotivo e
corrupto. Tal visão prevaleceu, e quase todos a seguem, de Raymundo Faoro
(1925-2003), Fernando Henrique Cardoso e Roberto DaMatta a Deltan Dallagnol e
Sergio Moro.
Essa é a única interpretação
totalizante da sociedade brasileira que existe até hoje.
A "esquerda", entendida
como a perspectiva que contempla os interesses da maioria da sociedade, jamais
construiu alternativa a essa leitura liberal e conservadora. Existem
contribuições tópicas geniais, mas elas esclarecem fragmentos da realidade
social, não a sua totalidade, permitindo que, por seus poros e lacunas, penetre
a explicação dominante.
A ausência de interpretação própria
fez com que a esquerda sempre fosse dominada pelo discurso do adversário.
Reescrever essa história é a ambição de meu novo livro, "A Elite do Atraso
- Da Escravidão à Lava Jato" [Leya, 240 págs., R$ 44,90]. O fio condutor é
a ideia de que a escravidão nos marca como sociedade até hoje —e não a suposta
herança de corrupção, como se convencionou sustentar.
Para Faoro, por exemplo, a história
do Brasil é a história da corrupção transplantada de Portugal e aqui exercida
pela elite do Estado. Nessa narrativa, senhores e escravos raramente aparecem e
nunca têm o papel principal.
Essa abordagem seria apenas ridícula
se não fosse trágica. Faoro imagina a semente da corrupção já no século 14, em
Portugal, quando não havia nem sequer a concepção de soberania popular, que é
parteira da noção moderna de bem público. É como ver um filme sobre a Roma
antiga cheio de cenas românticas que foram inventadas no século 18. Não
obstante, o país inteiro acredita nessa bobagem.
ESCRAVIDÃO
Os adeptos dessa interpretação
dominante parecem não se dar conta de que, em uma sociedade, cada indivíduo é
criado pela ação diária de instituições concretas, como a família, a escola, o
mundo do trabalho.
No Brasil Colônia, a instituição que
influenciava todas as outras era a escravidão (que não existia em Portugal, a
não ser de modo tópico). Tanto que a (não) família do escravo daquele período
sobrevive até hoje, com poucas mudanças, na (não) família das classes excluídas:
monoparental, sem construir os papéis familiares mais básicos, refletindo o
desprezo e o abandono que existiam em relação ao escravo.
Também no mundo do trabalho a
continuidade impressiona. A "ralé de novos escravos", mais de um
terço da população, é explorada pela classe média e pela elite do mesmo modo
que o escravo doméstico: pelo uso de sua energia muscular em funções indignas,
cansativas e com remuneração abjeta.
Em outras palavras, os estratos de
cima roubam o tempo dos de baixo e o investem em atividades rentáveis,
ampliando seu próprio capital social e cultural (com cursos de idiomas e
pós-graduação, por exemplo) e condenando a outra classe à reprodução de sua
miséria.
A classe que chamo provocativamente
de ralé é uma continuação direta dos escravos. Ela é hoje em grande parte
mestiça, mas não deixa de ser destinatária da superexploração, do ódio e do
desprezo que se reservavam ao escravo negro. O assassinato indiscriminado de
pobres é atualmente uma política pública informal de todas as grandes cidades
brasileiras.
A nossa elite econômica também é uma
continuidade perfeita da elite escravagista. Ambas se caracterizam pela
rapinagem de curto prazo. Antes, o planejamento era dificultado pela
impossibilidade de calcular os fatores de produção. Hoje, como o recente golpe
comprova, ainda predomina o "quero o meu agora", mesmo que a custo do
futuro de todos.
É importante destacar essa diferença.
Em outros países, as elites também ficam com a melhor fatia do bolo do
presente, mas além disso planejam o bolo do futuro. Por aqui, a elite dedica-se
apenas ao saque da população via juros ou à pilhagem das riquezas naturais.
INTERMEDIÁRIAS
Historicamente, a polarização entre
senhores e escravos em nossa sociedade permaneceu até o alvorecer do século 20,
quando surgiram dois novos estratos por força do capitalismo industrial: a
classe trabalhadora e a classe média.
Em relação aos trabalhadores, a
violência e o engodo sempre foram o tratamento dominante. Com a classe média,
porém, a elite se viu contraposta a um desafio novo.
A classe média não é necessariamente
conservadora. Tampouco é homogênea. O tenentismo, conhecido como nosso primeiro
movimento político de classe média, na década de 1920, já revelava essas
características, pois abrigava múltiplas posições ideológicas.
A elite paulistana, tendo perdido o
poder político em 1930, precisava fazer com que a heterodoxia rebelde da classe
média apontasse para uma única direção, agora em conformidade com os interesses
das camadas mais abastadas. Como naquele momento os endinheirados de São Paulo
não controlavam o Estado, o caminho foi dominar a esfera pública e usá-la como
arma.
O que estava em jogo era a captura
intelectual e simbólica da classe média letrada pela elite do dinheiro, para a
formação da aliança de classe dominante que marcaria o Brasil dali em diante.
O acesso ao poder simbólico exige a
construção de "fábricas de opiniões": a grande imprensa, as grandes
editoras e livrarias, para "convencer" seu público na direção que os
proprietários queriam, sob a máscara da "liberdade de imprensa" e de
opinião.
A imprensa, todavia, só distribui
informação e opinião. Ela não cria conteúdo. A produção de conteúdo é monopólio
de especialistas treinados: os intelectuais. A elite paulistana, então,
constrói a USP, destinando-a a ser uma espécie de gigantesco "think
tank" do liberalismo conservador brasileiro, de onde saem as duas ideias
centrais dessa vertente: as noções de patrimonialismo e de populismo.
LAVA JATO
Enquanto conceito, o patrimonialismo
procede a uma inversão do poder social real, localizando-o no Estado, não no
mercado. Abre-se espaço, assim, para a estigmatização do Estado e da política
sempre que se contraponham aos interesses da elite econômica. Nesse esquema, a
classe média cooptada escandaliza-se apenas com a corrupção política dos
partidos ligados às classes populares.
A noção de populismo, por sua vez,
sempre associada a políticas de interesse dos mais pobres, serve para mitigar a
importância da soberania popular como critério fundamental de uma sociedade
democrática —afinal, como os pobres ("coitadinhos!") não têm
consciência política, a soberania popular sempre pode ser posta em questão.
É impressionante a proliferação dessa
ideia na esfera pública a partir da sua "respeitabilidade científica"
e, depois, pelo aparato legitimador midiático, que o repercute todos os dias de
modos variados.
As noções de patrimonialismo e de
populismo, distribuídas em pílulas pelo veneno midiático diariamente, são as
ideias-guia que permitem à elite arregimentar a classe média como sua tropa de
choque.
Essas noções legitimam a aliança
antipopular construída no Brasil do século 20 para preservar o privilégio real:
o acesso ao capital econômico por parte da elite e o monopólio do capital
cultural valorizado para a classe média. É esse pacto que permite a união dos
20% de privilegiados contra os 80% de excluídos.
A atual farsa da Lava Jato é apenas a
máscara nova de um jogo velho que completa cem anos.
Em conluio com a grande mídia, não se
atacou apenas a ideia de soberania popular, pela estigmatização seletiva da
política e de empresas supostamente ligadas ao PT —o saque real, obra dos
oligopólios e da intermediação financeira, que capturam o Estado para seus
fins, ficou invisível como sempre. Destruiu-se também, com protagonismo da Rede
Globo nesse particular, a validade do próprio princípio da igualdade social
entre nós.
O ataque seletivo ao PT, de 2013 a
2016, teve o sentido de transformar a luta por inclusão social e maior
igualdade em mero instrumento para um fim espúrio: a suposta pilhagem do
Estado.
Desqualificada enquanto fim em si
mesma, a demanda pela igualdade se torna suspeita e inadequada para expressar o
legítimo ressentimento e a raiva que os excluídos sentem, mas que agora não
podem mais expressar politicamente.
Assim, abriu-se caminho para quem
surfa na destruição dos discursos de justiça social e de valores democráticos
—Jair Bolsonaro como ameaça real é filho do casamento entre a Lava Jato e a
Rede Globo.
O pacto antipopular das classes alta
e média não significa apenas manter o abandono e a exclusão da maioria da
população, eternizando a herança da escravidão. Significa também capturar o
poder de reflexão autônoma da própria classe média (assim como da sociedade em
geral), que é um recurso social escasso e literalmente impagável."
JESSÉ SOUZA, 57, doutor em sociologia
pela Universidade de Heidelberg (Alemanha), é autor de "A Tolice da
Inteligência Brasileira" e "A Radiografia do Golpe" (Leya), além
de professor de sociologia da UFABC.
quinta-feira, setembro 21, 2017
Para quem falam os militares?
Depois da revolução de 1930, nunca os militares ficaram por tantos anos fora da cena política brasileira como a partir de 1985, quando a ditadura militar chegou ao fim com a devolução do poder aos civis na pessoa de Tancredo Neves. Passados 32 anos, aqui estamos nós, perplexos, diante dos sinais inequívocos de que há disposição, pelo menos de alguns “bolsões”, para uma nova intervenção na política, destinada a colocar ordem no caos detonado pelo golpe parlamentar de 2016.
Houve a fala do general Mourão, defendendo a intervenção, a do general Augusto Heleno, em seu apoio, e a do comandante do Exército, na entrevista a Pedro Bial, na TV Globo, onde informou que não punirá o subordinado e também admitiu, de forma contraditória, a ação das Forças Armadas em situações excepcionais.
A pergunta que se impõe é esta: para quem estão falando os militares? Quem são os destinatários do aviso de que eles poderão resolver a crise política se os poderes constituídos não o fizerem? Talvez o primeiro destinatário seja a Câmara, que em breve julgará a segunda denúncia contra Michel Temer. Talvez seja a classe política como um todo, o que nos traz a lembrança das listas de cassações, à esquerda e à direita, que vieram depois do golpe de 1964. Temer, comandante em chefe-das-Forças Armadas, segue calado, mas hoje ele volta ao Brasil e terá que se pronunciar, já que o ministro da Defesa deixou a tarefa para o comandante do Exército, que só acentuou a perplexidade.
Aqui estamos, perplexos, e também divididos. Um intelectual da envergadura de Moniz Bandeira, de convicções democráticas indiscutíveis, já vinha defendendo a intervenção militar para evitar o desmonte do Estado e a entrega do patrimônio nacional ao capital estrangeiro predador. A Constituição e o Estado de Direito, vem dizendo ele, já foram rasgados no ano passado.
Houve espanto e reações à esquerda, como a do petista Valter Pomar, que criticou suas “ilusões”, dando ensejo a uma troca de correspondência que merece ser lida, e está toda transcrita no blog de Pomar: http://valterpomar.blogspot.com.br.
A entrevista do comandante do Exército a Pedro Bial não serviu para dissipar, e sim para acentuar a percepção de que a fala do general Mourão não foi um solilóquio, mas a expressão de uma disposição latente no meio militar. Em que extensão é que ninguém sabe. Tanto é que Mourão recebeu apoio explícito do general Augusto Heleno, uma voz muito respeitada no Exército, principalmente por sua atuação no comando das tropas brasileiras no Haiti. Não punindo Mourão, justificando sua fala “em ambiente fechado” (como se houvesse licença para isso no regramento militar), e admitindo que as Forças Armadas podem atuar para conter o caos, o comandante do Exército nada mais fez do que repetir o subordinado. Há na praça política a interpretação de que ele não o puniu para não criar uma vítima e insuflar ainda mais o ambiente. Mas ele fez mais que minimizar ou justificar Mourão, ao admitir a possibilidade de intervenção, em respostas contraditórias, em que misturou o emprego das Forças Armadas em situações excepcionais, como ocorre agora mesmo no Rio de Janeiro, com uma intervenção para conter o caos político.
São coisas distintas mas ele as embaralhou ao afirmar que Forças Armadas podem ser empregadas para garantir a lei, a ordem e os poderes constituídos, a pedido de um deles ou por iniciativa própria.
O artigo 142 da Constituição diz que isso só pode ocorrer na primeira hipótese (a pedido de um dos poderes). Ele acrescentou a segunda. Vale dizer, a iniciativa própria, “quando houver a iminência de um caos”. Esta foi uma interpretação constitucional perigosa, pois na situação atual não se espera de nenhum dos Três Poderes um pedido de intervenção.
Sempre que os militares imiscuíram-se na política, foram tentados pelas “vivandeiras de quartel”, expressão que no passado identificava os políticos que pediam intervenção militar. Quem melhor as definiu foi o general Castelo Branco: “Eu os identifico a todos. E são muitos deles, os mesmos que, desde 1930, como vivandeiras alvoroçadas, vêm aos bivaques bolir com os granadeiros e provocar extravagâncias do Poder Militar."
Mas hoje não há vivandeiras, não há políticos interessados em perder tetas e mamatas, embora haja setores minoritários da sociedade civil que defendem a solução militar. Ela teria que vir por iniciativa própria das Forças Armadas, tal como disse o general Vilas-Boas.
Muitas vivandeiras se iludiram, em 1964, acreditando que os militares, após derrubar João Goulart, cumpririam o calendário eleitoral com a realização das eleições presidenciais de 1965. Eles ficaram mais 20 anos, ao longo dos quais sabemos o que aconteceu: cassações, inclusive de vivandeiras exaltadas, como Carlos Lacerda, fechamento do Congresso, liquidação dos partidos, perseguições, torturas, mortes e desaparecimentos.
Depois da Revolução de 1930, liderada por Getúlio Vargas com forte e decisivo apoio dos oficiais do “tenentismo”, os militares protagonizaram golpes em 1945, 1954, 1955, 1961 e 1964. Vale recordar o que disse Alfred Stepan, em seu livro “Os militares na política”, em que estudou o caso brasileiro. Os golpes triunfantes, diz ele, foram o de 1945 (que apeou Vargas do poder), o de 1954 (que o levou ao suicídio, no segundo governo) e o de 1964, que derrubou Jango e abriu a porteira para uma longa ditadura. E todos eles ocorreram em situações em que havia baixo grau de legitimidade do Poder Executivo e alto grau de legitimidade dos militares. Em 1955 (tentativa de impedir a posse de JK) e em 1961 (veto à posse de Jango após a renúncia de Jânio), na ausência destas condições, eles perderam.
Desnecessário falar da baixíssima ou inexistente legitimidade de Michel Temer como chefe do Executivo. Isso porém não garante a legitimidade das Forças Armadas para uma intervenção. Mas eles devem ser ouvidos, por aqueles a quem estão se dirigindo. Por Temer, pelo Congresso, pelo Supremo. Antes que seja tarde.*****
quarta-feira, setembro 20, 2017
Resposta de Moniz-Bandeira a Valter Pomar
Resposta a Valter Pomar ( Sobre a "ilusão" de Luiz Alberto Moniz Bandeira acerca de uma "intervenção militar" )
Meu querido Valter,
insisto, em nada tenho ilusão. Sei que tudo pode acontecer, se houver uma intervenção militar. Mas o fato é que, se Dilma Rousseff foi deposta por um golpe de Estado, e de fato foi, não mais existe Estado de Direito nem democracia no Brasil. Acabou a Constituição.
O governo, que só conta com a simpatia de cerca de 3% da população, realiza reformas para as quais não teve mandato.
O Congresso, corrompido e desmoralizado, assumiu poderes constituintes para os quais não foi eleito.
Nada do que ocorreu e está a ocorrer é constitucional. Nada tem legitimidade.
E o golpe de Estado foi dado exatamente para a execução de tais reformas: trabalhista, previdenciária, terceirização, redução do Estado, com a venda das empresas públicas, impedir os gastos públicos por 20 anos etc.
E as forças econômicas, nacionais e estrangeiras, que estão por trás do presidente de fato Michel Temer e do seu sinistro ministro da Fazenda, o banqueiro Henrique Meirelles, farão tudo para que não haja retrocesso na execução do seu projeto, modelado pelo Consenso de Washington.
Falar em Constituição, agora, é que é uma grande ilusão.
As liberdades são relativas, como durante o regime militar, porém nem imprensa alternativa existe mais como naquele tempo. Toda a mídia repete o mesmo e o alvo é o ex-presidente Lula, com judiciário a condená-lo, sem provas, apenas para efeito de repercussão na imprensa e para desmoralizá-lo. Quanto mais ele cresce nas pesquisas mais me parece que as poderosas forças econômicas nacionais e estrangeiras, que sustentaram o golpe do impeachment da presidente Dilma Rousseff, tentarão tirá-lo de qualquer forma das eleições.
Tenho até dúvidas de que as eleições ocorrerão. Temer e demais cúmplices sabem que, ao descer a rampa do Planalto, sem imunidade, podem ser presos e enviado para a Papuda. A insatisfação no meio militar é enorme, conforme exprimiu o Antônio Olímpio Mourão. E teve toda razão o deputado Aldo Rebelo, do PC do B, quando recomendou o diálogo com os militares.
O proto-nazifascista Jair Bolsonaro não é representativo das Forças Armadas. É minoria.
A intervenção militar pode ocorrer. Como se desdobrará é difícil imaginar. O ideal seria que fosse como a do general Henrique Teixeira Lott em 1955. Mas não creio, em face do Congresso que aí está.
O importante é impedir que o patrimônio nacional – Eletrobrás, Eletronuclear, Petrobrás e pré-sal, bancos estatais – seja dilapidado, entregue aos gringos: é evitar que o desenvolvimento do Brasil, com a inclusão, não seja interrompido; é impedir a entrega aos gringos de uma parte da Amazônia maior que a Dinamarca.
Claro que não defendo regime de exceção, mas regime de exceção é o que já existe no Brasil, com um verniz de legalidade. O que ocorreu no Brasil, com a derrubada da presidenta Dilma, foi golpe de Estado, como, na Ucrânia, com a destituição do presidente Wiktor Yanukovytch, na madrugada de 21 para 22 de fevereiro de 2014, por uma decisão de um Congresso comprado.
A Constituição deixou de existir. Ilusão é pensar que, após realizar as reformas pretendidas pelo capital financeiro e o empresariado nacional, as forças que se apossaram do poder vão deixá-lo, sem ser por um golpe de força. E, infelizmente, as forças populares já demonstraram a sua impotência. A nada reagiram.
Não desejaria que ocorresse intervenção. Todos sabem como começa, mas não quando termina. Porém, não estou a ver outra perspectiva no Brasil. É necessário impedir o desmonte do Estado nacional. E há-de chegar um momento em que o impasse político, com o agravamento da situação econômica e social, terá de ser pela força.
Com afetuoso abraço, Moniz [Fim da carta]
segunda-feira, setembro 18, 2017
Berço de ouro, mentalidade autoritária: a “árvore genealógica” da Lava Jato
Professor da UFPR debate as conclusões de pesquisa realizada
pelo Núcleo de Estudos Paranaenses
Daniel Giovanaz
Brasil de Fato | Curitiba (PR)
10 de Agosto de 2017 às 09:03
Artigo descreve a trajetória do juiz Sérgio Moro (foto),
além de procuradores e delegados que atuaram na Lava Jato / Fábio Rodrigues
Pozzebom
Rafael Braga foi o único brasileiro preso nas manifestações
de junho de 2013. Negro, pobre e morador de favela, o ex-catador de material
reciclável foi condenado
a 11 anos e três meses de prisão pelo suposto porte de maconha,
cocaína e material explosivo. Quatro anos depois, não resta comprovado que,
naquele dia, Rafael levava consigo algo além de produtos de limpeza. Ele
continua preso, à espera de um novo julgamento.
Breno Borges, filho da desembargadora Tânia Borges, teve
melhor sorte. Flagrado no dia 8 de abril com 129 quilos de maconha e 270
munições, além de uma arma sem autorização, o jovem branco foi julgado e solto
em menos de uma semana. A mãe dele, presidenta do Tribunal Regional
Eleitoral do Mato Grosso do Sul, é investigada por favorecimento na libertação
do filho.
Os vínculos familiares são determinantes para se entender as
dinâmicas dos campos político e judiciário no Brasil. Professor do Departamento
de Ciência Política e Sociologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR),
Ricardo Costa de Oliveira afirma que a origem social dos indivíduos está
relacionada a uma série de privilégios, hábitos e visões de mundo
compartilhadas.
A última pesquisa dele foi publicada esta semana na revista
Núcleo de Estudos Paranaenses (NEP). O artigo “Prosopografia
familiar da operação Lava Jato e do ministério Temer” foi assinado em
conjunto com outros três pesquisadores: José Marciano Monteiro, Mônica Helena
Harrich Silva Goulart e Ana Christina Vanali.
De pai para filho
O texto apresenta uma biografia coletiva do juiz de primeira
instância Sérgio Moro, dos 14 membros da força-tarefa nomeados pela
Procuradoria-Geral da República e de oito delegados da Polícia Federal que
atuam no caso, além de ministros indicados pelo presidente golpista Michel
Temer (PMDB).
O aspecto mais relevante do artigo diz respeito aos vínculos
da operação Lava Jato com a elite econômica do Paraná. “Este seleto grupo de
indivíduos forma parte do 1% mais rico no Brasil, e muitos até mesmo do 0,1%
mais rico em termos de rendas”, descrevem os pesquisadores.
Políticos defensores da ditadura civil-militar e indivíduos
que atuaram no sistema de justiça durante o regime também aparecem na “árvore
genealógica” da Lava Jato. O procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, por
exemplo, é “filho do ex-deputado estadual da ARENA Osvaldo dos Santos Lima,
promotor, vice-prefeito em Apucarana e presidente da Assembleia Legislativa do
Paraná, em 1973, no auge da ditadura, quando as pessoas não podiam votar e nem
debater livremente”, segundo o texto. O pai de Carlos Fernando, assim como os
irmãos, Luiz José e Paulo Ovídio, também atuaram como procuradores no Paraná.
O professor Ricardo Costa de Oliveira conversou com a
reportagem do Brasil de Fato e debateu os resultados da
pesquisa. Confira os melhores momentos da entrevista:
Brasil de Fato - O que há em comum na biografia de todos
os personagens da operação Lava Jato analisados no artigo?
Ricardo Costa de Oliveira - Todos eles pertencem à alta
burocracia estatal. Há alguns, da magistratura ou do Ministério Público, que
ganham acima do teto [salarial do funcionalismo público, equivalente a R$ 33,7
mil por mês]. Com suas esposas e companheiras, eles estão situados no 0,1% mais
ricos do país.
Quase todos são casados com operadores políticos, ou do
Direito. Você só entende os nomes entendendo a família. É uma unidade familiar
que opera juridicamente, opera politicamente.
O juiz de primeira instância Sérgio Moro é um desses
exemplos?
O juiz Moro é filho de um professor universitário, mas
também é parente de um desembargador já falecido, o Hildebrando Moro. A mulher
do Moro, a Rosângela [Wolff], é advogada e prima do Rafael Greca de Macedo
[prefeito de Curitiba]. Ela pertence a essa importante família política e
jurídica do Paraná, que é o grande clã Macedo, e também é parente de dois desembargadores.
O artigo ressalta as coincidências entre a Lava Jato e o
caso Banestado [que investigou o envio ilegal de 28 bilhões de dólares ao
exterior]. Como isso ajuda a entender o papel da força-tarefa e do Judiciário
nas investigações sobre os contratos da Petrobras?
Boa parte deles também estiveram no [caso] Banestado. Foi
uma operação que desviou muito dinheiro e apresentou uma grande impunidade, ao
contrário de outros momentos. Até porque era outra conjuntura, outros atores
políticos que foram investigados.
O [procurador] Celso Tres era um dos maiores especialistas
nessas questões. Por que ele não foi convidado para entrar na Lava Jato? Porque
ele não tinha a homogeneidade político-ideológica que essa equipe tem. É uma
equipe que foi preparada para essa tarefa, não apenas jurídica, mas também
política - que na nossa leitura, é a perseguição, lawfare [“guerra
jurídica”] à esquerda, ao Partido dos Trabalhadores, ao ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva.
Em relação aos vínculos com a ditadura civil-militar
[1964-1985], quais foram as constatações mais relevantes da pesquisa?
Os operadores da Lava Jato, bem como os jovens ministros do
governo Temer, são de famílias políticas. E os pais trabalharam, defenderam,
reproduziram e atuaram na ditadura militar. Os filhos herdam a mesma
mentalidade autoritária, o elitismo, o ódio de classe contra o PT.
Como pertencem ao 1% mais rico, eles sempre tiveram uma vida
muito luxuosa e beneficiada [pelas condições econômicas]. Estudaram em escolas
de elite, vivem em ambientes luxuosos, estudaram Direito, depois fizeram
concursos, com muito sucesso. Quando você tem pais no sistema, você tem
facilidades.
Por que incluir na mesma pesquisa os operadores da Lava
Jato e os ministros nomeados por Michel Temer?
Há uma conexão, no sentido de que é a mesma ação política da
classe dominante. Eles operam em rede. Há uma coordenação.
Por isso que é uma prosopografia [biografia coletiva]. Eles
são originários da mesma classe social, do mesmo círculo social, e eles
transitam nos mesmos ambientes empresariais, elitizados.
O juiz Sérgio Moro, por exemplo: onde é que ele atua quando
está em público? Em grandes publicações da mídia dominante burguesa, quando ele
está muitas vezes abraçado, cumprimentando efusivamente os membros do golpe [de
2016]. Você vai ver um juiz ou um membro da Lava Jato num acampamento
sem-terra? Ou num órgão alternativo da mídia, num sindicato de trabalhadores de
categorias braçais e manuais? Jamais.
—–
Tudo em família
Coordenador da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol é
filho de outro procurador de Justiça, Agenor Dallagnol. O procurador Andrey
Borges de Mendonça, que também atua na operação, é irmão do procurador Yuri
Borges de Mendonça. Outro membro da força-tarefa, Diogo Castor de Mattos, é
filho de um ex-procurador de Justiça, Delivar Tadeu de Mattos. O tio de Diogo,
Belmiro Jobim Castor, foi secretário de Estado várias vezes no Paraná nos anos
1970 e 1980.
O escritório de advocacia Delivar de Mattos & Castor é
dos mais conhecidos do Paraná. Nele também atuam os irmãos Rodrigo Castor de
Mattos e Analice Castor de Mattos.
Os vínculos familiares de Gebran Neto
Amigo e admirador confesso de Sérgio Moro, João Pedro Gebran
Neto é um dos desembargadores da 8ª
Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). Ele será o relator
do processo conhecido como “caso triplex”, em segunda instância, cujo réu é o
ex-presidente Lula (PT).
Segundo pesquisa do professor Ricardo Costa de
Oliveira, o desembargador que atua no Rio Grande do Sul é filho de Antonio
Sebastião da Cunha Gebran e neto de João Pedro Gebran, ex-diretores-gerais da
Assembleia Legislativa do Paraná nos anos 1950 e 1970.
O casamento de João Pedro Gebran, em 1924, foi o
acontecimento que abriu as portas da família junto à classe dominante
paranaense. Foi quando eles passaram a ter relações com a antiga rede social e
política de sua esposa, Francisca Cunha, filha do coronel Francisco Cunha,
prefeito da Lapa na República Velha.
O avô do coronel Cunha era o comendador Manuel Antonio da
Cunha, primeiro prefeito da Lapa, em 1833, casado com a filha do 1º capitão-mor
da Lapa, o português Francisco Teixeira Coelho. Todas, famílias com origens
históricas no latifúndio escravista, aparentadas entre si - tais como a família
Braga, do ex-governador Ney Braga, e a família Lacerda, do ex-reitor e ministro
da Educação do início da ditadura, Flávio Suplicy de Lacerda.
Este material faz parte da cobertura especial da
operação Lava Jato. Clique
aqui para ter acesso a outros materiais produzidos sobre o tema.
Edição: Ednubia Ghisi
Entrevista importante do prof. Moniz Bandeira (que dá aulas na Alemanha) a O Cafezinho.
Para LER NA PÁGINA DO CAFEZINHO, reler e distribuir.
VV
VV
Veja aqui a entrevista do senhor: https://www.facebook.com/OCafezinho/videos/1567222769967517/?hc_ref=ARSr51sxy8r_Rvg6OQt4xjlyNsGUO_zjr6eobFPy_mkA9-L2OnXW0yOk1taAzazj4iY&pnref=story
www.facebook.com
Moniz Bandeira - A sociedade brasileira está narcotizada pela imprensa Por Wellington Calasans, Colunista do Cafezinho O cientista político e escritor Luiz Alberto Moniz Bandeira adverte a...
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Moniz Bandeira - A sociedade brasileira está narcotizada pela imprensa
Por Wellington Calasans, Colunista do Cafezinho
O cientista político e escritor Luiz Alberto Moniz Bandeira adverte a sociedade brasileira e os setores progressistas da política para a importância de abandonarem o preconceito contra as Forças Armadas. Para o cientista, somente uma intervenção militar para a transição democrática pode barrar o desmonte do Brasil e dos direitos históricos dos brasileiros.
Assista a entrevista, via Skype, com o professor Moniz, radicado na Alemanha. Compartilhe e recomende aos seus contatos.
Assista a entrevista, via Skype, com o professor Moniz, radicado na Alemanha. Compartilhe e recomende aos seus contatos.
Com a colaboração da leitora Camila Govedice, temos aqui a transcrição da entrevista:
Transcrita por Camila Govedice
quinta-feira, setembro 14, 2017
É muito GRAVE o que está acontecendo. A Direita Fascista está usando amplos setores da máquina pública no judiciário, na Polícia e Forças Armadas para criminalizar e prender quem não concorda com a sua visão de mundo. É preciso formar uma Frente Democrática que faça a denúncia internacional e exija o funcionamento das instituições dentro do marco da Democracia.
Um pouco depois, os militantes do MBL foram removidos dali, acompanhados por uma viatura que estava entre o Memorial e o Santander. Eles entraram na viatura tranquilamente e foram levados dali. Eu questionei alguns policiais sobre o que eles achavam de sua tropa, um serviço público do Estado, estar servindo a militantes do MBL, escoltando esses militantes e agredindo outros. Neste momento, recebi um spray de pimenta na cara, mas consegui desviar. Eu insisti na pergunta e um policial veio caminhando do meu lado e disse: “Tu não tá entendendo. A gente apoia eles, a gente apoia o MBL e eu ainda apoio o Bolsonaro pra acabar com pessoas como vocês”.
Sul21: Foi um policial do choque que disse isso?
Douglas Freitas: Não. Era um policial que estava de cinza, atrás da linha do choque, que foi quem escoltou os militantes do MBL até a viatura. Voltei para a Praça da Alfândega e o choque seguia se movimentando mais para a direção do Margs e acabou se postando em frente ao museu. Eu estava atrás da linha do choque e eles queriam que eu saísse dali. Insisti que estava fazendo o meu trabalho até que escutei uma ordem de alguém do batalhão de choque para alguns soldados, que acredito trabalharem ali pelo Centro, para que prendessem um morador de rua de camisa azul xadrez no meio da praça. Eles saíram correndo e eu fui atrás. Agarraram ele e colocaram no chão. Eu estava filmando e eles tentaram me agarrar. Consegui me desvencilhar e repeti que estava trabalhando. Eles arrastaram o morador de rua até a parte de trás da linha de choque.
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sábado, setembro 09, 2017
Lula fala sobre o preconceito de classes no Brasil. "Tem setores da classe média que pensam como se fossem ricos. Não aceitam que o filho da empregada esteja no banco da escola que o filho deles estão."
O ex-presidente concedeu entrevista ao jornalista Walter Santos, da Revista do Nordeste.