sexta-feira, agosto 29, 2008
FHC foi apenas um bocó?
A corrupção planejada
Os teóricos da moeda e os operadores das privatizações fecharam o círculo para o assalto ao Estado, com apoio decisivo do então presidente FHC, aquele que se definiu como “mais inteligente do que vaidoso”
Por Mauro Santayana
A privatização do Estado era coisa de amadores. Passou a ser negócio organizado, com planejamento técnico e jurídico, quando alguns jovens “gênios” das finanças foram convocados pelo senhor Fernando Henrique Cardoso, a fim de criar o Plano Real, a partir do Plano Schacht, da Alemanha dos anos 20. Eles perceberam, na reforma monetária, a sua oportunidade de ascensão ao mundo dos grandes negócios. E se uniram a Daniel Dantas, protegido do senhor Antonio Carlos Magalhães – o poderoso e temido senador –, que criaria, no mesmo ano de 1994, o instrumento adequado: o Fundo Opportunity. Contavam com forte bancada no Congresso constituída dos representantes dos bancos, do agronegócio e das multinacionais, todos interessados nas reformas constitucionais que favorecessem as privatizações. Ao mesmo tempo criaram outras instituições para atuar no mercado de capitais e no programa de privatizações, que cresceram em meses, graças às informações privilegiadas de que dispunham como mentores da política econômica e financeira.
Os teóricos da moeda e os operadores das privatizações fecharam, dessa forma, o círculo para o assalto ao Estado. Os dois grupos contavam com o apoio decidido do então presidente da República. Alguns que o conhecem de perto acham que se deixou perder pela vaidade. Uma das gravações divulgadas pelos meios de comunicação – e não desmentidas – mostra como eles sabiam envolvê-lo. O consórcio comprador que pretendiam favorecer – em que se encontrava Daniel Dantas e seu Opportunity – dependia da Previ, o fundo de pensões dos funcionários do Banco do Brasil. Mas a Previ tinha as suas razões para desconfiar do grupo. Era preciso quebrar as resistências. O então presidente do BNDES, André Lara Resende, telefona a Fernando Henrique:
ALR – Então, o que nós precisaríamos é o seguinte: com o grupo do Opportunity, nós até poderíamos turbiná-lo, via BNDES-Par. Mas o ideal é que a Previ entre com eles lá./ FHC – Com o Opportunity?/ ALR – Com o Opportunity e os italianos./ FHC – Certo./ ALR – Perfeito? Porque aí esse grupo está perfeito./ FHC – Mas e por que não faz isso?/ ALR – Porque a Previ tá, tá do outro lado./ FHC – A Previ?/ ALR – Exatamente. Inclusive com o Banco do Brasil, que ia entrar com a seguradora etc., que diz ‘não, isso aí é uma seguradora privada porque...’/ FHC – Não./ ALR – Então, é muito chato./ FHC – Muito chato./ ALR – Olha, quase.../ FHC – Cheira a manobra perigosa./ ALR – Mas é quase explícito./ FHC – Eu acho./ ALR – Quase explícito./ FHC – Eu acho./ ALR – Então, nós vamos ter uma reunião aqui, estive falando com o Luiz Carlos, tem uma reunião hoje aqui às 6h30. Vem aqui aquele pessoal do Banco do Brasil, o Luiz Carlos etc. Agora, se precisarmos de uma certa pressão.../ FHC – Não tenha dúvida./ ALR – A idéia é que podemos usá-lo aí para isso./ FHC – Não tenha dúvida.
Não tiveram dúvida. Iniciou-se a partir daí, com a aprovação do presidente, a liquidação dos bens do Estado, sem levar em conta as leis anteriores nem as regras elementares de licitude administrativa e de ética. Ao falar no Senado sobre o processo de privatizações, o ministro encarregado Luiz Carlos Mendonça de Barros disse que a situação era sui generis e, portanto, não estava sujeita a regras anteriores. O grande negócio de Daniel Dantas – o da participação na telefonia, com menos de 1% dos capitais envolvidos – só foi possível com o dinheiro dos fundos de pensão das empresas estatais.
Segundo as investigações da Polícia Federal, o Opportunity conseguiu envolver nas teias de seus interesses homens com respeitáveis biografias, como ex-militantes de esquerda e conhecidos acadêmicos. Entre esses, contratou, como seu advogado nos Estados Unidos, por US$ 2 milhões, o senhor Mangabeira Unger. Além disso, montou seu sistema de espionagem, ao contratar a Kroll, que chegou a monitorar até mesmo o gabinete presidencial.
Enfim, como todos deviam saber, o mundo se divide entre os capitalistas e os trabalhadores. Os capitalistas sempre se unem. Os trabalhadores, nem sempre.
http://www.revistadobrasil.net/ponto_de_vista.htm
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quinta-feira, agosto 28, 2008
O Estadão é o pior jornal do mundo
Lá abaixo, assinada pelo O Estado de S.Paulo, é exatamente a notícia que DES-democratiza e não nos interessa. Lida grátis, já seria ruim. Paga... nem se fala!
A notícia que nos interessa deve ter mais ou menos a cara que aí vai. [Adiante]
Enquanto ninguém escrever notícias que interessem à democracia, mais do que ao Estadão, ninguém conseguirá VER que o Estadão é o pior jornal do mundo.
Nem Mein Kampf, editado como jornal, seria mais daninho à democracia, do que o Estadão. E há gente que paga pra ler esta piração DES-jornalística do Estadão! Só rindo!
Aí vai a tentativa que fizemos cá na Vila Vudu (tomando cerveja e dando risada). 8-)
>>>
Evo Morales opta por não cobrir de (muita) porrada (muita, mas muita mesmo, que bem merecem!), alguns fascistas juniores que tentaram agredir o presidente da República com paus e pedras, e impedir que seu helicóptero pousasse
[a Agência pode ser qquer uma, desde que NÃO SEJA a Agência Estado]
LA PAZ - O presidente da Bolívia, Evo Morales, tem alto índice de aprovação, dentre outros motivos porque sabe não entrar em provocações de fascistas em geral e, em especial, não entra em provocações de fascistas juniores. Um grupo destes fascistas juniores bolivianos, armados com paus e pedras, tentaram agredir o presidente da República e impedir que o helicóptero pousasse.
Os fascistas juniores bolivianos sabem que SEMPRE podem contar com os fascistas seniores de O Estado de S.Paulo, que sempre publicam, das notícias, a versão mas desdemocratizatória e fascistizante que consigam.
Então, um grupo de fascistas juniores (provavelmente mercenários, pagos por gente mais fascista-atrevida do que eles -- alguma CIA, talvez, ou, mesmo, quem sabe, o editor-chefe de O Estado de S.Paulo, ou, mesmo, Dona Dora Kramer em pessoa, ou a D. Danuza, ou a mãe) -- ocuparam cenograficamente um aeroporto de selva, no qual o helicóptero do presidente Evo Morales teria de pousar para abastecer no estado boliviano de Beni.
Não se sabe e O Estado de S.Paulo NÃO INVESTIGOU nem noticiou as vias pelas quais aqueles canalhas-lá sabiam que o presidente pousaria ali durante a madrugada.
"Dado que o presidente Evo ordenou que os fascistas juniores do estado de Beni não fossem nem presos nem cobertos de porradas (muita porrada!), a melhor solução foi ir por terra até Guajará-Mirim (no Brasil), porque a pista oferecia todas as garantias e daí nos recolheu um avião", explicou o ministro de Hidrocarbonetos, Carlos Villegas à rádio Erbol.
Um funcionário do consulado brasileiro em La Paz participou da operação. É mais um motivo para que o Brasil muito se orgulhe de seus diplomatas na gestão Celso Amorim, quando já nenhum diplomata brasileiro rasteja em aeroportos e descalço, e pode, portanto, oferecer auxílio a um presidente latino-americano que, diferente dos sabujos de antes está decidido a encerrar o período das TOTAIS arbitrariedades, e período do qual O Estado de S.Paulo moooooooooooooooooooooooorre de saudades.
Evo chegou a La Paz à meia-noite de ontem. E os fascistas juniores do estado boliviano de Beni tiveram de meter o rabo entre as pernas. O que é deles, tá guardado. O que é do Estadão, também.
O presidente Evo Morales foi ratificado no cargo com 67,4% dos votos, em plebiscito realizado no dia 10 de agosto. Há 32,6% de gente, na Bolívia, que não quer a democracia.
É ótimo sinal, que os que não querem a democracia sejam menos de 1/3, porque, há pouco tempo, havia 100% de gente aos quais ninguém perguntava sobre desejos políticos e os 0% restantes mandavam e desmandavam na Bolívia -- e O Estado de S.Paulo nunca reclamou e achava ótimo.
A oposição boliviana continuará tentando golpes e o Estadão continuará a apoiar todas as tentativas de golpe. Felizmente, hoje, O Estadão já está obrigado a apoiar tentativas de golpes tentadas por fascistas juniores, porque os fascistas seniores que O Estado de São Paulo sempre apoiou já foram varridos para a lata do lixo (boliviana) da história (boliviana), igualzinho lá, como cá. E foram varridos por votos democráticos, em eleições legais, legítimas e perfeitas, o que O Estadão não engole e D. Dora Kramer é contra.
E, sim, o texto aprovado em plebiscito, os votos e o plebiscito manifestam, é claro, não todos, mas a maioria democrática dos bolivianos.
>>>
Manifestantes obrigam Evo a usar aeroporto do Brasil
AE-AP - Agencia Estado
LA PAZ - O presidente da Bolívia, Evo Morales, pode ter um alto índice de aprovação. Porém manifestantes literalmente forçaram que o líder deixasse o país por algum tempo. Evo teve que cruzar a fronteira com o Brasil para poder chegar a La Paz, na noite de ontem. O motivo foi o assédio de manifestantes, que tomaram um aeroporto no departamento (Estado) de Beni. "A melhor solução foi ir por terra até Guajará-Mirim (no Brasil), porque a pista oferecia todas as garantias e daí nos recolheu um avião", explicou o ministro de Hidrocarbonetos, Carlos Villegas à rádio Erbol.O helicóptero em que o presidente viajaria até La Paz não conseguiu aterrissar em Guayamerín para reabastecer. Havia na pista um grupo de jovens com paus de pedras, informou . A aeronave que levaria o presidente para La Paz o encontrou em Cachuela Esperanza, vizinha a Guayaramerín. Um funcionário do consulado brasileiro em La Paz participou da operação. Evo chegou a La Paz à meia-noite de ontem. O presidente foi ratificado no cargo com 67,4% dos votos, em um plebiscito revogatório realizado no dia 10 de agosto. Apesar disso, Evo enfrenta uma forte rejeição em regiões dominadas por líderes oposicionistas. A oposição protesta contra um projeto constitucional apoiado pelo presidente, porque considera que o texto não representa todos os bolivianos.
http://www.estadao.com.br/internacional/not_int232379,0.htm
E se o Estadão fosse atacado com paus e pedras???
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A notícia que nos interessa deve ter mais ou menos a cara que aí vai. [Adiante]
Enquanto ninguém escrever notícias que interessem à democracia, mais do que ao Estadão, ninguém conseguirá VER que o Estadão é o pior jornal do mundo.
Nem Mein Kampf, editado como jornal, seria mais daninho à democracia, do que o Estadão. E há gente que paga pra ler esta piração DES-jornalística do Estadão! Só rindo!
Aí vai a tentativa que fizemos cá na Vila Vudu (tomando cerveja e dando risada). 8-)
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Evo Morales opta por não cobrir de (muita) porrada (muita, mas muita mesmo, que bem merecem!), alguns fascistas juniores que tentaram agredir o presidente da República com paus e pedras, e impedir que seu helicóptero pousasse
[a Agência pode ser qquer uma, desde que NÃO SEJA a Agência Estado]
LA PAZ - O presidente da Bolívia, Evo Morales, tem alto índice de aprovação, dentre outros motivos porque sabe não entrar em provocações de fascistas em geral e, em especial, não entra em provocações de fascistas juniores. Um grupo destes fascistas juniores bolivianos, armados com paus e pedras, tentaram agredir o presidente da República e impedir que o helicóptero pousasse.
Os fascistas juniores bolivianos sabem que SEMPRE podem contar com os fascistas seniores de O Estado de S.Paulo, que sempre publicam, das notícias, a versão mas desdemocratizatória e fascistizante que consigam.
Então, um grupo de fascistas juniores (provavelmente mercenários, pagos por gente mais fascista-atrevida do que eles -- alguma CIA, talvez, ou, mesmo, quem sabe, o editor-chefe de O Estado de S.Paulo, ou, mesmo, Dona Dora Kramer em pessoa, ou a D. Danuza, ou a mãe) -- ocuparam cenograficamente um aeroporto de selva, no qual o helicóptero do presidente Evo Morales teria de pousar para abastecer no estado boliviano de Beni.
Não se sabe e O Estado de S.Paulo NÃO INVESTIGOU nem noticiou as vias pelas quais aqueles canalhas-lá sabiam que o presidente pousaria ali durante a madrugada.
"Dado que o presidente Evo ordenou que os fascistas juniores do estado de Beni não fossem nem presos nem cobertos de porradas (muita porrada!), a melhor solução foi ir por terra até Guajará-Mirim (no Brasil), porque a pista oferecia todas as garantias e daí nos recolheu um avião", explicou o ministro de Hidrocarbonetos, Carlos Villegas à rádio Erbol.
Um funcionário do consulado brasileiro em La Paz participou da operação. É mais um motivo para que o Brasil muito se orgulhe de seus diplomatas na gestão Celso Amorim, quando já nenhum diplomata brasileiro rasteja em aeroportos e descalço, e pode, portanto, oferecer auxílio a um presidente latino-americano que, diferente dos sabujos de antes está decidido a encerrar o período das TOTAIS arbitrariedades, e período do qual O Estado de S.Paulo moooooooooooooooooooooooorre de saudades.
Evo chegou a La Paz à meia-noite de ontem. E os fascistas juniores do estado boliviano de Beni tiveram de meter o rabo entre as pernas. O que é deles, tá guardado. O que é do Estadão, também.
O presidente Evo Morales foi ratificado no cargo com 67,4% dos votos, em plebiscito realizado no dia 10 de agosto. Há 32,6% de gente, na Bolívia, que não quer a democracia.
É ótimo sinal, que os que não querem a democracia sejam menos de 1/3, porque, há pouco tempo, havia 100% de gente aos quais ninguém perguntava sobre desejos políticos e os 0% restantes mandavam e desmandavam na Bolívia -- e O Estado de S.Paulo nunca reclamou e achava ótimo.
A oposição boliviana continuará tentando golpes e o Estadão continuará a apoiar todas as tentativas de golpe. Felizmente, hoje, O Estadão já está obrigado a apoiar tentativas de golpes tentadas por fascistas juniores, porque os fascistas seniores que O Estado de São Paulo sempre apoiou já foram varridos para a lata do lixo (boliviana) da história (boliviana), igualzinho lá, como cá. E foram varridos por votos democráticos, em eleições legais, legítimas e perfeitas, o que O Estadão não engole e D. Dora Kramer é contra.
E, sim, o texto aprovado em plebiscito, os votos e o plebiscito manifestam, é claro, não todos, mas a maioria democrática dos bolivianos.
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Manifestantes obrigam Evo a usar aeroporto do Brasil
AE-AP - Agencia Estado
LA PAZ - O presidente da Bolívia, Evo Morales, pode ter um alto índice de aprovação. Porém manifestantes literalmente forçaram que o líder deixasse o país por algum tempo. Evo teve que cruzar a fronteira com o Brasil para poder chegar a La Paz, na noite de ontem. O motivo foi o assédio de manifestantes, que tomaram um aeroporto no departamento (Estado) de Beni. "A melhor solução foi ir por terra até Guajará-Mirim (no Brasil), porque a pista oferecia todas as garantias e daí nos recolheu um avião", explicou o ministro de Hidrocarbonetos, Carlos Villegas à rádio Erbol.O helicóptero em que o presidente viajaria até La Paz não conseguiu aterrissar em Guayamerín para reabastecer. Havia na pista um grupo de jovens com paus de pedras, informou . A aeronave que levaria o presidente para La Paz o encontrou em Cachuela Esperanza, vizinha a Guayaramerín. Um funcionário do consulado brasileiro em La Paz participou da operação. Evo chegou a La Paz à meia-noite de ontem. O presidente foi ratificado no cargo com 67,4% dos votos, em um plebiscito revogatório realizado no dia 10 de agosto. Apesar disso, Evo enfrenta uma forte rejeição em regiões dominadas por líderes oposicionistas. A oposição protesta contra um projeto constitucional apoiado pelo presidente, porque considera que o texto não representa todos os bolivianos.
http://www.estadao.com.br/internacional/not_int232379,0.htm
E se o Estadão fosse atacado com paus e pedras???
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terça-feira, agosto 26, 2008
UM JORNAL CONTRA O BRASIL
Encomenda, a segunda natureza do jornalismo?
A manchete do jornal O Globo, de 24 de agosto, "denunciando" que "cada medalha custou R$ 53 milhões à União", é um primor em matéria de distorção e ocultamento da verdade. A reportagem mostra que o jornalismo de encomenda não poupa esforços quando o alvo é o governo federal.
Gilson Caroni Filho
Que ganha bem um editor de primeira página de O Globo ninguém duvida. "O valor do sal" é calculado de acordo com a "esperteza" dos bem selecionados peixinhos do aquário. A manchete de domingo, 24 de agosto, "Cada medalha custou R$ 53 milhões à União", é um primor em matéria de distorção e ocultamento da verdade. A reportagem, alusiva aos investimentos públicos feitos, em quatro anos, através da lei Piva e de recursos de estatais a diversas modalidades olímpicas, mostra que o jornalismo de encomenda não poupa esforços quando o alvo é o governo federal.
Talvez a melhor análise já tenha sido feita pelo leitor Álvaro Marins em comentário a um artigo que versava sobre outro assunto. O que o jornal tentou ocultar foi "que as empresas brasileiras públicas estão fazendo um investimento médio de R$ 8.000,00 por mês, por atleta, para que ele tenha treinamento e equipamentos adequados para participar com brilho de competições internacionais (que a Globo não transmite), entre elas, os Jogos Olímpicos (cujas competições a Globo só transmite se elas não alterarem a sua grade de programação). Enfim, hoje o leitor de manchetes de O Globo ficou sabendo que o governo Lula investe no esporte (como todo governo responsável) e que as Organizações Globo ficam muito aborrecidas com isso". Na mosca, Marins, na mosca.
Há dois anos, mais precisamente em 7 de maio de 2006, publiquei no Observatório da Imprensa, um artigo intitulado "O velho serviço de encomenda". Peço licença ao leitor para reproduzi-lo aqui. É interessante a cadeia alimentar do campo jornalístico. Da labuta dos peixes de mercado, os ornados e pomposos extraem os nutrientes para os interesses dos peixões associados em empreendimentos políticos e econômicos. Qualquer advertência crítica à perfeição desse "ecossistema" soará como grito paranóico. Mas a leitura atenta não pode ceder aos reclamos do senso comum das redações. Nesse caso, a repetição mostra a que ponto chega um jornalismo que se considera como a única oposição confiável. Vale a pena ler de novo.
"O velho serviço de encomenda"
"Poucas vezes um jornal produziu uma edição tão explícita em intenções como o Globo de domingo (7/5). A entrevista com o ex-secretário-geral do PT, Silvio Pereira, é um primor de golpismo travestido de trabalho jornalístico. Prestidigitação e tentativas de projeção inserem-se de forma aguda nas páginas internas. O inédito exercício de futurologia trai os objetivos políticos da publicação. É o velho serviço de encomenda que não deveria surpreender a mais ninguém. A lamentar, sua previsível recorrência, apesar das loas tecidas ao exercício da democracia.
Ocupando a dobra superior inteira da primeira página, o diário alardeia como novidade bombástica a afirmação do ex-dirigente partidário, manchete da página 4: "Quem mandava no PT eram Lula, Genoino, Mercadante e Dirceu". Se notícia é divulgação, sob formato jornalístico, de algo socialmente relevante que merece publicação, fica difícil definir o que norteou o jornal carioca. Se, tal como definem os manuais, a novidade é um dos fatores de qualidade da informação, os editores parecem não ter noção de regras elementares. Ora, quem, entre os leitores da grande imprensa, não conhecia a importância hierárquica dos três políticos citados?
Definitivamente, mais uma vez, contrariando um dos slogans das Organizações, "o que pintou de novo não pintou na manchete do Globo". O que podemos ver, no entanto, é uma entrevista esburacada, sem sustentação interna e que nada acrescenta ao que já foi escrito sobre a crise política.
Todos sabemos que é a edição que confere sentido às informações contidas em uma matéria. Longe de ser mero procedimento técnico, o ordenamento do conteúdo é pautado por determinações ideológicas do veículo. No caso da entrevista, isso salta aos olhos. Basta que, tal como faz o jornal, pincemos alguns trechos do depoimento de Silvio Pereira. Escolhamos outros, diferentes dos selecionados pelo Globo, para elucidar a dinâmica:
1. "Não me conformo de o PT pagar todo o pato. Se investigassem a fundo realmente veriam isso. E o governo nada fez de errado";
2. "Só não mexi com os fundos de pensão. Os maiores ficaram com Gushiken. Mas não houve nada de errado com os fundos";
3. "Foi uma grande mística [a distribuição dos cargos]. De 7.900 pessoas que se inscreveram no sistema que eu montei, para toda a base aliada, com cargos e perfis técnicos, ficaram mais de 90% de fora. Foi um sistema legítimo".
Organizando o movimento
Ora, com base nas afirmações acima, a manchete poderia ser "Ex-dirigente do PT revela: o governo nada fez de errado". Haveria alguma distorção quanto às declarações do entrevistado? Será, enfim, o jornalismo uma atividade que comporte práticas discursivas efetivamente isentas? Creio que a resposta a estas questões já foi dada em marcos históricos bem distintos. As evidências empíricas há muito tempo desmontaram o mito da objetividade. Mas voltemos ao assunto que move nosso pequeno artigo.
Deixemos, então que o jornal fale de suas reais motivações. Segundo Soraya Aggege, jornalista que entrevistou Pereira, o que levou o Globo a procurá-lo "foi mostrar como vive o ex-secretário um ano após a crise do ‘mensalão’". Uma espécie de "onde anda você", muito comum nas editorias de esporte e seções dedicadas ao mundo artístico, mas raro, senão inédito, no campo político.
Mas por que logo ele? Havia tantos outros atores... Alguns, com predicados de barítono, como o ex-deputado Roberto Jefferson, certamente não se furtariam a atender à imprensa. Para os propósitos do jornal, porém, tinha que ser um ex-dirigente do partido. Alguém com conhecimento da máquina que pudesse, rompendo o silêncio, reiterar o que era por todos sabido como se novidade fosse. Uma legítima farsa, modalidade teatral que, desligada de princípios éticos, às vezes ganha conteúdo de denúncia à revelia do autor. Foi a isso que o Globo dedicou seis páginas na sua roupa de domingo.
Publicada na véspera da reunião do Conselho Federal da OAB, que decidiria se a entidade encaminha ou não o pedido de impeachment de Lula, a entrevista é emblemática. Mostra, sem qualquer disfarce, seu real objetivo. O que se lê na página 9 não deixa qualquer margem de dúvida. "As declarações de Sílvio Pereira – que repercutiram ontem mesmo porque a edição de O Globo começa a ser vendida nas bancas do Rio a partir das 15h – deram novo fôlego à crise".
O que impressiona é a capacidade premonitória do jornal. O que é publicado sábado permite adivinhar o que aconteceria na segunda-feira. E não estamos na seção de horóscopo. Mais uma vez a família Marinho vem a público anunciar que organiza o movimento. Orienta o carnaval e, na medida do possível, inaugura um monumento no Planalto Central do país”.
E assim será até 2010, não duvidem.
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Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Observatório da Imprensa.
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sábado, agosto 23, 2008
A classe média encontra Getúlio
Wanderley Guilherme dos Santos
Se um dos já mitológicos torneiros mecânicos do ABC paulista, com formação escolar profissionalizante, recebesse no ano 2000 dez vezes mais do que recebia em 1980, teria, muito provavelmente, progredido na escala estatística da renda, continuando a ser, todavia, um torneiro mecânico de escolaridade profissionalizante na estratificação social. Seu filho, se também torneiro mecânico, com escolarização profissional, obteria seu primeiro emprego com o salário que custara ao pai 20 anos de trabalho, mas ingressaria na mesma posição na mesma escala da estratificação social. Mudanças nas classes de renda, ainda quando dramáticas, não equivalem automaticamente a mobilidade social.
Os estudiosos exigem, ademais, progresso no nível educacional e substituição do trabalho anterior por ocupação mais nobre. E existem analistas duros que só reconhecem mudanças na estratificação social quando à subida de um corresponde a descida de alguém do escalão superior. Por isso, transformações na estratificação social são fenômenos de longo prazo, que se medem, sobretudo, entre sucessivas gerações, estabilizadas as transformações depois de intermitentes oscilações nos níveis de renda dos diversos estratos, mas sempre acompanhados de aperfeiçoamento educacional e maior qualificação ocupacional. As notícias brasileiras são alvissareiras, mas de outra natureza.
Não é pouca coisa revelar que a história recente do país conseguiu retirar dezenas de milhões de pessoas do limbo social da indigência e da pobreza. Ao mesmo tempo, no atual universo expansionista brasileiro, também cresceu o número de ricos. Pouco provável, portanto, que tenha havido significativa mobilidade social no sentido de enorme taxa de substituição de pessoas, e remota a possibilidade de que, em tão curto período de tempo, a escala de estratificação exiba sensíveis alterações. Algumas exceções individualizadas à parte, o perfil da estratificação social brasileira permanece o mesmo.
A convergência entre dois documentos de objetivos distintos - o comunicado da presidência do Ipea, "Pobreza e Riqueza no Brasil Metropolitano", preparado pela assessoria técnica, com a colaboração de Fabio Vaz, Ricardo L. C. Amorim e Rafael Ribas, e o elaborado pela equipe do Centro de Políticas Sociais, da FGV, "A Nova Classe Média", sob coordenação de Marcelo Neri - sustentam o diagnóstico de que nos últimos seis a sete anos a migração de pessoas de classes de renda inferiores para classes de renda superiores alcançou taxas de considerável magnitude. Examinadas com microscópio, o documento da FGV identifica, inclusive, padrões "chineses" de crescimento da renda em algumas regiões e certos estratos de renda. Ambos os documentos registram, igualmente, o crescimento da renda e do número de pessoas situadas no topo da escala de ganhos.
Não é pouca coisa revelar que a história recente do país conseguiu retirar dezenas de milhões de pessoas do limbo social da indigência e da pobreza. Ao mesmo tempo, no atual universo expansionista brasileiro, também cresceu o número de ricos. Pouco provável, portanto, que tenha havido significativa mobilidade social no sentido de enorme taxa de substituição de pessoas, e remota a possibilidade de que, em tão curto período de tempo, a escala de estratificação exiba sensíveis alterações. Algumas exceções individualizadas à parte, o perfil da estratificação social brasileira permanece o mesmo.
A convergência entre dois documentos de objetivos distintos - o comunicado da presidência do Ipea, "Pobreza e Riqueza no Brasil Metropolitano", preparado pela assessoria técnica, com a colaboração de Fabio Vaz, Ricardo L. C. Amorim e Rafael Ribas, e o elaborado pela equipe do Centro de Políticas Sociais, da FGV, "A Nova Classe Média", sob coordenação de Marcelo Neri - sustentam o diagnóstico de que nos últimos seis a sete anos a migração de pessoas de classes de renda inferiores para classes de renda superiores alcançou taxas de considerável magnitude. Examinadas com microscópio, o documento da FGV identifica, inclusive, padrões "chineses" de crescimento da renda em algumas regiões e certos estratos de renda. Ambos os documentos registram, igualmente, o crescimento da renda e do número de pessoas situadas no topo da escala de ganhos.
Isso significa que a redução do número de pobres e miseráveis não se deu em virtude de forte redistribuição da pizza em favor dos mais carentes, mas resultou basicamente do inchaço da pizza, ou seja, teve como condição de possibilidade um razoável ritmo de crescimento econômico. De fato, o vulto da migração entre classes de renda só seria possível, na ausência do crescimento do bolo, mediante violenta subtração dos bem situados em benefício dos estratos inferiores, e é difícil supor que algo semelhante se dê sem intensa instabilidade política.
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É relevante o fato de que acréscimos nas rendas do trabalho privado foram superiores aos obtidos por via pública
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O documento do Ipea, ademais de registrar as diferentes taxas de alteração na renda de carentes e de regiões metropolitanas, explora o trajeto do grupo de altas rendas e também uma hipotética distribuição dos ganhos em produtividade industrial entre proprietários do capital e trabalhadores. Tentativamente, o estudo sugere que o aumento na produtividade da economia não esteja sendo compartilhado equitativamente entre o capital e o "fator" trabalho.
O estudo "A Nova Classe Média" é bem mais ambicioso e conduzido de forma bastante minuciosa. Duas contribuições me atraíram em particular. Depois de mensurar os ganhos de todas as classes de renda, no período 2002/2008, inclusive no interior de cada região metropolitana, a pesquisa revela que os acréscimos nas rendas do trabalho privado, isto é, não auferidos através de alocação pública - por exemplo, bolsa família -, foram superiores, no período, aos acréscimos obtidos por via pública. Em síntese, no meritório resgate de grande parte da população pobre, as políticas sociais do governo contaram com a colaboração de acentuada expansão do trabalho formalizado. Importante achado, a recomendar que os futuros estudos sobre mobilidade de renda ou redução da pobreza atentem para outras variáveis, além das canônicas, na apreensão do que ocorre ao nível das pessoas.
Um aspecto interessantíssimo é a ponderação de que a "formalização das relações do trabalho", a carteira assinada, teria passado a ser uma dimensão caracterizadora da "nova classe média", fazendo parte, inclusive, de seus sonhos de consumo. Ora, a introdução da "carteira de trabalho" ocorreu no ano de 1932, sob o governo de Getúlio Vargas, e então considerada como uma política social de caráter revolucionário. Com ela se estabeleceu um dos marcos institucionais destinados a retirar as relações de trabalho entre patrões e operários das delegacias de polícia. Tratava-se, à época, de violenta intervenção estatal na ordem do mercado, e a carteira, como até hoje, precisava ser registrada no Ministério do Trabalho.
No documento deveria constar a ocupação do trabalhador, aspecto que associava a política das relações entre patrões e empregados à política das relações entre os sindicatos como órgãos de direito público e o Estado. Só as "ocupações" reconhecidas pelo Estado dispunham de um sindicato e, pela mobilização deste, ficavam os cidadãos registrados com a garantia de que lhes seriam assegurados os direitos embutidos na carteira. A carteira de trabalho era a certidão de batismo da cidadania, e quem não a possuía, por não ter ocupação "reconhecida", estava destituído dos direitos econômicos e sociais que o governo de Getúlio Vargas ia criando.
Havendo começado como principal evidência de um ciclo de políticas sociais, consubstanciadas na eficaz inovação varguista que foi a "cidadania regulada", registro como avanço civilizatório o fato de que a carteira de trabalho tenha deixado de ser reconhecida como política social, e sim como uma espécie de direito natural. E que a classe média a tenha como objeto de consumo não deixa de ser uma reparação histórica ao ódio que grande parte dessa classe média sempre devotou a Getulio.
Está comprovada, creio que de maneira irrespondível, a ascensão de enorme contingente de brasileiros à estatística classe C de renda. Lá se encontraram com os históricos estatísticos C, habitantes com créditos de residência acumulados há décadas. Digamos que a nova classe média de renda é mais promíscua do que virginal. Ganhou a sociedade brasileira em pluralismo e, certamente, em padrões de comportamento a serem ainda tornados públicos. Eleitoralmente, todavia, sempre esteve onde está. Mas essa é outra história.
Wanderley Guilherme dos Santos, membro da Academia Brasileira de Ciências.
Havendo começado como principal evidência de um ciclo de políticas sociais, consubstanciadas na eficaz inovação varguista que foi a "cidadania regulada", registro como avanço civilizatório o fato de que a carteira de trabalho tenha deixado de ser reconhecida como política social, e sim como uma espécie de direito natural. E que a classe média a tenha como objeto de consumo não deixa de ser uma reparação histórica ao ódio que grande parte dessa classe média sempre devotou a Getulio.
Está comprovada, creio que de maneira irrespondível, a ascensão de enorme contingente de brasileiros à estatística classe C de renda. Lá se encontraram com os históricos estatísticos C, habitantes com créditos de residência acumulados há décadas. Digamos que a nova classe média de renda é mais promíscua do que virginal. Ganhou a sociedade brasileira em pluralismo e, certamente, em padrões de comportamento a serem ainda tornados públicos. Eleitoralmente, todavia, sempre esteve onde está. Mas essa é outra história.
Wanderley Guilherme dos Santos, membro da Academia Brasileira de Ciências.
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sexta-feira, agosto 22, 2008
Quem tem medo de democracia que se quebre...
Lula celebra momento econômico e diz aos trabalhadores: "A hora de brigar é essa"
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou nesta quinta-feira (21) que os trabalhadores devem aproveitar o bom momento econômico do país para reivindicar aos patrões melhorias salariais e de qualidade de trabalho. "A hora de brigar é essa. A economia está crescendo, as empresas estão crescendo", afirmou, durante a cerimônia do 20º aniversário da Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos (CNTM).
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou nesta quinta-feira (21) que os trabalhadores devem aproveitar o bom momento econômico do país para reivindicar aos patrões melhorias salariais e de qualidade de trabalho. "A hora de brigar é essa. A economia está crescendo, as empresas estão crescendo", afirmou, durante a cerimônia do 20º aniversário da Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos (CNTM).
Lula está confiante de que o Brasil conquistará nos próximos dois anos mais avanços na economia, lembrando que o crescimento econômico já está provocando carência de mão-de-obra qualificada. "Esse é um bom problema", comentou, antes de garantir que o governo está trabalhando para atender essa demanda.
O presidente falou sobre as eleições de 2010 e de sua expectativa em fazer o sucessor devido ao bom desempenho de seu governo.
"Se Deus quiser, temos de preparar a caminhada para 2010 no momento certo. Estou convencido que nós temos condições de fazer a nossa sucessão", afirmou.
Na cerimônia, Lula voltou a ressaltar que o lucro com as novas descobertas de petróleo na camada de pré-sal vai ser revertido em investimentos em educação e na melhoria da qualidade de vida dos mais pobres do país.
Na cerimônia, Lula voltou a ressaltar que o lucro com as novas descobertas de petróleo na camada de pré-sal vai ser revertido em investimentos em educação e na melhoria da qualidade de vida dos mais pobres do país.
"O petróleo é do povo brasileiro. Não é da Petrobras, não é do governo não é do Lula", afirmou. "Vamos utilizar esse petróleo para educação e para os miseráveis."
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quarta-feira, agosto 20, 2008
Veja como funciona a blindagem do PSDB/PFL
Cadê a Veja?
A chave do esquema
Leandro Colon e Marcelo Rocha
Correio Braziliense
19/8/2008
A chave do esquema
Leandro Colon e Marcelo Rocha
Correio Braziliense
19/8/2008
Intermediário do grupo que fraudava licitações no Senado é flagrado pela Polícia Federal abrindo a porta do gabinete do senador Efraim Morais A investigação da Polícia Federal revela o elo entre as fraudes nas licitações milionárias do Senado e o gabinete do senador Efraim Morais (DEM-PB). O serviço de inteligência da PF flagrou Eduardo Bonifácio Ferreira abrindo, com a própria chave, o gabinete do parlamentar. Oficialmente, ele nunca trabalhou para o senador na Casa.
Ferreira foi denunciado pelo Ministério Público Federal sob a acusação de ter negociado com as empresas Conservo e Ipanema o resultado nas licitações feitas pelo Senado em 2006 para contratação de mão-de-obra terceirizada. De acordo com a investigação, ele se encontrou com os empresários durante o andamento das concorrências. O código das reuniões era “tomar vinho”.
Primeiro-secretário do Senado, Efraim é o responsável pelos contratos da Casa. Ele prorrogou sem licitação até 2009 todos esses serviços suspeitos, que somam R$ 35 milhões. Para os investigadores, Ferreira teria atuado em nome do parlamentar, mas o senador nega. Os relatórios da PF, porém, começam a desvendar esse mistério.
A polícia decidiu seguir os passos de Ferreira em 29 de junho daquele ano, logo após a vitória das empresas para assumir os contratos do Senado. De acordo com relatório do Departamento de Inteligência Policial (DIP) nº 055/06, obtido pelo Correio, Ferreira saiu de casa, na 112 Norte, chegou ao Senado às 11h20, tirou do bolso a chave e abriu uma porta do gabinete 21 da Ala Alexandre Costa, naquela época ocupado por Efraim.
Aceno
Ferreira foi denunciado pelo Ministério Público Federal sob a acusação de ter negociado com as empresas Conservo e Ipanema o resultado nas licitações feitas pelo Senado em 2006 para contratação de mão-de-obra terceirizada. De acordo com a investigação, ele se encontrou com os empresários durante o andamento das concorrências. O código das reuniões era “tomar vinho”.
Primeiro-secretário do Senado, Efraim é o responsável pelos contratos da Casa. Ele prorrogou sem licitação até 2009 todos esses serviços suspeitos, que somam R$ 35 milhões. Para os investigadores, Ferreira teria atuado em nome do parlamentar, mas o senador nega. Os relatórios da PF, porém, começam a desvendar esse mistério.
A polícia decidiu seguir os passos de Ferreira em 29 de junho daquele ano, logo após a vitória das empresas para assumir os contratos do Senado. De acordo com relatório do Departamento de Inteligência Policial (DIP) nº 055/06, obtido pelo Correio, Ferreira saiu de casa, na 112 Norte, chegou ao Senado às 11h20, tirou do bolso a chave e abriu uma porta do gabinete 21 da Ala Alexandre Costa, naquela época ocupado por Efraim.
Aceno
No relato, os policiais não escondem a surpresa. “Na entrada, o alvo (Ferreira), simplesmente, colocou a mão para fora do carro e acenou para o vigilante, este, prontamente, levantou a cancela para a sua entrada sem exigir nenhum tipo de identificação. O alvo entrou e estacionou na parte que fica rente ao gabinete 21 do senador Efraim Morais”, diz o texto, que continua: “O alvo desceu do carro e se deslocou em direção à porta que dá acesso direto do estacionamento ao gabinete 21, tomou umas chaves no bolso, abriu a citada porta e entrou no gabinete”, ressalta.
A PF conclui: “Ou seja, o alvo entrou no estacionamento privativo do Senado Federal, depois entrou no gabinete do senador Efraim Morais”.
O conteúdo da investigação policial compromete o discurso feito pelo primeiro-secretário em 6 de agosto em plenário, quando ele afirmou que não surgiria “nenhum fragmento de informação no contexto da Operação Mão-de-Obra” (leia mais na página 4).
A reportagem tenta localizar o senador desde a sexta-feira passada. A assessoria do parlamentar informou que ele viajou ao Uruguai para participar do Parlamento do Mercosul. Até o fechamento desta edição, não houve qualquer retorno.
Já Eduardo Ferreira foi procurado em sua casa ontem à tarde, mas ele não estava. Foi deixado um recado e nenhuma resposta foi dada. De acordo com o diretor da Secretaria de Comunicação Social do Senado, Helival Rios, ele trabalhou no Senado entre julho de 2004 e junho de 2005 na liderança da minoria, naquela época nas mãos do senador Sérgio Guerra (PSDB-PE). Ou seja, Ferreira não ocupava nenhuma função quando abriu a porta do gabinete de Efraim.
O conteúdo da investigação policial compromete o discurso feito pelo primeiro-secretário em 6 de agosto em plenário, quando ele afirmou que não surgiria “nenhum fragmento de informação no contexto da Operação Mão-de-Obra” (leia mais na página 4).
A reportagem tenta localizar o senador desde a sexta-feira passada. A assessoria do parlamentar informou que ele viajou ao Uruguai para participar do Parlamento do Mercosul. Até o fechamento desta edição, não houve qualquer retorno.
Já Eduardo Ferreira foi procurado em sua casa ontem à tarde, mas ele não estava. Foi deixado um recado e nenhuma resposta foi dada. De acordo com o diretor da Secretaria de Comunicação Social do Senado, Helival Rios, ele trabalhou no Senado entre julho de 2004 e junho de 2005 na liderança da minoria, naquela época nas mãos do senador Sérgio Guerra (PSDB-PE). Ou seja, Ferreira não ocupava nenhuma função quando abriu a porta do gabinete de Efraim.
O senador Sérgio Guerra não se recorda do ex-servidor. Ele alega que as vagas na minoria eram divididas entre PSDB e DEM. Ferreira pode ter sido indicado pelo segundo partido, argumenta o tucano.
A ação da PF
A ação da PF
A Operação Mão-de-Obra foi feita pela PF em 2006 para desmontar uma quadrilha que fraudou concorrências públicas na Esplanada dos Ministérios. Em março deste ano, o Ministério Público Federal denunciou Eduardo Ferreira e os diretores do Senado Dimitrios Hadjinicolaou e Aloysio Brito Vieira por improbidade administrativa, além dos donos das empresas Conservo e Ipanema.
Apesar da denúncia feita pelo MPF, o Senado prorrogou esses contratos até o ano que vem. Ignorou as suspeitas. Após o Correio revelar detalhes e diálogos da investigação, o presidente da Casa, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), anunciou novas concorrências nos próximos meses. Ele promete substituir esses contratos até o fim do ano. Por enquanto, as empresas continuam prestando serviços ao Senado.
Apesar da denúncia feita pelo MPF, o Senado prorrogou esses contratos até o ano que vem. Ignorou as suspeitas. Após o Correio revelar detalhes e diálogos da investigação, o presidente da Casa, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), anunciou novas concorrências nos próximos meses. Ele promete substituir esses contratos até o fim do ano. Por enquanto, as empresas continuam prestando serviços ao Senado.
Cadê o Gabeira?
sexta-feira, agosto 15, 2008
Quem confia em Aécio Neves?
Não há qualquer diferença entre as prioridades do "construtor de pontes" e o ideário neoliberal da cúpula tucana. As reformas estruturais mais importantes - agrária, habitação, educação e a do saneamento básico- não têm lugar na sua agenda. Como não teve nas de FHC, Serra e Alckmin.
Gilson Caroni Filho
O governador de Minas Gerais, Aécio Neves, gosta de aparecer na grande imprensa como o "tucano diferente". Um oposicionista que caminha na contramão da política pequena de seus companheiros de partido, apresentando-se como um homem público preocupado com o desequilíbrio federativo, originado pelo que chama de "hegemonia paulista na política". Sua originalidade residiria no fato de ser um oposicionista com propostas para o país, ave rara no bloco conservador. Nada mais enganoso. Nada mais perigoso.
Suas críticas mais recentes ao governo do presidente Lula desmontam os elementos discursivos empregados na tentativa de produzir sua significação, de elaborar uma persona que o defina como "construtor de pontes" entre partes que, segundo ele, estão "cegas por radicalizados projetos de poder".
Segundo o jornalista Ricardo Noblat, o governador lamenta que Lula desperdice o seu segundo mandato não promovendo reformas na Previdência Social, na área tributária e nas relações trabalhistas. Todas elas, segundo Aécio, "indispensáveis para a fundação de um Estado moderno, ficarão para ser feitas pelo sucessor de Lula. Que ainda será obrigado a enxugar despesas governamentais que não param de crescer". Como se vê, não há qualquer diferença entre as prioridades do "construtor de pontes" e o ideário neoliberal da cúpula tucana. As reformas estruturais mais importantes - agrária, habitação, educação e a do saneamento básico-não têm lugar na sua agenda. Como não teve nas de FHC, Serra e Alckmin.
A reforma da Previdência é uma bandeira cara ao neoliberalismo. Com o "nobre" propósito de combater um falso déficit, o objetivo é a supressão de direitos, principalmente de mulheres e beneficiários do salário mínimo. Aécio finge ignorar que as receitas superam as despesas, mesmo após três anos seguidos de aumentos reais do mínimo.
Simula desconhecer que o presidente já afirmou que a reforma será pautada pelo Fórum de Negociação da Previdência, como proposta amadurecida na sociedade civil, "permitindo que as novas gerações tenham um sistema mais condizente com as necessidades dos trabalhadores". Um foco bem diferente do que reza o receituário mercantil.
Não sabe também que, em fevereiro, o governo encaminhou projeto de reforma tributária que pretende desonerar empresas, gerar mais empregos e acabar com a guerra fiscal entre os Estados. Em que nuvem anda o jovem Aécio? Ou em que praia do litoral fluminense tem surfado o sobrinho de Tancredo? Para o "construtor de pontes", o PAC ( Programa de Aceleração do Crescimento) não passa de uma jogada marqueteira."Rode por Minas. Tente encontrar alguma obra de vulto financiada pelo PAC. Não encontrará", aconselha.
Pena que tenha esquecido de dizer que o Estado que governa tem 114 das 119 prefeituras envolvidas em desvios de verbas do programa. E que o PSDB detém o maior número de prefeitos sob suspeita de fazer parte do esquema de apropriação ilegal dos recursos. Alguém precisa lembrar ao governador que obras de vulto não brotam do chão, ainda mais se no subsolo há dutos duvidosos. E que, como liderança estadual, cabe a ele alertar seus correligionários quanto a esse pequeno deslize ético.
Em visita ao Rio, na manhã de um ensolarado 15 de agosto, Aécio atacou supostas falhas do governo na segurança pública, argumentando que "o governo federal não assumiu a sua responsabilidade na questão da segurança pública, contingenciando recursos do Fundo Penitenciário e do Fundo Nacional de Segurança". É uma pena que a censura da imprensa mineira, praticada em proveito do seu próprio governo, deixe o fenômeno de Minas tão desinformado.
Uma breve leitura do jornal Brasil de Fato, em 14 de maio de 2007, faria com que tomasse ciência de que na sua gestão ", os investimentos em saúde, segurança pública e educação caíram, de R$ 11,6 bilhões para R$ 8,7 bilhões, impactando a vida de milhares de pessoas na capital e no interior do estado.
"Há algum tempo, a vereadora petista Neila Batista, em artigo intitulado "MG: Quase um Estado de exceção" afirmou que "o silêncio da Assembléia Legislativa de Minas, com exceção das poucas vozes do PT e do PC do B, e o pacto da maior parte imprensa regional, que se engajou em sua carreira rumo à Presidência da República confirmam a regra... ou a exceção".
"Fragilizando instituições caras ao jogo democrático, ignorando a importância do sistema partidário e "fazendo uso de uma máquina de marketing inigualável no país", a "novidade" que vem das alterosas é a melhor expressão do mandonismo risonho que segue à risca os preceitos neoliberais.
Seria interessante que Aécio aproveitasse a segunda metade do mandato para redemocratizar o Estado, dialogar com os movimentos sociais e, se der tempo, conhecer Minas Gerais. É uma das unidades federativas mais ricas do país. Bem mais surpreendente que as noites do Leblon.
Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Observatório da Imprensa.
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CENSURA TUCANA ATACA DE NOVO EM MINAS
MP alega "indícios de prática de crimes"
e censura site em MG
Por Thaís Naldoni, editora-executiva/Redação Portal IMPRENSA
Nesta quinta-feira (14), foi retirado do ar, pela Promotoria Estadual de Combate aos Crimes Cibernéticos, o site Novo Jornal, de propriedade do jornalista Marco Aurélio Flores Carone, com sede em Belo Horizonte (MG).
A suspensão da página faz parte de uma operação batizada de "Anonymus", encabeçada pela Promotoria, em conjunto com a Polícia Militar do Estado de Minas Gerais. Portando um mandado de busca e apreensão, representantes do Ministério Público Estadual (MPE) confiscaram os computadores da redação e o servidor do site.
Ao acessar o Novo Jornal, lê-se uma mensagem do MPE, afirmando que o site está sendo investigado, em razão de "indícios de prática de crimes". Segundo a assessoria de Comunicação Social do Ministério Público - MG, a investigação acontece em razão de uma representação criminal, na qual a página era acusada de publicar matérias que afetavam a honra de autoridades públicas. "A Promotoria Estadual de Combate aos Crimes Cibernéticos recebeu representação criminal de que o site vinha publicando, desde de o ano de 2007, diversas matérias atentatórias à honra de autoridades públicas federais e estaduais, dentre as quais o procurador-geral de Justiça, Jarbas Soares Júnior, em razão de suas funções de chefe do MPE".
Reprodução
Mensagem do MPE no endereço do Novo Jornal
Com a investigação, ainda segundo o MPE, foi constatado que o site "não estampava o nome de diretor ou redator-chefe responsável, fato que fere frontalmente a Constituição Federal, que prevê no Art. 5°, IV "- é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato". Dessa forma, a suspensão da página e a apreensão dos computadores visam dar "prosseguimento às investigações e a identificar a autoria dos crimes praticados".
"O que você tem a ver com a corrupção?"
O Ministério Público Federal lançou campanha nacional com a marca "O que você tem a ver com a corrupção?". Baseado nesta chamada, o Novo Jornal colocou em sua página editorial a frase, completando com o nome do procurador-geral de Justiça de Minas Gerais, Dr. Jarbas Soares. "Quando clicava no selo, o internauta era direcionado para um editorial, em que nós questionávamos as ações da procuradoria, que barrava toda e qualquer apuração denunciativa", explica Marco Aurélio Carone, responsável pelo site.
Segundo Carone, o Novo Jornal está no ar há três anos e sempre foi um site 100% combativo. "Sempre fizemos denúncias e elas não são ligadas apenas ao Poder Público e ao governo do estado de Minas Gerais. Quando foi tirado do ar, estávamos com uma matéria na manchete que falava sobre o ministro Gilmar Mendes".
O site, de acordo com Carone, conta cerca de 80 mil pageviews por dia e tem quatro jornalistas trabalhando em sua atualização. Sua manutenção é paga por anúncios, sempre conquistados via licitação. "Procuramos não atrelar anunciantes à página sem licitação, exatamente para que não haja amarras políticas".
Para o jornalista, que faz parte de uma tradicional família de políticos mineiros e se considera uma espécie de "ovelha negra", esse tipo de atitude do Ministério Público lhe parecia improvável nos tempos atuais. "Me assusta ver esse tipo de ação no Brasil novamente".
Na Justiça
Na Justiça
O processo contra o site corre em segredo de Justiça. Carone já consultou seus advogados, mas ainda não sabe exatamente quais ações legais deve tomar. A investigação segue a cargo da promotora de Justiça Vanessa Fusco, coordenadora da Promotoria Estadual de Combate aos Crimes Cibernéticos.
Quanto à exibição da página do MPE no endereço do Novo Jornal, a promotoria informa que este tipo de página-aviso é "largamente utilizada pelo Serviço Secreto Americano e a decisão do juiz da Vara de Inquéritos é pioneira no Brasil". Trata-se, portanto, do primeiro caso em que se tem autorização judicial para a exibição deste texto.
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quinta-feira, agosto 14, 2008
Lobby estrangeiro do petróleo aluga a Folha
Monopólios externos fazem intrigas para roubar pré-sal
EMPRESA
Nas duas páginas que tentam sustentar a manchete, é dito que o governo teria chegado à essa conclusão porque “1) A Petrobrás é uma empresa mista, com participação de capital privado; e 2) a estatal se transformaria numa empresa gigantesca, com poderes demais, podendo representar riscos no futuro, como já ocorreu na Venezuela, onde diretores da estatal PDVSA participaram de articulações golpistas. ‘Hoje, a Petrobras já é um outro país. Felizmente, um país amigo’, afirma um ministro ao falar sobre as restrições do governo em tornar a estatal poderosa demais, ‘maior do que o próprio Estado brasileiro’”.
A Petrobrás sempre foi uma “empresa mista” desde a sua fundação. O que não a impediu de ser a executora do monopólio estatal do petróleo por 40 anos. Mas, detenhamo-nos, antes, na segunda questão.
Segundo o parecer que a “Folha” atribui ao governo, o fortalecimento da Petrobrás colocaria em risco o Estado brasileiro. Portanto, leiloar o petróleo do pré-sal para a Exxon, a Shell, a BP ou a Chevron seria, provavelmente, uma segurança para o nosso Estado nacional; deixar o pré-sal ser sugado pelas multinacionais do cartel petrolífero, supõe-se, é a melhor forma de promover os interesses nacionais e a nossa soberania. A Petrobrás, cuja diretoria é escolhida pelo governo, se fortalecida, seria um Estado paralelo - mas as companhias estrangeiras, não.
Pode ser que alguns redatores da “Folha” tenham essa opinião de jerico. Mas é o samba do lobista doido atribuir ao governo a idéia (?) de que uma estatal forte é um risco para o Estado - e que o melhor para o Estado nacional é entregar o pré-sal, ou parte dele, a empresas estrangeiras. Como se ninguém tivesse ouvido falar no golpe contra Mossadegh, no Irã, em 1953, e outros lugares onde hoje as petroleiras zelam muito pelo Estado nacional: Iraque; Darfur; Chechenia; e, inclusive, Afeganistão e Geórgia.
O problema da PDVSA na Venezuela foi, precisamente, o de que sua cúpula era um laranjal das companhias norte-americanas. Por isso ela necessitou, na prática, ser reestatizada pelo presidente Chávez – simplesmente, banindo da empresa os petro-laranjas.
É verdade que Fernando Henrique entregou parte do capital da empresa a particulares, sobretudo estrangeiros. Mas a maioria do capital votante – as “ações ordinárias” - está em mãos da União. E nada impede que o governo amplie a sua participação, principalmente depois da descoberta do pré-sal.
Porém, como ressaltou Fernando Siqueira, da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET), mesmo na situação atual seria simples garantir a propriedade efetiva da União sobre o petróleo. Bastaria elevar para a média praticada em todo o mundo (84%) a participação que cabe a ela (hoje essa participação vai de zero a 40% e só a Petrobrás paga): “suponhamos que a Petrobrás seja a encarregada da exploração do pré-sal: 16% (100 menos 84%) da produção caberiam a ela. Mesmo tendo 40% das ações no exterior, isto representaria só 6,4% (40% de 16%), mas a União ficaria com 90,4% da produção (84 + 6,4%), pois ela ainda detém 40% das ações da Petrobrás” (v. nossa edição de 11/07/2008).
Portanto, não procedem as duas supostas razões para restringir a atuação da Petrobrás no pré-sal. Também não procede a suposta necessidade de fundar outra estatal para administrar o pré-sal, transformando a Petrobrás em “apenas uma prestadora de serviços”. Para quê? Para esvaziar o papel público da nossa maior empresa, daquela que conhece mais sobre petróleo do que qualquer outra? Para tratar a Petrobrás como outra empresa qualquer, ou seja, como se fosse uma empresa privada, isolada em meio a um mercado monopolizado até a tampa? A quem aproveitaria isto, senão às multinacionais e àqueles que sempre quiseram privatizar a Petrobrás?
No entanto, o lobismo fica mais claro ainda em duas matérias coadjuvantes na mesma edição da “Folha”. Numa delas um “consultor” diz que a definição da nova lei do petróleo, prevista para o fim do ano, “pode atrasar investimentos na área de petróleo no Brasil”. Para não atrasar esses “investimentos”, o melhor é continuar com uma lei inconstitucional e entreguista, que em seu artigo 26 determina que a propriedade do petróleo extraído é de quem o extrair – logo, apenas a propriedade da reserva (ou seja, do petróleo que não foi extraído) é do país. Extraído, passa a ser da empresa que o extraiu, ainda que seja num mar de petróleo com risco zero de não achá-lo. O consultor esclarece de que “investimentos” está falando: “futuras concessões”, ou seja, a nova lei poderia atrapalhar o açambarcamento do pré-sal por empresas estrangeiras.
A outra matéria diz que o modelo de “prestação de serviços”, pelo qual o governo contrataria empresas para extrair o petróleo, mas este pertenceria, depois de extraído, ao país, “é o que menos gera novas tecnologias, porque as empresas contratadas não são donas nem sócias do negócio”.
MODELO
O que tem uma coisa com a outra, a “Folha” não esclarece – provavelmente porque o cinismo não pode esclarecer que é cinismo. Há 11 anos essas empresas são “donas ou sócias do negócio”, sob a lei atual, com o modelo de concessões - onde o petróleo extraído é das companhias que arrematam em leilão os lotes a explorar. E, nenhuma delas, exceto a Petrobrás, gerou alguma “nova tecnologia”.
Sobre outro modelo, o de “partilha da produção”, pelo qual “a petrolífera ganha o direito de explorar uma área e fica com parte da produção, mas a maior parcela vai para o Estado” é dito que “fora a Petrobrás, as demais empresas que atuam no Brasil preferem a manutenção da regra de concessões”. Realmente. Foram elas que fizeram a lei atual – o modelo atual é o modelo delas, de acordo com seus interesses, com os interesses de seus proprietários externos, e não de acordo com os interesses do país. Por isso, é natural que a Petrobrás, que, apesar dos atentados contra ela, tem como donos o Estado nacional e o povo brasileiro, prefira outro modelo.
Querem transformar a Petrobrás numa mera “prestadora de serviços” para eles
A “Folha de S. Paulo”, no domingo, saiu com a manchete: “Petrobrás não terá monopólio de campo”.
Naturalmente, isso é mais um anúncio de lobista do que uma manchete.
O “campo” referido é a área do pré-sal, um gigantesco lago de petróleo descoberto pela Petrobrás, talvez a maior descoberta petrolífera da História. Depois de garantir que a Petrobrás não extrairá petróleo do pré-sal sozinha – ou seja, que o pré-sal vai ser aberto às multinacionais – o próprio texto da primeira página da “Folha” desmente o título: “Embora o governo Lula ainda não tenha posição final sobre as regras para explorar os novos megacampos de petróleo na costa...”. Se o governo não tem ainda posição final sobre o assunto, como é que “já decidiu que não deve entregar à Petrobrás todas as áreas da camada do pré-sal que ainda serão leiloadas”? Pois quem garante que haverá leilões no pré-sal? Exatamente isso é o que está sendo decidido – e por isso os leilões estão suspensos.
EMPRESA
Nas duas páginas que tentam sustentar a manchete, é dito que o governo teria chegado à essa conclusão porque “1) A Petrobrás é uma empresa mista, com participação de capital privado; e 2) a estatal se transformaria numa empresa gigantesca, com poderes demais, podendo representar riscos no futuro, como já ocorreu na Venezuela, onde diretores da estatal PDVSA participaram de articulações golpistas. ‘Hoje, a Petrobras já é um outro país. Felizmente, um país amigo’, afirma um ministro ao falar sobre as restrições do governo em tornar a estatal poderosa demais, ‘maior do que o próprio Estado brasileiro’”.
A Petrobrás sempre foi uma “empresa mista” desde a sua fundação. O que não a impediu de ser a executora do monopólio estatal do petróleo por 40 anos. Mas, detenhamo-nos, antes, na segunda questão.
Segundo o parecer que a “Folha” atribui ao governo, o fortalecimento da Petrobrás colocaria em risco o Estado brasileiro. Portanto, leiloar o petróleo do pré-sal para a Exxon, a Shell, a BP ou a Chevron seria, provavelmente, uma segurança para o nosso Estado nacional; deixar o pré-sal ser sugado pelas multinacionais do cartel petrolífero, supõe-se, é a melhor forma de promover os interesses nacionais e a nossa soberania. A Petrobrás, cuja diretoria é escolhida pelo governo, se fortalecida, seria um Estado paralelo - mas as companhias estrangeiras, não.
Pode ser que alguns redatores da “Folha” tenham essa opinião de jerico. Mas é o samba do lobista doido atribuir ao governo a idéia (?) de que uma estatal forte é um risco para o Estado - e que o melhor para o Estado nacional é entregar o pré-sal, ou parte dele, a empresas estrangeiras. Como se ninguém tivesse ouvido falar no golpe contra Mossadegh, no Irã, em 1953, e outros lugares onde hoje as petroleiras zelam muito pelo Estado nacional: Iraque; Darfur; Chechenia; e, inclusive, Afeganistão e Geórgia.
O problema da PDVSA na Venezuela foi, precisamente, o de que sua cúpula era um laranjal das companhias norte-americanas. Por isso ela necessitou, na prática, ser reestatizada pelo presidente Chávez – simplesmente, banindo da empresa os petro-laranjas.
É verdade que Fernando Henrique entregou parte do capital da empresa a particulares, sobretudo estrangeiros. Mas a maioria do capital votante – as “ações ordinárias” - está em mãos da União. E nada impede que o governo amplie a sua participação, principalmente depois da descoberta do pré-sal.
Porém, como ressaltou Fernando Siqueira, da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET), mesmo na situação atual seria simples garantir a propriedade efetiva da União sobre o petróleo. Bastaria elevar para a média praticada em todo o mundo (84%) a participação que cabe a ela (hoje essa participação vai de zero a 40% e só a Petrobrás paga): “suponhamos que a Petrobrás seja a encarregada da exploração do pré-sal: 16% (100 menos 84%) da produção caberiam a ela. Mesmo tendo 40% das ações no exterior, isto representaria só 6,4% (40% de 16%), mas a União ficaria com 90,4% da produção (84 + 6,4%), pois ela ainda detém 40% das ações da Petrobrás” (v. nossa edição de 11/07/2008).
Portanto, não procedem as duas supostas razões para restringir a atuação da Petrobrás no pré-sal. Também não procede a suposta necessidade de fundar outra estatal para administrar o pré-sal, transformando a Petrobrás em “apenas uma prestadora de serviços”. Para quê? Para esvaziar o papel público da nossa maior empresa, daquela que conhece mais sobre petróleo do que qualquer outra? Para tratar a Petrobrás como outra empresa qualquer, ou seja, como se fosse uma empresa privada, isolada em meio a um mercado monopolizado até a tampa? A quem aproveitaria isto, senão às multinacionais e àqueles que sempre quiseram privatizar a Petrobrás?
No entanto, o lobismo fica mais claro ainda em duas matérias coadjuvantes na mesma edição da “Folha”. Numa delas um “consultor” diz que a definição da nova lei do petróleo, prevista para o fim do ano, “pode atrasar investimentos na área de petróleo no Brasil”. Para não atrasar esses “investimentos”, o melhor é continuar com uma lei inconstitucional e entreguista, que em seu artigo 26 determina que a propriedade do petróleo extraído é de quem o extrair – logo, apenas a propriedade da reserva (ou seja, do petróleo que não foi extraído) é do país. Extraído, passa a ser da empresa que o extraiu, ainda que seja num mar de petróleo com risco zero de não achá-lo. O consultor esclarece de que “investimentos” está falando: “futuras concessões”, ou seja, a nova lei poderia atrapalhar o açambarcamento do pré-sal por empresas estrangeiras.
A outra matéria diz que o modelo de “prestação de serviços”, pelo qual o governo contrataria empresas para extrair o petróleo, mas este pertenceria, depois de extraído, ao país, “é o que menos gera novas tecnologias, porque as empresas contratadas não são donas nem sócias do negócio”.
MODELO
O que tem uma coisa com a outra, a “Folha” não esclarece – provavelmente porque o cinismo não pode esclarecer que é cinismo. Há 11 anos essas empresas são “donas ou sócias do negócio”, sob a lei atual, com o modelo de concessões - onde o petróleo extraído é das companhias que arrematam em leilão os lotes a explorar. E, nenhuma delas, exceto a Petrobrás, gerou alguma “nova tecnologia”.
Sobre outro modelo, o de “partilha da produção”, pelo qual “a petrolífera ganha o direito de explorar uma área e fica com parte da produção, mas a maior parcela vai para o Estado” é dito que “fora a Petrobrás, as demais empresas que atuam no Brasil preferem a manutenção da regra de concessões”. Realmente. Foram elas que fizeram a lei atual – o modelo atual é o modelo delas, de acordo com seus interesses, com os interesses de seus proprietários externos, e não de acordo com os interesses do país. Por isso, é natural que a Petrobrás, que, apesar dos atentados contra ela, tem como donos o Estado nacional e o povo brasileiro, prefira outro modelo.
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segunda-feira, agosto 11, 2008
Veja aqui o vídeo que o Serra censurou
O governador de São Paulo, José Serra, aquele que quer ser Presidente em 2010, conseguiu uma liminar na justiça para proibir a veiculação de um vídeo gravado para os fins de reivindicação pelas associações e síndicatos da Polícia Civil de São Paulo pelos canais de TV. Mas como aqui o Serra não censura, confira o vídeo.
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O GATO COMEU A LÍNGUA DO BONNER???
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domingo, agosto 10, 2008
Nas listas...
A crise do subprime e o bar do seu Biu
O que vai abaixo é a melhor explicação para a tal crise do subprime nos Estados Unidos. A história circula na blogosfera, mas a autoria é desconhecida. O texto é simplesmente um primor, vale a pena ler até o fim.
Entendendo a complexidade da crise subprime americana
Entender a crise não é fácil (vide as tentativas de David Leonhardt, em um excelente artigo para o NYT), mas permitam-me oferecer um similar nacional, pesquisado pelo nosso intrépido correspondente Osto Craudiley.
É assim: o seu Biu tem um bar, na Vila Carrapato, e decide que vai vender cachaça "na caderneta" aos seus leais fregueses, todos bêbados, quase todos desempregados. Porque decide vender a crédito, ele pode aumentar um pouquinho o preço da dose da branquinha (a diferença é o sobrepreço que os pinguços pagam pelo crédito).
O gerente do banco do seu Biu, um ousado administrador formado em curso de emibiêi, decide que as cadernetas das dívidas do bar constitui, afinal, um ativo recebível, e começa a adiantar dinheiro ao estabelecimento tendo o pindura dos pinguços como garantia.
Uns seis zécutivos de bancos, mais adiante, lastreiam os tais recebíveis do banco, e os transformam em CDB, CDO, CCD, UTI, OVNI, SOS ou qualquer outro acrônimo financeiro que ninguém sabe exatamente o que quer dizer.
Esses adicionais instrumentos financeiros alavancam o mercado de capítais e conduzem a que se façam operações estruturadas de derivativos, na BM&F, cujo lastro inicial todo mundo desconhece (as tais cadernetas do seu Biu ).
Esses derivativos estão sendo negociadas como se fossem títulos sérios, com fortes garantias reais, nos mercados de 73 países.Até que alguém descobre que os bêubo da Vila Carrapato não têm dinheiro para pagar as contas, e o Bar do seu Biu vai à falência. E toda a cadeia sifu.
Postado por Luiz Antonio Magalhães
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Número de postes danificados em Curitiba cai 33% depois da lei seca
Além da redução do número de mortos e feridos em colisões, os dados também são favoráveis do ponto de vista financeiro
09/08/2008 12:36 Gazeta do Povo
Uma estatística inusitada chamou a atenção em um levantamento feito pela Copel: depois da instauração da “lei seca”, o número de postes avariados na cidade de Curitiba caiu 33% em julho, primeiro mês transcorrido integralmente sob a vigência das novas regras que endureceram o tratamento aos motoristas flagrados embriagados.
O levantamento da Companhia Paranaense de Energia (Copel), divulgado pela Agência Estadual de Notícias, mostra que o número de postes danificados após colisões de veículos diminuíram em um terço desde que a “lei seca” entrou em vigor. A média dos seis primeiros meses do ano era de 51 postes atingidos em acidentes de trânsito por mês. Em julho, esse número caiu para 34.
Além da redução do número de mortos e feridos em colisões, os dados também são favoráveis do ponto de vista financeiro. O valor da reposição de postes, apesar de variar bastante de acordo com o tipo de estrutura avariada, geralmente é alto. Além disso, os estoques de material e mão-de-obra podem ser usados para ampliação da rede e não apenas para a reposição das estruturas que já existiam e foram atingidas.
Curitiba abrange cerca de 20 % das 3,5 milhões de ligações elétricas dos 393 municípios paranaenses atendidos pela Copel.
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Bovespa é a única em alta desde o início da crise
Publicado em 09/08/2008 Folhapress
Apesar de estar negativa neste ano, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) é a única das grandes bolsas mundiais que está em um patamar superior ao de 9 de agosto do ano passado, um dos marcos da atual crise nos mercados financeiros – que se espalhou por boa parte da economia mundial. Em um ano, a Bovespa (que está em queda de 11,43% em 2008) se valorizou em 2,43%, em um cenário em que grandes mercados têm perdas superiores a 10%. Devido à valorização do real na comparação com a moeda americana, a alta da bolsa brasileira em dólar é ainda maior: 19,9%.
A Bolsa de Xangai (China) perdeu quase metade do seu valor e foi a que mais se desvalorizou desde o início da crise, mas sua queda também se deve a outros fatores, como as altas do juro pelo governo para conter a inflação.
Em 9 de agosto de 2007, o banco francês BNP Paribas congelou três fundos ligados ao setor de crédito imobiliário americano, o que derrubou fortemente as bolsas e fez o Banco Central Europeu (BCE) e os bancos centrais dos Estados Unidos e do Japão injetarem dezenas de bilhões de dólares nos mercados, para elevar a sua liquidez.
As bolsas dos EUA, apesar de o país ser a origem da crise, não estão entre as que mais caíram. Mercados de emergentes, como a Argentina, e de desenvolvidos, como o Japão, tiveram resultados piores.
O Dow Jones, principal índice da Bolsa de Nova Iorque e que reúne 30 empresas, caiu 14,1%, e o S&P 500 (mais amplo, reúne as 500 maiores companhias americanas), 13,4%. A Nasdaq, de empresas de alta tecnologia, teve queda de 7,6%.
A crise foi vista inicialmente como restrita ao mercado imobiliário, mas os problemas se espalharam para setores como o de emprego nos EUA. E países como a Alemanha e o Japão, além dos EUA, temem entrar em recessão.
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Em carta, Pérez Esquivel manifesta solidariedade a Morales
(no Blog do Bertolino, em http://osvaldo-bertolino.zip.net/index.html)
O argentino Adolfo Pérez Esquivel, Prêmio Nobel de Paz em 1980, encaminhou uma carta ao presidente da Bolívia manifestando solidariedade ao povo boliviano.
"Quero expressar-lhe todo nosso apoio e solidariedade pela permanente luta em benefício do povo boliviano, por dignificar aos mais pobres e postergados do país, dar-lhes o lugar que lhes corresponde de vida e democracia com dignidade", disse.
"Fazer realidade os direitos humanos, compreendidos em sua integridade", destacou.
Esquivel lembra que durante longas décadas a Bolívia sofreu a dominação dos poderosos, "que sempre exploraram o povo e que não se resignam em compartilhar a riqueza".
Disse também que quando contrariados em seus interesses "buscam todos os métodos perversos para manter seus privilégios".
Ele afirmou ainda que teme um golpe político.
Tudo "com apoio dos meios de comunicação, cúmplices em tergiversar a verdade", e aval da embaixada dos Estados Unidos.
"São traidores da pátria e preferem a colonização do império à liberdade e soberania da Bolívia".
Esquivel ressalta que muitas organizações na América Latina e no mundo vêem com preocupação a atual campanha de desestabilização do governo Evo e oferecem solidariedade e apoio.
E diz que estas organizações confiam na resistência e na consciência crítica do digno povo boliviano.
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CBF desmente, mais uma vez, notícia do globoesporte.com sobre Seleção Brasileira
CBF NEWS
O site globoesporte.com publica, mais uma vez, notícia que não é verdadeira sobre a Seleção Brasileira Olímpica.
Nesta sexta-feira, dia 8 de agosto, com o título "Seleção Brasileira perde a hora mais uma vez e atrasa o treinamento da Bélgica" e subtítulo "Por causa de quatro minutos, dirigentes belgas fazem queixa aos organizadores do torneio de futebol masculino", as informações publicadas na matéria merecem os seguintes esclarecimentos.
"O Brasil estourou outra vez o tempo-limite do treino, que deveria ser encerrado às 18h (horário local), em Shenyang".
Não é verdade. A Seleção Brasileira encerrou o treino rigorosamente dentro do horário previsto.
"Os dirigentes belgas chegaram a reclamar com os brasileiros com veemência sobre a demora.
Em seguida, passaram a se queixar com os organizadores do torneio de futebol".
Os dirigentes belgas não reclamaram com os brasileiros e não se queixaram com os organizadores. O fato não existiu, até porque não havia motivo para tal.
"A bronca, então, recaiu sobre o supervisor Américo Faria. Não é a primeira vez que a seleção brasileira atrapalha uma outra equipe com o seu atraso. Nesta mesma Olimpíada, a equipe feminina da Alemanha foi prejudicada em situação parecida".
Ninguém, em nenhum momento na preparação para as Olimpíadas, falou sobre este assunto com o supervisor Americo Faria.
Não é verdade, igualmente, que "a equipe feminina da Alemanha foi prejudicada em situação parecida".
Isso não aconteceu, como comprovam as notícias publicadas no dia, em que as jogadoras alemãs aparecem tirando fotos com os jogadores brasileiros, em um momento de confraternização.
Para finalizar, é importante esclarecer que não há representante do globoesporte.com nos treinos da Seleção Brasileira em Shenyang - a matéria tem, inclusive, o crédito "Das agências de notícias".
É importante registrar que os sites uol e terra, que se faziam representar no treino, não noticiaram os fatos erradamente publicados.
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O direito à memória e à verdade
Como não poderia deixar de acontecer, a manifestação da reserva das Forcas Armadas às declarações dos ministros Tarso Genro, da Justiça, e Paulo Vanucchi, dos Direitos Humanos, que defenderam a responsabilização criminal de agentes públicos que, na ditadura, participaram de atos de tortura, descambou para o mais puro revanchismo. E, pior, para ataques ao governo sem nenhuma base na realidade política do país e no momento histórico que estamos vivendo, fora os lugares comuns e as bravatas, como a do ex-membro do STJ e do STE, Waldemar Szeiter, que ameaçou tirar o ministro Tarso Genro do cargo e derrotar o governo nas urnas.
O general da reserva escolhido para falar em evento do Clube Militar do Rio, além das obviedades de sempre da direita militar na reserva, disse algumas barbaridades como a de que o Brasil caminha para uma Revolução do Socialismo e deu corda no factóide criado pela revista Cambio da Colômbia, e embalada por alguns setores da oposição e da mídia, sobre as relações do PT e do governo Lula com as FARCs, quando o conteúdo dos e-mails e relatórios, exatamente por isso mesmo não publicados nem pelo governo da Colômbia e nem pela revista, atestam exatamente o contrário, ou seja, o afastamento e a critica direta do PT e do governo as FARCs.
Como vemos nada de novo no front da direita militar, que não só reivindica o golpe de 64 como tem saudades do tempo da ditadura. O problema é que a roda da história não volta e quem vai decidir se os crimes de tortura estão ou não anistiados é a Justiça brasileira, como manda nossa constituição, que se imporá, com sua legitimidade e força legal, a qualquer outro poder, particularmente o militar, submetido a Constituição e a lei, como todos os outros.
No blog do Zé Dirceu
http://www.zedirceu.com.br/index.php?option=com_content&task=blogsection&id=11&Itemid=37
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Sobre a 4ª Frota americana, nenhum desses generais de pijama engrossou a voz.
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sábado, agosto 09, 2008
Seis anos e meio em Guantánamo. Testemunho de Sami El Haj, jornalista da Al-Jazira
por Silvia Cattori [*]
Sami El-Haj, jornalista sudanês da cadeia Al-Jazira, foi libertado após seis anos e meio de detenção na Baía de Guantanamo. Silvia Cattori entrevistou-o aquando da sua passagem por Genebra, onde veio encontrar-se com organismos de direitos humanos das Nações Unidas. Ela não se contentou em transcrever os seus depoimentos pois não saiu indemne desta entrevista. Acompanhou portanto as palavras do entrevistado com os seus comentários. No fim, ninguém pode permanecer insensível a isto – não se trata apenas de uma história individual, mas de um testemunho vivo sobre o sistema de terror dos Estados Unidos.
Erecto, grande, impressionante, a emanar o sentimento de uma interioridade intensa, Sami El Haj avança a claudicar, apoiado numa bengala. Os risos e sorrisos já não animam o rosto fino deste homem, desgastado antes de velho. Habita-o uma profunda tristeza. Ele tinha 32 anos quando, em Dezembro de 2001, sua vida, tal como aquelas de dezenas de milhares de outras pessoas de confissão muçulmana, caíram no horror.
Ele sofreu enormemente. Enfraquecido por uma greve de fome que durou 438 dias, libertado dia 1º de Maio de 2008, ele vos recebe com atenção, com doçura. Fala-vos, sem insistir, de um universo cujo horror vos ultrapassa, vos tetaniza, vos sufoca.
Este é o primeiro sobrevivente dos campos, construídos pela administração Bush na base naval da Baía de Guantánamos, a ser autorizado a viajar.
"Vim a Genebra, à cidade da ONU e das liberdades, [1] para pedir que se faça respeitar o direito, exigir o encerramento do campo de Guantánamo e das prisões secretas, e acabar com esta situação ilegal", diz ele calmamente. A palavra está desgastada. Tudo é "ilegal", tudo é falso, manipulado, absurdo, kafkiano, nesta guerra, dirigida essencialmente contra pessoas de religião muçulmana.
Sabemos hoje muitas coisas. Nomeadamente, que numerosos atentados que desde 1996 tem sido atribuídos aos muçulmanos foram financiados e manipulados pelos agentes secretos do MI6, da CIA, do Mossad. Foram testemunhos corajosos, como o do antigo ministro alemão Andreas Von Bülow [2] , que desvelaram e denunciaram este género de actividades criminosas, praticadas pelas grandes potências. Excepto nos novos media, qual jornalista alguma vez falou das revelações feitas por este grande senhor que é Andreas Von Bülow?
Em Guantánamo, sustentado pela sua paixão pela justiça, por sua convicção de que todo jornalista tem por missão testemunhar aquilo que vê, Sami El Haj teve a força psíquica de aguentar, de resistir aos piores abusos, pondo de lado os seus próprios sofrimentos. Ele experimentou sentimentos de grande dor mas soube, nos piores momentos, manter a esperança de que sairia de lá vivo. E de dizer a si próprio que devia observar tudo, que poderia amanhã testemunhar, isso o ajudou a suportar o indizível.
É, de resto, pelo olhar do jornalista observando com recuo este universos assustador, desejado pelo sr. Bush, e que teria podido ser a sua tumba, que Sami El Haj pôde sobreviver e manter a sua razão. Outros, que tiveram menos sorte que ele, estão mortos ou tornaram-se loucos; portanto incapazes de transmitir seu testemunho.
Sem lápis nem papel, Sami El Haj esforçou-se por tudo memorizar para continuar, mesmo na cela, seu trabalho de "jornalista da Al-Jazira em reportagem", como ele diz.
Hoje ele está concentrado na ideia de chamar a atenção do mundo para estas dezenas de milhares de prisioneiros que continuam, nas masmorras de Guantánamo, Bagram, Kandahar, a sofrer um tratamento desumano. Responde incansavelmente, e com gentileza, a todos os jornalistas que o interrogam, esperando que a sua palavra permitirá fazer ouvir a voz daqueles que não a têm.
Seu depoimento é essencial. Ao invés de outros cativos, abusivamente qualificado como ele de "terroristas", Sami El Haj jamais foi julgado e jamais soube do que era acusado. O que demonstra que os "terroristas islamistas" do sr. Bush, e dos jornalistas que apoiaram a sua tese, tiveram de ser fabricados. Seres como Sami El Haj jamais teriam podido ser presos, nem permanecer tão longo tempo reféns desta barbárie, porque muçulmanos, sem a cumplicidade dos governos europeus e destes propagandistas islamófobos subservientes a Tel Aviv e Washington que, depois há décadas, desinformam a opinião pública e influenciam as elites com base em mentiras.
Silvia Cattori: Como se sente, a apenas algumas semanas após a vossa libertação?
Sami El Haj: Sinto-me bem, obrigado. Quando vejo que pessoas se empenham em salvar seres humanos e lutam pela defesa dos seus direitos, isso me conforta. Naturalmente, na minha saída de Guantánamo, há dois meses, eu não estava inteiramente bem. Mas agora sinto-me melhor, descobrindo que as pessoas, aqui fora, lutam e não esquecem o objectivo principal: obter a paz e a liberdade para todo o mundo.
Silvia Cattori: Após estes anos dolorosos, passados nos campos, quais são os vossos sentimentos e os vossos desejos mais ansiados?
Sami El Haj: Bem, evidentemente sinto-me feliz por ter recuperado a minha liberdade. Reencontrei minha família, minha esposa e meu filho. Durante seis anos e meio ele não me viu, teve de ir à escola sem mim. Esperou-me e disse-me: "Papá, tu me faltaste por muito tempo! Eu sofri, sobretudo quando via meus colegas na escola, acompanhados pelo seu pai, que me perguntavam: Onde está o teu pai? Eu não tinha resposta para lhes dar. Foi por isso que pedi à mamã para me levar à escola de carro, porque eu não queria que me colocassem sempre esta pergunta".
Disse ao meu filho: "Agora estou em condições de te levar à escola, mas tu deves compreender que tenho uma mensagem a transmitir, uma causa justa a defender. Quero lutar pela causa dos direitos do homem, pelas pessoas que foram privadas da sua liberdade. Não vou lutar só. Há milhares de pessoas que se empenham em toda a parte onde se atenta contra a dignidade dos humanos. Não esqueça que lutamos pela paz, para defender os direitos onde eles são espezinhados, para um melhor futuro para ti. Talvez um dia cheguemos a isso e, então, vou poder ficar ao teu lado e levar-te à escola".
Não sei se ele compreendeu, pois ainda é pequeno, mas sorriu-me. Minha esposa, ela tão pouco, não desejava que eu partisse outra vez. Mas quando lhe lembrei a situação dolorosa em que se encontram as pessoas encerradas em Guantánamos, que também têm família, filhos, filhas, esposa, que lhes faltam, e que, se eu permanecesse sem lutar, estas pessoas iriam ficar encerradas ainda mais tempo, ela compreendeu que eu devia continuar a viajar, a somar a minha voz a todas as outras vozes, para que os detidos possam voltar para as suas casas o mais rapidamente possível. Ela deu-me todo apoio. Ao acompanhar-me ao aeroporto disse-me: Vou rezar por ti.
Silvia Cattori: Assim, ao ir ao Afeganistão para filmar os massacres de civis, vítimas da guerra do sr. Bush, tornou-se uma das suas vítimas? Não tem medo do que possa vos acontecer?
Sami El Haj: Para mim, não há nenhuma dúvida, vou continuar meu trabalho de jornalista. Devo continuar a levar uma mensagem de paz, seja qual for. No que me concerne, passei seis anos e seis meses na prisão, longe da minha família; mas, para outros, foi bem mais terrível. Perdi um amigo muito querido, jornalista da Al-Jazira: morreu em Bagdad, morto no bombardeamento do hotel onde se encontrava. Perdi igualmente uma colega que trabalhava comigo na Al-Jazira, que considero como uma irmã: morta, também ela, em Bagdad.
Muitas pessoas perderam a vida por causa desta guerra. Deve saber que a administração Bush quis impedir a cobertura dos media livres, como a Al-Jazira, no Médio Oriente. Os escritórios da Al-Jazira, em Cabul e Bagdad, foram bombardeados.
Em 2001, quando deixei meu filho e minha esposa para ir filmar a guerra desencadeada pelos Estados Unidos contra o Afeganistão, podia esperar encontrar a morte num bombardeamento. Eu fui, consciente dos riscos. Todo jornalista sabe que cumpre uma missão e deve estar pronto a sacrificar-se para testemunhar o que se passa, pelos seus filmes e seus escritos. E para ajudar as pessoas a compreenderem que a guerra não traz nada mais do que a morte de inocentes, destruição e sofrimentos. É na base desta convicção que meus colegas e eu fomos a países em guerra.
Agora, após todos estes anos de cativeiro, posso novamente fazer alguma coisa em favor da paz. Vou empenhar-me neste sentido, até onde puder. Estou certo de que um dia, mesmo se não for eu a recolher os frutos, acabaremos por obter a paz e o respeito dos direitos humanos, assim como a protecção dos jornalistas por toda a parte do mundo. Estou certo de que chegaremos a isto de os jornalistas não serem mais torturados ou feridos ao fazerem o seu trabalho, ao defenderem os direitos das pessoas à informação e ao mostrarem os abusos contra os humanos.
Silvia Cattori: Disse no início que se sentia bem. Mas, depois de uma experiência tão horrível, e depois de ter sido solto sem a menor desculpa da parte dos vossos torcionários, como pode evocar este passado sem ressentimento nem rancor?
Sami El Haj: Sim, este passado é extremamente duro e minha situação pessoal é difícil. Mas quando penso naqueles que ainda estão em Guantánamo, a quem a sua família, das quais não têm notícia nenhuma, falta, digo a mim próprio que a minha situação, por difícil que seja, é melhor que a deles.
Não posso esquecer que deixei em Guantánamo irmãos que estão destruídos, que foram tornados loucos. Penso em particular neste médico yemenita que vive hoje todo nu na sua cela pois perdeu a razão.
Silvia Cattori: Que género de torturas vos faziam sofrer?
Sami El Haj: Todas as espécie de torturas físicas e psíquicas. Como os detidos eram todos muçulmanos, a administração do campo submetia-os a muitas vexações e humilhações respeitantes à religião. Vi com os meus próprios olhos soldados dilacerarem o Corão e jogá-lo nas toilettes. Vi com os meus próprios olhos, durante os interrogatórios, sentar-se sobre o Corão enquanto não se respondesse às questões colocadas. Eles insultavam nossas famílias, nossa religião. Faziam cara de telefonar ao nosso Deus para lhe pedir, caçoando de nós, para vir nos salvar. O único imam do campo foi acusado de conivência com os detidos e foi demitido, em 2005, por se ter recusado a dizer aos visitantes que o campo respeitava a liberdade religiosa.
Eles nos espancavam com golpes. Cobriam-nos de insultos racistas. Encerravam-nos em peças frias, abaixo de zero, com uma única refeição fria por dia. Suspendiam-nos pelas mãos. Impediam-nos de dormir e, quando se dormitava, batiam-nos na cabeça. Mostravam-nos filmes mostrando sessões de torturas atrozes. Mostravam-nos fotos de torturados mortos, tumefactos, sanguinolentos. Mantinham-nos sob a ameaça de nos transferir alhures para nos torturas ainda mais. Lançavam-nos água fria. Forçavam-nos a fazer a saudação militar ouvindo o hino dos Estados Unidos. Forçavam-nos a vestir roupas de mulheres. Forçavam-nos a olhar fotos eróticas. Ameaçavam-nos de violação. Punham-nos nus, faziam-nos marchar como asnos, mandando-nos ir aqui e ali. Mandavam-nos sentar e nos por de pé 500 vezes seguidas. Humilhavam os detidos envolvendo-os na bandeira estado-unidense e israelense, o que era uma maneira de dizer que estamos encerrados no quadro de uma guerra de religião.
Quando, coberto de piolhos, sujo, o detido é tirado da sua cela para ser submetido a novas sessões de torturas, para o levar a colaborar, ele acaba por dizer não importa o que e não saber mais quem é.
Sofri mais de 200 interrogatórios sob tortura. Noventa e cinco por cento das perguntas referiam-se à Al-Jazira. Queriam que aceitar trabalhar como espião no seio da Al-Jazira. Em troca, ofereciam-me a nacionalidade estado-unidense, para mim e minha família, e um salário em função dos meus resultados. Recusei. Eu lhes repetia que a minha profissão é de jornalista, não a de espião, e que tinha o dever de fazer conhecer a verdade e trabalhar para que os direitos do homem sejam respeitados.
Silvia Cattori: Hoje, está disposto a perdoar vossos torcionários?
Sami El Haj: Naturalmente que vou perdoá-los se encerrarem Guantánamo. Mas se eles continuam a fazer o mal, vou recorrer a um tribunal, iniciar uma acção contra eles.
Apesar de saber que a administração Bush fez tanto mal, continuo a pensar que não é demasiado tarde para estas pessoas corrigirem os seus erros.
É preciso saber diferenciar entre a administração e o povo. Os detidos de Guantánamo sabem que têm amigos nos Estados Unidos, como este advogado que veio a Guantánamo e que se bateu pelo meu caso.
Silvia Cattori: Fica-se com o sentimento de que eles não conseguiram quebrá-lo.
Sami El Haj: Porque não estou só. Há pessoas atrás de mim; este sentimento dá-me força. Na prisão, retirei minha força da convicção de que todo homem livre não pode aceitar ser posto nesta situação de inferioridade e de desumanização. Experimenta-se sentimentos de dor, de desapontamento, mas esforça-se por manter a esperança de que haverá uma saída; e a ideia de que, mesmo na prisão, pode-se continuar o trabalho de jornalista limita o sofrimento.
Silvia Cattori: Enquanto estava em Guantánamo sabia que havia, no exterior, pessoas que lutavam para voz fazer libertar?
Sami El Haj: De facto, eu não sabia. Porque no interior da prisão as notícias são muito difíceis de serem obtidas, mesmo que se tenha um advogado porque ele está proibido de vos informar. As pessoas que trabalham para os direitos do homem, e aqueles que não gostam da administração Bush, hoje eu os conheço. Creio que a sua voz é cada vez mais forte.
Silvia Cattori: Vosso irmão, ao revê-lo, disse que tinha o ar de um homem idoso. É este o vosso sentimento?
Sami El Haj: No que me concerne, vivo pelo meu coração, e não pelo meu rosto ou pelo meu corpo. Sinto meu coração sempre jovem, e mais forte que antes.
Silvia Cattori: Portanto, foi uma experiência muito doloroso mas, de facto, mas sai dela rico com um potencial insuspeitado?
Sami El Haj: Exacto. Do tempo passado em Guantánamos soube tirar algum benefício. Antes de ir para Guantánamo não tinha senão uma pequena família; agora tenho uma grande família, ganhei centenas de amigos no mundo inteiro. Isso é muito positivo: perdi seis anos e meio mas, agora, tenho mais amigos.
Silvia Cattori: Ainda é considerado como um "combatente inimigo"? [3]
Sami El Haj: Não sei mas, quando fui solto disseram-me: Agora já não é perigoso para os Estados Unidos.
Silvia Cattori: E vosso nome não figura mais na "lista terrorista"?
Sami El Haj: Eu não sei. Penso que, na mentalidade deles, todos aqueles que qualificaram como "terroristas" vão ficar "terroristas". E que agora eles têm medo de nós porque nos fizeram mal sem nenhuma razão.
Silvia Cattori: Pensa que os agentes da CIA vão continuar a vos espionar?
Sami El Haj: Sim. Na realidade, não tenho nada contra este país e seu povo. Se a administração Bush corrigir seus erros, não vou queixar-me de nada.
Silvia Cattori: Ficou surpreendido quando, na vossa saída, um oficial do Pentágono, ao vê-lo com uma bengala, vos acusou de ser um manipulador?
Sami El Haj: A gente do Pentágono pretende que os prisioneiros de Guantánamo são malfeitores mas, na realidade, 500 dentre eles agora voltaram para as suas casas. Como poderiam tê-los deixado sair se fossem realmente malfeitores? Eles mentem sempre.
Silvia Cattori: Dois outros sudaneses foram soltos aos mesmo tempo que vós, Amir Yacoub Mohamed al Amin e Walid Mohamed. Como estão eles agora?
Sami El Haj: O governo e a administração do Sudão trataram-nos muito bem. Eles nos acolheram, a todos os três, directamente no aeroporto. Se bem que os Estados Unidos tenham tomado meu passaporte, deram-me um novo em duas horas, e não fizeram nenhuma objecção a que eu viajasse para fora do Sudão.
Silvia Cattori: Em Guantánamo, os militares vos chamavam pelo nome ou pela matrícula de prisioneiro: "número 345"?
Sami El Haj: Nunca me chamavam pelo meu nome, mas "three, four, five", meu número de matrícula. Nos últimos tempos chamavam-me "Al-Jazira". Só os delegados da Cruz Vermelha chamavam-me pelo meu nome.
Silvia Cattori: Estes delegados vos visitaram frequentemente?
Sami El Haj: Quando eles eram autorizador vir nos visitar, todos os dois ou três meses; eu lhes falava, eles traziam cartas da minha família.
Silvia Cattori: A administração Bush e os oficiais encarregados de vos torturar sabiam que era um homem honesto, um simples jornalistas desejoso de dar a conhecer as brutalidades que eles cometiam contra o povo afegão e não um "terrorista". Sabe porque razão eles vos fizeram tanto mal?
Sami El Haj: A maioria dos soldados seguia as ordens dos seus oficiais. Eles torturavam sem qualquer emoção. Mas devo na verdade dizer que alguns dentre eles eram bons. Alguns soldados utilizavam o seu cérebro.
Silvia Cattori: Os agentes da CIA redigiram um relatório sobre as torturas em Guantánamo. Quando eles vos torturavam, ficava com a impressão que eles o observavam, que faziam experiências convosco?
Sami El Haj: Estávamos sob a vigilância constante de médicos psiquiatras em uniformes militares. Eles não estavam lá para cuidar, mas para participar nos interrogatórios, para observar os torturados de modo a que nenhum pormenor no comportamento do prisioneiro lhes escapasse. É sob a responsabilidade do coronel Morgan, médico especializado em psiquiatria, que se faziam os interrogatórios. Este coronel foi colocado, desde Março de 2002, em Guantánamo. Servira na prisão afegã de Bagram a partir de Novembro de 2001. Ele dava instruções aos oficiais que nos interrogavam, estudava nossas reacções, notava cada pormenor para, em seguida, adaptar as torturas à personalidade de cada detido, o que deixou traços profundos no seu psiquismo.
Falei com eles. Disse-lhe que a missão do médico era nobre, ajudar as pessoas, não torturá-las. Responderam-me: "Nós somos militares, devemos seguir as regras; quando um oficial dá uma ordem, sou obrigado a executá-la, senão, serei colocado na prisão como vós; quando assinei o contrato com o exército, nesse momento compreendi que devia obedecer a tudo".
Silvia Cattori: Dentre as torturas praticadas em Guantánamo, vejo semelhanças com as torturas praticadas em Israel sobre os prisioneiros políticos palestino. A tortura do sono, por exemplo, é a sua especialidade.
Sami El Haj: Creio que a maioria dos serviços de informação do mundo inteiro veio a Guantánamo. Vi britânicos, vi canadianos. Eles foram lá por se interessarem em interrogatórios, e também para fornecer aos oficiais da CIA e do FBI conselhos sobre como torturar, como interrogar, com base nas suas experiências.
Silvia Cattori: Consegue dormir tranquilamente?
Sami El Haj: Já não é como antes de Guantánamo. Não durmo senão 3 a 4 horas. Hoje, quando reencontrei pessoas da Cruz Vermelha, pedi-lhes para me ajudarem a ultrapassar minhas dificuldades, para me aconselharem um médico que possa examinar-me. Sete anos, não é um período curto.
Silvia Cattori: A greve de fome não era um pouco como uma tortura dirigida contra vós próprios? Por que fazê-la durante períodos tão longos, quando vossos carcereiros a utilizavam para vos infligir ainda mais humilhações e sofrimentos?
Sami El Haj: Porque pensávamos que não podíamos permanecer silenciosos, que devíamos fazer alguma coisa. Não tínhamos senão este meio para nos fazer ouvir. A greve de fome é um meio de acção penoso, certamente, muito difícil de suportar. Mas quando se está privado de liberdade deve-se lutar para obtê-la. Era a única coisa que nos restava para dizer à administração Bush que um detido tem sua dignidade, que ele não vive senão do pão, que a liberdade é mais importante.
Silvia Cattori: Como se passava isso quando eles vos alimentavam à força?
Sami El Haj: Quando havia mais de 40 detidos que faziam a greve de fome, a administração do campo tentava quebrar sua resistência fazendo-nos sofrer mais torturas. Éramos isolados em compartimentos frios, desnudados, impedidos de dormir durante longos períodos. Duas vezes por dia, os soldados prendiam-nos numa cadeira especial. Eles nos aplicavam uma máscara sobre a boca; introduziam-nos um tubo grosso no nariz, não no estômago. Quando a ração de alimento normal era de duas latas, eles nos puniam injectando 24 latas e seis garrafas de água. O estômago, encolhido por longas greves de fome, não podia conter estas quantidades. Eles acrescentavam produtos que provocavam a diarreia. O detido, mantido preso nesta cadeira mais de três horas, vomitava, vomitava. Eles nos deixavam no vómito e nos excrementos. Terminada a sessão, arrancavam-nos o tubo com violência; quando viam o sangue a correr eles riam de nós. Como utilizam tubos infectados, nunca limpos, os detidos sofrem de doenças deixadas sem cuidados.
Silvia Cattori: Foi devido a esta longa greve de fome que foi libertado?
Sami El Haj: Não só por causa dela, mas foi uma das razões que levou a administração a soltar-me.
Silvia Cattori: O que pensar das confissões de Khaled Sheik Mohamed [4] , que é acusado de ter organizado mais de 30 atentados em 17 países?
Sami El Haj: Talvez eles o tenham torturado a um ponto em que já não era ele próprio. Nunca o encontrei porque eles o puseram num campo especial. Um oficial disse-me o haviam atingido duramente; pode-se por em dúvida: eles o torturaram terrivelmente.
Silvia Cattori: Quando os Estados Unidos afirmam que ele é o "terrorista Nº 3 da Al-Qaïda", isso tem alguma relação com a realidade?
Sami El Haj: Realmente, não creio em nada que venha da administração Bush. Porque, a mim também, acusaram-me de ser um "terrorista". E sei melhor do que ninguém o que se passa. Estas pessoas mentem demasiado. Nunca acredito em nada do que afirma esta administração. Conheci um prisioneiro que foi tal forma torturado que no fim dizia: Eu sou Ussama Ben Laden. Ele dizia o que eles quisessem para fazer cessar as torturas.
Silvia Cattori: Então, é a Al-Qaida uma criação dos serviços informações ocidentais?
Sami El Haj: Pelo que eu sei, na minha vida nunca encontrei ninguém que me tenha dito: Eu pertenço à Al-Qaida. Em Guantánamo, encontrei a maioria dos detidos porque a política dos nossos guardiões era não deixar os prisioneiros viverem muito tempo juntos na mesma cela. Eles nos transferiram a cada semana; assim, conheciam-se novas pessoas. As pessoas que encontrei em Guantánamo são todas pacíficas. Desde que saí, falei com mais de 100 dentre elas. Aqueles que eram casados recomeçaram a sua vida, o solteiros casaram-se.
Silvia Cattori: Aqueles que extraem forças na oração têm mais possibilidades de escapar à loucura?
Sami El Haj: Certamente! Se sente que alguém vos acompanha, sobretudo se é Deus, irá ser paciente e recordar a todo momento que Deus tem mais poder que os seres humanos. Devo orar a Deus e agradecer-lhe. Devo também agradecer todas as pessoas que me apoiaram. Penso que, mesmo se passasse a minha vida a dizer obrigado, não chegaria a agradecer a todos. Agora, pelo meu trabalho em favor dos direitos do homem, talvez eu possa contribuir para tornar mais feliz a vida de outras pessoas.
Silvia Cattori: Creio que os media e as ONG, no nosso país, não deram a importância devida à defesa dos direitos destes prisioneiros muçulmanos [5] . Durante muito tempo, denunciar os abusos cometidos contra eles era visto como um sinal de simpatia para com os "terroristas". Sabia que os responsáveis de "Repórteres sem fronteiras", por exemplo, cuja missão é proteger os jornalistas, foram criticados por terem esperado cinco anos até falar do vosso caso? [6]
Sami El Haj: As pessoas, infelizmente, acreditaram naquilo que lhes dizia a administração dos Estados Unidos. Agora que compreenderam que aquilo não era verdade, elas corrigirão. Como vos disse, se alguém comete um erro, isto não é um problema; o problema, é perseverar no erro.
Se os jornalistas não se sentem preocupados quando jornalistas são aprisionados no quadro da sua profissão, um dia talvez estes mesmos jornalistas irão encontrar-se na prisão e não encontrarão ninguém para os defender. Devemos trabalhar em conjunto, devemos nos ocupar de cada caso. Se se sabe que um jornalista está aprisionado, há que apoiá-lo, para além da sua cor ou da sua religião.
Como jornalista, quero empenhar-me no apoio aos jornalistas que trabalham para a defesa dos direitos e das liberdades. Há um imenso trabalho diante de nós. Devemos nos empenhar plenamente para fazer libertar estas pessoas que estão encerradas em Guantánamo e nas numerosas prisões secretas onde a administração Bush priva dos seus direitos dezenas de milhares de outras.
Esta experiência em Guantánamo marcou-nos profundamente. O que eu quero reter é a necessidade e a importância da defesa dos direitos do homem. Depois de todo o mal que eles fizeram, todo o mundo hoje está mais preocupado, creio. Não é aceitável abandonar pessoas que sofrem. Temos a obrigação imperiosa de nos solidarizar com eles.
A Al-Jazira tenciona associar-se com os media livres para colectar informações respeitantes aos direitos do homem e às liberdades. Peço a todos os jornalistas para cooperarem connosco neste sentido. Havia mais de 50 nacionalidades em Guantánamo; é um assunto mundial, e não uma questão de tal ou tal detido.
É vergonhoso que, na nossa sociedade, inocentes que foram vendidos encontrem-se encerrados em jaulas, e que esta violação dos direitos fundamentais seja feita num país que pretende ser o garante dos direitos e das liberdades.
Não tenho nenhum ódio. Respeitamos os cidadãos dos Estados Unidos. É o seu governo actual que deve assumir as consequências destes actos.
Os direitos do homem e a segurança não são separáveis, não se pode ter segurança sem o respeito dos direitos fundamentais.
Silvia Cattori: Tem razão em apelar às pessoas honestas e aos jornalistas para não aceitarem que se viole o direito internacional e que se inflijam tratamentos cruéis e degradantes a seres humanos. Mas esta política não teria podido durar se não tivesse o apoio tácito dos governos das grandes potências; é com o seu assentimento que as pessoas designadas como "combatentes inimigos" foram torturadas [7] . O "Patriot Act", por exemplo, promulgado após o 11 de Setembro nos Estados Unidos, todos os países europeus subscreveram seu conteúdo. É no quadro destes acordos secretos que os agentes da CIA e do FBI puderam sequestrar e torturar, na Europa, milhares de inocentes como vós.
Sami El Haj: Quero vos dizer isto: não creio na acção dos governos. Porque todo governo, não importa de que país, prefere governar sem se confrontar com os problemas reais das pessoas. Talvez, por vezes, ele intervenha para dizer que apoia tal causa mas, no fundo, ele não a apoia. Não é senão por razões políticas oportunistas que ele se pronuncia. E talvez mesmo ele afirme sustentar, por cálculo político, uma causa na qual ele não acredita. Esqueça os governos, porque eles fazem sua política. Sim, devemos continuar a trabalhar arduamente para defender os direitos e as liberdades de cada um.
Silvia Cattori: Pode-se concluir dizendo que os "terroristas", tais como os apresentados pela administração Bush e os nossos media, não existem?
Sami El Haj: Posso vos assegurar que os detidos de Guantánamo que encontrei não são "terroristas". Tive ocasião de falar com eles, de os conhecer: são pessoas pacíficas.
Silvia Cattori: Então prenderam-vos porque era preciso fazer número para convencer os outros países europeus que haviam realmente "terroristas" muçulmanos?
Sami El Haj: Nós fomos presos na sequência do atentado do 11 de Setembro, de ninguém até hoje pode dizer quem é o autor. Bush não queria dizer: Cometi erros, não garanti correctamente a segurança. Ele disse: Vamos começar uma guerra contra estes "terroristas". Resultado: ele não trouxe a segurança a quem quer que seja.
Ele tem feito bombardear o Afeganistão, ele enviou os seus soldados para a guerra a povos inteiros, mas ele não prendeu as pessoas que se determina a prender. Ele pagou somas de dinheiro aos paquistaneses para que em contrapartida este começassem a prender pessoas e as remetessem à sua administração.
Em Guantánamo, 89% das pessoas foram compradas, contra dinheiro sonante, às autoridades paquistanesas. Onde eles a encontraram? Encontraram-nas no Paquistão, não no Afeganistão.
Silvia Cattori: Estes prisioneiros foram a seguir torturados com a promessa de parar, se aceitassem tornar-se espiões ao serviço da CIA!? É um sistema terrífico!
Sami El Haj: Sim. Aguardemos que o sr. Bush deixe a administração. Quando ele tiver deixado sua poltrona, estou certo que muitas pessoas vão exprimir-se acerca das suas malfeitorias.
Silvia Cattori: Vosso testemunho é muito importante. Massacraram a vossa juventude. E tendes a magnanimidade de transformar este desastre em alguma coisa de construtivo. Recusai-vos a vos considerar como vítima. Sois verdadeiramente magnífico! Tantas pessoas na prisão devem esperar a ajuda de pessoas da vossa qualidade.
Sami El Haj: Devemos trabalhar arduamente a fim de que aqueles que continuam a apoiar a administração Bush acabem por se sentir envergonhados dos seus actos. Neste momento, ninguém mais vai ajudá-las. E quanto mais ninguém as ajudar, elas pararão. Toda a história de Guantánamo é uma mancha negra. A administração Bush quis enganar a opinião pública dizendo que éramos terroristas. Ora, estes homens que foram encerrados na sua grande maioria são, como eu, inocentes.
Silvia Cattori: Obrigado por nos ter concedido esta entrevista.
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Toda a gente pode constar: os pretensos "terroristas" que as nossas sociedades perseguem são na realidade vítimas O sr. Sami El Haj impressona pela sua sabedoria, sua maturidade, sua elevação de vistas. Ele faz pensar em Cristo na Cruz, pois o seu calvário não acabou; os ferimentos são demasiado profundos. Sua delicadeza contrasta com a descrição dos presumidos "terroristas" que as autoridades e os media tradicionais nos serviram durante todos estes anos. Nada de reivindicações nem de queixas. Seu relato é sóbrio, sem ênfase. Ele deveria fazer mexer as coisas. Enfatiza a acção a efectuar para fazer sair, sem tardar, aqueles que permanecem cativos. Ele diz e repete que não poderá encontrar repouso enquanto os detidos de Guantánamo não forem libertados. Há doravante a urgência, a obrigação moral de reagir, de explicar honestamente o que realmente se passou, a lutar para que as nossas sociedades adoptem uma política em que o mundo árabe e muçulmano possa esperar outra coisa além de guerra e racismo. Se, em conjunto, os media do arco em torno do Lago Leman relataram correctamente a passagem por Genebra do sr. Sami El Haj, acontece também que a televisão pública local (TSR) minimizou o acontecimento e não se dignou a convidá-lo ao seu écran. Deve-se notar – será que isto explica aquilo? – que os redactores da TSR deram a palavra abundantemente, nestes últimos sete anos, aos "bons árabes", como Antoine Basbous ou Antoine Sfeir, que vão repetindo aquilo que os nossos redactores dizem ou querem ouvir, contribuindo assim para apoiar as teses belicistas que tem, aparentemente, o seu favor. Os sequestros, os centros de tortura como Guantánamo, Abou Ghraib, Bagram, Kandahar, não são, como muitas vezes se dá a entender, uma simples "derrapagem" [8] , mas exactamente a expressão de uma política criminosa que serve os interesses ocultos de dois Estados, principalmente os Estados e Israel. Pode-se aliás perguntar-se se este último não é o único ganhador destas guerras, que não só devastaram povos inteiros como também arruinaram a imagem dos Estados Unidos no mundo. Esta "guerra contra o terrorismo", da qual nos enchem os ouvidos, é uma guerra criminosa; uma guerra manipulada pelas grandes potências e seus serviços de informação. São cada vez mais numerosas as pessoas que compreendem que as sanções da ONU, as "listas terroristas" que a Europa igualmente redigiu, as campanhas depreciativas em relação aos muçulmanos, são instrumentos de manipulação da opinião pública, destinada a manter artificialmente um clima conflitual. Os atentados do 11 de Setembro de 2001, de resto, serviram imediatamente de pretexto para orientar a política internacional de Tel Aviv e Washington no sentido de objectivos militares programados de longa data. Eles serviram nomeadamente para liquidar toda forma de resistência à sua política criminosa. A começar pela resistência palestina e muçulmana. Após o desmantelamento da União Soviética, o mundo islâmico foi designado como o novo "eixo do mal". Desde o princípio dos anos 90, os Estados Unidos e Israel manobraram de modo a provocar o medo e a intolerância em relação aos muçulmanos e a incitar os serviços secretos de diversos países a infiltrá-los, a manipulá-los, a financiá-los, a encorajar renegados a fazerem atentados; para a seguir apontarem o dedo, justificarem medidas coercivas, os sequestros, as torturas as detenções arbitrárias. Desde 2001, quando os principais media prazeirosamente faziam-se eco de campanhas contra "anti-semitas" frequentemente imaginários, dezenas de milhares de muçulmanos eram sequestrados, encapuçados, aprisionados, moídos, por torcionários, a fim de os constranger a aceitar, à força, a trabalhar como espiões para os serviços de informações estatais. Tudo isso decalcado nos métodos dos serviços secretos israelenses do Shin Beth [9], que tão bem funcionou para triturar uns 700 mil palestinos aprisionados arbitrariamente durante estes últimos 40 anos. É esta sociedade que queremos? O que é mais lamentável e mais desencorajador nesta triste história é o facto de que os governos europeus serviram-se desta pretensa "ameaça islâmica" para se desembaraçarem de numerosas protecções constitucionais e puseram, também eles, em aplicação as medidas ilegais ditadas pelo sr. Bush, e permitiram assim à CIA sequestrar, no seu solo, muçulmanos, sabendo perfeitamente que iam ser entregues a centros de torturas, fora de todo direito, e por durações ilimitadas. Cabe perguntar igualmente quanto ao lugar que os chefes de redacções têm concedidos, e continuam a conceder, a estes pretensos "especialistas em terrorismo" que tem cultivado o fantasma do "perigo islamista". "Especialistas" que retomam a propaganda estado-unidense, associando Islão e "terrorismo", quando sabem perfeitamente que a estratégia de Washington e de Tel Aviv é associar, sem qualquer prova, muçulmanos a "terroristas" [10] . Cada um de nós recorda-se daquelas campanhas enviesadas destinadas a vilipendiar e destruir a carreira de dois irmão: Hani e Tariq Ramadan, nomeadamente em França e na Suíça. Nos outros países houve montagens semelhantes. Se não quisermos uma sociedade pervertida, baseada na mentira, que autoriza os sequestros, os centros de tortura, os assassinatos selectivos, as estratégias de infiltrações, destinadas a transformar pessoas em informadores, é tempo de reagir. Ver o sr. Sami El Hadj, retornando do inferno, a apelar, sem ódio nem espírito de vingança, os jornalistas a trabalhar para fazer triunfar os direitos humanos, para apagar esta "mancha negra da memória", é uma grande lição. Nossa "civilização ocidental", nossa "democracias" tão louvadas, em nome das quais se fizeram tantas guerra e cometeram-se tantos crimes, nossos media "livres", deverão contar doravante com estes retornados que nos conclamam a acordar.
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[1] Sami El Haj foi convidado a Genebra pela Fundação "Alkarama for Human Right". Ver: "Sami El Haj achève une intense visite à Genève" , Alkarama for Human Rights, 2 juillet2008.
[2] Ver: "Andreas von Bülow : Nous devons d'abord lutter contre la manipulation" , Réseau Voltaire, 6 janvier 2006.
[3] Segundo o sr. Dick Marty, relator da Comissão de Assuntos Jurídicos e dos Direitos Humanos do Conselho da Europa encarregado de inquirir a existência de prisões secretas da CIA na Europa, um "acordo secreto, concluído em Outubro de 2001 entre os Estados Unidos e seus aliados da NATO, estabeleceu o quadro que permitiu à CIA encarcerar "detidos de grande importância" na Europa. É este acordo que autoriza as graves violações dos direitos, inclusive a tortura".
[4] Khalid Cheikh Mohammed foi preso no Paquistão em 2003. Acusado de ser o número 3 da Al-Qaida, ele foi internado em diversas prisões secretas antes de ser colocado no isolamento, desde 2006, em Guantánamo, e torturado com selvajaria. Seu processo-farsa diante do tribunal militar, juntamente com 14 outros responsáveis da Al-Qaida, teve lugar em Junho de 2008.
[5] A "Comissão Árabe dos Direitos Humanos" bateu-se desde o princípio pelo encerramento de Guantánamo. Ver: http://www.achr.nu/
[6] Ver: "Reporters Sans Frontières se souvient (tardivement) de Sami Al Haj" , Réseau Voltaire, 17 février 2006.
[7] O estatuto de "combatente inimigo" e "combatente ilegal" permitindo ao governo dos Estados Unidos deter sem limites, sem passar por uma jurisdição civil, os prisioneiros assim designados, decorre da lei "Patriot Act", uma lei de excepção destinada a "unir e reforçar a América fornecendo as ferramentas apropriadas para detectar e conter o terrorismo" votada pelo Congresso dos Estados Unidos e assinada por George W. Bush em 26 de Outubro de 2001.
[8] O diário "24 Horas" escreveu em 27 de Junho de 2008: "Sami Elhaj está de passagem em Genebra para denunciar a derrapagem insensata da grande máquina anti-terrorista americana".
[9] Ver: "Why did they treat me like that?" , por Gideon Levy, Haaretz, 6 juillet 2008. Ver igualmente: "Full account of Muhammed Omer's hair-raising encounter with the Shin Beth" , por Khalid Amayreh, 1er juillet 2008.
[10] No seu sítio internet, M. Youssef Nada mostra o papel que certos jornalistas desempenharam na sua destruição com base em mentiras. Ver: http://www.youssefnada.ch/
[*] Jornalista suíça.
O original encontra-se em http://www.voltairenet.org/article157806.html
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
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Sami El-Haj, jornalista sudanês da cadeia Al-Jazira, foi libertado após seis anos e meio de detenção na Baía de Guantanamo. Silvia Cattori entrevistou-o aquando da sua passagem por Genebra, onde veio encontrar-se com organismos de direitos humanos das Nações Unidas. Ela não se contentou em transcrever os seus depoimentos pois não saiu indemne desta entrevista. Acompanhou portanto as palavras do entrevistado com os seus comentários. No fim, ninguém pode permanecer insensível a isto – não se trata apenas de uma história individual, mas de um testemunho vivo sobre o sistema de terror dos Estados Unidos.
Erecto, grande, impressionante, a emanar o sentimento de uma interioridade intensa, Sami El Haj avança a claudicar, apoiado numa bengala. Os risos e sorrisos já não animam o rosto fino deste homem, desgastado antes de velho. Habita-o uma profunda tristeza. Ele tinha 32 anos quando, em Dezembro de 2001, sua vida, tal como aquelas de dezenas de milhares de outras pessoas de confissão muçulmana, caíram no horror.
Ele sofreu enormemente. Enfraquecido por uma greve de fome que durou 438 dias, libertado dia 1º de Maio de 2008, ele vos recebe com atenção, com doçura. Fala-vos, sem insistir, de um universo cujo horror vos ultrapassa, vos tetaniza, vos sufoca.
Este é o primeiro sobrevivente dos campos, construídos pela administração Bush na base naval da Baía de Guantánamos, a ser autorizado a viajar.
"Vim a Genebra, à cidade da ONU e das liberdades, [1] para pedir que se faça respeitar o direito, exigir o encerramento do campo de Guantánamo e das prisões secretas, e acabar com esta situação ilegal", diz ele calmamente. A palavra está desgastada. Tudo é "ilegal", tudo é falso, manipulado, absurdo, kafkiano, nesta guerra, dirigida essencialmente contra pessoas de religião muçulmana.
Sabemos hoje muitas coisas. Nomeadamente, que numerosos atentados que desde 1996 tem sido atribuídos aos muçulmanos foram financiados e manipulados pelos agentes secretos do MI6, da CIA, do Mossad. Foram testemunhos corajosos, como o do antigo ministro alemão Andreas Von Bülow [2] , que desvelaram e denunciaram este género de actividades criminosas, praticadas pelas grandes potências. Excepto nos novos media, qual jornalista alguma vez falou das revelações feitas por este grande senhor que é Andreas Von Bülow?
Em Guantánamo, sustentado pela sua paixão pela justiça, por sua convicção de que todo jornalista tem por missão testemunhar aquilo que vê, Sami El Haj teve a força psíquica de aguentar, de resistir aos piores abusos, pondo de lado os seus próprios sofrimentos. Ele experimentou sentimentos de grande dor mas soube, nos piores momentos, manter a esperança de que sairia de lá vivo. E de dizer a si próprio que devia observar tudo, que poderia amanhã testemunhar, isso o ajudou a suportar o indizível.
É, de resto, pelo olhar do jornalista observando com recuo este universos assustador, desejado pelo sr. Bush, e que teria podido ser a sua tumba, que Sami El Haj pôde sobreviver e manter a sua razão. Outros, que tiveram menos sorte que ele, estão mortos ou tornaram-se loucos; portanto incapazes de transmitir seu testemunho.
Sem lápis nem papel, Sami El Haj esforçou-se por tudo memorizar para continuar, mesmo na cela, seu trabalho de "jornalista da Al-Jazira em reportagem", como ele diz.
Hoje ele está concentrado na ideia de chamar a atenção do mundo para estas dezenas de milhares de prisioneiros que continuam, nas masmorras de Guantánamo, Bagram, Kandahar, a sofrer um tratamento desumano. Responde incansavelmente, e com gentileza, a todos os jornalistas que o interrogam, esperando que a sua palavra permitirá fazer ouvir a voz daqueles que não a têm.
Seu depoimento é essencial. Ao invés de outros cativos, abusivamente qualificado como ele de "terroristas", Sami El Haj jamais foi julgado e jamais soube do que era acusado. O que demonstra que os "terroristas islamistas" do sr. Bush, e dos jornalistas que apoiaram a sua tese, tiveram de ser fabricados. Seres como Sami El Haj jamais teriam podido ser presos, nem permanecer tão longo tempo reféns desta barbárie, porque muçulmanos, sem a cumplicidade dos governos europeus e destes propagandistas islamófobos subservientes a Tel Aviv e Washington que, depois há décadas, desinformam a opinião pública e influenciam as elites com base em mentiras.
Silvia Cattori: Como se sente, a apenas algumas semanas após a vossa libertação?
Sami El Haj: Sinto-me bem, obrigado. Quando vejo que pessoas se empenham em salvar seres humanos e lutam pela defesa dos seus direitos, isso me conforta. Naturalmente, na minha saída de Guantánamo, há dois meses, eu não estava inteiramente bem. Mas agora sinto-me melhor, descobrindo que as pessoas, aqui fora, lutam e não esquecem o objectivo principal: obter a paz e a liberdade para todo o mundo.
Silvia Cattori: Após estes anos dolorosos, passados nos campos, quais são os vossos sentimentos e os vossos desejos mais ansiados?
Sami El Haj: Bem, evidentemente sinto-me feliz por ter recuperado a minha liberdade. Reencontrei minha família, minha esposa e meu filho. Durante seis anos e meio ele não me viu, teve de ir à escola sem mim. Esperou-me e disse-me: "Papá, tu me faltaste por muito tempo! Eu sofri, sobretudo quando via meus colegas na escola, acompanhados pelo seu pai, que me perguntavam: Onde está o teu pai? Eu não tinha resposta para lhes dar. Foi por isso que pedi à mamã para me levar à escola de carro, porque eu não queria que me colocassem sempre esta pergunta".
Disse ao meu filho: "Agora estou em condições de te levar à escola, mas tu deves compreender que tenho uma mensagem a transmitir, uma causa justa a defender. Quero lutar pela causa dos direitos do homem, pelas pessoas que foram privadas da sua liberdade. Não vou lutar só. Há milhares de pessoas que se empenham em toda a parte onde se atenta contra a dignidade dos humanos. Não esqueça que lutamos pela paz, para defender os direitos onde eles são espezinhados, para um melhor futuro para ti. Talvez um dia cheguemos a isso e, então, vou poder ficar ao teu lado e levar-te à escola".
Não sei se ele compreendeu, pois ainda é pequeno, mas sorriu-me. Minha esposa, ela tão pouco, não desejava que eu partisse outra vez. Mas quando lhe lembrei a situação dolorosa em que se encontram as pessoas encerradas em Guantánamos, que também têm família, filhos, filhas, esposa, que lhes faltam, e que, se eu permanecesse sem lutar, estas pessoas iriam ficar encerradas ainda mais tempo, ela compreendeu que eu devia continuar a viajar, a somar a minha voz a todas as outras vozes, para que os detidos possam voltar para as suas casas o mais rapidamente possível. Ela deu-me todo apoio. Ao acompanhar-me ao aeroporto disse-me: Vou rezar por ti.
Silvia Cattori: Assim, ao ir ao Afeganistão para filmar os massacres de civis, vítimas da guerra do sr. Bush, tornou-se uma das suas vítimas? Não tem medo do que possa vos acontecer?
Sami El Haj: Para mim, não há nenhuma dúvida, vou continuar meu trabalho de jornalista. Devo continuar a levar uma mensagem de paz, seja qual for. No que me concerne, passei seis anos e seis meses na prisão, longe da minha família; mas, para outros, foi bem mais terrível. Perdi um amigo muito querido, jornalista da Al-Jazira: morreu em Bagdad, morto no bombardeamento do hotel onde se encontrava. Perdi igualmente uma colega que trabalhava comigo na Al-Jazira, que considero como uma irmã: morta, também ela, em Bagdad.
Muitas pessoas perderam a vida por causa desta guerra. Deve saber que a administração Bush quis impedir a cobertura dos media livres, como a Al-Jazira, no Médio Oriente. Os escritórios da Al-Jazira, em Cabul e Bagdad, foram bombardeados.
Em 2001, quando deixei meu filho e minha esposa para ir filmar a guerra desencadeada pelos Estados Unidos contra o Afeganistão, podia esperar encontrar a morte num bombardeamento. Eu fui, consciente dos riscos. Todo jornalista sabe que cumpre uma missão e deve estar pronto a sacrificar-se para testemunhar o que se passa, pelos seus filmes e seus escritos. E para ajudar as pessoas a compreenderem que a guerra não traz nada mais do que a morte de inocentes, destruição e sofrimentos. É na base desta convicção que meus colegas e eu fomos a países em guerra.
Agora, após todos estes anos de cativeiro, posso novamente fazer alguma coisa em favor da paz. Vou empenhar-me neste sentido, até onde puder. Estou certo de que um dia, mesmo se não for eu a recolher os frutos, acabaremos por obter a paz e o respeito dos direitos humanos, assim como a protecção dos jornalistas por toda a parte do mundo. Estou certo de que chegaremos a isto de os jornalistas não serem mais torturados ou feridos ao fazerem o seu trabalho, ao defenderem os direitos das pessoas à informação e ao mostrarem os abusos contra os humanos.
Silvia Cattori: Disse no início que se sentia bem. Mas, depois de uma experiência tão horrível, e depois de ter sido solto sem a menor desculpa da parte dos vossos torcionários, como pode evocar este passado sem ressentimento nem rancor?
Sami El Haj: Sim, este passado é extremamente duro e minha situação pessoal é difícil. Mas quando penso naqueles que ainda estão em Guantánamo, a quem a sua família, das quais não têm notícia nenhuma, falta, digo a mim próprio que a minha situação, por difícil que seja, é melhor que a deles.
Não posso esquecer que deixei em Guantánamo irmãos que estão destruídos, que foram tornados loucos. Penso em particular neste médico yemenita que vive hoje todo nu na sua cela pois perdeu a razão.
Silvia Cattori: Que género de torturas vos faziam sofrer?
Sami El Haj: Todas as espécie de torturas físicas e psíquicas. Como os detidos eram todos muçulmanos, a administração do campo submetia-os a muitas vexações e humilhações respeitantes à religião. Vi com os meus próprios olhos soldados dilacerarem o Corão e jogá-lo nas toilettes. Vi com os meus próprios olhos, durante os interrogatórios, sentar-se sobre o Corão enquanto não se respondesse às questões colocadas. Eles insultavam nossas famílias, nossa religião. Faziam cara de telefonar ao nosso Deus para lhe pedir, caçoando de nós, para vir nos salvar. O único imam do campo foi acusado de conivência com os detidos e foi demitido, em 2005, por se ter recusado a dizer aos visitantes que o campo respeitava a liberdade religiosa.
Eles nos espancavam com golpes. Cobriam-nos de insultos racistas. Encerravam-nos em peças frias, abaixo de zero, com uma única refeição fria por dia. Suspendiam-nos pelas mãos. Impediam-nos de dormir e, quando se dormitava, batiam-nos na cabeça. Mostravam-nos filmes mostrando sessões de torturas atrozes. Mostravam-nos fotos de torturados mortos, tumefactos, sanguinolentos. Mantinham-nos sob a ameaça de nos transferir alhures para nos torturas ainda mais. Lançavam-nos água fria. Forçavam-nos a fazer a saudação militar ouvindo o hino dos Estados Unidos. Forçavam-nos a vestir roupas de mulheres. Forçavam-nos a olhar fotos eróticas. Ameaçavam-nos de violação. Punham-nos nus, faziam-nos marchar como asnos, mandando-nos ir aqui e ali. Mandavam-nos sentar e nos por de pé 500 vezes seguidas. Humilhavam os detidos envolvendo-os na bandeira estado-unidense e israelense, o que era uma maneira de dizer que estamos encerrados no quadro de uma guerra de religião.
Quando, coberto de piolhos, sujo, o detido é tirado da sua cela para ser submetido a novas sessões de torturas, para o levar a colaborar, ele acaba por dizer não importa o que e não saber mais quem é.
Sofri mais de 200 interrogatórios sob tortura. Noventa e cinco por cento das perguntas referiam-se à Al-Jazira. Queriam que aceitar trabalhar como espião no seio da Al-Jazira. Em troca, ofereciam-me a nacionalidade estado-unidense, para mim e minha família, e um salário em função dos meus resultados. Recusei. Eu lhes repetia que a minha profissão é de jornalista, não a de espião, e que tinha o dever de fazer conhecer a verdade e trabalhar para que os direitos do homem sejam respeitados.
Silvia Cattori: Hoje, está disposto a perdoar vossos torcionários?
Sami El Haj: Naturalmente que vou perdoá-los se encerrarem Guantánamo. Mas se eles continuam a fazer o mal, vou recorrer a um tribunal, iniciar uma acção contra eles.
Apesar de saber que a administração Bush fez tanto mal, continuo a pensar que não é demasiado tarde para estas pessoas corrigirem os seus erros.
É preciso saber diferenciar entre a administração e o povo. Os detidos de Guantánamo sabem que têm amigos nos Estados Unidos, como este advogado que veio a Guantánamo e que se bateu pelo meu caso.
Silvia Cattori: Fica-se com o sentimento de que eles não conseguiram quebrá-lo.
Sami El Haj: Porque não estou só. Há pessoas atrás de mim; este sentimento dá-me força. Na prisão, retirei minha força da convicção de que todo homem livre não pode aceitar ser posto nesta situação de inferioridade e de desumanização. Experimenta-se sentimentos de dor, de desapontamento, mas esforça-se por manter a esperança de que haverá uma saída; e a ideia de que, mesmo na prisão, pode-se continuar o trabalho de jornalista limita o sofrimento.
Silvia Cattori: Enquanto estava em Guantánamo sabia que havia, no exterior, pessoas que lutavam para voz fazer libertar?
Sami El Haj: De facto, eu não sabia. Porque no interior da prisão as notícias são muito difíceis de serem obtidas, mesmo que se tenha um advogado porque ele está proibido de vos informar. As pessoas que trabalham para os direitos do homem, e aqueles que não gostam da administração Bush, hoje eu os conheço. Creio que a sua voz é cada vez mais forte.
Silvia Cattori: Vosso irmão, ao revê-lo, disse que tinha o ar de um homem idoso. É este o vosso sentimento?
Sami El Haj: No que me concerne, vivo pelo meu coração, e não pelo meu rosto ou pelo meu corpo. Sinto meu coração sempre jovem, e mais forte que antes.
Silvia Cattori: Portanto, foi uma experiência muito doloroso mas, de facto, mas sai dela rico com um potencial insuspeitado?
Sami El Haj: Exacto. Do tempo passado em Guantánamos soube tirar algum benefício. Antes de ir para Guantánamo não tinha senão uma pequena família; agora tenho uma grande família, ganhei centenas de amigos no mundo inteiro. Isso é muito positivo: perdi seis anos e meio mas, agora, tenho mais amigos.
Silvia Cattori: Ainda é considerado como um "combatente inimigo"? [3]
Sami El Haj: Não sei mas, quando fui solto disseram-me: Agora já não é perigoso para os Estados Unidos.
Silvia Cattori: E vosso nome não figura mais na "lista terrorista"?
Sami El Haj: Eu não sei. Penso que, na mentalidade deles, todos aqueles que qualificaram como "terroristas" vão ficar "terroristas". E que agora eles têm medo de nós porque nos fizeram mal sem nenhuma razão.
Silvia Cattori: Pensa que os agentes da CIA vão continuar a vos espionar?
Sami El Haj: Sim. Na realidade, não tenho nada contra este país e seu povo. Se a administração Bush corrigir seus erros, não vou queixar-me de nada.
Silvia Cattori: Ficou surpreendido quando, na vossa saída, um oficial do Pentágono, ao vê-lo com uma bengala, vos acusou de ser um manipulador?
Sami El Haj: A gente do Pentágono pretende que os prisioneiros de Guantánamo são malfeitores mas, na realidade, 500 dentre eles agora voltaram para as suas casas. Como poderiam tê-los deixado sair se fossem realmente malfeitores? Eles mentem sempre.
Silvia Cattori: Dois outros sudaneses foram soltos aos mesmo tempo que vós, Amir Yacoub Mohamed al Amin e Walid Mohamed. Como estão eles agora?
Sami El Haj: O governo e a administração do Sudão trataram-nos muito bem. Eles nos acolheram, a todos os três, directamente no aeroporto. Se bem que os Estados Unidos tenham tomado meu passaporte, deram-me um novo em duas horas, e não fizeram nenhuma objecção a que eu viajasse para fora do Sudão.
Silvia Cattori: Em Guantánamo, os militares vos chamavam pelo nome ou pela matrícula de prisioneiro: "número 345"?
Sami El Haj: Nunca me chamavam pelo meu nome, mas "three, four, five", meu número de matrícula. Nos últimos tempos chamavam-me "Al-Jazira". Só os delegados da Cruz Vermelha chamavam-me pelo meu nome.
Silvia Cattori: Estes delegados vos visitaram frequentemente?
Sami El Haj: Quando eles eram autorizador vir nos visitar, todos os dois ou três meses; eu lhes falava, eles traziam cartas da minha família.
Silvia Cattori: A administração Bush e os oficiais encarregados de vos torturar sabiam que era um homem honesto, um simples jornalistas desejoso de dar a conhecer as brutalidades que eles cometiam contra o povo afegão e não um "terrorista". Sabe porque razão eles vos fizeram tanto mal?
Sami El Haj: A maioria dos soldados seguia as ordens dos seus oficiais. Eles torturavam sem qualquer emoção. Mas devo na verdade dizer que alguns dentre eles eram bons. Alguns soldados utilizavam o seu cérebro.
Silvia Cattori: Os agentes da CIA redigiram um relatório sobre as torturas em Guantánamo. Quando eles vos torturavam, ficava com a impressão que eles o observavam, que faziam experiências convosco?
Sami El Haj: Estávamos sob a vigilância constante de médicos psiquiatras em uniformes militares. Eles não estavam lá para cuidar, mas para participar nos interrogatórios, para observar os torturados de modo a que nenhum pormenor no comportamento do prisioneiro lhes escapasse. É sob a responsabilidade do coronel Morgan, médico especializado em psiquiatria, que se faziam os interrogatórios. Este coronel foi colocado, desde Março de 2002, em Guantánamo. Servira na prisão afegã de Bagram a partir de Novembro de 2001. Ele dava instruções aos oficiais que nos interrogavam, estudava nossas reacções, notava cada pormenor para, em seguida, adaptar as torturas à personalidade de cada detido, o que deixou traços profundos no seu psiquismo.
Falei com eles. Disse-lhe que a missão do médico era nobre, ajudar as pessoas, não torturá-las. Responderam-me: "Nós somos militares, devemos seguir as regras; quando um oficial dá uma ordem, sou obrigado a executá-la, senão, serei colocado na prisão como vós; quando assinei o contrato com o exército, nesse momento compreendi que devia obedecer a tudo".
Silvia Cattori: Dentre as torturas praticadas em Guantánamo, vejo semelhanças com as torturas praticadas em Israel sobre os prisioneiros políticos palestino. A tortura do sono, por exemplo, é a sua especialidade.
Sami El Haj: Creio que a maioria dos serviços de informação do mundo inteiro veio a Guantánamo. Vi britânicos, vi canadianos. Eles foram lá por se interessarem em interrogatórios, e também para fornecer aos oficiais da CIA e do FBI conselhos sobre como torturar, como interrogar, com base nas suas experiências.
Silvia Cattori: Consegue dormir tranquilamente?
Sami El Haj: Já não é como antes de Guantánamo. Não durmo senão 3 a 4 horas. Hoje, quando reencontrei pessoas da Cruz Vermelha, pedi-lhes para me ajudarem a ultrapassar minhas dificuldades, para me aconselharem um médico que possa examinar-me. Sete anos, não é um período curto.
Silvia Cattori: A greve de fome não era um pouco como uma tortura dirigida contra vós próprios? Por que fazê-la durante períodos tão longos, quando vossos carcereiros a utilizavam para vos infligir ainda mais humilhações e sofrimentos?
Sami El Haj: Porque pensávamos que não podíamos permanecer silenciosos, que devíamos fazer alguma coisa. Não tínhamos senão este meio para nos fazer ouvir. A greve de fome é um meio de acção penoso, certamente, muito difícil de suportar. Mas quando se está privado de liberdade deve-se lutar para obtê-la. Era a única coisa que nos restava para dizer à administração Bush que um detido tem sua dignidade, que ele não vive senão do pão, que a liberdade é mais importante.
Silvia Cattori: Como se passava isso quando eles vos alimentavam à força?
Sami El Haj: Quando havia mais de 40 detidos que faziam a greve de fome, a administração do campo tentava quebrar sua resistência fazendo-nos sofrer mais torturas. Éramos isolados em compartimentos frios, desnudados, impedidos de dormir durante longos períodos. Duas vezes por dia, os soldados prendiam-nos numa cadeira especial. Eles nos aplicavam uma máscara sobre a boca; introduziam-nos um tubo grosso no nariz, não no estômago. Quando a ração de alimento normal era de duas latas, eles nos puniam injectando 24 latas e seis garrafas de água. O estômago, encolhido por longas greves de fome, não podia conter estas quantidades. Eles acrescentavam produtos que provocavam a diarreia. O detido, mantido preso nesta cadeira mais de três horas, vomitava, vomitava. Eles nos deixavam no vómito e nos excrementos. Terminada a sessão, arrancavam-nos o tubo com violência; quando viam o sangue a correr eles riam de nós. Como utilizam tubos infectados, nunca limpos, os detidos sofrem de doenças deixadas sem cuidados.
Silvia Cattori: Foi devido a esta longa greve de fome que foi libertado?
Sami El Haj: Não só por causa dela, mas foi uma das razões que levou a administração a soltar-me.
Silvia Cattori: O que pensar das confissões de Khaled Sheik Mohamed [4] , que é acusado de ter organizado mais de 30 atentados em 17 países?
Sami El Haj: Talvez eles o tenham torturado a um ponto em que já não era ele próprio. Nunca o encontrei porque eles o puseram num campo especial. Um oficial disse-me o haviam atingido duramente; pode-se por em dúvida: eles o torturaram terrivelmente.
Silvia Cattori: Quando os Estados Unidos afirmam que ele é o "terrorista Nº 3 da Al-Qaïda", isso tem alguma relação com a realidade?
Sami El Haj: Realmente, não creio em nada que venha da administração Bush. Porque, a mim também, acusaram-me de ser um "terrorista". E sei melhor do que ninguém o que se passa. Estas pessoas mentem demasiado. Nunca acredito em nada do que afirma esta administração. Conheci um prisioneiro que foi tal forma torturado que no fim dizia: Eu sou Ussama Ben Laden. Ele dizia o que eles quisessem para fazer cessar as torturas.
Silvia Cattori: Então, é a Al-Qaida uma criação dos serviços informações ocidentais?
Sami El Haj: Pelo que eu sei, na minha vida nunca encontrei ninguém que me tenha dito: Eu pertenço à Al-Qaida. Em Guantánamo, encontrei a maioria dos detidos porque a política dos nossos guardiões era não deixar os prisioneiros viverem muito tempo juntos na mesma cela. Eles nos transferiram a cada semana; assim, conheciam-se novas pessoas. As pessoas que encontrei em Guantánamo são todas pacíficas. Desde que saí, falei com mais de 100 dentre elas. Aqueles que eram casados recomeçaram a sua vida, o solteiros casaram-se.
Silvia Cattori: Aqueles que extraem forças na oração têm mais possibilidades de escapar à loucura?
Sami El Haj: Certamente! Se sente que alguém vos acompanha, sobretudo se é Deus, irá ser paciente e recordar a todo momento que Deus tem mais poder que os seres humanos. Devo orar a Deus e agradecer-lhe. Devo também agradecer todas as pessoas que me apoiaram. Penso que, mesmo se passasse a minha vida a dizer obrigado, não chegaria a agradecer a todos. Agora, pelo meu trabalho em favor dos direitos do homem, talvez eu possa contribuir para tornar mais feliz a vida de outras pessoas.
Silvia Cattori: Creio que os media e as ONG, no nosso país, não deram a importância devida à defesa dos direitos destes prisioneiros muçulmanos [5] . Durante muito tempo, denunciar os abusos cometidos contra eles era visto como um sinal de simpatia para com os "terroristas". Sabia que os responsáveis de "Repórteres sem fronteiras", por exemplo, cuja missão é proteger os jornalistas, foram criticados por terem esperado cinco anos até falar do vosso caso? [6]
Sami El Haj: As pessoas, infelizmente, acreditaram naquilo que lhes dizia a administração dos Estados Unidos. Agora que compreenderam que aquilo não era verdade, elas corrigirão. Como vos disse, se alguém comete um erro, isto não é um problema; o problema, é perseverar no erro.
Se os jornalistas não se sentem preocupados quando jornalistas são aprisionados no quadro da sua profissão, um dia talvez estes mesmos jornalistas irão encontrar-se na prisão e não encontrarão ninguém para os defender. Devemos trabalhar em conjunto, devemos nos ocupar de cada caso. Se se sabe que um jornalista está aprisionado, há que apoiá-lo, para além da sua cor ou da sua religião.
Como jornalista, quero empenhar-me no apoio aos jornalistas que trabalham para a defesa dos direitos e das liberdades. Há um imenso trabalho diante de nós. Devemos nos empenhar plenamente para fazer libertar estas pessoas que estão encerradas em Guantánamo e nas numerosas prisões secretas onde a administração Bush priva dos seus direitos dezenas de milhares de outras.
Esta experiência em Guantánamo marcou-nos profundamente. O que eu quero reter é a necessidade e a importância da defesa dos direitos do homem. Depois de todo o mal que eles fizeram, todo o mundo hoje está mais preocupado, creio. Não é aceitável abandonar pessoas que sofrem. Temos a obrigação imperiosa de nos solidarizar com eles.
A Al-Jazira tenciona associar-se com os media livres para colectar informações respeitantes aos direitos do homem e às liberdades. Peço a todos os jornalistas para cooperarem connosco neste sentido. Havia mais de 50 nacionalidades em Guantánamo; é um assunto mundial, e não uma questão de tal ou tal detido.
É vergonhoso que, na nossa sociedade, inocentes que foram vendidos encontrem-se encerrados em jaulas, e que esta violação dos direitos fundamentais seja feita num país que pretende ser o garante dos direitos e das liberdades.
Não tenho nenhum ódio. Respeitamos os cidadãos dos Estados Unidos. É o seu governo actual que deve assumir as consequências destes actos.
Os direitos do homem e a segurança não são separáveis, não se pode ter segurança sem o respeito dos direitos fundamentais.
Silvia Cattori: Tem razão em apelar às pessoas honestas e aos jornalistas para não aceitarem que se viole o direito internacional e que se inflijam tratamentos cruéis e degradantes a seres humanos. Mas esta política não teria podido durar se não tivesse o apoio tácito dos governos das grandes potências; é com o seu assentimento que as pessoas designadas como "combatentes inimigos" foram torturadas [7] . O "Patriot Act", por exemplo, promulgado após o 11 de Setembro nos Estados Unidos, todos os países europeus subscreveram seu conteúdo. É no quadro destes acordos secretos que os agentes da CIA e do FBI puderam sequestrar e torturar, na Europa, milhares de inocentes como vós.
Sami El Haj: Quero vos dizer isto: não creio na acção dos governos. Porque todo governo, não importa de que país, prefere governar sem se confrontar com os problemas reais das pessoas. Talvez, por vezes, ele intervenha para dizer que apoia tal causa mas, no fundo, ele não a apoia. Não é senão por razões políticas oportunistas que ele se pronuncia. E talvez mesmo ele afirme sustentar, por cálculo político, uma causa na qual ele não acredita. Esqueça os governos, porque eles fazem sua política. Sim, devemos continuar a trabalhar arduamente para defender os direitos e as liberdades de cada um.
Silvia Cattori: Pode-se concluir dizendo que os "terroristas", tais como os apresentados pela administração Bush e os nossos media, não existem?
Sami El Haj: Posso vos assegurar que os detidos de Guantánamo que encontrei não são "terroristas". Tive ocasião de falar com eles, de os conhecer: são pessoas pacíficas.
Silvia Cattori: Então prenderam-vos porque era preciso fazer número para convencer os outros países europeus que haviam realmente "terroristas" muçulmanos?
Sami El Haj: Nós fomos presos na sequência do atentado do 11 de Setembro, de ninguém até hoje pode dizer quem é o autor. Bush não queria dizer: Cometi erros, não garanti correctamente a segurança. Ele disse: Vamos começar uma guerra contra estes "terroristas". Resultado: ele não trouxe a segurança a quem quer que seja.
Ele tem feito bombardear o Afeganistão, ele enviou os seus soldados para a guerra a povos inteiros, mas ele não prendeu as pessoas que se determina a prender. Ele pagou somas de dinheiro aos paquistaneses para que em contrapartida este começassem a prender pessoas e as remetessem à sua administração.
Em Guantánamo, 89% das pessoas foram compradas, contra dinheiro sonante, às autoridades paquistanesas. Onde eles a encontraram? Encontraram-nas no Paquistão, não no Afeganistão.
Silvia Cattori: Estes prisioneiros foram a seguir torturados com a promessa de parar, se aceitassem tornar-se espiões ao serviço da CIA!? É um sistema terrífico!
Sami El Haj: Sim. Aguardemos que o sr. Bush deixe a administração. Quando ele tiver deixado sua poltrona, estou certo que muitas pessoas vão exprimir-se acerca das suas malfeitorias.
Silvia Cattori: Vosso testemunho é muito importante. Massacraram a vossa juventude. E tendes a magnanimidade de transformar este desastre em alguma coisa de construtivo. Recusai-vos a vos considerar como vítima. Sois verdadeiramente magnífico! Tantas pessoas na prisão devem esperar a ajuda de pessoas da vossa qualidade.
Sami El Haj: Devemos trabalhar arduamente a fim de que aqueles que continuam a apoiar a administração Bush acabem por se sentir envergonhados dos seus actos. Neste momento, ninguém mais vai ajudá-las. E quanto mais ninguém as ajudar, elas pararão. Toda a história de Guantánamo é uma mancha negra. A administração Bush quis enganar a opinião pública dizendo que éramos terroristas. Ora, estes homens que foram encerrados na sua grande maioria são, como eu, inocentes.
Silvia Cattori: Obrigado por nos ter concedido esta entrevista.
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Toda a gente pode constar: os pretensos "terroristas" que as nossas sociedades perseguem são na realidade vítimas O sr. Sami El Haj impressona pela sua sabedoria, sua maturidade, sua elevação de vistas. Ele faz pensar em Cristo na Cruz, pois o seu calvário não acabou; os ferimentos são demasiado profundos. Sua delicadeza contrasta com a descrição dos presumidos "terroristas" que as autoridades e os media tradicionais nos serviram durante todos estes anos. Nada de reivindicações nem de queixas. Seu relato é sóbrio, sem ênfase. Ele deveria fazer mexer as coisas. Enfatiza a acção a efectuar para fazer sair, sem tardar, aqueles que permanecem cativos. Ele diz e repete que não poderá encontrar repouso enquanto os detidos de Guantánamo não forem libertados. Há doravante a urgência, a obrigação moral de reagir, de explicar honestamente o que realmente se passou, a lutar para que as nossas sociedades adoptem uma política em que o mundo árabe e muçulmano possa esperar outra coisa além de guerra e racismo. Se, em conjunto, os media do arco em torno do Lago Leman relataram correctamente a passagem por Genebra do sr. Sami El Haj, acontece também que a televisão pública local (TSR) minimizou o acontecimento e não se dignou a convidá-lo ao seu écran. Deve-se notar – será que isto explica aquilo? – que os redactores da TSR deram a palavra abundantemente, nestes últimos sete anos, aos "bons árabes", como Antoine Basbous ou Antoine Sfeir, que vão repetindo aquilo que os nossos redactores dizem ou querem ouvir, contribuindo assim para apoiar as teses belicistas que tem, aparentemente, o seu favor. Os sequestros, os centros de tortura como Guantánamo, Abou Ghraib, Bagram, Kandahar, não são, como muitas vezes se dá a entender, uma simples "derrapagem" [8] , mas exactamente a expressão de uma política criminosa que serve os interesses ocultos de dois Estados, principalmente os Estados e Israel. Pode-se aliás perguntar-se se este último não é o único ganhador destas guerras, que não só devastaram povos inteiros como também arruinaram a imagem dos Estados Unidos no mundo. Esta "guerra contra o terrorismo", da qual nos enchem os ouvidos, é uma guerra criminosa; uma guerra manipulada pelas grandes potências e seus serviços de informação. São cada vez mais numerosas as pessoas que compreendem que as sanções da ONU, as "listas terroristas" que a Europa igualmente redigiu, as campanhas depreciativas em relação aos muçulmanos, são instrumentos de manipulação da opinião pública, destinada a manter artificialmente um clima conflitual. Os atentados do 11 de Setembro de 2001, de resto, serviram imediatamente de pretexto para orientar a política internacional de Tel Aviv e Washington no sentido de objectivos militares programados de longa data. Eles serviram nomeadamente para liquidar toda forma de resistência à sua política criminosa. A começar pela resistência palestina e muçulmana. Após o desmantelamento da União Soviética, o mundo islâmico foi designado como o novo "eixo do mal". Desde o princípio dos anos 90, os Estados Unidos e Israel manobraram de modo a provocar o medo e a intolerância em relação aos muçulmanos e a incitar os serviços secretos de diversos países a infiltrá-los, a manipulá-los, a financiá-los, a encorajar renegados a fazerem atentados; para a seguir apontarem o dedo, justificarem medidas coercivas, os sequestros, as torturas as detenções arbitrárias. Desde 2001, quando os principais media prazeirosamente faziam-se eco de campanhas contra "anti-semitas" frequentemente imaginários, dezenas de milhares de muçulmanos eram sequestrados, encapuçados, aprisionados, moídos, por torcionários, a fim de os constranger a aceitar, à força, a trabalhar como espiões para os serviços de informações estatais. Tudo isso decalcado nos métodos dos serviços secretos israelenses do Shin Beth [9], que tão bem funcionou para triturar uns 700 mil palestinos aprisionados arbitrariamente durante estes últimos 40 anos. É esta sociedade que queremos? O que é mais lamentável e mais desencorajador nesta triste história é o facto de que os governos europeus serviram-se desta pretensa "ameaça islâmica" para se desembaraçarem de numerosas protecções constitucionais e puseram, também eles, em aplicação as medidas ilegais ditadas pelo sr. Bush, e permitiram assim à CIA sequestrar, no seu solo, muçulmanos, sabendo perfeitamente que iam ser entregues a centros de torturas, fora de todo direito, e por durações ilimitadas. Cabe perguntar igualmente quanto ao lugar que os chefes de redacções têm concedidos, e continuam a conceder, a estes pretensos "especialistas em terrorismo" que tem cultivado o fantasma do "perigo islamista". "Especialistas" que retomam a propaganda estado-unidense, associando Islão e "terrorismo", quando sabem perfeitamente que a estratégia de Washington e de Tel Aviv é associar, sem qualquer prova, muçulmanos a "terroristas" [10] . Cada um de nós recorda-se daquelas campanhas enviesadas destinadas a vilipendiar e destruir a carreira de dois irmão: Hani e Tariq Ramadan, nomeadamente em França e na Suíça. Nos outros países houve montagens semelhantes. Se não quisermos uma sociedade pervertida, baseada na mentira, que autoriza os sequestros, os centros de tortura, os assassinatos selectivos, as estratégias de infiltrações, destinadas a transformar pessoas em informadores, é tempo de reagir. Ver o sr. Sami El Hadj, retornando do inferno, a apelar, sem ódio nem espírito de vingança, os jornalistas a trabalhar para fazer triunfar os direitos humanos, para apagar esta "mancha negra da memória", é uma grande lição. Nossa "civilização ocidental", nossa "democracias" tão louvadas, em nome das quais se fizeram tantas guerra e cometeram-se tantos crimes, nossos media "livres", deverão contar doravante com estes retornados que nos conclamam a acordar.
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[1] Sami El Haj foi convidado a Genebra pela Fundação "Alkarama for Human Right". Ver: "Sami El Haj achève une intense visite à Genève" , Alkarama for Human Rights, 2 juillet2008.
[2] Ver: "Andreas von Bülow : Nous devons d'abord lutter contre la manipulation" , Réseau Voltaire, 6 janvier 2006.
[3] Segundo o sr. Dick Marty, relator da Comissão de Assuntos Jurídicos e dos Direitos Humanos do Conselho da Europa encarregado de inquirir a existência de prisões secretas da CIA na Europa, um "acordo secreto, concluído em Outubro de 2001 entre os Estados Unidos e seus aliados da NATO, estabeleceu o quadro que permitiu à CIA encarcerar "detidos de grande importância" na Europa. É este acordo que autoriza as graves violações dos direitos, inclusive a tortura".
[4] Khalid Cheikh Mohammed foi preso no Paquistão em 2003. Acusado de ser o número 3 da Al-Qaida, ele foi internado em diversas prisões secretas antes de ser colocado no isolamento, desde 2006, em Guantánamo, e torturado com selvajaria. Seu processo-farsa diante do tribunal militar, juntamente com 14 outros responsáveis da Al-Qaida, teve lugar em Junho de 2008.
[5] A "Comissão Árabe dos Direitos Humanos" bateu-se desde o princípio pelo encerramento de Guantánamo. Ver: http://www.achr.nu/
[6] Ver: "Reporters Sans Frontières se souvient (tardivement) de Sami Al Haj" , Réseau Voltaire, 17 février 2006.
[7] O estatuto de "combatente inimigo" e "combatente ilegal" permitindo ao governo dos Estados Unidos deter sem limites, sem passar por uma jurisdição civil, os prisioneiros assim designados, decorre da lei "Patriot Act", uma lei de excepção destinada a "unir e reforçar a América fornecendo as ferramentas apropriadas para detectar e conter o terrorismo" votada pelo Congresso dos Estados Unidos e assinada por George W. Bush em 26 de Outubro de 2001.
[8] O diário "24 Horas" escreveu em 27 de Junho de 2008: "Sami Elhaj está de passagem em Genebra para denunciar a derrapagem insensata da grande máquina anti-terrorista americana".
[9] Ver: "Why did they treat me like that?" , por Gideon Levy, Haaretz, 6 juillet 2008. Ver igualmente: "Full account of Muhammed Omer's hair-raising encounter with the Shin Beth" , por Khalid Amayreh, 1er juillet 2008.
[10] No seu sítio internet, M. Youssef Nada mostra o papel que certos jornalistas desempenharam na sua destruição com base em mentiras. Ver: http://www.youssefnada.ch/
[*] Jornalista suíça.
O original encontra-se em http://www.voltairenet.org/article157806.html
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
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