sexta-feira, outubro 14, 2016

As convicções e o fascismo

, por Mauro Santayana

por Mauro Santayana
Em seu site
(Revista do Brasil) - Os países, como as pessoas, precisam tomar cuidado com as suas convicções.
Convicções arraigadas, quando não nascem da informação, da razão, do conhecimento, costumam ser fruto do ódio, do preconceito e da ignorância.
Não é por acaso que entre as características do fascismo, a mais marcante está em colocar, furiosamente, a convicção acima da razão.
Foi por ter a forte convicção de que os judeus, os comunistas, os ciganos, os homossexuais, eram espécimes de diferentes raças sub-humanas, que os nazistas fizeram coisas extremamente "razoáveis", como guardar centenas, milhares de pênis e cérebros arrancados dos corpos de prisioneiros em vidros de formol, esquartejar pessoas para fazer sabão, adubar repolhos com cinzas de crematório, ou recortar e curtir pedaços de pele humana para colecionar tatuagens e fazer móveis e abajours, em um processo que começou justamente nos tribunais, com a gestação da jurisprudência racista e assassina das Leis de Nuremberg.
De tanta mentira, distorção,  hipocrisia, servidas - ou melhor, impostas, cotidianamente  - à população, nos últimos quatro anos, o Brasil tem se transformado, paulatinamente, em um país em que a realidade está sendo substituída por fantásticos  paradigmas, que são absorvidos e disseminados como as mais sagradas verdades, e adquirem rapidamente a condição de inabalável convicção na cabeça e nos corações de quem os adota, a priori, emocionalmente, sem checar, minimamente, sua veracidade ou sustentação.
Senão, vejamos:
Muitíssimas pessoas, no Brasil de hoje, têm convicção de que o PT quebrou o país.
Assim como têm convicção de que o Governo do Sr. Fernando Henrique Cardoso foi um tremendo sucesso do ponto de vista econômico, certo?
Errado.
Os números oficiais do Banco Mundial provam que o PIB  e a Renda per Capita em dólares recuaram no Governo do Sr. Fernando Henrique Cardoso, com relação ao de Itamar Franco (de 534 para 504 bilhões e de 3.426 para 2.810 dólares), e aumentaram mais de 300% no governo do PT, de 504 bilhões para 2.4 trilhões de dólares, e de 2.810 para 11.208 dólares, entre 2002 e 2014; com o salário mínimo subindo também mais de 300% em moeda norte-americana nesse período, de  88 para 308 dólares no ano passado, com um dólar nominal mais ou menos equivalente, que chegou a 4,00 reais tanto em 2002 como em 2015.
A queda atual da economia é um ponto fora de curva que irá se recuperar, mais cedo do que tarde, se não forem adotadas medidas recessivas, que mandem, mais uma vez, a vaca para o brejo. 
A maioria das pessoas - incluídos ministros do atual governo, que exageram os problemas,  para vender a sua "competência" e seus projetos, muitos deles ligados, direta e indiretamente à iniciativa privada - têm convicção que o Brasil está endividado até o pescoço, certo?
Errado.
Nona economia do mundo em 2016 - éramos a décima-quarta em 2002 - o Brasil ocupa, apenas, o quadragésimo lugar entre os países mais endividados do planeta.
Temos uma Dívida Pública Bruta com relação ao PIB (66%) mais baixa que a que tinhamos em 2002 (80%); e menor que a dos EUA (104%), Zona do Euro (Europa) (90%), Japão (220%), Alemanha (71.20%),  Inglaterra (89.20%), França (96,10%), Itália (132.70%), Canadá (91.50%).
Além de possuirmos mais reservas internacionais (370 bilhões de dólares) que qualquer uma dessas nações e de não estar devendo - somos credores do FMI - um centavo para o Fundo Monetário Internacional.
E, mesmo assim, ninguém fica fazendo, nesses países que citamos, o mesmo carnaval - verdadeiro massacre - que se faz aqui, com relação à questão da dívida pública.
Uma grande pilantragem midiática que ajuda a justificar, entre outras coisas, o absurdo teto de despesas públicas proposto pelo atual governo - que não existe em nenhum país desenvolvido e irá engessar e tolher o desenvolvimento nacional nos próximos 20 anos -   os juros pornográficos        que a nação paga, a cada 12  meses, aos bancos, e a privatização e entrega de empresas estatais brasileiras a países estrangeiros.
Muitas pessoas também aparentam ter desenvolvido a convicção, no Brasil de hoje, de que o PT é um partido que é contra as Forças Armadas, bolivariano e comunista, certo?
Errado.
O PT sempre trabalhou com o tripé capital estatal, capital privado nacional e capital estrangeiro,  e apoiou - a ponto de estar sendo execrado por isso - as maiores empresas privadas do país, e não apenas as de controle brasileiro - expandindo para elas o crédito subsidiado do BNDES, aumentando a oferta de crédito na economia, melhorando a situação do varejo e da indústria, fomentando a indústria automobilística, triplicando a produção e as vendas de caminhões, automóveis e equipamentos agrícolas, com linhas especiais de financiamento, e fortalecendo o agronegócio injetando bilhões de reais no Plano Safra, duplicando, praticamente, a colheita de grãos depois que chegou ao poder, sem atrapalhar o mercado financeiro, que teve forte expansão após 2002.
E, na área bélica, prestigiou o Exército, a Marinha e a Aeronáutica, lançando e bancando, por meio da adoção da Estratégia Nacional de Defesa, o maior programa de rearmamento das Forças Armadas na história brasileira.
Nem nos governos militares ousou-se investir, ao mesmo tempo, em tantos projetos estratégicos como se fez nos últimos anos, como é o caso do programa de construção de 36 caças-bombardeiros com a Suécia.
Ou o do submarino atômico - além de outros quatro, convencionais - como se está fazendo  em Itaguaí, no Rio de Janeiro, com parceria francesa.
Ou o da construção de mais de mil blindados multipropósito Guarani, em um único contrato, com a IVECO, com design e projeto de engenheiros do Exército Brasileiro.
Ou o do maior avião já construído no Brasil, o KC-390 da EMBRAER, produzido para substituir os Hércules C-130 norte-americanos, capaz de realizar missões também múltiplas, como o transporte de paraquedistas e blindados e o reabastecimento de outras aeronaves em voo.
Para não falar da família de radares SABER, dos novos mísseis da AVIBRAS, do programa Astros 2020, da nova família de rifles de assalto IA-2 da IMBEL, capaz de disparar 600 tiros por minuto, e de outros projetos como o do míssil ar-ar A-Darter desenvolvido por uma subsidiária da Odebrecht, com a Denel, sul-africana.
Da mesma forma, muitíssimas pessoas têm convicção,  nos dias de hoje, que o PT é o partido mais corrupto do Brasil, certo?
Errado.
Em ranking publicado pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral em 2012 - que, estranhamente, parou de publicar rankings anuais por partido depois disso - o PT aparece apenas em nono lugar, em uma lista encabeçada pelo DEM.
Na lista de 50 políticos investigados na Lava Jato que estão com processos no STF, cuja maioria pertence ao PP, só 6 nomes são do PT, e do total de 252 candidatos impugnados por serem ficha-suja nas eleições de 2014, por exemplo, apenas 20 são do Partido dos Trabalhadores.
Dados que não mudam em nada o fato de que o discurso anticorrupção, no Brasil de hoje, só existe na proporção que ocorre, porque pertence e serve, como bandeira, desde o início - na tradição golpista da UDN - à direita e à extrema direita em nosso país.
A esquerda, que costuma cair com facilidade nessa esparrela moral dos imorais, principalmente quando pretende utilizá-la, como seus adversários o fazem, como arma política, precisa tratar de outros temas, sem deixar - prudentemente - de colocar suas barbas de molho.
Como, por exemplo, o futuro do projeto nacional-desenvolvimentista brasileiro, com foco, principalmente, nas áreas social, científica, da educação, da indústria bélica, naval e de petróleo e de infraestrutura.
Ou a defesa da Democracia, do Estado de Direito e da Soberania Nacional, em tempos de risco - quase certeza, a depender do avanço da imbecilidade vigente -  de inserção subalterna do país em um processo de globalização que não deixará outras opções, a não ser o fortalecimento ou a capitulação. 
Tudo isso, no contexto do urgente estabelecimento de uma aliança que permita manter a estabilidade da República e evitar a vitória da Antipolítica com a ascensão do fascismo - em aliança com partidos conservadores tradicionais - à presidência da República em 2018.
É nesse país ridículo, mal informado, rasteiramente manipulado, por segmentos da mídia mendazes e deturpadores, que alguns procuradores do Ministério Público Federal vieram a público, há alguns dias, para dizer que tem "convicção" de que o ex-presidente Lula é o Chefe Supremo, o "Capo di tutti capi"   da corrupção nacional, neste Brasil "casto" e "ilibado", nunca dantes atingido - como diziam no Caso do "Mensalão", estão lembrados? - por semelhante tsunami antiético.
Que ele, que nunca teve contas no exterior, como, digamos, Eduardo Cunha ou Maluf, teria recebido "virtualmente", para o padrão de consumo de nossa impoluta elite, acostumada a apartamentos em Paris, Miami e Higienópolis, um modesto apartamento de 215 metros quadrados, de cooperativa - no qual nunca dormiu e do qual não sem tem notícia de escritura em seu nome.
Além de um sitiozinho mambembe, até mesmo para o gosto de nossa pseudo classe média paneleira, que também não está em seu nome.
E de uma ajuda para a guarda de seus documentos presidenciais - de inestimável valor histórico, por abarcarem oito anos de história nacional - tudo isso apresentado como a parte do leão, do "Pai", do "Comandante", de um suposto esquema de propina que o mesmo MPF afirma - ainda sem provas cabais - ter movimentado a extraordinária soma de 42 bilhões de reais em desvios da Petrobras (antes eram 6 bilhões, segundo "impecável" "auditoria" da "competentíssima", jamais multada, "honestíssima", "imparcialíssima", consultoria norte-americana Price Watherhouse).
Cinismo por cinismo, poderíamos dizer que, na hipótese, difícil de provar, que tivesse recebido os alegados 3.7 milhões em propina pelos quais foi acusado, em um negócio de mais de 40 bilhões, Lula seria o mais "ingênuo" senão um dos mais "modestos", políticos brasileiros, considerando-se a quantidade de empregos, negócios, projetos, obras, programas, que ajudou a proporcionar à economia nacional nos anos em que esteve à frente da Presidência da República.
E o PT, que teria pedido apenas miseráveis 5 milhões de reais para pagar contas atrasadas devidas a publicitários, em um  contrato de aproximadamente 1 bilhão de dólares para a construção de duas plataformas de petróleo pela empresa do Senhor Eike Batista - um sujeito que resolveu depor "espontaneamente", depois de ter recebido bilhões do BNDES, durante anos, em apoio às suas empresas falidas - teria sido, diante das franciscanas proporções da solicitação, de uma tacanhice digna de fazer corar outras legendas e personagens do espectro político nacional.
Ora, nos poupem.
Ninguém está aqui para santificar o Partido dos Trabalhadores ou o Sr Luís Inácio Lula da Silva, que, se tiver cometido algum crime, deve purgá-lo - respeitada sua condição de réu primário - na mesma proporção de seus erros.
O que nos indigna e nos tira do sério, trabalhando na área em que trabalhamos, é a desfaçatez, a caradurice, a hipocrisia institucionalizada, com que estão tratando a verdade,  a maior vítima desse atual "surto" de "convicções" brasileiro. 
Não nos venham com estórias da Carochinha  e mirabolantes apresentações que vão ridicularizar, pelo exagero, ausência de lógica, de proporcionalidade, razoabilidade e verossimilhança - como já mostram as matérias e editoriais dos jornais estrangeiros - o Ministério Público e o Judiciário brasileiros junto à opinião pública internacional.
Correndo o risco, seus "convictos" acusadores, de verem o tiro sair pela culatra, transformando Lula em uma espécie de símbolo, ou de herói, se for impedido de concorrer à presidência da República.
Ou em um mártir - caso alguma coisa ocorra a ele, eventualmente, na prisão - para boa parte do planeta.

quinta-feira, outubro 13, 2016

CRIANÇA FELIZ E COMBATIVA. SEGURA ESSA VICE GOLPISTA...

Mídia Ninja RN adicionou um novo vídeo.
"Agora imagina você, pobre, que não tem direito a estudar Filosofia e Sociologia, nem Artes, passar no Enem. Você não passa. Sabe quem passa? Quem tem dinheiro para pagar. Sabe por que eles têm medo de estudante que vai para a rua? Porque o governo quer máquinas. Máquinas programadas para obedecer a eles".
Maria Deusdédite da Silva Neta, aluna do 3°ano do curso de eletrotécnica do IFRN - Campus João Câmara, representante do Grêmio Estudantil Francisca Alves -GEFA
O VÍDEO É IMPERDÍVEL:
https://www.facebook.com/midianinjaRN/videos/1172598969452662/

segunda-feira, outubro 10, 2016

terça-feira, outubro 04, 2016

É a Globo estúpido!

A tragédia brasileira. 
Um bico de Luz, 
a máquina de costura 
e a TV ligada na Globo. 


O Império contra-ataca




Há uma década, governos de esquerda, desafiando Washington e as corporações globais, assumiram o poder no Brasil, Argentina, Paraguai, Venezuela, Uruguai, Bolívia e Equador. Parecia que a maré estivesse virando, na América Latina. A interferência por Washington e a exploração por corporações internacionais, talvez afinal pudessem ser derrotadas. Governos latino-americanos, com governantes carismáticos como Hugo Chávez na Venezuela, Luiz Inácio Lula da Silva no Brasil, Evo Morales na Bolívia e Rafael Correa no Equador, tiveram enormes vitórias eleitorais. Instituíram reformas socialistas que beneficiaram os mais pobres e a classe trabalhadora. Recusaram-se ao papel de fantoches dos EUA. Assumiram o controle dos recursos de suas próprias nações e do próprio destino. Foram a primeira revolta bem-sucedida contra o
neoliberalismo e a dominação pelas grandes empresas e bancos. Foi uma revolta que muitos norte-americanos sempre esperaram ver acontecer também aqui nos EUA.

Mas os movimentos e governos na América Latina tornaram-se presas das obscuras forças do imperialismo norte-americano e da ira e do poder dos empresários. Os truques que tantas vezes Washington e seus aliados empresários e banqueiros usaram estavam de volta – propaganda negra, manipulação dos veículos comunicação, na chamada "mídia"; suborno e corrupção de agentes do estado e políticos, generais, polícia, líderes sindicais e jornalistas; os golpes de Estado dentro dos Parlamentos nacionais; o estrangulamento econômico; o enxovalhamento de reputações de líderes democraticamente eleitos; a criminalização da esquerda; e o uso de esquadrões da morte para silenciar e fazer sumir os que lutassem em defesa dos mais fracos. É o mesmo velho jogo, o mesmo jogo sujo.

O presidente Correa, que ganhou o ódio eterno de Washington por ter garantido asilo político a
Julian Assange já há quatro anos, e por ter fechado a base aérea-militar de Manta em 2009, alertou recentemente que está em marcha uma nova versão da Operação Condor, na América Latina.

Operação Condor, que existiu nos anos 1970s e ’80s, é causa de torturas, assassinatos e do sumiço de milhares de organizadores sociais, líderes comunitários, estudantes, ativistas, políticos, diplomatas, líderes religiosos, jornalistas e artistas. Os chefes de inteligência de regimes da direita na Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai, Uruguai e, depois, no Brasil, supervisionavam campanhas de terror. Recebiam fundos dos EUA e apoio logístico e treinamento da CIA. Liberdade de imprensa, de organização, todas as formas do protesto pela via artística e de oposição política foram proibidas. Num esforço coordenado, esses regimes destroçaram, com brutalidade, todos os movimentos de esquerda em toda a América Latina. Só na Argentina, houve 30 mil desaparecidos.

A América Latina parece a caminho de ser novamente lançada num período de controle ditatorial e de exploração nua e crua pelas empresas em geral e pelos bancos em especial. Os governos de Equador, Bolívia e Venezuela, que está á beira do colapso, têm tido de enfrentar sucessivas tentativas de golpes de direita e enfrentam sabotagem econômica.

No Brasil, o Senado depôs por impeachment sem crime e sem prova alguma de qualquer malfeito, a presidenta democraticamente eleita Dilma Rousseff.

Na Argentina, o novo presidente, Mauricio Macri, de direita, posto no poder pelos grandes hedge funds norte-americanos, imediatamente pagou seus benfeitores sob a forma de $4,65 bilhões entregues a quatro hedge funds, inclusive o Elliott Management, presidido pelo bilionário Paul Singer. O
pagamento aos hedge funds que haviam comprado a dívida argentina por centavos de dólar, significou ganho, para a empresa de Singer, de 2,4 bilhões, quantia 10-15 vezes maior que o investimento original. Antes disso, o governo de Cristina Fernández de Kirchner havia resistido, inclusive em tribunais internacionais, contra pagar o que os hedge funds, que ela chamava de "fundos abutres", reclamavam.

Entrevistei o ministro Guillaume Long, de Relações Exteriores e Mobilidade Humana do Equador, semana passada, para meu programa "On Contact".

Long, que é doutor pelo Institute for the Study of the Americas da Universidade de Londres, sugeriu à ONU que crie uma agência reguladora global de impostos. Disse que uma agência desse tipo poderia forçar corporações sonegadoras de impostos – que o FMI estima que custem aos países desenvolvidos mais de $200 bilhões ao ano, de impostos não pagos –, a pagarem aos países pelos recursos naturais que extraem e pelas perdas nacionais resultantes de negócios, quase sempre secretos, entre as grandes empresas e bancos. Também requereu à ONU a abolição completa dos chamados "paraísos fiscais", que há em vários países.

Há muito tempo se sabe que as políticas econômicas neoliberais dos anos 1980s e ’90s foram profundamente destrutivas na América Latina. Até controles econômicos muito débeis foram abandonados em nome do 'livre comércio' e da desregulação. Corporações internacionais e bancos receberam licença para operar livremente. "Essa desregulação, em ambiente já desregulado" resultou em anarquia, disse o ministro Long. "Os poderosos praticamente já não tinham qualquer controle ou quaisquer contrapesos que moderassem os seus poderes."

"O neoliberalismo é ruim, em praticamente todos os contextos", disse Long, quando conversamos em New York. "Foi ruim na Europa, tem sido ruim em outras partes do mundo. Desmantelou o Estado de Bem-estar. No contexto no qual já há estado fraco, onde as instituições não são consolidadas, onde há acentuados remanescentes feudais, como na América Latina, onde você realmente não tem contrato social forte com as instituições, com a modernidade, o neoliberalismo só faz esfacelar qualquer tipo de pacto social que haja. Sempre significa mais pobreza, mais desigualdade, enormes ondas de instabilidade."

Os países viram os serviços básicos, muitos já insuficientes e inadequados, reduzidos ou eliminados em nome de uma suposta 'austeridade'. As elites acumularam fortunas, ao tempo em que praticamente todos em volta mergulharam na miséria econômica. A paisagem política e econômica tornou-se instável. O Equador teve sete presidentes entre 1996 e 2006, ano em que Correa foi eleito. Em 1999, sofreu massiva crise bancária. Em desespero, Correa trocou a moeda nacional, que passou a ser o dólar norte-americano. O caos no Equador repetia-se na Bolívia e na Argentina. Em 1998, a Argentina entrou em depressão, que fez a economia encolher 28%. Mais de 50% dos argentinos foram empurrados para a miséria.

"A América Latina", disse Long, "chegou ao fundo do poço".

E foi desse fracasso generalizado do neoliberalismo, que a esquerda reagrupou-se e chegou ao poder.

"Os povos se relocalizaram, retomaram o pé da própria história, depois daquela crise avassaladora" – Long analisa. – "E decidiram reconstruir as próprias sociedades e combater contra o intervencionismo estrangeiro. Digo, mesmo, lutar contra o imperialismo. Ainda hoje, a principal questão é a desigualdade. A América Latina talvez não seja o continente mais pobre do mundo. Mas com certeza é o continente mais desigual em todo o mundo."

"O Equador produz petróleo" – continua o ministro Long. – "Produzimos 530 mil barris/dia. Recebíamos 20% a título de royalties, das multinacionais que extraem o petróleo. Hoje é o contrário. Pagamos uma taxa às multinacionais, pela extração, mas o petróleo é nosso. Tivemos de renegociar todos os nossos contratos de petróleo em 2008 e 2009. Algumas multinacionais recusaram-se a aceitar as novas regras, e deixaram o país. Nesses casos, nossa empresa estatal de petróleo entrou e ocupou os poços. Mas a maioria das multinacionais aceitaram. Pensaram "OK, podemos aceitar. Ainda assim é negócio lucrativo". Quero dizer, hoje as coisas são muito diferentes. Pagamos empresas privadas para extrair o petróleo, mas o petróleo é nosso. Nós o negociamos."

Long admitiu que houve graves revezes, mas insistiu que a esquerda não está quebrada.

"Depende de como você afere o sucesso" – disse o ministro. – "Se você o mede em termos de longevidade, e do tempo ao longo do qual esses governos permaneceram no poder – no caso do Equador, ainda estamos no poder e, claro, vamos vencer as eleições de fevereiro de 2017 –, nesse caso é coisa de, na Venezuela, mais ou menos 17 anos [que o governo de esquerda permanece no poder]; no Equador, agora, dez anos; na Argentina e no Brasil, são [ou foram] 13 anos."

"Uma das críticas que se fazem à esquerda é que são bem-intencionados, gente boa, com boas ideias, mas não os ponham no governo, porque o país explode," – disse Long. – "Mas no Equador tivemos crescimento realmente pujante, de 5 a 10% ao ano. Tivemos muitos excelentes indicadores econômicos. Diversificamos nossa economia. Mudamos, de importar, como antes, 80% de energia, para sermos hoje exportadores líquidos de eletricidade. Fizemos uma grande reforma na educação, na educação superior. Muitas coisas que são economicamente bem-sucedidas. A ortodoxia econômica neoliberal não colheu sucesso algum na década passada."

Long concedeu que seu governo, sim, fez inimigos poderosíssimos, não só por ter garantido asilo político a Assange em sua embaixada em Londres, mas também porque processou a Chevron Texaco, tentando que pagassem pelo dano massivo que a empresa provocou na Amazônia equatorial, quando a empresa perfurava ali, do início anos 1960 até que se retirou, em 1992. Deixou para trás cerca de 1.000 poços de dejetos tóxicos. Os vazamentos, no total, equivaliam a 85 vezes o vazamento provocado pela British Petroleum no Golfo do México, e a 18 vezes o vazamento do
Exxon Valdez. Um tribunal equatoriano ordenou que a Chevron Texaco pagasse $18,2 bilhões pelos danos, quantia posteriormente reduzida a $9,5 bilhões. Mas a petroleira recusou-se a pagar. O Equador recorreu a tribunais internacionais, para tentar arrancar deles o dinheiro.

Long disse que a diferença entre os vazamentos massivos em outras partes do mundo e o que houve no Equador é que, no Equador, não houve acidente. "[Os vazamentos no Equador] foram deliberados, um meio para tentarem cortar custos. Estavam lá no meio da Amazônia... Normalmente, o que se faz é extrair o petróleo e usam-se aquelas membranas de proteção, para impedir que o óleo se infiltre no solo. Não usaram as tais membranas. O petróleo chegou aos sistemas de água.
E poluiu todo o sistema do rio Amazonas. Criaram um gigantesco problema sanitário e de saúde pública. Detectou-se aumento no número de casos de câncer."

Long diz que evidentemente o seu governo sabia que a empresa Chevron Texaco tinha [e tem] "muito poder de lobbying nos EUA, em Wall Street, em Washington."

"Há muita coisa que não vemos" – disse ele da campanha para desestabilizar seu governo e outros governos de esquerda. "Benefícios que poderíamos colher, investimentos que não vêm, porque tivemos ação soberana, de preservar nossa soberania. No caso de [o Equador fechar a base aérea militar dos EUA em] Manta, gostamos de pensar que o governo dos EUA compreendeu, e tudo bem. Mas foi movimento pensado e definitivo. Dissemos 'acabou'. Inscrevemos em nossa Constituição, na nova Constituição, de 2008. Foi momento muito vibrante de nossa história. Criamos novas regras do jogo. A Constituição do Equador, hoje, é das mais progressistas do mundo. Declaramos os direitos da natureza. A nossa é a única constituição que declara os direitos da natureza, não apenas os direitos do homem. O território do Equador foi declarado livre de bases militares estrangeiras. Não havia outro modo: era isso ou isso. Mas há consequências para todas e quaisquer ações."

Uma dessas consequências foi uma tentativa abortada de golpe, em setembro de 2010, por membros da Polícia Nacional Equatoriana. Foi contida por força militar. Long acusou muitas das ONGs ocidentais que operam no Equador e em toda a região, de serem conduítes de dinheiro para os partidos de direita. Oficiais militares e da Polícia há muito tempo estão na folha de pagamento da CIA em toda a América Latina. Em 2008, o presidente Correa demitiu seu ministro da Defesa, o chefe da inteligência do Exército, vários comandantes do Exército e da Força Aérea e chefes do Estado-maior, sob a acusação de que os sistemas de inteligência do Equador estavam "completamente infiltrados e subjugados pela CIA."

"Há uma conspiração internacional em andamento agora, nesse momento, contra alguns governos progressistas" – disse o ministro Long. "Houve uns poucos revezes eleitorais na Argentina, e a Venezuela está em situação difícil. A mídia dá a tudo um tom especial, mas, sim, não há dúvidas de que a Venezuela enfrenta problemas graves. Há uma tentativa em curso para tirar o máximo possível da queda dos preços de algumas commodities, para criar caos social e derrubar governos. Já vimos um golpe parlamentar no Brasil. [A presidenta Rousseff] foi eleita com 54 milhões de votos. O Partido dos Trabalhadores, no Brasil [esteve] no poder durante 13 anos. O único modo que [a direita brasileira] tinha para tirar do governo os eleitos, era o golpe. Pelo voto universal não conseguiriam eleger-se."

Long disse que até com os revezes políticos que a direita sofreu, será difícil para os golpistas reinstituir políticas estritamente neoliberais.

"Há um campo político forte, disputado ainda pela direita tradicional e uma esquerda radical" – diz ele. – "Há uma esquerda radical que já provou que sabe reduzir a pobreza e a reduz, que sabe fazer e pode reduzir a desigualdade, que pode comandar a economia. Já há novos quadros com experiência de governo, ministros e pessoas que realmente assumiram responsabilidades de governar com a esquerda. Não há dúvidas de que, mais cedo ou mais tarde esses governos progressistas estarão novamente no poder."

Os Leviatãs empresariais e as agências imperialistas que trabalham a serviço deles estão novamente tentando reformatar a América Latina, para fazer do continente um paraíso para a exploração comercial empresarial. É a eterna história da luta do fraco contra o forte, do pobre contra o rico, do sem poder contra o poderoso, e dos que querem a própria autonomia, contra as forças do imperialismo.

"Não há limites nessa luta até a morte" – disse
Ernesto "Che" Guevara. "Não podemos ser indiferentes ao que acontece em qualquer canto do mundo, porque a vitória de qualquer país contra o imperialismo é vitória nossa; assim como a derrota de qualquer país, nessa mesma luta, é derrota de todos."*****